Usando da faculdade conferida pelo n.º 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo o seguinte:
TÍTULO I
Do regime da emigração
CAPÍTULO I
Disposições preliminares
Artigo 1.º De harmonia com o artigo 3.º do Decreto-Lei 44427, desta data, consideram-se emigrantes:
a) Os portugueses que saiam do território nacional para trabalharem em país estrangeiro;
b) As mulheres que acompanhem ou vão juntar-se ao marido emigrante;
c) Os parentes por consanguinidade em qualquer grau da linha recta ou até ao 3.º grau da linha transversal de qualquer emigrante, quando o acompanhem ou vão juntar-se-lhe;
d) Os portugueses que transfiram a sua residência para país estrangeiro em que beneficiem da qualidade de imigrante ou equivalente.
§ único. A acção tutelar do Estado em matéria de emigração exerce-se desde que o emigrante inicia os actos preparatórios da sua saída do território nacional até que regressa definitivamente ao País.
Art. 2.º Não são considerados emigrantes:
a) Os indivíduos que se ausentarem para o estrangeiro em missão de estudo ou de serviço oficial;
b) Os estudantes que vão frequentar estabelecimentos de ensino no estrangeiro;
c) Os seminaristas e alunos de entidades de formação religiosa que pelas autoridades eclesiásticas interessadas sejam mandados concluir a sua formação religiosa no estrangeiro;
d) Os indivíduos no exercício de uma profissão liberal, os artistas e os desportistas que se desloquem a países estrangeiros por curto período de tempo;
e) Os tripulantes de aeronaves ou navios mercantes estrangeiros que escalem regularmente portos nacionais;
f) Os trabalhadores das zonas fronteiriças;
g) Os serviçais, motoristas e condutores de viaturas automóveis que no exercício da sua função profissional acompanhem os respectivos patrões ou proprietários de nacionalidade portuguesa residentes em território nacional em viagens de turismo ou culturais;
h) Os indivíduos que ao serviço de entidades, patronais estabelecidas em território nacional sejam enviados ao estrangeiro para o desempenho de funções de carácter transitório ou para fins de estágio com vista ao aperfeiçoamento da sua formação profissional.
CAPÍTULO II
Do recrutamento de emigrantes
Art. 3.º O recrutamento no País de indivíduos de nacionalidade portuguesa para trabalharem no estrangeiro depende de autorização da Junta da Emigração, mediante parecer favorável da Direcção-Geral do Trabalho e Corporações.
§ 1.º Para efeitos do disposto neste artigo, a Junta da Emigração exigirá a prova da idoneidade e capacidade das entidades interessadas em cada recrutamento, bem como dos respectivos representantes.
§ 2.º As bases dos contratos de trabalho necessários para a concessão de licenças de emigração a trabalhadores recrutados nos termos deste artigo ficam sujeitas a aprovação pelo Ministério das Corporações e Previdência Social.
§ 3.º Nos contratos de trabalho respeitantes a recrutamentos efectuados pela Junta da Emigração, quando aqueles tenham merecido a aprovação das autoridades competentes do país de destino, poderá ser dispensada a sua legalização nos consulados de Portugal.
TÍTULO II
Dos passaportes para emigrantes
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Art. 4.º A concessão de passaporte de emigrante é pedida por meio de requerimento no qual o impetrante declare o país onde pretende estabelecer-se, e que será instruído com documentos destinados a provar:
1.º A sua identidade;
2.º Que tem a saúde e robustez física necessárias;
3.º Que tem trabalho ou a manutenção assegurada no país de destino; e, consoante os casos;
4.º Que tem autorização de entrada no país de destino;
5.º Que a manutenção das pessoas de família a seu cargo fica devidamente assegurada;
6.º Que, sendo maior de 18 e menor de 45 anos, satisfaz os preceitos das leis e regulamentos militares aplicáveis;
7.º Que, tratando-se de mulher casada ou de menor de 21 anos, não emancipado, que não sejam chamados, respectivamente, pelo marido ou pelos pais ou tutores, tem autorização marital ou de quem exerça o pátrio poder ou o seu suprimento;
8.º Que tratando-se de funcionário civil não aposentado nem na situação de licença ilimitada, ou militar em qualquer situação, tem autorização do superior competente de que depende;
9.º Que tem as habilitações literárias exigidas por lei;
10.º Que, sendo chamado por parente até ao 3.º grau, se verifica o parentesco invocado.
