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Assento , de 12 de Janeiro

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Sumário

Na vigência do Decreto-Lei n.º 289/73, de 6 de Junho, é valido o contrato-promessa de compra e venda de terreno compreendido em loteamento sem alvará, a menos que no momento da celebração desse contrato haja impossibilidade de obtenção do alvará, por haver lei, regulamento ou acto administrativo impeditivo da sua emissão

Texto do documento

Assento

Processo 72357

Acórdão

Acordam, em plenário, no Supremo Tribunal de Justiça:

Fernando Alberto dos Santos Loio recorreu para o tribunal pleno, nos termos do artigo 763.º do Código de Processo Civil, do acórdão proferido neste Tribunal em 26 de Abril de 1984, proferido na revista n.º 71266/1.ª S., com o fundamento de estar ele em oposição com o Acórdão deste mesmo Supremo de 15 de Outubro de 1980, publicado no Boletim, n.º 300, p. 381, sobre a mesma questão de direito: são, ou não, nulos os contratos-promessa de compra e venda de terreno compreendido em loteamento ainda não titulado por alvará? E, de facto, enquanto na decisão recorrida a resposta foi negativa, no acórdão indicado como estando em oposição ela foi afirmativa e, deste modo, foi ali já dado válido o contrato-promessa, enquanto no último foi ele declarado nulo, julgamentos contraditórios proferidos, qualquer deles, quando vigorava o Decreto-Lei 289/73, de 6 de Junho, que no seu artigo 27.º previa expressamente esta matéria.

Esta oposição entre os dois acórdãos foi reconhecida pela respectiva secção, como se vê do Acórdão de 10 de Janeiro de 1985, a fl. 20 destes autos, o qual mandou, por isso, prosseguir os autos.

O recorrente, na sua douta alegação, formulou a conclusão seguinte:

Face ao disposto no n.º 1 do artigo 401.º do Código Civil, não poderá deixar de se considerar nulo, por impossibilidade (legal) originária da prestação, o contrato-promessa de compra e venda que tenha por objecto talhão de terreno resultante de uma operação de loteamento sem estar o respectivo alvará aprovado.

O recorrido não contra-alegou e o Exmo. Magistrado do Ministério Público, no seu douto parecer, defende a confirmação do acórdão recorrido, sugerindo se lavre assento, para o qual propõe a seguinte redacção:

Na vigência do Decreto-Lei 289/73, de 6 de Junho, é válida a promessa de compra e venda de terrenos compreendidos em loteamento sem alvará, excepto quando, no momento da celebração do contrato, haja impossibilidade de obtenção de alvará, por haver lei, regulamento ou acto administrativo impeditivo da sua emissão.

O artigo 766.º, n.º 3, do Código de Processo Civil dispõe que, embora reconhecida preliminarmente a existência da oposição, isso não impede decisão em contrário do tribunal pleno, ao apreciar o recurso. Contudo, porque é patente a oposição do acórdão recorrido com o referido de 15 de Outubro de 1980, não nos deteremos mais nesta matéria, dando definitivamente como assente a existência da oposição.

Tudo visto.

O artigo 27.º do Decreto-Lei 289/73 estabelece:

1 - As operações de loteamento referidas no artigo 1.º, bem como a celebração de quaisquer negócios jurídicos relativos a terrenos, com ou sem construção, abrangidos por tais operações, só poderão efectuar-se depois de obtido o respectivo alvará, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 21.º

2 - Nos títulos de arrematação ou outros documentos judiciais, bem como nos instrumentos notariais relativos aos actos ou negócios referidos no número anterior, deverá sempre indicar-se o número e data do alvará de loteamento em vigor, sem o que tais actos serão nulos e não podem ser objecto de registo.

O problema que logo se levanta equaciona-se deste modo: o n.º 1 do artigo 27.º aplica-se a todo e qualquer negócio jurídico implicando imediata divisão em lotes de qualquer área de um ou vários prédios, situados em zonas urbanas ou rústicas e destinados, imediata ou subsequentemente, à construção (artigo 1.º desse decreto-lei) ou abrangerá igualmente «todos os demais negócios jurídicos que apresentassem uma relação de qualquer natureza com a globalidade do prédio ou com os lotes nele constituídos, edificados ou não?» (O Novo Regime Jurídico dos Loteamentos Urbanos, de Maria do Patrocínio Paz Ferreira e Luís Perestrelo de Oliveira, p. 95).

