Decreto-Lei 46698
1. A assistência médica através dos serviços hospitalares é hoje uma necessidade indispensável ao bem-estar das populações em todos os países.
Fruto das conquistas das ciências médicas e do desenvolvimento cultural dos povos, estimulada pela melhoria do nível económico, esta necessidade põe em causa toda a estrutura clássica dos hospitais, tanto no campo da organização dos serviços, em nível nacional ou local, como no seu financiamento, ou ainda no que respeita ao pessoal e seu estatuto.
Naturalmente, as soluções não serão precisamente iguais em toda a parte. Cada povo tem as suas características próprias, o seu grau de desenvolvimento económico e cultural, as suas tradições e as suas aspirações particulares.
2. Há, no entanto, objectivos válidos em todos os países, entre os quais sobressaem dois que poderemos considerar essenciais: a garantia de assistência pronta e eficiente às populações e o maior aproveitamento dos meios de acção (edifícios, apetrechamento e pessoal), em que a comunidade investe somas vultosas.
Efectivamente, a assistência médica nos hospitais deve ser não só tècnicamente actualizada, mas também pronta e eficiente.
Quer-se dizer que não basta usar os meios científicos mais modernos, mas sim que não devem os doentes aguardar, por tempo superior ao devido, os cuidados de que necessitam, nem a sua demora nos serviços hospitalares se deve prolongar para além do estritamente necessário.
Por cada dia de espera na entrada para o hospital ou de demora não necessária no internamento, há um forte prejuízo material e moral para os indivíduos, para a família e para a sociedade, que importa evitar, tanto quanto possível.
3. O Governo tem feito um esforço notável na construção e apetrechamento de hospitais, despendendo nisso somas elevadas.
Todavia, a correcta utilização destes meios impõe a revisão do regime de trabalho do pessoal médico, precisamente aquele pessoal que constitui o cerne da organização e do qual depende, em primeira mão, a sua eficiência.
Não parece possível aceitar que os nossos hospitais continuem a trabalhar mèdicamente apenas o período da manhã e se encontrem durante 18 e 20 horas por dia sem equipas médicas, exceptuando aquelas que, por escala, asseguram a assistência de urgência.
Esta subutilização dos nossos meios hospitalares traduz-se em altas médias na duração do internamento e, como consequência, no congestionamento das enfermarias, assim como no alongamento das listas de espera.
Cada dia que pudermos reduzir à hospitalização, aos exames complementares ou à assistência ambulatória corresponde a novas camas ou serviços postos à disposição das populações.
Já se calculou que, se pudéssemos reduzir dez dias à estada de internamento nos nossos hospitais-centrais - e isso aproximar-nos-ia das médias correntes noutros países -, tal facto corresponderia ao funcionamento permanente de cinco hospitais de 500 camas - sem as pertinentes despesas de instalação e redução, muito importante nas de manutenção, como é óbvio.
4. Para atingir este objectivo, teremos de seguir o caminho já andado por outros países e que, embora diverso nos pormenores, tem de comum em todos a preocupação de fixar os médicos no hospital.
O hospital sem médicos é corpo sem vida, inútil, quando não prejudicial. É também no hospital que os médicos encontram a possibilidade plena de se realizarem profissionalmente. Esta harmonia de interesses - do médico e do hospital - tem de ser prosseguida com urgência, mas também com muita prudência.
Em alguns países, como a França, por exemplo, esta transformação da vida hospitalar foi apoiada financeiramente pela Previdência Social. Entre nós, o recente acordo celebrado entre a Direcção-Geral dos Hospitais e a Federação de Caixas de Previdência e Abono de Família abre perspectivas favoráveis que, por certo, se acentuarão à medida que o seu âmbito vier a ampliar-se.
5. Trata-se, todavia, de campo em que nos falta experiência e no qual devemos agir com toda a precaução. Não podemos, desde já, estabelecer sistemas generalizados ou regulamentações definitivas que, embora teòricamente defensáveis, se arrisquem a ser rejeitadas pela prática.
Importa, antes, agir com espírito experimental. Esse é o motivo por que, em vez de uma excessiva generalização, se adopta o sistema de escolher hospitais - e mais provàvelmente serviços dentro de cada hospital - para iniciar uma organização de presença médica constante ou de médicos em tempo completo. E é essa também a razão que leva a fazer funcionar esses serviços no regime transitório de instalação, previsto nos artigos 7.º a 9.º do Decreto-Lei 31913, de 12 de Março de 1942.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. O Ministro da Saúde e Assistência pode estabelecer, em hospitais ou serviços que para isso reúnam as necessárias condições, o regime de presença médica constante, em ordem a utilizar as instalações e o material durante o maior período que, em cada dia, seja possível.
2. O regime referido no número anterior obter-se-á pela presença de turnos de pessoal, cujo trabalho não excederá, em duração, o que constar do respectivo contrato ou das condições legais de admissão.
Art. 2.º - 1. Pode o Ministro da Saúde e Assistência designar hospitais ou serviços nos quais todo ou parte do pessoal clínico trabalhe em tempo completo.
2. Estabelecer-se-á, em regulamento, um regime transitório que salvaguarde os direitos dos médicos que trabalhem nesses serviços em tempo parcial e não desejem ingressar no horário de tempo completo.
Art. 3.º Nos hospitais e serviços referidos nos artigos anteriores é aplicável, mediante portaria do Ministro da Saúde e Assistência, o regime de instalação, contido nos artigos 7.º a 9.º do Decreto-Lei 31913, de 12 de Março de 1942.
Art. 4.º O pessoal que trabalhe nos referidos hospitais ou serviços à data da instauração de alguns dos regimes previstos nos artigos 1.º e 2.º poderá, sem perda de direitos adquiridos, desempenhar as funções que lhe sejam atribuídas, em regime de comissão de serviço, válida por todo o tempo que durar o período de instalação ou até à publicação dos quadros, se esta não coincidir com o fim daquele período.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 4 de Dezembro de 1965. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - António Jorge Martins da Mota Veiga - Manuel Gomes de Araújo - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior - João de Matos Antunes Varela - Joaquim da Luz Cunha - Fernando Quintanilha Mendonça Dias - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - Eduardo de Arantes e Oliveira - Inocêncio Galvão Teles - José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira - Carlos Gomes da Silva Ribeiro - José João Gonçalves de Proença - Francisco Pereira Neto de Carvalho.
Para ser presente à Assembleia Nacional.