§ 1.º A concessão de passaporte de emigrante a mulheres contratadas depende ainda da existência de garantias de protecção moral no país de destino.
§ 2.º Os documentos comprovativos das autorizações a que se refere o n.º 7.º deste artigo carecem de reconhecimento notarial das respectivas assinaturas; quando as mesmas autorizações sejam dadas por quem não saiba ou não possa escrever, o reconhecimento será feito nos termos do artigo 165.º do Código do Notariado.
§ 3.º As autorizações a que se refere o n.º 7.º deste artigo, quer sejam dadas por carta de chamada ou documento equivalente, quer por documento avulso, devidamente reconhecido, têm validade ilimitada, salvo menção em contrário neles exarada. A mesma caducará, no entanto, quando, por declaração com a assinatura reconhecida por notário ou por autoridade consular portuguesa, o marido ou quem exerça o pátrio poder, consoante os casos, expressamente manifestar a sua vontade nesse sentido.
§ 4.º Na concessão de passaporte a indivíduos que pretendam trabalhar temporàriamente no estrangeiro poderá ser dispensada a apresentação dos documentos referidos nos n.os 2.º, 5.º e 9.º deste artigo.
§ 5.º Na concessão de passaporte a indivíduos que pretendam regressar ao país onde já tenham residido como emigrantes, antes de decorridos quatro anos sobre a respectiva ausência, poderá ser dispensada a prova dos requisitos dos n.os 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 8.º, 9.º e 10.º deste artigo.
§ 6.º Em casos devidamente justificados poderá o Ministro do Interior permitir a concessão de passaporte de emigrante com dispensa dos requisitos a que se referem os n.os 7.º e 9.º deste artigo.
Art. 5.º São competentes para a concessão de passaportes de emigrante:
No continente, o presidente da Junta da Emigração;
Nas ilhas adjacentes, os governadores dos respectivos distritos autónomos ou o chefe da delegação da Junta da Emigração, quando esta exista;
Nas províncias ultramarinas, os respectivos governadores.
Art. 6.º São causas de indeferimento dos pedidos de concessão de passaporte de emigrante:
1.º A falta de qualquer dos requisitos referidos no artigo 4.º, sem prejuízo do, disposto nos §§ 4.º, 5.º e 6.º daquele artigo;
2.º No caso de mulheres casadas, o facto de não acompanharem os maridos ou não pretenderem juntar-se-lhes, salvo em casos devidamente justificados;
3.º A circunstância de os impetrantes terem sido repatriados, excepto em casos devidamente justificados;
4.º A oposição do pedido com quaisquer outras normas relativas ao condicionamento da emigração.
§ único. O despacho que recusar a concessão de passaporte de emigrante será fundamentado. Deste despacho cabe recurso para o Ministro do Interior ou o do Ultramar, consoante os casos.
Art. 7.º O passaporte para emigrante pode ser individual ou familiar.
§ único. O passaporte familiar pode abranger o marido, a mulher e filhos menores de 14 anos, ou a mãe e filhos até àquela idade.
Art. 8.º O passaporte de emigrante é válido para o país onde o titular pretende estabelecer-se, devendo nele averbar-se os países por onde o mesmo haja de transitar.
§ único. Os averbamentos em passaportes de emigrante ou ordinários emitidos a favor de indivíduos legalmente residentes no estrangeiro, quando os seus titulares se encontrem no País, são da competência das entidades referidas no artigo 5.º deste diploma.
