Clínica Internacional de Campo de Ourique
Pub

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda

Acórdão 363/2001/T, de 13 de Outubro

Partilhar:

Texto do documento

Acórdão 363/2001/T. Const. - Processo 667/2000. - Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - Maria Virgínia Abreu Fonseca de Carvalho impugnou, junto do Tribunal Tributário de 1.ª Instância do Porto, o acto tributário de liquidação de contribuição autárquica relativa a 1991, referente a uma caravana/rulote situada no Parque de Campismo da Árvore, em Vila do Conde.

Na respectiva petição inicial, a impugnante suscita a inconstitucionalidade do artigo 2.º, n.os 2 e 3, do Código da Contribuição Autárquica, quando interpretado "literalmente" no sentido de ser aplicável no caso de se tratar de uma caravana de campismo colocada num parque de campismo, por violação do princípio da justiça e da proibição de dupla tributação, decorrentes dos artigos 106.º e 107.º da Constituição.

O Tribunal Tributário de 1.ª Instância do Porto, por sentença de 29 de Abril de 1997, considerou que a impugnante ilidiu a presunção do n.º 3 do artigo 2.º do Código da Contribuição Autárquica, pelo que anulou a liquidação impugnada.

2 - O representante da Fazenda Pública interpôs recurso da sentença de 29 de Abril de 1997 para o Supremo Tribunal Administrativo. O Supremo Tribunal Administrativo, pelo Acórdão de 12 de Novembro de 1997, julgou-se incompetente, em razão da hierarquia, para apreciar o objecto do recurso. Consequentemente, os autos foram remetidos ao Tribunal Central Administrativo.

O Tribunal Central Administrativo, pelo Acórdão de 22 de Junho de 1999, concedeu provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e julgando improcedente a impugnação judicial deduzida.

3 - Maria Virgínia Abreu Fonseca de Carvalho interpôs recurso do Acórdão de 22 de Junho de 1999 para o Supremo Tribunal Administrativo.

Nas alegações de recurso, a recorrente sustentou a inconstitucionalidade da norma do artigo 2.º, n.os 2 e 3, do Código da Contribuição Autárquica, por violação da proibição da dupla tributação, alegadamente decorrente dos artigos 106.º e 107.º da Constituição. A recorrente considera verificar-se dupla tributação, uma vez que o Clube Nacional de Montanhismo, proprietário do terreno onde se encontra instalado o Parque de Campismo da Árvore, está isento de contribuição autárquica, o que consubstancia um primeiro acto tributário. Na sua perspectiva, a liquidação de contribuição autárquica ao proprietário da caravana traduzir-se-á numa dupla tributação "sobre parte do mesmo bem (terreno), que é o Parque de Campismo da Árvore".

O Supremo Tribunal Administrativo, pelo Acórdão de 11 de Outubro de 2000, negou provimento ao recurso. Quanto à alegada inconstitucionalidade normativa, o tribunal considerou "que a recorrente se limita a alegar ofensa dos princípios dos artigos 106.º e 107.º da CRP, sem intentar demonstrá-lo, o que de imediato compromete, inexoravelmente, o êxito da alegação".

4 - Maria Virgínia Abreu Fonseca de Carvalho interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do disposto nos artigos 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição, e 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição do artigo 2.º, n.os 2 e 3, do Código da Contribuição Autárquica.

Junto do Tribunal Constitucional, a recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:

"Em conclusão:

A) O CNM está tributado pela Fazenda Nacional/fisco/Estado em CA, sobre o PCA, de que é proprietário dos referidos terrenos - 1.º acto tributário;

B) A Fazenda Nacional/fisco/Estado, ao tributar o alvéolo n.º 668 do PCA, com o artigo 1854 da matriz urbana de Árvore, descrito na respectiva ficha de matriz com a área total de 83 m2 (parte do PCA - 62,70 m2 de área descoberta e 20,30 m2 de área coberta), onde a recorrente tem assente a sua caravana/rulote, está a praticar um 2.º acto tributário, da mesma natureza e de idêntico imposto CA, sobre parte do mesmo bem/terreno, e do mesmo ano 1991;

C) O fim e escopo do campismo e caravanismo a que a recorrente afecta a sua caravana/rulote, assente no alvéolo n.º 668 do PCA, é transitório e precário por natureza, por razões estatutárias do CNM/PCA, idade da recorrente, climatéricas de Portugal, e reduz-se a alguns fins-de-semana e semanas nas férias de Verão;

D) A recorrente ilidiu e afastou a presunção que decorre do artigo 2.º, n.os 2 e 3, da CA, ao provar nos autos que o fim a que afecta a sua caravana no PCA é transitório, por natureza, estatutárias, idade e climatéricas;

