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Acórdão 255/2001/T, de 18 de Julho

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Texto do documento

Acórdão 255/2001/T. Const. - Processo 410/00. - Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - Maria Filomena do Nascimento Nogueira e outro (ora recorridos) requereram no Tribunal Judicial da Comarca de Moimenta da Beira, contra a Companhia de Seguros Zurich (ora recorrente), arbitramento de indemnização provisória, pedindo que a requerida ficasse adstrita a processar à primeira requerente uma renda mensal não inferior a 350 000$00, a iniciar-se em 1 de Setembro de 1999 e a manter-se até ao momento em que lhe fosse processado o pagamento de indemnização definitiva, que reclamava na acção principal, e ao segundo requerente a renda mensal de 30 000$00, nos mesmos termos.

Alegaram, no essencial, que sofreram elevados danos num acidente de viação causados por um veículo automóvel segurado pela requerida, necessitando dessa reparação provisória dos danos sofridos para além dos limites considerados numa anterior e idêntica providência cautelar.

2 - Por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Moimenta da Beira, de 7 de Julho de 1999, foi a providência cautelar liminarmente indeferida, por se ter considerado que se verificava a excepção do caso julgado material prevista no artigo 671.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

3 - Inconformados com esta decisão os requerentes agravaram para o Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de 16 de Novembro de 1999, concedeu provimento ao agravo e, em consequência, revogou o despacho recorrido ordenando a sua substituição por um outro que ordenasse o prosseguimento dos autos.

4 - Foi agora a vez da requerida, inconformada, recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações que então apresentou sustentou a inconstitucionalidade dos artigos 403.º a 405.º do CPC por alegada violação do artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, e do princípio da proporcionalidade.

5 - O Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 10 de Maio de 2000, decidiu negar provimento ao recurso. Sobre a alegada inconstitucionalidade dos artigos 403.º a 405.º do CPC, ponderou aquele Tribunal:

"[...]

Com os artigos 403.º a 405.º do Código de Processo Civil, criou o legislador de 1995-1996 (Decreto-Lei 329.º-A/95, de 12 de Dezembro, e Decreto-Lei 180/96, de 25 de Setembro) uma nova providência cautelar - arbitramento de reparação provisória -, destinada a minorar os prejuízos que o lesado sofre em consequência da demora na obtenção de uma sentença condenatória do lesante.

Nos termos do n.º 2 do referido artigo 403.º, a providência só será deferida no caso de verificação de dois requisitos: uma situação de necessidade do requerente em consequência dos danos sofridos e a existência indiciada da obrigação de indemnizar a cargo do requerido.

Antes da decisão, porém, o requerido tem a possibilidade de contestar a pretensão do requerente, apresentando a sua prova em julgamento - artigos 400.º, n.º 2, e 404.º, n.º 1, do CPC.

Não se vê, assim, que tais normas briguem com o disposto no n.º 4 do artigo 20.º da Constituição.

Tratando-se de uma providência cautelar, a decisão há-de ser proferida em prazo curto. E não se vê, por outro lado, que o processo não seja equitativo, pelo facto de o requerente ter de apresentar a sua defesa em prazo porventura mais reduzido, tendo em conta que o requerente deduz a sua pretensão sem limite de prazo. É o que sucede, de resto, em qualquer acção. O réu tem sempre um prazo para contestar. O que não retira equidade ao processo.

Quanto à violação do princípio da proporcionalidade, também não ocorre no caso que nos ocupa.

Como se diz na contra-alegação 'se o princípio constitucional da proporcionalidade, também chamado da proibição do excesso, essencialmente postula uma adequação entre os fins e os meios, o procedimento de arbitramento de reparação provisória representa justamente um meio processual adequado à satisfação da necessidade de se conferir tutela expedita a situações comprovadamente graves.'

Conclui-se, assim, que os artigos 403.º a 405.º do Código de Processo Civil não enfermam de inconstitucionalidade, podendo ser aplicados pelos tribunais."

6 - É desta decisão que vem interposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o presente recurso de constitucionalidade. Pretende a recorrente ver apreciada a constitucionalidade dos artigos 403.º a 405.º do CPC, por alegada violação do disposto no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, e do princípio da proporcionalidade.