E foi na resposta a esta pergunta que os tribunais começaram a divergir, como são paradigma os dois acórdãos em causa: o recorrido e o indicado como em oposição a ele.

Ora, não se compreende que a nulidade sancionada pelo n.º 2 do artigo 27.º abrangesse qualquer hipótese que, directa ou mediatamente, implicasse a divisão em lotes do prédio ou prédios.

Com efeito, como referem os autores citados, pode surgir «uma vasta gama de negócios jurídicos que, embora relativos a terrenos abrangidos por uma operação de loteamento urbano, nenhuma relevância adquiriam em face da finalidade do preceito» (ob. cit., p. 95). E esta vem indicada no relatório do decreto: para além de «defender os compradores menos cautelosos, pretende ainda evitar a criação de núcleos habitacionais contrários a um desenvolvimento urbano racional».

Entre esses negócios jurídicos sem relevância para isso, temos os simples contratos-promessa, uma vez que estes são uma mera convenção obrigacional de prestação de facto, sendo certo que (Acórdão deste Supremo de 31 de Março de 1981, no Boletim, n.º 305, p. 288) o n.º 2 do artigo 27.º só comina nulidade para os actos ou negócios jurídicos referidos no n.º 1 quando constantes dos «títulos de arrematação ou outros documentos judiciais, bem como nos instrumentos notariais relativos a actos ou negócios referidos no número anterior», isto é, quando tenham efeitos reais.

A nulidade só abrange esses actos ficando os restantes, logo os contratos-promessa não constantes desses instrumentos, como no caso dos autos, que não implicam qualquer divisão de terreno, unicamente sujeitos às sanções do artigo 30.º desse decreto-lei, não sendo despiciendo recordar o que Galvão Teles (Direito das Obrigações, 4.ª ed., p. 77) pertinentemente escreve:

O contrato-promessa e o contrato prometido são distintos e com efeitos diversos e estão por isso sujeitos a regimes diferentes, salvas as disposições comuns dos contratos em geral.

Não têm os contratos-promessa como o dos autos, constando apenas de documento particular de natureza unicamente obrigacional, repete-se, qualquer eficácia real (artigo 413.º do Código Civil, na primitiva redacção). No momento desta convenção, na qual se promete a celebração de novo contrato, pode este não ser possível, mas vir a sê-lo no momento da celebração do contrato prometido.

Trata-se de interpretação tendo hoje a apoiá-la o n.º 2 do artigo 8.º do Decreto-Lei 194/83, de 17 de Maio, ao estabelecer que «a menção do número e data do alvará de loteamento exigida pelo n.º 2 do artigo 27.º do Decreto-Lei 289/73, de 6 de Junho, é feita em face do respectivo alvará, que, para o efeito, será exibido, e só tem lugar nos instrumentos notariais se os actos ou contratos por ele titulados estiverem abrangidos pelo artigo 1.º do mesmo decreto», isto é, que tenham «por objecto ou simplesmente tenham como efeito a divisão em lotes de qualquer área de um ou vários prédios [...] e destinados imediata ou subsequentemente à construção [...]», disposição esta parecendo ter evidente natureza interpretativa (O Novo Regime Jurídico dos Loteamentos Urbanos, cit., p. 99) e impõe a interpretação restritiva do acórdão recorrido.

Além de que, serem os escopos do decreto, aliás já acima referido, a defesa dos compradores menos cautelosos, é, assim, na interpretação propugnada, totalmente assegurada, conduzindo a contrária ao manifesto prejuízo do promitente comprador, recebendo, somente e futuramente, quanto prestara, enquanto o promitente vendedor conservaria o seu terreno, bem sempre valorizável, ao mesmo tempo a pretendida defesa do desenvolvimento urbanístico racional, com tal interpretação, não pode sofrer qualquer desvio.

