Acórdão 455/2005/T. Const. - Processo 714/2005. - 1 - No processo eleitoral respeitante às eleições para os órgãos das autarquias locais no concelho de Alter do Chão, foi admitido como concorrente um grupo de cidadãos eleitores relativamente à Assembleia de Freguesia, à Assembleia Municipal e à Câmara Municipal daquele concelho, concorrente esse denominado "Movimento Independente Concelho de Alter", tendo o mesmo encimado determinados documentos do processo da sua candidatura, de entre estes o dirigido ao juiz do Tribunal da Comarca de Fronteira, com a menção "MICA Movimento Independente do Concelho de Alter", junto da qual ou sobre a qual se apresentava uma figura gráfica representativa de um castelo e uma árvore junta a ele.
Após o sorteio das listas foi, por sorteio, atribuído o número XII ao grupo em causa.
Finalizado o processo de admissão das candidaturas, o indicado grupo de cidadãos, por intermédio do seu mandatário e do seu primeiro proponente, dirigiu ao juiz do Tribunal da Comarca de Fronteira requerimento no qual, em síntese, disse que, examinados os boletins de voto, foi verificado que "o símbolo do Movimento", que constava "em todo o processo inerente à" sua "constituição", "bem como na troca de correspondência mantida com" o Tribunal, "não foi tido em conta pela entidade que os elaborou", sendo que "toda a informação até" então "distribuída pelo Movimento aos eleitores, assim como toda a propaganda que já" estava "impressa para entrega durante o período de campanha eleitoral, cartazes e alguns outdoors já em fase de afixação, todos" eram "incidentes na ideia de junção entre o Movimento, o símbolo e o candidato".
Tendo sido determinada a remessa de exemplares dos boletins de voto, foram estes juntos aos autos, nos mesmos se surpreendendo, no que agora interessa, que os respeitantes aos órgãos autárquicos a que concorreu o grupo em questão, este se encontrava identificado como Movimento Independente Concelho de Alter - MICA, e, no local destinado à aposição do símbolo dos demais partidos e coligações concorrentes, foi impresso o número romano XII, em caracteres de maior dimensão do que a utilizada no nome e sigla do grupo.
A juíza de turno, por despacho de 13 de Setembro de 2005, deferiu a reclamação, referindo, no que ora interessa:
"Decorre do artigo 23.º, n.º 2, da lei eleitoral que constituem elementos de identificação, entre outros, a denominação e sigla do grupo de cidadãos.
Os símbolos ou estas siglas de identificação, no que diz respeito ao movimento de cidadãos, tem por função permitir uma identificação rápida das forças concorrentes às eleições, permitindo uma identificação mais rápida por parte de todos os eleitores, nomeadamente dos analfabetos, facilitando assim a votação.
Assim, os símbolos dos partidos concorrentes e as siglas identificadoras dos grupos de cidadãos concorrentes devem ser impressas nos boletins de voto.
Ora, in casu, tal não aconteceu relativamente ao Movimento reclamante.
A reclamação foi tempestiva e a reclamação apresentada merece, a nosso ver, ser atendida, tendo em atenção o disposto no preceito legal supra-indicado, conjugado com o artigo 91.º da mesma lei.
Assim, deferindo a reclamação, determina-se que se proceda à alteração da impressão dos boletins de voto, por forma a deles constarem a sigla do Movimento Independente Concelho de Alter - MICA, constante das listas (boletins de voto referentes aos órgãos a que se candidatou o referido Movimento)."
Efectuada a notificação, via fax e em 13 de Setembro de 2005, aos mandatários dos demais concorrentes, veio, igualmente via fax e no indicado dia, recorrer para o Tribunal Constitucional o mandatário da coligação "Continuar Alter", formada pelo Partido Social-Democrata (PPD/PSD) e pelo Partido Popular (CDS-PP), tendo o original dado na secretaria do Tribunal da Comarca de Fronteira no sequente dia 14.
Pode ler-se no requerimento de interposição do recurso:
"1 - O Movimento Independente Concelho de Alter, de ora em diante designado por MICA, apresentou reclamação, por entender que no boletim de voto deveria constar o símbolo do movimento em causa, dado que igualmente no seu entender a lei eleitoral não é explicita quanto a essa possibilidade;
2 - Analisando-se o douto despacho do M.mº Juiz de Direito da comarca de Fronteira, verifica-se que no mesmo existe alguma confusão entre o conceito sigla e o conceito símbolo, senão vejamos:
2.1 - Logo no início do despacho refere-se explicitamente que '[j]untas as provas tipográficas dos boletins de voto, constatamos que das mesmas não consta a sigla do movimento supra-identificado, impresso nas listas dos candidatos apresentados pelo mesmo movimento';
2.2 - Por outro lado refere ainda que '[a]ssim, os símbolos dos partidos concorrentes e as siglas identificadoras dos grupos de cidadãos concorrentes devem ser impressos nos boletins de voto. Ora in casu tal não aconteceu relativamente ao movimento reclamante'.
2.3 - Determinado por fim o douto despacho que 'se proceda à alteração da impressão dos boletins de voto, por forma a deles constarem a sigla do Movimento Independente Concelho de Alter - MICA'.
3 - Não pode a presente candidatura conformar-se com tal decisão, pois analisando-se as provas tipográficas dos boletins de voto, fácil é constatar que a sigla MICA consta dos mesmos.
4 - Nem tal era o objectivo da reclamação do MICA, pois após a sua leitura, é fácil verificar que o que aquele movimento pretende é introduzir o seu símbolo nos boletins de voto sem que tal pretensão tenha qualquer sustentabilidade legal.
