Decreto Legislativo Regional 14/89/A
Dadores de sangue
O recurso, cada vez mais frequente, a novos processos terapêuticos utilizadores de tecnologias médicas modernas e o agravamento ocorrido no domínio da epidemiologia dos acidentes, particularmente dos de trânsito, traz, em resultado, consumos de sangue mais elevados.
Tal circunstância acentua a importância da regulamentação do ciclo de sangue na comunidade, nomeadamente da sua colheita e da sua utilização, tanto mais que se trata de um bem insuprível, embora escasso, o que conduz à necessidade de providenciar uma boa gestão dos bancos de sangue a nível de cada unidade de saúde da Região.
Neste contexto, os dadores de sangue açorianos têm assumido papel relevante e da maior dignidade, sendo de destacar, de modo muito especial, aqueles que o têm feito de forma benévola e com espírito de abnegação e bem fazer, merecedores, portanto, de reconhecimento público.
É justo, porém, alargar e adequar a co-responsabilidade da comunidade, designadamente dos familiares dos doentes e de outros utilizadores, levando-os, como princípio ético, a cooperar com os serviços de saúde, fazendo-os depositar, previamente, quantidades mínimas de sangue, sempre que se preveja a sua utilização. Com esta medida, pretende-se que, a par da assumpção da responsabilidade e solidariedade de cada indivíduo, se anule a prática de venda de sangue.
Assim, a Assembleia Regional dos Açores decreta, nos termos da alínea a) do artigo 229.º da Constituição e da alínea c) do artigo 32.º do Estatuto Político-Administrativo da Região:
CAPÍTULO I
Princípios gerais
Artigo 1.º A Região Autónoma dos Açores reconhece o mérito dos indivíduos que, por iniciativa própria, com sentido de causa pública e com espírito de abnegação e bem fazer, têm contribuído ou venham a contribuir com dávidas benévolas de sangue aos serviços de saúde.
Art. 2.º É um dever dos familiares dos utilizadores de sangue cooperar com os serviços de saúde no sentido de serem efectuados depósitos benévolos de sangue, sempre que se preveja a sua utilização.
Art. 3.º Para garantir o cumprimento do estabelecido no presente diploma, os serviços de saúde assegurarão o funcionamento dos bancos de sangue.
CAPÍTULO II
Dadores de sangue
Art. 4.º Cada serviço de saúde deve proceder ao registo, que manterá actualizado, dos dadores de sangue que residam na respectiva área de influência.
Art. 5.º - 1 - Cada dador de sangue será portador de cartão de identificação, a passar pelo serviço de saúde responsável pelo respectivo registo.
2 - O modelo do cartão de identificação será aprovado por portaria do Secretário Regional da Saúde e Segurança Social.
Art. 6.º - 1 - Cada dador de sangue deverá ser sujeito a exame médico periódico, da iniciativa e a cargo do serviço de saúde responsável pelo respectivo registo.
2 - O serviço de saúde deverá elaborar, para cada dador de sangue registado, uma ficha médica, que actualizará após cada exame.
Art. 7.º - 1 - Para cumprimento do estabelecido no artigo 2.º do presente diploma, cada serviço de saúde diligenciará no sentido de ser efectuado o necessário depósito de sangue.
2 - A realização do depósito de sangue é da responsabilidade dos familiares do doente, podendo este, todavia, suprir esta obrigatoriedade por entreposto dador.
3 - Quando se torne necessária a transferência do doente de um serviço de saúde para outro, o serviço de saúde onde foi feito o depósito referido no n.º 1 providenciará, também, a transferência do sangue depositado.
4 - Caso se venha a verificar a não utilização de sangue, o dador e seu agregado familiar ficam dispensados de proceder a um eventual futuro depósito.
5 - Considera-se agregado familiar, para efeitos do presente diploma, o cônjuge do dador e os familiares que estejam nas condições que a lei prevê para atribuição de abono de família.
Art. 8.º - 1 - Aos dadores benévolos de sangue referidos no artigo 1.º e ao respectivo agregado familiar, tal como é definido no n.º 5 do artigo anterior, são reconhecidos os seguintes benefícios:
a) Isenção de pagamento de comparticipação na consulta externa, em qualquer serviço de saúde da Região;
b) Isenção de pagamento de comparticipação na realização de exames complementares de diagnóstico e actos terapêuticos;
c) Internamento gratuito, em regime de enfermaria;
d) Assistência medicamentosa gratuita incluindo o regime ambulatório em termos a regulamentar.
Art. 9.º - 1 - O pedido para concessão de benefícios deve ser formulado pelo dador, ou seu representante, e endereçado ao serviço de saúde em que está registado.
2 - Qualquer concessão de benefícios deve ser averbada em anexo ao cartão de identificação do dador, a que se refere o artigo 5.º deste diploma.