E) A administração fiscal e os acórdãos a quo fazem uma interpretação extensiva e alargada no artigo 2.º da CCA, o que viola o princípio da tipicidade fiscal, nullum tributem sine lege, consagrado constitucionalmente;

F) Na base, substracto da CA está um direito real, e o direito na base do qual a recorrente utiliza e ocupa o alvéolo n.º 668 do PCA, onde tem a sua caravana/roulotte assente é um direito obrigacional ou social, decorrente do seu estatuto de associada de CNM/PCA;

G) A tributação da recorrente em CA pela sua caravana/rulote, assente no alvéolo n.º 668 do PCA, leva a situações de tributação manifestamente caricatas e ao absurdo fiscal;

H) A dupla tributação em causa é um imposto sobre o rendimento e é não só indesejável, como ilegal e inconstitucional, na senda da interpretação extensiva que lhe dá a administração fiscal e os acórdãos a quo.

Princípios e direito constitucional violado. - Salvo melhor opinião, a administração fiscal e os acórdãos a quo, na interpretação extensiva e alargada que fazem do artigo 2.º do CCA, e ao permitirem a tributação da caravana/rulote da recorrente em CA, incorrem em inconstitucionalidade porquanto violam os seguintes princípios e normas constitucionais:

1.º Princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP);

2.º Princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei (artigos 13.º e 266.º, n.º 2, da CRP);

3.º Princípio da tipicidade fiscal - nullum tributem sine lege - (artigo 106.º, n.º 2, da CRP);

4.º Princípio da justiça (artigos 266.º, n.º 2, e 268.º, n.os 4 e 5, da CRP).

Em conformidade requer a V. Exmas. seja sentenciado inconstitucional o artigo 2.º da CA, na senda da interpretação extensiva e alargada feita pela administração fiscal e acórdãos proferidos e de que se recorre, ao permitir assim uma dupla tributação, que se afigura patente e evidente."

Por seu turno, a Fazenda Pública contra-alegou, afirmando o seguinte:

"Carece de razão a recorrente:

Não ocorre no caso qualquer situação de interpretação extensiva, porquanto a tributação decorre da letra da lei ao delimitar o conceito de prédio - artigo 2.º do CCA, que define como 'as águas, plantas, edifícios ou construções dotados de autonomia em relação ao terreno onde se encontram implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso', neles se incluindo as construções móveis por natureza quando afectos a fins não transitórios;

E, quanto à alegada transitoriedade do fim, a mesma não se verifica face ao disposto no n.º 3 do artigo 2.º do CCA, que faz presumir o carácter de permanência quando as construções móveis se acharem assentes no mesmo local por um período superior a um ano, sendo que, inclusivamente, como a recorrente também refere, à sua caravana foi atribuído artigo matricial urbano - o artigo 1854 da freguesia de Árvore, Vila do Conde;

Isto é, a tributação em CA da caravana/rulote da recorrente decorre de uma situação de incidência real por o seu bem preencher o conceito de prédio definido no artigo 2.º do CCA e não de qualquer interpretação extensiva do texto da lei;

Pelo que, assentando toda a alegação da recorrente na invocação de uma interpretação extensiva desta disposição legal, é manifesto que não pode proceder a arguição de inconstitucionalidade."

Cumpre decidir.

II - Fundamentação. - 5 - O preceito impugnado tem a seguinte redacção:

"Artigo 2.º

Conceito de prédio

1 - ...

2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, serão havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.

3 - Presume-se tal carácter de permanência quando se acharem assentes no mesmo local por um período superior a um ano."

A recorrente invoca a violação do princípio da tipicidade tributária, em virtude de o tribunal a quo ter feito interpretação extensiva do preceito impugnado.

No caso em apreciação nos presentes autos, a caravana em questão encontra-se instalada no Parque de Campismo da Árvore ininterruptamente desde 1984.

O n.º 1 do artigo 2.º do Código da Contribuição Autárquica determina que, para efeito de contribuição autárquica, "prédio é toda a fracção de terreno, abrangendo [...] edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes com carácter de permanência [...] bem como [...] edifícios ou construções nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso [...]".

Os n.os 2 e 3 do preceito, transcritos supra, definem o que se deve entender por "carácter de permanência", verificando-se que o caso dos autos, face ao tempo em que a caravana se encontra instalada no parque, é, pelo menos formalmente, subsumível no aludido n.º 3.