7 - Já neste Tribunal foi a recorrente notificada para alegar, o que fez, tendo concluído nos seguintes termos:

"I - O artigo 20,.º, n.º 4, da CRP institui princípios informadores, designadamente do processo civil e entre os quais se destacam o da imparcialidade, o da igualdade de armas e o da proibição de excesso;

II - Os artigos 403.º a 405.º do Código de Processo Civil, ao permitirem, como no caso dos autos, que a recorrente tivesse apenas oito dias (contados o da recepção da carta e o do julgamento) para preparar a sua defesa e a apresentar, por sua conta e risco, em tribunal, não beneficiando sequer da possibilidade de obter certidão da presença das suas testemunhas no acto processual em questão, porque não haviam sido notificadas pelo tribunal, enquanto que aos requerentes" lhes é facultada a possibilidade de definirem o tempo e o modo em que o intentarão, para além de ser o tribunal a notificar as suas testemunhas para comparecerem em juízo, certificando-lhes a sua presença, quando em causa estão mais de 100 000 contos, violam, materialmente, o disposto no artigo 20.º da Constituição; tanto mais que:

III - Não pode vencer a tese segundo a qual, com a faculdade legal atribuída à recorrente de exigir dos requerentes do procedimento cautelar as prestações pagas, se entende ser garantida a igualdade de armas e a proibição de excesso, uma vez que:

IV - Dependendo a atribuição da reparação provisória de um estado de carência económica, e estando em causa mais de 100 000 contos;

V - A renda que se vier a fixar destinar-se-á, exclusivamente, a combater este estado de carência, pelo que dela, no futuro, nada restará;

VI - Não tendo os requerentes do procedimento cautelar dinheiro, quer antes de intentarem quer depois, a recorrente nunca terá qualquer possibilidade de reaver o que dispendeu;

VII - Nestes termos e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, por via disso, declarando-se inconstitucionais os artigos 403.º a 405.º do Código de Processo Civil, por violação do disposto no artigo 20.º da CRP, e deve a recorrente ser absolvida do pagamento da reparação provisória contra ela requerida."

8 - Notificados para responderem, querendo, às alegações da recorrente, disseram, a concluir, os recorridos:

"I - Tendo já produzido o efeito nefasto de retardar a apreciação judicial de uma prestação de tutela urgente, o presente recurso, além de pretender a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 403.º a 405.º do Código de Processo Civil com a inovação das circunstâncias que apenas dizem respeito à aplicação do disposto na primeira parte dos n.os 1 e 2 do artigo 400.º ex vi do n.º 2 do artigo 404.º, assenta em argumentos insubsistentes;

II - O princípio do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, exige que o sistema jurídico preveja meios processuais subordinados a princípios de prioridade e sumariedade para os casos em que as delongas inerentes à decisão definitiva exponham os titulares dos direitos deduzidos em juízo a consequências graves que só possam ser evitadas ou minimizadas através da concessão de uma tutela urgente, como sucede quando os factos lesivos dos direitos à vida ou à integridade física dêem causa a uma situação de carência, de meios de subsistência;

III - O procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória, regulado nos artigos 403.º a 405.º do Código de Processo Civil, possibilitando às pessoas que comprovadamente fiquem colocadas na situação de necessidade em resultado de morte ou lesão corporal, a concessão, na pendência da acção de indemnização definitiva, de prestações periódicas postas a cargo daqueles sobre quem recaem indícios de um dever de indemnizar e fixadas segundo critérios de equidade, corresponde à satisfação do imperativo constitucional de uma justiça efectiva;

IV - Subordinada ao que vier a ser decidido numa acção principal, e de concessão dependente da verificação, em procedimento judicial contraditório, de condições legalmente bem definidas a demonstrar pelos requerentes, como a ocorrência de uma situação de necessidade actual consequente dos danos e a existência provável de uma obrigação de indemnizar por parte dos requeridos, essa providência antecipatória traduz uma política processual de equilíbrio entre os interesses da celeridade e da justiça no tratamento de situações prementes e graves que não viola os princípios da equidade, alteridade, proibição do excesso ou qualquer outro comando constitucional;

V - Permite, pelo contrário, atenuar situações de flagrante injustiça que o tempo sempre suposto pela decisão da acção condenatória pode criar às vítimas de ofensas aos direitos à vida e à integridade física pessoal, reconhecidos como fundamentais pelos artigos 24.º e 25.º da CRP."

Nestes termos e no demais que VV. Exmas. doutamente suprirão, deve negar-se provimento ao recurso, baixando os autos para julgamento, pelo Tribunal da Comarca, da providência que os ora recorridos requereram.

Dispensados os vistos legais, cumpre decidir.

