Despacho 22 651/2000 (2.ª série). - Os medicamentos são um contributo inestimável para a redução da morbilidade e da mortalidade e para o aumento da qualidade e da esperança de vida do homem na sociedade e no espaço económico em que se insere.
Temos assistido nos últimos anos ao aumento crescente da despesa com medicamentos, num ciclo de acelerada introdução no mercado de novas moléculas com custos de investigação e desenvolvimento também em crescimento rápido e com a perspectiva de cada vez maior número de cidadãos consumirem mais e mais caros medicamentos, com o legítimo objectivo de melhor e prolongar a vida.
O desafio da sustentabilidade económica e financeira que se coloca ao Serviço Nacional de Saúde, enquanto terceira entidade pagadora de medicamentos, não é exclusivo de Portugal.
Qualquer mercado farmacêutico é complexo, nele persistindo interesses e objectivos por vezes conflituantes, onde a necessidade de conciliação da oferta privada e da eficiência industrial com os objectivos sociais, que ao Estado incumbe assegurar, implica uma permanente intervenção das autoridades.
Perceber as determinantes comuns e específicas de qualquer mercado farmacêutico, em países dotados de serviços de saúde com financiamento público e cobertura universal, é crucial para a identificação das principais situações-problema causadoras de bloqueios e de constrangimentos face às medidas estruturais que à intervenção pública competem e que devem prosseguir os objectivos genéricos de garantir o acesso, a equidade e a solidariedade na cobertura das necessidades fármaco-terapêuticas da população e de estimular a inovação, a eficiência e a competitividade da indústria farmacêutica.
Neste contexto, a comparticipação nos preços dos medicamentos constitui a mais decisiva das intervenções do Serviço Nacional de Saúde na prossecução destes objectivos, pelo que urge definir os critérios a que deve obedecer a avaliação e reavaliação dos medicamentos para efeitos dessa comparticipação.
Assim, ao abrigo do artigo 4.º do Decreto-Lei 205/2000, de 1 de Setembro, e considerando o disposto nos artigos 5.º a 7.º do Decreto-Lei 118/92, de 25 de Junho, com as redacções dadas por aquele diploma, e no artigo 4.º da Lei 14/2000, de 8 de Agosto, determino o seguinte:
1 - A inclusão de medicamentos na lista de medicamentos comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde e a respectiva exclusão dependem do grau de qualidade da demonstração da evidência científica de eficácia e de efectividade para as indicações terapêuticas reclamadas, associada à verificação de uma favorável relação benefício-risco, bem como do seu valor terapêutico acrescido.
2 - A recomendação de comparticipação ou de descomparticipação, a formular pela comissão de avaliação, pode revestir diversos graus, consoante a qualidade da prova científica apresentada, em função da classificação dos estudos disponibilizados quanto à sua metodologia, conteúdo e resultados.
3 - Para efeitos do disposto nos números anteriores e à luz do conhecimento científico, os estudos são classificados de acordo com:
a) Revisões sistemáticas e metaanálises de ensaios clínicos, controlados e aleatorizados;
b) Ensaios clínicos, controlados e aleatorizados;
c) Estudos quase experimentais bem delineados e ensaios clínicos não aleatorizados (sempre que as circunstâncias impedirem a realização de ensaios clínicos controlados), estudos observacionais prospectivos e retrospectivos (coortes e casos e controlos);
d) Opinião de peritos.
4 - A graduação da recomendação de comparticipação, em função da qualidade metodológica, do conteúdo e dos resultados dos estudos, poderá ser dos seguintes níveis:
a) Recomendação de comparticipação;
b) Recomendação de descomparticipação sem prejuízo de apresentação de melhor evidência;
c) Recomendação de descomparticipação.
5 - Apenas os medicamentos relativamente aos quais haja sido formulada uma recomendação de comparticipação são passíveis de inclusão na lista de medicamentos comparticipados, implicando a obtenção de uma recomendação de grau diferente a não inclusão do medicamento na referida lista ou a sua exclusão da comparticipação, sem prejuízo do disposto nos n.os 7 e seguintes do presente despacho.
6 - Os titulares de autorização de introdução no mercado de medicamentos que obtenham recomendação de comparticipação não se encontram isentos da obrigação de apresentação de estudo fármaco-económico, sempre que o mesmo seja exigido pela legislação em vigor.
7 - O medicamento que obtenha recomendação de descomparticipação sem prejuízo de apresentação de melhor evidência poderá manter-se na lista de medicamentos comparticipados até à obtenção de recomendação de comparticipação, não podendo aquela situação exceder o máximo de dois anos contados a partir da notificação daquela recomendação.
8 - O regime transitório referido no número anterior depende de aprovação do INFARMED, mediante requerimento do titular da autorização de introdução no mercado, devidamente instruído com o necessário protocolo, a apresentar no prazo de 60 dias a contar da data da notificação da recomendação.
9 - Decorrido o período de dois anos referido no n.º 7 e caso a evidência apresentada não seja suficiente para alterar a anterior recomendação, será o medicamento descomparticipado.
10 - Compete ao INFARMED a prática de todos os actos necessários à boa execução do presente despacho.
28 de Setembro de 2000. - O Secretário de Estado da Saúde, José Miguel Marques Boquinhas.