Independentemente da questão de saber se o problema suscitado de uma eventual interpretação extensiva seria uma verdadeira questão de constitucionalidade normativa, pois não são evidenciados explicitamente pela recorrente critérios normativos que delimitem um sentido da norma mais amplo do que o previsto legalmente (única situação em que se justificará o conhecimento de uma questão de constitucionalidade normativa em casos de invocação de violação da proibição de analogia, como se decidiu no Acórdão 205/99, de 7 de Abril, onde o Tribunal Constitucional afirmou:

"Assim, desde logo, o recorrente não submete à apreciação do Tribunal Constitucional um processo interpretativo utilizado pontualmente na decisão recorrida, isto é, a inserção do caso concreto num âmbito normativo predeterminado pelo julgador. Não é um tal momento de sobreposição do caso no quadro lógico decorrente da interpretação da norma o que verdadeiramente se questiona, mas antes um certo conteúdo interpretativo atribuído ao artigo 120.º, n.º 1, alínea a), o qual é identificado. Questiona-se, sem dúvida, se a fixação de sentido da norma, segundo a qual esta abrangerá, em geral, na interrupção da prescrição 'a notificação ao arguido do despacho do Ministério Público para interrogatório no inquérito e a realização deste' é uma interpretação normativa compatível com a Constituição, em face dos artigos 29.º, n.os 1 e 3, e 32.º, n.os 1 e 4. É, assim. o conteúdo final da interpretação, ou, dito de outro modo, o resultado interpretativo pelo qual se atinge a norma que decide o caso, norma que eventualmente não tem competência constitucional para o decidir, que é submetido ao controlo de constitucionalidade.

A isto acresce que o referido conteúdo interpretativo não é apenas determinado pelo caso concreto, mas é referido com elevada abstracção, na base de uma linha jurisprudencial anterior que utilizou a mesma perspectiva interpretativa para casos idênticos.

Emerge, assim, claramente, de um momento interpretativo a questão de constitucionalidade. Não se trata de um momento meramente aplicativo da norma ao caso concreto, isto é, de uma situação em que o recorrente suscite apenas a correcção lógico-jurídica da inclusão do caso na norma. Trata-se, antes, da indicação, com suficiente autonomia, dos critérios jurídicos genérica e abstractamente referidos pelo julgador ao texto legal para decidir casos semelhantes. Neste caso, foi enunciada pelo julgador uma dimensão normativa que, segundo o recorrente, não corresponde fielmente às palavras do legislador, violando, por isso, o princípio da legalidade, sendo essa dimensão normativa que o recorrente pretende ver apreciada.

Ora, o Tribunal Constitucional não pode deixar de controlar dimensões normativas referidas pelo julgador a uma norma legal ainda que resultantes de uma aplicação analógica, em casos em que estejam constitucionalmente vedados certos modos de interpretação ou a analogia. O resultado do processo de interpretação ou criação normativa (tanto de meras dimensões normativas como de normas autónomas), ínsito na actividade interpretativa dos tribunais, não pode deixar de ser matéria de controlo de constitucionalidade pelos tribunais comuns e pelo Tribunal Constitucional, quando a própria Constituição exigir limites muito precisos a tais processos de interpretação ou criação normativa, não reconhecendo qualquer amplitude criativa ao julgador."

Não decorre, minimamente, dos elementos constantes dos autos que o tribunal recorrido haja realizado sequer uma qualquer interpretação extensiva do preceito em causa, o que afasta só por si, e desde logo, a consideração do problema. Na verdade, a correspondência entre a situação em apreço e a previsão da norma não implica, obviamente, uma qualquer ultrapassagem do sentido literal das palavras utilizadas pelo legislador, ocorrendo antes uma evidente adequação dos elementos de facto do caso ao significado (ou a um dos significados) normais da letra da lei (cf., entre outros, Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 1989, pp. 185 e 186). Aliás, na petição de impugnação da liquidação até a recorrente chega a afirmar que a liquidação da contribuição autárquica in casu resultaria de uma "interpretação literal" do preceito questionado. E a recorrente nem sequer suscitou tal questão antes das alegações perante o Tribunal Constitucional.

Por tudo isto, não existe, pois, qualquer fundamento que permita sequer discutir a realização, pelo tribunal a quo, de uma interpretação extensiva do preceito impugnado, interpretação essa que apenas é alegada sem ser devidamente demonstrada.

6 - A recorrente sustenta, por outro lado, que a interpretação normativa impugnada consubstancia uma dupla tributação, pelo que é inconstitucional, por violação do princípio da justiça, decorrente dos artigos 106.º, 107.º, n.º 1, 266.º, n.º 2, e 268.º, n.os 4 e 5, da Constituição.