Art. 10.º - - Perdem o direito aos benefícios a que se refere o artigo 8.º deste diploma os dadores que interromperem, por mais de 24 meses, a dávida de sangue.
2 - O preceituado no número anterior não é aplicável aos dadores que interrompam a dávida de sangue, por motivos que lhes não sejam imputáveis e aos que hajam completado 60 anos de idade ou aos que forem atingidos por doença impossibilitadora.
3 - Quando se verificar a situação referida no n.º 1 do presente artigo, os membros do agregado familiar do dador perdem também o direito aos benefícios definidos no artigo 8.º
Art. 11.º A concessão dos benefícios a que se referem os artigos anteriores deve efectivar-se no serviço de saúde onde o dador está registado, sem prejuízo da responsabilidade solidária dos outros serviços de saúde da Região, a que se poderá recorrer em caso de necessidade.
Art. 12.º Se, na sequência de dávida de sangue, ocorrer uma situação mórbida com ela directamente correlacionada, serão, gratuitamente, assegurados ao dador todos os cuidados indispensáveis à reposição do seu estado de saúde.
CAPÍTULO III
Associações de dadores
Art. 13.º - 1 - A Região reconhece a importância das associações de dadores de sangue, como entidades privilegiadas na defesa dos dadores, na dinamização da dávida de sangue e no esclarecimento das questões com ela relacionadas, pelo que a Secretaria Regional de Saúde e Segurança Social deverá incentivar a sua criação e apoiar o seu funcionamento.
2 - Os serviços de saúde manterão com as associações de dadores uma especial articulação, garantindo, assim, o melhor relacionamento com os dadores e a maior eficácia no processo de doação de sangue.
CAPÍTULO IV
Reconhecimento público
Art. 14.º - 1 - Aos dadores de sangue referidos nos artigos 1.º e 2.º deste diploma poderá o Governo Regional, como recompensa ética, fazer reconhecer publicamente o valor dos actos praticados.
2 - O reconhecimento público deverá efectivar-se através da concessão de medalha de dador de sangue, de diploma e de distintivo.
Art. 15.º - 1 - A medalha de dador de sangue compreende os graus de medalha de ouro, medalha de prata e de medalha de cobre.
2 - A medalha de ouro será concedida aos dadores que tenham completado 60 dávidas benévolas de sangue; a medalha de prata aos que tenham completado 40, e a medalha de cobre aos dadores que hajam completado 20 dádivas.
3 - A medalha de dador de sangue será concedida por despacho do Secretário Regional da Saúde e Segurança Social mediante proposta dos serviços de saúde responsáveis pelo registo do dador.
Art. 16.º - 1 - O diploma de dador de sangue será concedido aos indivíduos que tenham completado dez dádivas benévolas de sangue.
2 - O diploma de dador de sangue será concedido pelo Secretário Regional da Saúde e Segurança Social, por proposta do serviço de saúde responsável pelo registo do dador, devendo a sua atribuição ser publicitada nos órgãos de comunicação social.
Art. 17.º - 1 - O distintivo de dador de sangue destina-se a galardoar os dadores benévolos, a partir da 3.ª doação, bem como os indivíduos que se tenham evidenciado por actividades que estimulem a doação de sangue.
2 - O distintivo de dador de sangue será concedido pelo director regional de Saúde, mediante proposta do serviço de saúde responsável pelo registo do dador.
Art. 18.º Os modelos das medalhas, diplomas e distintivos serão definidos por portaria do Secretário Regional da Saúde e Segurança Social.
Art. 19.º - 1 - A organização dos processos de atribuição das medalhas, diplomas ou distintivos é da competência do serviço de saúde em que o dador está registado, por iniciativa do serviço ou a pedido do dador.
2 - Do processo devem constar o número de doações efectivadas, as datas das colheitas, bem como informações necessárias à decisão a tomar.
Art. 20.º A Secretaria Regional da Saúde e Segurança Social, através dos seus serviços competentes, organizará e manterá actualizado um registo das medalhas, diplomas e distintivos concedidos nos termos deste diploma.
CAPÍTULO V
Disposições finais
Art. 21.º Os encargos resultantes da concessão dos galardões referidos neste diploma serão suportados pelo Orçamento da Região Autónoma dos Açores.
Art. 22.º O presente diploma entra em vigor com as portarias que aprovem modelos do cartão individual de identificação e das medalhas, diplomas e distintivos, a que se referem os artigos 5.º e 18.º, respectivamente.
Aprovado pela Assembleia Regional dos Açores, na Horta, em 11 de Maio de 1989.
O Presidente da Assembleia Regional, José Guilherme Reis Leite.
Assinado em Angra do Heroísmo em 6 de Julho de 1989.
Publique-se.
O Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores, Vasco Joaquim Rocha Vieira.