de 3 de Agosto
A Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro, que estabelece um quadro de acção comunitária no domínio da política da água, assim como as modernas abordagens à gestão ambiental, recomendam o emprego de instrumentos económicos e financeiros na protecção dos recursos hídricos. Estes instrumentos podem desempenhar um papel da maior importância na racionalização do aproveitamento dos recursos hídricos e na sinalização do seu valor, além de serem um instrumento de compensação dos custos que a Administração concretamente suporta na gestão e controlo destes recursos naturais.Os fundos públicos constituem um dos instrumentos que, ao nível internacional têm, vindo a ser utilizados na prossecução de políticas no sector das águas. Através da constituição de fundos públicos procura-se mobilizar e gerir com maior eficácia os recursos do Estado e devolver aos particulares uma parcela dos tributos ambientais que sobre eles incidem.
É esta a razão que explica o surgimento de fundos ambientais, como o Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos, previsto no artigo 19.º do Decreto-Lei 97/2008, de 11 de Junho, a cuja criação procede o presente decreto-lei. Trata-se de um fundo público que visa promover a utilização racional e a protecção dos recursos hídricos através da afectação de recursos a projectos e investimentos necessários ao seu melhor uso e, muito em particular, através da afectação aos mesmos de uma parcela da receita gerada pela taxa de recursos hídricos. Até por isso, a contribuição do Orçamento do Estado para o financiamento do Fundo deve ser residual. Procura-se, assim, acompanhar as melhores práticas internacionais na matéria, devolvendo aos operadores económicos a receita por eles gerada e reforçando, deste modo, uma relação comutativa com o Estado, que não apenas legitima a taxa e recursos hídricos como resulta em benefício maior para o meio ambiente.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
O presente decreto-lei procede à criação do Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos, doravante designado como Fundo, em conformidade com o n.º 1 do artigo 19.º do Decreto-Lei 97/2008, de 11 de Junho.
Artigo 2.º
Natureza jurídica
O Fundo é um património autónomo sem personalidade jurídica, com autonomia administrativa e financeira e com personalidade judiciária.
Artigo 3.º
Missão
1 - O Fundo tem por missão contribuir para a utilização racional e para a protecção dos recursos hídricos, através da afectação de recursos a projectos e investimentos necessários ao seu melhor uso, designadamente os seguintes:a) Projectos tendentes a melhorar a eficiência na captação, aproveitamento e distribuição de águas;
b) Projectos tendentes a minorar a carga poluente objecto de rejeição nos meios hídricos;
c) Projectos tendentes a minorar o impacto ambiental da ocupação do domínio público hídrico do Estado;
d) Projectos tendentes a melhorar os ecossistemas hídricos;
e) Projectos que contribuam para o controlo de cheias e outras intervenções de sistematização fluvial;
f) Outros projectos que contribuam para a protecção e valorização dos recursos hídricos no âmbito das competências da Autoridade Nacional da Água e das Administrações das Regiões Hidrográficas.
2 - O Fundo visa ainda a redistribuição de recursos entre as administrações das regiões hidrográficas, sempre que aquela se mostre necessária à concretização de intervenções e projectos de maior envergadura e que exijam destas maior esforço financeiro.
3 - O Fundo pode estabelecer mecanismos de articulação com outros fundos públicos, de direito nacional, comunitário ou internacional, que tenham como objectivos a promoção da utilização racional e a protecção dos recursos hídricos.
Artigo 4.º
Direcção
1 - O Fundo é dirigido por um director, coadjuvado por um subdirector, que são, por inerência, o secretário-geral e um secretário-geral-adjunto do ministério responsável pela área do ambiente.2 - Sem prejuízo das competências que lhe sejam conferidas por lei ou que nele sejam delegadas ou subdelegadas, compete ao director dirigir e orientar a acção do Fundo, nomeadamente:
a) Elaborar o plano anual de actividades, o relatório de actividades e os documentos plurianuais de planeamento;
b) Elaborar o orçamento anual e assegurar a respectiva execução;
c) Promover a arrecadação de receitas;
d) Autorizar a realização de despesas;
e) Praticar os actos de gestão do património;
f) Propor à tutela a aplicação financeira das receitas, em articulação com a programação financeira das administrações das regiões hidrográficas;
g) Elaborar o relatório e contas de gerência;
h) Apreciar os projectos de intervenção que lhe sejam submetidos;
i) Acompanhar, avaliar e controlar a execução dos projectos financiados pelo Fundo;
j) Zelar pela existência e pelo funcionamento de um sistema de informação relativo à execução dos projectos financiados pelo Fundo;
l) Propor à tutela os regulamentos necessários ao funcionamento do Fundo;
m) Exercer as demais competências conferidas pelo presente decreto-lei.
3 - O subdirector exerce as competências que lhe sejam delegadas ou subdelegadas pelo director, competindo-lhe ainda substituir o director nas suas faltas e impedimentos.
Artigo 5.º
Fiscal único
1 - O Fundo dispõe de um fiscal único, que é o órgão responsável pelo controlo da legalidade e da regularidade da sua gestão financeira e patrimonial.2 - O fiscal único é nomeado por despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e do ambiente, para um mandato com a duração de três anos, no qual é fixada a respectiva remuneração.
3 - Compete ao fiscal único:
a) Emitir parecer sobre o relatório de actividades e a conta de gerência;
b) Acompanhar, com regularidade, a gestão através dos balancetes e mapas demonstrativos da execução orçamental;
c) Manter informado o director e os membros do Governo competentes sobre o resultado de verificações ou de exames a que proceda;
d) Propor a realização de auditorias externas quando as mesmas se revelem necessárias ou convenientes;
e) Pronunciar-se sobre qualquer outra matéria no domínio da gestão económica e financeira sempre que tal lhe seja solicitado pelos membros do Governo competentes ou pelo director do Fundo.