A dupla tributação resulta, na perspectiva da recorrente, da circunstância de o Clube Nacional de Montanhismo, proprietário do terreno onde se encontra o Parque de Campismo da Árvore, estar isento de contribuição autárquica, o que configura um acto tributário. A liquidação de contribuição autárquica pela instalação da caravana no terreno do referido parque consubstanciaria um segundo acto tributário sobre o mesmo terreno.

É duvidoso que se possa considerar, tecnicamente, este acto tributário como um acto de que procede uma dupla tributação. Com efeito, para além de não haver identidade de sujeitos, a isenção de imposto é diferente, máxime nos seus efeitos, da liquidação e cobrança do imposto (cf. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, 1972, pp. 109 e segs., e Direito Tributário Internacional, 1993, pp. 31 e segs.).

Porém, nem sequer se exigirá aqui a análise da fundamentação do acto de liquidação de contribuição autárquica sob a perspectiva de uma dupla tributação, porque desde logo não existe nos preceitos constitucionais invocados qualquer referência expressa ao fenómeno da dupla tributação e muito menos uma sua proibição expressa.

Poderá, então, perguntar-se, apenas, se a dimensão normativa em questão, ou seja, a interpretação do artigo 2.º, n.os 2 e 3, do Código da Contribuição Autárquica, segundo a qual está sujeito ao pagamento de contribuição autárquica o proprietário de uma caravana de campismo que a tem instalada há mais de um ano, para uso periódico, num terreno (parque de campismo) cujo proprietário se encontra isento dessa mesma contribuição, viola ou não um qualquer princípio de justiça fiscal que integre o regime constitucional do sistema fiscal.

7 - A questão de constitucionalidade normativa que o presente recurso suscita refere, de um modo central, o problema da justiça como padrão de constitucionalidade (cf., sobre a questão, Maria Fernanda Palma, "Constitucionalidade e justiça: Novos desafios para a justiça constitucional", em Themis, ano 1, n.º 1, 2000, pp. 21 e segs.).

O Tribunal Constitucional tem reconhecido, em alguns casos, a justiça como parâmetro de constitucionalidade (cf., entre outros, o Acórdão 368/97 - Diário da República, 2.ª série, de 12 de Julho de 1997 -, onde o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional a norma que previa um horário de trabalho para as guardas de passagem de nível sem limite).

O Tribunal Constitucional chegou mesmo a afirmar que a justiça era parâmetro de constitucionalidade, quando considerou que o direito à indemnização dos trabalhadores no despedimento colectivo derivava de um princípio de justiça (cf. o Acórdão 162/95 - Diário da República, 1.ª série-A, de 8 de Maio de 1995).

O princípio da justiça, como parâmetro aferidor da conformidade constitucional das normas jurídicas, pressupõe, porém, que esteja em causa uma solução normativa absolutamente inaceitável (como sempre aconteceu nos casos apreciados nos arestos citados), que afecte uma dada dimensão do núcleo fundamental dos interesses essenciais da pessoa humana e que colida com os valores estruturantes do ordenamento jurídico (cf. Maria Fernanda Palma, ob. cit., p. 28).

8 - A questão de constitucionalidade normativa em apreciação, tal como a recorrente a define, funda-se no entendimento segundo o qual a solução normativa impugnada consubstancia uma afectação dos interesses do contribuinte, vedada pelos princípios da justiça resultante dos preceitos constitucionais em matéria fiscal.

Porém, tal não acontece.

À recorrente foi liquidada contribuição autárquica em virtude de possuir uma caravana de campismo instalada há mais de um ano num parque de campismo cujo terreno é propriedade de um sujeito isento dessa contribuição.

Ora, não é demonstrado nem é perceptível em que medida é que tal solução afecta de modo absolutamente intolerável qualquer interesse fundamental da recorrente, para que se possa afirmar a violação de um princípio de justiça fiscal com relevância constitucional.

Ao estabelecer a contribuição autárquica o legislador justificou-a (cf. o preâmbulo do Código) com a "lógica do princípio do benefício", correspondendo o seu pagamento à contrapartida dos benefícios que os proprietários recebem com obras e serviços que a comunidade proporciona (cf. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 1998, p. 23).

