de 29 de Agosto
O início do processo de normalização do mercado de capitais levou a reponderar diversos aspectos com este relacionados, entre os quais o da reduzida dimensão do mercado de obrigações de empresas, resultante em parte da insuficiente procura de títulos de rendimento fixo por parte dos investidores não institucionais, o que constitui obstáculo sério à adequada orientação da poupança para o financiamento do desenvolvimento económico.A situação verificada entre nós tem-se igualmente verificado, com mais ou menos acuidade, em mercados estrangeiros, onde tem sido combatida através da constante modernização dos esquemas clássicos de obrigações e da introdução de fórmulas novas, que concedem aos títulos de rendimento fixo certos direitos em princípio apenas aplicáveis a acções.
Pelo presente diploma criam-se e regulamentam-se as chamadas obrigações participantes, que se julga poderem vir a ter boa aceitação por parte das sociedades que habitualmente recorrem ao mercado de títulos e do público em geral. Na verdade, à garantia de um rendimento fixo, devido qualquer que seja a evolução dos resultados da empresa, aliam a possibilidade de um rendimento adicional, distribuído sob a forma de juro suplementar ou de prémio de reembolso, e que se calcula, de acordo com critérios previamente fixados, em função dos lucros da entidade que as emite. As obrigações adquirem, assim, uma das características mais importantes do capital de risco: a participação nos resultados da empresa. Por seu turno, a sociedade, emitindo as obrigações a juro naturalmente mais baixo, só vê aumentar o custo dos capitais desse modo obtidos quando o seu lucro se expanda e largamente compense o acréscimo de encargos.
A flexibilidade que se procura atingir, ao regular este tipo de obrigações, tem em vista deixar às empresas emitentes grande liberdade na escolha dos critérios e formas de relacionação com os lucros, que em mercados estrangeiros alcançaram já grau de desenvolvimento considerável. Impunham-se, todavia, e como é óbvio, cuidados especiais no atinente à protecção dos legítimos interesses de accionistas e obrigacionistas.
Aponta-se, consequentemente, para a introdução de uma cláusula especial que confira aos obrigacionistas direito de voto em assembleias gerais da sociedade emitente no tocante a matérias que directamente lhes interessem, em termos a regular em diploma especial. Crê-se, assim, ter conseguido um equilíbrio adequado de todos os interesses em presença, susceptível de viabilizar a difusão desta modalidade particular de títulos.
Dir-se-á, por último, que se considera dever ser dada também às empresas públicas a possibilidade de emitirem obrigações participantes, como forma de fazer o público partilhar dos resultados obtidos por tais instituições, que, em conjunto, ocupam hoje em dia uma posição de peso na economia portuguesa.
Nestes termos:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. As sociedades que, de acordo com a lei comercial, têm a faculdade de emitir obrigações, e as empresas públicas, podem emitir obrigações que, além de conferirem aos seus titulares o direito a um juro fixo, os habilitem a um juro suplementar ou a um prémio de reembolso, cuja existência e montante dependam dos lucros realizados pela sociedade ou empresa emitente.
2. O juro suplementar ou o prémio de reembolso poderão:
a) Ser estabelecidos, para cada obrigação ou para o conjunto das obrigações em vigor, como percentagem fixa do lucro de cada exercício, independentemente do montante deste e das oscilações que registe durante o período de vida do empréstimo;
b) Ser fixados nos termos da alínea anterior, mas apenas para a hipótese de o lucro exceder um limite mínimo que se estipulará aquando da emissão, aplicando-se a percentagem estabelecida a todo o lucro apurado ou somente à parte que exceder o limite referido;
c) Ser determinados por qualquer das formas previstas nas alíneas precedentes, mas com base numa percentagem variável em função do volume dos lucros produzidos em cada exercício ou dos lucros a considerar para além do limite estipulado nos termos da alínea b);
d) Ser apurados nos termos das alíneas anteriores, mas com imputação dos lucros a accionistas e obrigacionistas na proporção do valor nominal dos títulos existentes, corrigindo-se ou não essa proporção com base em coeficiente estipulado aquando da emissão;
e) Ser calculados por qualquer outra forma similar, devidamente aprovada pelo Ministro das Finanças, a requerimento da sociedade ou empresa pública interessada.
3. Registando a sociedade ou empresa prejuízos ou lucros inferiores ao limite de que dependa a participação estabelecida, os obrigacionistas terão apenas direito ao juro fixo mencionado no n.º 1.
Art. 2.º - 1. A emissão das obrigações de que trata o presente diploma, por parte de sociedades comerciais, tem de ser deliberada em assembleia geral, que definirá as respectivas condições.
2. A deliberação da assembleia geral será tomada sob proposta do conselho de administração ou órgão equivalente e parecer da entidade fiscalizadora da sociedade, se a houver.
3. Na proposta a que alude o número precedente devem, nomeadamente, indicar-se:
a) O quantitativo global da emissão e os motivos que a justifiquem, o valor nominal das obrigações, o preço por que são emitidas e reembolsadas ou o modo de o determinar, a taxa de juro fixo, o critério de apuramento do juro suplementar ou do prémio de reembolso e o plano de amortização do empréstimo;
b) A identificação dos subscritores e o número de obrigações a subscrever por cada um, quando a sociedade não recorra à subscrição pública.