Art. 9.º O passaporte para emigrante, concedido nos termos do artigo 4.º deste decreto, é válido por quatro anos, improrrogáveis, e pode ser utilizado em número ilimitado de viagens.
Art. 10.º O passaporte concedido a indivíduos que pretendam trabalhar temporàriamente em país estrangeiro terá o prazo de validade nele fixado, até ao limite de um ano, podendo, satisfeitas as condições legais, ser prorrogada a sua validade por uma ou mais vezes, até ao máximo de quatro anos.
§ 1.º A prorrogação do prazo de validade é da competência da autoridade que tiver concedido o passaporte; quando os interessados se encontrem no estrangeiro, deverá o pedido de prorrogação ser dirigido àquela entidade por intermédio da autoridade consular competente. Em qualquer caso porém, o respectivo pedido só poderá obter deferimento quando formulado antes de findo o prazo inicial ou já prorrogado.
§ 2.º Os pedidos de concessão de passaportes destinados a indivíduos que ao serviço de patrões estrangeiros residentes em Portugal pretendam acompanhá-los nas respectivas ausências da País, com carácter temporário, serão instruídos com declarações de que estes se responsabilizam pelo regresso a Portugal dos titulares dos passaportes assim emitidos dentro dos prazos nos mesmos fixados, bem como pela devolução destes à entidade que os tiver concedido.
§ 3.º Nos casos previstos no parágrafo anterior, a entidade patronal incorrerá na multa de 2000$00 quando não devolva os passaportes, conforme o estabelecido na parte final do referido parágrafo. Esta multa será elevada para 5000$00 sempre que a não devolução seja determinada pelo facto de os titulares dos passaportes não regressarem ao País dentro do prazo da respectiva validade.
§ 4.º Se o titular de passaporte concedido de harmonia com o disposto no corpo deste artigo não regressar ao País dentro do prazo de validade que lhe tiver sido, fixado, ser-lhe-á instaurado processo por emigração clandestina.
§ 5.º Compete ao director da Polícia Internacional e de Defesa do Estado a aplicação das multas previstas no § 3.º, seguindo-se na sua liquidação o disposto no artigo 88.º do Decreto-Lei 39749, de 9 de Agosto de 1954, na redacção dada pelo Decreto-Lei 43582, de 4 de Abril de 1961.
CAPÍTULO II
Disposições especiais
Art. 11.º Nos passaportes para emigrantes a emitir pelas autoridades das províncias ultramarinas observar-se-á, em tudo o que não seja incompatível com o estabelecido na legislação que nelas vigora, o disposto neste diploma relativamente a passaportes para emigrantes.
§ único. A competência atribuída ao Ministro do Interior no § 6.º do artigo 4.º deste diploma pertence ao Ministro do Ultramar quando respeite a indivíduos residentes nas províncias ultramarinas.
Art. 12.º A concessão de passaportes pelas autoridades consulares a favor de nacionais residentes nas respectivas áreas continua a fazer-se nos termos do Regulamento Consular e demais legislação aplicável.
§ 1.º Os passaportes concedidos pelas autoridades consulares permitem a entrada no País e o regresso ao lugar da residência, sem prejuízo do disposto nos n.os 6.º e 7.º do artigo 4.º deste diploma.
§ 2.º Nos casos de expulsão, repatriação, ou quando os interessados não possam provar que se encontram ausentes lìcitamente do País, os passaportes concedidos serão válidos apenas para o regresso ao território nacional.
CAPÍTULO III
Do preenchimento do impresso do passaporte para emigrantes
Art. 13.º Para os passaportes destinados a emigrantes que pretendam estabelecer-se definitivamente no estrangeiro será utilizado o impresso de passaporte ordinário, levando aposta na parte superior da primeira página e do lado direito, por baixo da numeração da série, em carimbo de tinta a óleo, a letra E, com as dimensões de 0,010 m x 0,010 m; nos passaportes emitidos a favor dos nacionais que pretendam apenas trabalhar temporàriamente no estrangeiro será aposta a letra T, com as dimensões e no local referidos.