II - Fundamentação. - 9 - Os artigos 403.º a 405.º do Código de Processo Civil, normas ora objecto do recurso, dispõem da seguinte forma:

"Artigo 403.º

Fundamento

1 - Como dependência da acção de indemnização fundada em morte ou lesão corporal, podem os lesados, bem como os titulares do direito a que se refere o n.º 3 do artigos 495.º do Código Civil, requerer o arbitramento de quantia certa, sob a forma de renda mensal, como reparação provisória do dano.

2 - O juiz deferirá a providência requerida, desde que se verifique uma situação de necessidade em consequência dos danos sofridos e esteja indiciada a existência da obrigação de indemnizar a cargo do requerido.

3 - A liquidação provisória, a imputar na liquidação definitiva do dano, será fixada equitativamente pelo Tribunal.

4 - O disposto nos números anteriores é também aplicável aos casos em que a pretensão indemnizatória se funde em dano susceptível de pôr seriamente em causa o sustento ou habitação do lesado.

Artigo 404.º

Processamento

1 - É aplicável ao processamento da providência referida no artigo anterior o disposto acerca dos alimentos provisórios, com as necessárias adaptações.

2 - Na falta de pagamento voluntário da reparação provisoriamente arbitrada, a decisão é imediatamente exequível, seguindo-se os termos da execução especial por alimentos.

Artigo 405.º

Caducidade da providência e repetição das quantias pagas

1 - Se a providência decretada vier a caducar, deve o requerente restituir todas as prestações recebidas, nos termos previstos para o enriquecimento sem causa.

2 - A decisão final, proferida na acção de indemnização, quando não arbitrar qualquer reparação ou atribuir reparação inferior à provisoriamente estabelecida, condenará sempre o lesado a restituir o que for devido."

10 - Alega a recorrente, como já vimos, que os artigos 403.º a 405.º do CPC - que prevêem o procedimento cautelar especificado de arbitramento de reparação provisória - violam o disposto no artigo 20.º, n.º, 4, da Constituição, designadamente na parte em que aí se prevê o direito a um processo equitativo, subordinado aos princípios da imparcialidade, da igualdade de armas e da proibição de excesso ou da proporcionalidade.

É, porém, manifesto, como vai ver-se, que não lhe assiste razão. E, fundamentalmente, por duas ordens de razões.

Por um lado porque, nos termos do n.º 2 do artigo 400.º, aqui aplicável ex vi do artigo 404.º, n.º, 1, ambos do CPC, ao requerido é efectivamente garantido o direito ao contraditório antes da providência ser deferida. É certo, como alega o recorrente, que do preceituado nos n.os 1 e 2 do artigo 400.º normalmente resultará que o tempo de que o requerido dispõe para preparar a sua defesa será inferior àquele de que o requerente dispõe para intentar o procedimento. Tal constatação, porém, não é suficiente para permitir concluir que o processo deixou de ser equitativo. Para o demonstrar basta recordar - como bem faz a decisão recorrida - que tal é o que sucede, por via de regra, em qualquer acção, onde o prazo de que o réu dispõe para contestar é normalmente bastante inferior àquele de que o autor dispõe (quando dispõe) para preparar e interpor a acção.

Por outro lado, também não procede a alegação de que o arbitramento de uma renda provisória antes de transitada em julgado a acção principal consubstancia a imposição ao requerido de um sacrifício desproporcionado. É que, nos termos do n.º 2 do artigo 403.º do CPC, o deferimento do requerimento depende não apenas de estar indiciada a existência de obrigação de indemnizar a cargo do lesado bem como, fundamentalmente, de estar demonstrada a existência de uma situação de necessidade do lesado em consequência dos danos sofridos.

E, isto ponderado, é manifesto que o sacrifício imposto ao requerido não é, nestas hipóteses, excessivo ou desproporcionado, consideradas as finalidades que o deferimento do requerimento visa satisfazer - fazer face à comprovada situação de necessidade do requerente provocada pelo comportamento gerador do dever de indemnizar.

III - Decisão. - Por tudo o exposto, decide-se:

a) Não julgar inconstitucional, designadamente por violação do artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, o disposto nos artigos 403.º a 405.º do CPC;

b) Em consequência, negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 UC.

29 de Maio de 2001 - José de Sousa e Brito - Messias Bento - Alberto Tavares da Costa - Luís Nunes de Almeida.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1921159.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga ao seguinte documento (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1996-09-25 - Decreto-Lei 180/96 - Ministério da Justiça

    Revê o Código de Processo Civil, altera o Decreto-Lei 329-A/95 de 12 de Dezembro que o reviu e republicou e rectifica algumas inexactidões na republicação do Código em anexo ao citado diploma.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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