4 - O fiscal único exerce as suas funções com independência técnica e funcional e no estrito respeito dos deveres de imparcialidade, isenção e sigilo sobre os factos de que tenha conhecimento no exercício, ou por causa, dessas funções.
Artigo 6.º
Receitas
1 - O Fundo dispõe das seguintes receitas:a) A parcela do produto da taxa de recursos hídricos que lhe cabe nos termos do n.º 1 do artigo 18.º do Decreto-Lei 97/2008, de 11 de Junho;
b) O produto das demais taxas, contribuições ou impostos que lhe sejam afectos, nos termos e limites definidos na Lei de Enquadramento Orçamental;
c) As dotações que lhe sejam atribuídas pelo Orçamento do Estado;
d) Os rendimentos provenientes da aplicação financeira dos seus capitais;
e) Os rendimentos provenientes da alienação, oneração ou cedência temporária do seu património;
f) O produto das heranças, legados, doações ou contribuições mecenáticas que lhe sejam destinadas;
g) Quaisquer outras receitas que lhe venham a ser atribuídas ou consignadas por lei ou por negócio jurídico.
2 - Os saldos que venham a ser apurados no fim de cada ano económico transitam para o ano seguinte, nos termos do decreto-lei de execução orçamental em vigor.
Artigo 7.º
Despesas
Constituem despesas do Fundo as resultantes dos encargos e das responsabilidades decorrentes da prossecução das suas actividades.
Artigo 8.º
Gestão financeira
1 - Os serviços contabilísticos, orçamentais e de secretariado necessários ao funcionamento do Fundo são prestados pela secretaria-geral do ministério responsável pela área do ambiente.2 - A gestão financeira do Fundo realiza-se de acordo com os princípios e os instrumentos de gestão aplicáveis aos fundos e serviços autónomos.
Artigo 9.º
Gestão técnica
1 - A gestão técnica do Fundo é assegurada pelo subdirector, considerando-se nele delegadas as competências referidas nas alíneas a) e g) a j) do n.º 2 do artigo 4.º 2 - O apoio técnico é prestado por trabalhadores em funções públicas, através de modalidade de mobilidade interna, nos termos da lei, no âmbito dos serviços integrados no ministério responsável pela área do ambiente, sendo a sua remuneração integralmente suportada pelo orçamento do Fundo ou partilhada com a secretaria-geral do ministério responsável pela área do ambiente.
Artigo 10.º
Financiamento de projectos e iniciativas
1 - São susceptíveis de ser objecto de financiamento os projectos apresentados por entidades públicas ou privadas cuja execução se enquadre no âmbito da missão do Fundo.
2 - O procedimento de apresentação e selecção de projectos consta do regulamento de gestão do Fundo, aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e do ambiente.
3 - Nenhum projecto pode beneficiar de mais de 20 % das verbas anuais do Fundo, excepto se devidamente autorizado por despacho do membro do Governo responsável pela área do ambiente.
Artigo 11.º
Disponibilização de financiamentos
1 - A disponibilização dos montantes correspondentes aos financiamentos aprovados pelo Fundo deve ser, preferencialmente, realizada de forma faseada, à medida da execução dos projectos, sempre que isso seja adequado à sua natureza.2 - As regras de pagamento dos montantes de financiamento constam do regulamento de gestão do Fundo, aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e do ambiente.
Artigo 12.º
Execução e fiscalização dos projectos
1 - Os projectos financiados pelo Fundo são executados nos termos, condições e prazos estabelecidos na decisão de financiamento.
2 - A execução de projectos em incumprimento do disposto no número anterior determina a imediata e integral restituição dos montantes objecto de financiamento, sem prejuízo da responsabilidade disciplinar, financeira, civil ou outra a que haja lugar.
3 - A execução técnica e financeira dos projectos é fiscalizada pelo Fundo, assegurando este o cumprimento das condições que determinaram o financiamento, bem como a eficácia e a eficiência das medidas adoptadas.
Artigo 13.º
Reembolso de financiamentos
1 - Quando tal se revele adequado à natureza do projecto, os financiamentos atribuídos pelo Fundo podem ser objecto de reembolso, devendo as condições de recuperação do investimento constar da decisão de financiamento.2 - Os financiamentos concedidos pelo Fundo podem ser por este recuperados através da sua participação em receitas que sejam geradas em resultado da execução dos projectos, proporcionalmente ao seu investimento.
3 - Os montantes de financiamento podem ser objecto de remuneração.
4 - As regras de reembolso e remuneração dos montantes de financiamento constam do regulamento de gestão do Fundo, aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e do ambiente.
Artigo 14.º
Colaboração com outras entidades
O Fundo pode requerer a todos os serviços e organismos públicos a colaboração e as informações que julgue necessárias à prossecução dos seus objectivos, nomeadamente na área técnico-pericial, podendo estabelecer convénios com outras entidades com o objectivo de melhor acompanhar os projectos de prevenção ou de reconstituição de bens ambientais.
Artigo 15.º
Início de funcionamento
O Fundo entra em funcionamento em 1 de Janeiro de 2010.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 5 de Junho de 2009. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - Fernando Teixeira dos Santos - Francisco Carlos da Graça Nunes Correia.
Promulgado em 16 de Julho de 2009.
Publique-se.O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendado em 17 de Julho de 2009.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.