A recorrente é proprietária da caravana que se encontra instalada no parque de campismo, utilizando-a periodicamente e beneficiando (ou podendo beneficiar) de todas as infra-estruturas inerentes. Assim, a circunstância de o Clube Nacional de Montanhismo, proprietário do terreno onde a caravana se encontra instalada, estar isento de contribuição autárquica não redunda na manifesta injustificação da liquidação dessa contribuição à recorrente (como aconteceria, eventualmente, se o contribuinte tivesse de pagar duas vezes o mesmo imposto), na medida em que essa liquidação incide sobre um benefício que é autónomo do proprietário do parque de campismo, tendo, porém, o pagamento do imposto uma justificação não contraditória com as razões específicas que presidem à isenção do parque de campismo. Não pode dizer-se, portanto, que a tributação em causa seja intolerável em face do princípio do benefício, que o preâmbulo do diploma que consagra o imposto expressamente invoca.

Mas se, em lugar de nos situarmos na "lógica do benefício", nos situarmos na da "capacidade contributiva" - que é o que exprime, como uniformemente se entende, a concepção geral de justiça tributária da Constituição -, a conclusão não será diferente: é que, e como é óbvio, o parque de campismo, por um lado, e a caravana, por outro, revelarão duas diferentes capacidades contributivas por serem as de dois sujeitos diversos.

É verdade que poderia ser outra a solução consagrada. Porém, isso não torna a dimensão normativa em apreciação inconstitucional, por violação de qualquer princípio de justiça fiscal.

9 - A recorrente invoca, por último, a violação do princípio da igualdade, utilizando vários exemplos nos quais não há lugar a liquidação de contribuição autárquica (carros abandonados, contentores dos trabalhadores da construção civil, entre outros).

Em primeiro lugar, cabe sublinhar que é a própria recorrente que qualifica tais exemplos como "absurdos" e "ridículos".

Por outro lado, a argumentação da recorrente assenta na circunstância de nesses exemplos os imóveis também poderem encontrar-se instalados no mesmo local por um período superior a um ano. Ora os pressupostos da norma de incidência (que, segundo o tribunal recorrido, se verificam no caso dos autos) são outros, para além desse (nomeadamente, a não afectação a um fim transitório).

Por último, e decisivamente, tais situações são substancialmente diferentes da situação dos autos, uma vez que em nenhuma delas se verifica uma utilização para fins permanentes, que justificarão (como no caso de uma caravana num parque de campismo por um período superior, pelo menos, a seis anos) a sua qualificação como prédio: um carro abandonado na rua ou um contentor continuam obviamente a ter a natureza de bens móveis.

Não se verifica, pois, qualquer violação do princípio da igualdade, que apenas ocorre quando a realidades substancialmente idênticas se confere tratamento substancialmente diverso, sem que para tal exista fundamento legítimo.

Improcede, assim, o presente recurso.

III - Decisão. - 10 - Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide negar provimento ao presente recurso de constitucionalidade, confirmando a decisão recorrida.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 UC.

Lisboa, 12 de Julho de 2001. - Maria Fernanda Palma (relatora) - Paulo Mota Pinto - Guilherme da Fonseca - Bravo Serra (com a declaração de voto junta). - José Manuel Cardoso da Costa (não subscrevendo, apenas, as considerações do acórdão sobre a possibilidade de conhecimento, pelo Tribunal, da questão da eventual ultrapassagem dos limites da interpretação - máxime, de uma interpretação "extensa" da lei -, conforme posição que, a esse respeito, tenho persistentemente assumido).

Declaração de Voto

Com a declaração de que me sobram abundantes dúvidas quanto à questão de saber se do objecto do vertente recurso se deveria conhecer, atenta a fundamentação que se surpreende no n.º 4 do Acórdão 246/2001, da 3.ª Secção deste Tribunal, aresto esse tirado, em 23 de Maio de 2001, em processo no qual figurava como recorrente a ora impugnante. - Bravo Serra.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1943822.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga ao seguinte documento (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1995-05-08 - Acórdão 162/95 - Tribunal Constitucional

    COM BASE EM VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS, 18, NUMERO 3, 53 E 168, NUMERO 1, ALÍNEA B), DA LEI FUNDAMENTAL, DECLARA-SE, COM FORÇA OBRIGATÓRIA GERAL, A INCONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS CONSTANTES DA ALÍNEA C) DO NUMERO 1 DO ARTIGO 4 DO DECRETO LEI 137/85, DE 3 DE MAIO, (EXTINCAO POR CADUCIDADE DE TODOS OS CONTRATOS DE TRABALHO EM QUE SEJA PARTE A CTM, COMPANHIA PORTUGUESA DE TRANSPORTES MARÍTIMOS, NO ÂMBITO DA EXTINÇÃO DESSA EMPRESA) E DA ALÍNEA C) DO NUMERO 1 DO ARTIGO 4 DO DECRETO LEI 138/85, DA MESMA DATA, (EXTINC (...)

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

O URL desta página é:

Clínica Internacional de Campo de Ourique
Pub

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda