de 14 de Setembro
Fernando António Nogueira Pessoa deixou publicada, em vida, uma décima parte da sua obra. O valor do seu legado cultural é hoje facto incontroverso, expresso no reconhecimento de críticos e pensadores sobre o valor de civilização e cultura dos escritos que deixou.A circunstância de não ter levado a termo a edição da sua obra, e as dos seus heterónimos, atribui ao seu espólio um valor cultural único. Nesse espólio, encontram-se plasmados os valores de memória, autenticidade, originalidade, singularidade e exemplaridade do génio do autor.
Se para qualquer autor o espólio testemunha vivências relevantes do percurso seguido no acto de criação, registando as respectivas técnicas e os hábitos de trabalho, no caso de Fernando Pessoa os autógrafos e demais documentos genéticos que integram o seu espólio tiveram, e continuarão a ter, um valor fundacional do legado conhecido e por conhecer.
A relevância cultural desse espólio confunde-se, pois, com a obra, já que é essencialmente no espólio que esta se materializa. Não se tratando de materiais acabados ou definitivamente fixados pelo autor, o espólio constitui uma matriz aberta a diferentes leituras que nem o mais laborioso conjunto de investigações poderá fechar.
Com efeito, de acordo com os critérios e os pressupostos de classificação previstos na Lei 107/2001, de 8 de Setembro, que estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização cultural, o testemunho de civilização e cultura do espólio de Fernando Pessoa reveste-se de interesse nacional e exige a respectiva protecção e valorização, atendendo ao relevante interesse cultural, designadamente histórico, linguístico, documental, artístico e social, reflectindo valores de memória, autenticidade, originalidade, raridade, singularidade e exemplaridade.
Assim, tendo em conta a necessidade de assegurar especiais medidas sobre o património cultural nacional, no quadro da obrigação do Estado de proteger e valorizar o património cultural como instrumento primacial de realização da dignidade da pessoa humana, objecto de direitos fundamentais, meio ao serviço da democratização da cultura e esteio da independência e da identidade nacionais, o Governo entende que o referido património bibliográfico deve ser objecto de especial protecção como universalidade de facto.
Para o efeito, o presente decreto procede à classificação do espólio documental de Fernando Pessoa como bem de interesse nacional, tendo em vista evitar o risco de dispersão, deterioração ou perecimento.
O procedimento de classificação do espólio de Fernando Pessoa foi amplamente divulgado, pela Biblioteca Nacional de Portugal no âmbito das respectivas atribuições, tendo contado com o parecer dos mais importantes especialistas da obra pessoana, verificando-se consenso unânime sobre o nível de protecção que se torna imperativo atribuir ao espólio.
Foi realizada a audiência prévia de todos os proprietários e detentores conhecidos das partes componentes do espólio documental de Fernando Pessoa, bem como consulta pública, e dada ampla divulgação pública na página electrónica da Biblioteca Nacional de Portugal de todos os documentos que integram o procedimento de classificação.
Assim:
Nos termos do artigo 28.º da Lei 107/2001, de 8 de Setembro, e da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Classificação
1 - É classificado como bem de interesse nacional o espólio de Fernando Pessoa, compreendido como a universalidade de facto composta por todos os documentos produzidos ou reunidos por Fernando Pessoa, seja na forma de manuscritos autógrafos, isolados ou integrados em documentos de terceiros, assinados ou não, de dactiloscritos ou tiposcritos, com ou sem intervenção autógrafa, assinados ou não, bem como todos os documentos biográficos de Fernando Pessoa ou que registem as suas técnicas e hábitos, assinados ou não, seja qual for o acabamento do texto ou textos neles contidos, e os documentos impressos que se reconheça terem pertencido à sua biblioteca e ostentem marcas autógrafas de utilização.2 - O espólio de Fernando Pessoa é designado como «tesouro nacional».
Artigo 2.º
Entrada em vigor
O presente decreto entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 30 de Julho de 2009. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - José António de Melo Pinto Ribeiro.
Assinado em 31 de Agosto de 2009.
Publique-se.O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendado em 1 de Setembro de 2009.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.