Art. 14.º O passaporte para emigrante só é válido quando as indicações respeitantes à entidade que o emitir e os espaços reservados à identificação do portador estiverem devidamente preenchidos, a parte manuscrita seja bem legível, não contenha rasuras ou emendas que suscitem dúvidas, as impressões digitais se apresentem nítidas, as fotografias possam reputar-se actualizadas, sem retoques ou modificações capazes de induzir em erro, e tenham sido, bem como a assinatura da autoridade que o emitir, autenticadas com respectivo selo branco.
§ 1.º Na indicação da autoridade que emite o passaporte é proibido o uso de carimbo circular.
§ 2.º Quando não haja lugar ao preenchimento de qualquer das indicações previstas no impresso do passaporte, inutilizar-se-á o respectivo espaço com um traço.
CAPÍTULO IV
Das formalidades a que estão sujeitos os titulares de passaportes de emigrantes para poderem transpor as fronteiras
Art. 15.º Os titulares de passaportes para emigrante só poderão sair do País ou a ele regressar pelos postos de fronteira oficialmente estabelecidos.
Art. 16.º Os titulares de passaporte para emigrante em idade militar não poderão sair do território português sem exibir documento comprovativo da respectiva licença, quando a ela sujeitos, ou o que for exigível por lei.
Art. 17.º Os funcionários civis não aposentados nem na situação de licença ilimitada e os militares em qualquer situação quando portadores de passaporte para emigrante, não poderão transpor as fronteiras do território português sem exibirem a autorização do superior competente de que dependam.
Art. 18.º Quando, na concessão de passaportes a favor de famílias emigrantes, sejam emitidos em separado passaportes para o marido e sua mulher, ou para esta e filhos menores, neles será mencionado, por averbamento, que os seus titulares seguem na companhia, respectivamente, do cônjuge e do pai ou da mãe.
§ único. No caso de, após a emissão de passaportes nas circunstâncias previstas neste artigo, se verificar o impedimento de algum dos componentes do agregado familiar, as autoridades da fronteira não autorizarão a saída do País dos restantes familiares sem que seja convenientemente averbada a alteração havida em relação ao pedido.
CAPÍTULO V
Da distribuição dos passaportes para emigrantes e fiscalização da sua emissão
Art. 19.º Compete à Secretaria-Geral do Ministério do Interior a distribuição dos impressos de passaportes para emigrantes, pela Junta da Emigração e pelos governos dos distritos autónomos.
Art. 20.º A Junta da Emigração e os governos dos distritos autónomos enviarão directamente à Polícia Internacional e de Defesa do Estado, até ao dia 10 de cada mês, relação dos passaportes emitidos no mês anterior, utilizando para esse efeito o impresso do modelo anexo a este decreto.
Art. 21.º No caso de inutilização de qualquer impresso de passaporte para emigrante, a entidade emissora enviará a primeira folha à Polícia Internacional e de Defesa do Estado para efeito de ser dada baixa nas relações dos impressos distribuídos e dos passaportes concedidos.
CAPÍTULO VI
Da estatística do movimento emigratório
Art. 22.º Compete à Junta da Emigração proceder à recolha dos elementos estatísticos do movimento emigratório do continente e ilhas adjacentes, a. remeter ao Instituto Nacional de Estatística, de harmonia com a lei e com as instruções de, ordem técnica emanadas deste organismo.
CAPÍTULO VII
Disposição final
Art. 23.º Os casos omissos neste diploma e as dúvidas suscitadas na sua aplicação serão resolvidos por despacho do Ministro do Interior, sob proposta fundamentada da Junta da Emigração.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 29 de Junho de 1962. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - Adriano José Alves Moreira - José João Gonçalves de Proença.
(ver documento original)
Ministério do Interior, 29 de Junho de 1962. - O Ministro do Interior, Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.