E não venha dizer-se ser tal contrato-promessa, sem efeitos reais, contrário ao disposto no artigo 280.º do Código Civil - «é nulo o negócio jurídico cujo objecto de seja [...] contrário à lei [...]». Com efeito, Vaz Serra, na Revista da Legislação e de Jurisprudência, ano 104.º, p. 9, distingue entre impossibilidade originária e superveniente, acrescentando:

Mas a impossibilidade só é originária, no caso de contrato, quando exista no momento da conclusão deste; ora, se uma coisa somente pode ser objecto de contrato com aprovação de uma autoridade, não há impossibilidade originária do objecto na data da conclusão do contrato, apenas se tornando impossível a prestação quando a aprovação for recusada, a não ser que logo de princípio pudesse contar-se com essa aprovação.

Assim, não pode falar-se em impossibilidade legal quando à data da realização da promessa não é impossível vir a obter, aquando do contrato definitivo, o alvará do loteamento, a esta mesma conclusão conduzindo o que se lê em Almeida Costa (Direito das Obrigações, 23.ª ed., p. 469), Galvão Teles (Direito das Obrigações 24.ª ed., p. 34) e Pessoa Jorge (Direito das Obrigações, p. 91).

Consequentemente, nega-se provimento ao recurso, com custas pelo recorrente, formulando-se o seguinte assento:

Na vigência do Decreto-Lei 289/73, de 6 de Junho, é válido o contrato-promessa de compra e venda de terreno compreendido em loteamento sem alvará, a menos que no momento da celebração desse contrato haja impossibilidade de obtenção do alvará, por haver lei, regulamento ou acto administrativo impeditivo da sua emissão.

Lisboa, 19 de Novembro de 1987. - António Carlos Vidal de Almeida Ribeiro - Licínio Adalberto Vieira de Castro Caseiro - Augusto Tinoco de Almeida - Aurélio Pires Fernandes Vieira - Júlio Carlos Gomes dos Santos - Fernando Pinto Simões - Manuel Augusto Gama Prazeres - Cláudio César Gama Vieira - António de Almeida Simões - João Alcides de Almeida - João de Deus Pinheiro Farinha - José Alfredo Soares Manso Preto - João Augusto Pacheco e Melo Franco - Pedro Augusto Lisboa de Lima Cluny - Silvino Alberto Villa-Nova - António Júdice de Magalhães Barros Baião - António Alexandre Soares Tomé - Salviano Francisco de Sousa - Mário Sereno Cura Mariano - Cesário Dias Alves - Jorge de Araújo Fernandes Fugas - António Poças - Frederico Carvalho de Almeida Batista [vencido. Ao contrato-promessa são, em regra, aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido (artigo 410.º do Código Civil), consequentemente a celebração de um contrato definitivo proibido por lei, no tocante ao seu objecto, é nula. Por isso, de harmonia com o disposto no artigo 27.º do Decreto-Lei 289/73, é nulo o contrato-promessa aludido nos autos, de compra e venda de terreno compreendido em loteamento sem alvará, situação que não pode ser objecto legal do contrato prometido] - João Solano Viana (vencido, pelas razões constantes do voto do Exmo. Conselheiro Frederico Batista) - Joaquim Augusto Roseira de Figueiredo (vencido, nos termos da declaração que junto) - Joaquim José Rodrigues Gonçalves (vencido, pelas razões do voto do Exmo. Conselheiro Frederico Batista) - José Manuel Meneres Sampaio Pimentel (vencido, nos termos da declaração anexa) - José Manuel de Oliveira Domingues (vencido, nos termos da declaração junta pelo Exmo. Conselheiro Joaquim Figueiredo).

Declaração de voto (processo 72357/2.ª)

O artigo 27.º, n.º 1, do Decreto-Lei 289/73 proíbe a celebração de quaisquer negócios jurídicos relativos a terrenos abrangidos por operações de loteamento antes de obtido o respectivo alvará. Os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo (preceptivo ou proibitivo) são nulos, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei (artigo 294.º do Código Civil). No caso vertente não resulta da lei outra solução.