4. A assembleia geral poderá reservar aos accionistas ou obrigacionistas, total ou parcialmente, as obrigações a emitir.
Art. 3.º A emissão das obrigações reguladas por este diploma, por parte de empresas públicas, deve obedecer ao disposto nas respectivas leis orgânicas, carecendo sempre de autorização do Ministro das Finanças e do Ministro de que dependa a respectiva actividade económica.
Art. 4.º O lucro a considerar para os efeitos do artigo 1.º será o que corresponder aos resultados líquidos do exercício, deduzidos das reservas legais ou obrigatórias, e não se considerando como custo as amortizações e provisões efectuadas para além dos máximos admitidos para efeitos de contribuição industrial.
Art. 5.º - 1. O apuramento feito pela sociedade, de acordo com o disposto no artigo anterior, do lucro que deva servir de base à determinação das importâncias destinadas a juro suplementar ou a prémio de reembolso, e bem assim o cálculo dessas importâncias, serão obrigatoriamente submetidos, conjuntamente com o relatório e contas de cada exercício, ao parecer de revisor oficial de contas, a designar nos termos do número seguinte.
2. O revisor oficial de contas referido no número anterior será designado pelos obrigacionistas, para o efeito reunidos em assembleia, convocada pelo presidente da assembleia geral da sociedade no prazo de sessenta dias a contar do termo da primeira subscrição das obrigações de que trata este diploma ou da vacatura do cargo.
3. O aludido revisor oficial de contas não poderá fazer parte do conselho fiscal nem exercer quaisquer funções na sociedade emitente ou em sociedades em que aquela detenha, directa ou indirectamente, participação superior a 10% do respectivo capital.
Art. 6.º O lucro das empresas públicas a considerar para efeitos de pagamento de juro suplementar ou de prémio de reembolso terá em conta a remuneração obrigatória do respectivo capital estatutário determinada pelo Decreto-Lei 75-A/77, de 28 de Fevereiro.
Art. 7.º - 1. O lucro a partir do qual se procederá, em cada um dos anos de vida do empréstimo, ao apuramento das importâncias destinadas a juro suplementar ou a prémio de reembolso será o referente ao exercício anterior.
2. Se, no próprio ano da colocação do empréstimo, e de acordo com as condições do mesmo, houver lugar à distribuição de juro suplementar ou à afectação de qualquer importância a prémio de reembolso, o montante respectivo calcular-se-á com base nos critérios para o efeito estabelecidos aquando da emissão.
Art. 8.º - 1. O juro suplementar respeitante a cada ano será pago por uma ou mais vezes, e separadamente ou em conjunto com o juro fixo, conforme se estabelecer aquando da emissão.
2. No caso de a amortização de uma obrigação ocorrer antes da data do vencimento do juro suplementar, deverá a sociedade comercial ou a empresa pública emitente fornecer ao titular daquela documento através do qual possa fazer valer o seu direito a eventual juro suplementar.
Art. 9.º - 1. O prémio de reembolso previsto no artigo 1.º será integralmente pago na data da amortização das obrigações, a qual não poderá ser fixada para momento anterior à data limite para a aprovação das contas anuais da sociedade comercial ou empresa pública de que se tratar.
2. Poderá estipular-se a capitalização dos montantes anualmente apuráveis a título de prémios de reembolso, nos termos para o efeito estabelecidos nas condições da emissão.
Art. 10.º Reservando-se a sociedade comercial ou a empresa pública a faculdade de proceder, no todo ou em parte, ao pagamento antecipado do empréstimo, os titulares das obrigações assim amortizadas terão direito a uma compensação calculada em função do tempo a decorrer até ao termo do prazo convencionado e com base em critérios que para o efeito deverão estipular-se aquando da emissão.
Art. 11.º Além dos elementos exigidos pela Portaria 103/72, de 21 de Fevereiro, os prospectos da emissão por subscrição pública das obrigações de que trata o presente diploma referirão obrigatoriamente:
a) O critério estabelecido para o cálculo das importâncias destinadas a juro suplementar ou a prémio de reembolso;
b) As datas em que os juros suplementares serão pagos;
c) As condições de capitalização das importâncias que se destinem a prémio de reembolso, se a capitalização for admitida;
d) Os critérios de fixação da compensação a que terão direito os obrigacionistas no caso de amortização antecipada dos seus títulos, e a data a partir da qual é possível;
e) Os resultados dos três últimos exercícios e a evidenciação, a título de exemplo, do lucro que, em relação a cada um deles, de harmonia com o disposto no artigo 4.º e, sendo caso disso, também no artigo 6.º, teria sido considerado no cálculo do juro suplementar ou do prémio de reembolso;
f) A indicação das matérias sobre as quais os obrigacionistas terão, eventualmente, direito de voto, os requisitos de que o mesmo dependa e os termos em que deva ser exercido.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Mário Soares - António Francisco Barroso de Sousa Gomes - Henrique Medina Carreira.
Promulgado em 29 de Agosto de 1977.
Publique-se.
O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.