5 - Senão vejamos, dispõe o n.º 1 do artigo 30.º da Lei 1/2001, de 14 de Agosto, in fine [...] 'o juiz preside ao sorteio das respectivas listas, para o efeito de se lhes atribuir uma ordem nos boletins de voto, assim como ao sorteio dos símbolos em numeração romana, de 1 a 20, a utilizar pelos grupos de cidadãos'.
Logo interpretando-se esta disposição legal torna-se de imediato perceptível que a reclamação apresentada por aquele movimento não tem sustentabilidade legal.
6 - No mesmo sentido basta atentar ao disposto no n.º 2 do artigo 23.º e no artigo 91.º da Lei 1/2001, de 14 de Agosto, que expressamente não prevêem a existência de símbolos para os grupos de cidadãos, basta atentar ao disposto do n.º 2 do artigo 23.º que aqueles grupos somente têm sigla e denominação.
Portanto é fácil concluir-se que o despacho do qual se recorre enferma do vício de violação da lei, pois deferiu contra legem uma pretensão sem sustentação legal, por outro lado, o próprio despacho em causa é confuso, pois enquanto a reclamação apresentada tem por fim a inserção no boletim de voto o símbolo do MICA, o despacho defere a possibilidade de se inserir a sigla do MICA no boletim de voto, facto que já se verifica.
Requer-se portanto que o despacho exarado no processo 196/05.TBFTR - processo eleitoral seja anulado por violação do n.º 1 do artigo 30.º, n.º 2 do artigo 23[.º] e do artigo 91[.º], todos da Lei 1/2001, de 14 de Agosto, e consequentemente indeferida a reclamação apresentada pelo Movimento Independente Concelho de Alter - MICA, repondo-se a legalidade e fazendo-se justiça."
2 - Não se suscitando dúvidas quanto à tempestividade da interposição do recurso e quanto à legitimidade do impugnante, cumpre decidir quanto à questão de saber se, efectivamente, tal como se determinou no despacho ora sub iudicio, de entre os elementos identificadores do grupo de cidadãos eleitores em causa nos boletins de voto haveria que constar um símbolo que, como resulta do relato supra-efectuado, se poderia considerar constituído pela figura gráfica representativa de um castelo e uma árvore junta a ele, e com a menção MICA aposta sobre ela ou junto a ela.
Do despacho impugnado retira-se que é confundida a sigla com o símbolo.
Ora, do n.º 2 do artigo 23.º da lei que regula a eleição dos órgãos das autarquias locais aprovada pela Lei Orgânica 1/2001, de 14 de Agosto, facilmente se extrai que, para efeitos de apresentação das candidaturas, se entendem como elementos de identificação do grupo de cidadãos as suas denominação e sigla.
Por outro lado, prescreve-se no n.º 1 do artigo 30.º da mencionada lei que o sorteio dos símbolos a utilizar pelos grupos de cidadãos é atribuído, em numeração romana, de 1 a 20, decorrendo do artigo 51.º do mesmo diploma que, durante a campanha eleitoral, os grupos de cidadãos eleitores utilizam sempre a denominação, sigla e símbolo fixados na parte final de apresentação das respectivas candidaturas.
Dos citados preceitos conclui-se, assim, que, no que se reporta aos grupos de cidadãos, o seu símbolo identificador é constituído por um dos n.os 1 a 20 (em numeração romana) que lhe for atribuído no sorteio a que se refere o aludido n.º 1 do artigo 30.º
E nem se esgrima, em contrário, com o argumento de harmonia com o qual o n.º 2 do artigo 90.º, ainda da dita lei, ao mencionar que são elementos identificativos, nos boletins de voto, as denominações, as siglas e os símbolos das entidades proponentes das candidaturas concorrentes que reproduzam os constantes dos registos no tribunal de comarca respectivo, quereria significar a aceitação de um símbolo gráfico de um grupo de cidadãos eleitores.
É que esse símbolo haverá de ser aquele que, de acordo com o n.º 1 do artigo 30.º, couber, pelo sorteio determinado em tal preceito, ao grupo de cidadãos proponentes, isto é, um dos n.os 1 a 20 - em numeração romana.
Não se vislumbra, de outra parte, que, na postura interpretativa que agora se adopta, haja qualquer resquício de um tratamento diferenciado em termos tais que pudesse conflituar com o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado.
Na verdade, são realidades diversas os partidos e coligações, que devem adoptar os respectivos símbolos, quer dos primeiros quer dos partidos que constituem as segundas, e os grupos de cidadãos eleitores, sendo certo que, em relação aos dois primeiros, é facilmente compreensível a razão de tal adopção, já que é facto notório que os partidos são, pelo comum dos eleitores, conhecidos pelos respectivos símbolos, os quais, aliás, são controlados em apertados termos pelo Tribunal Constitucional.
Mas, a mais do que isso, constituindo o símbolo dos grupos de cidadãos eleitores uma dada realidade - um número de 1 a 20 em numeração romana - facilmente perceptível e que haverá que ser utilizada no período de propaganda eleitoral, não se pode, sequer, dizer que, com a solução da lei, essa forma de expressão do símbolo dificulte a percepção dos eleitores.
3 - Perante o que se deixa dito, concede-se provimento ao recurso, em consequência se revogando o despacho impugnado.
19 de Setembro de 2005. - Bravo Serra - Maria dos Prazeres Pizarro Beleza - Maria Helena Brito - Paulo Mota Pinto - Carlos Pamplona de Oliveira - Maria João Antunes - Mário José de Araújo Torres - Vítor Gomes - Benjamim Rodrigues - Rui Manuel Moura Ramos - Gil Galvão - Artur Maurício.