São diferentes as previsões dos dois números daquele artigo 27.º e mais amplo o campo de aplicação do n.º 2, pois a nulidade que aí se comina atinge mesmo a hipótese de já haver alvará (desde que nos documentos em referência se não indiquem os seus número e data). A disposição do artigo 8.º, n.º 2, do Decreto-Lei 194/83 poderia ser (e não me parece que seja) interpretativa do n.º 2 do artigo 27.º do Decreto-Lei 289/73, mas não do seu n.º 1.

De qualquer maneira, haveria sempre que ter em consideração o chamado «princípio da equiparação», estabelecido pelo artigo 410.º, n.º 1, do Código Civil: à convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido. O que, no dizer do Prof. Almeida Costa (Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 116.º, p. 381), significa que o contrato-promessa se encontra, por via de regra, submetido (também) às normas que sejam específicas do contrato prometido. Mesmo o Prof. Galvão Teles, que entende ser infeliz e inadequada a fórmula do artigo 410.º, n.º 1, que o contrato-promessa e o contrato prometido «estão sujeitos a regimes diferentes, salvas as disposições comuns aos contratos em geral», reconhece que «se se prometer um contrato que, atentas as disposições legais aplicáveis ao caso, for inválido (por uma razão de ordem objectiva, e não apenas respeitante à pessoa do promitente), será nulo o contrato-promessa» (Direito das Obrigações, 4.ª ed., p. 77).

Pelas razões expostas, votei se concedesse provimento ao recurso, lavrando-se assento em que se adoptasse a doutrina do Acórdão de 15 de Outubro de 1980.

Lisboa, 19 de Novembro de 1987. - Joaquim Augusto Roseira de Figueiredo.

Declaração de voto

Em coerência com o entendimento que segui na votação do assento de 21 de Julho próximo passado, também agora teria dado provimento ao recurso.

O douto acórdão socorre-se, por mais de uma vez, do livro dos Drs. Maria do Patrocínio Paz Ferreira e Luís Perestrelo de Oliveira, O Novo Regime Jurídico dos Loteamentos Urbanos, designadamente a p. 95. Com o devido respeito pelos referidos juristas, o raciocínio por eles desenvolvido está viciado. Depois de afirmarem certeiramente que o artigo 27.º do Decreto-Lei 289/73, de 6 de Junho, constituía a «peça-chave da operacionalidade do diploma, permitindo uma reacção eficaz contra os loteamentos urbanos ilegais»; depois de reconhecerem que «as proibições» nele contidas se fundamentaram «em razões de interesse e ordem pública», o que conduziria à nulidade (absoluta) dos negócios jurídicos celebrados com violação das tais «proibições» - terminam por dizer que a «letra do n.º 1 do preceito ia mais longe do que estava na sua ratio». Justificando esta surpreendente conclusão, propõe esta interpretação: «só os negócios que implicavam directa ou mediatamente a divisão do prédio estavam na sua mira, porque prejudiciais ao interesse público, sendo os demais indiferentes ao escopo do preceito». Ora, o apontado vício consiste no seguinte esquecimento: desde o início da vigência do Código Civil de 1966 (muito antes do diploma objecto da interpretação do presente assento) tornou-se possível a realização coactiva (específica) da obrigação de contratar quando a obrigação proviesse de um contrato-promessa (cf. Antunes Varela, principal responsável pelo referido Código, em Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 120.º, p. 74). Assim, é impossível, ao que parece, sustentar não constituir um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel um negócio jurídico susceptível de «implicar» mediatamente a divisão do prédio.

De resto, o diploma de 1973 continuou a criminalizar as condutas que infringirem as suas proibições, pelo que continuo a não entender como é que uma infracção penal não gera a nulidade absoluta do negócio que lhe subjaz.

19 de Novembro de 1987. - José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2486045.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1973-06-06 - Decreto-Lei 289/73 - Ministério das Obras Públicas - Secretaria de Estado do Urbanismo e Habitação

    Revê o regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46673, que regula a intervenção das autoridades administrativas responsáveis nas operações de loteamento.

  • Tem documento Em vigor 1983-05-17 - Decreto-Lei 194/83 - Ministério da Justiça

    Altera o regime da actividade notarial, conferindo nova redacção a vários artigos do Código do Notariado.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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