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Acórdão 277/99/T, de 1 de Março

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Texto do documento

Acórdão 277/99/T. Const. - Processo 706/98. - Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 - Por sentença do Tribunal do Trabalho de Portalegre de 27 de Novembro de 1997, proferida no processo de transgressão n.º 44/97-T, foi DISTRICAMPO - Supermercados, S. A., condenada no pagamento de uma multa de 10 000$00 e de indemnizações, respectivamente, de 175 344$00 à trabalhadora Rosa Maria Tomé e de 68 463$00 à segurança social, por infracção ao disposto no n.º 7 da cláusula 27.ª do contrato colectivo de trabalho celebrado entre as Associações Comerciais de Portalegre e Elvas e o Sindicato dos Trabalhadores de Escritório, Comércio e Serviços do Distrito de Portalegre, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 9, de 8 de Março de 1982, com portaria de extensão de 5 de Maio do mesmo ano, publicada no mesmo Boletim, 1.ª série, n.º 19, de 22 de Maio de 1982, com alterações publicadas no Boletim, 1.ª série, n.º 11, de 22 de Março de 1984.

É por força da citada portaria de extensão que o contrato é aplicável à DISTRICAMPO.

O Tribunal da Relação de Évora, porém, julgando procedente o recurso interposto da condenação, revogou a decisão da 1.ª instância, com fundamento na ilegalidade [por violação do disposto no artigos 43.º do Decreto-Lei 409/71, de 27 de Setembro, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei 519-C1/79, de 29 de Dezembro] e na inconstitucionalidade [por violação do princípio, consagrado na alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, de que "para trabalho igual, salário igual", "princípio" que "afinal, é o corolário - para os trabalhadores - de outro mais genérico e abrangente", o princípio da igualdade], da norma constante do referido n.º 7 da cláusula 27.ª atrás identificada.

O Tribunal da Relação de Évora considerou que a diferença de tratamento, no que toca ao cálculo da retribuição, entre os trabalhadores a tempo completo e a tempo parcial, traduzida num "injustificando privilégio" para os últimos, não tem justificação substancial, traduzindo um "puro arbítrio legislativo". Para o demonstrar, coloca a seguinte hipótese:

"Se, por hipótese, a tabela salarial de um trabalhador de escritório for de 100 000$00 mensais, para o cálculo da retribuição a pagar a um trabalhador que apenas preste trinta horas semanais essa tabela passará automaticamente (arbitrariamente, sem qualquer justificação objectivada) a 150 000$00 ('acrescida de 50%'). Fazendo agora o cálculo, tendo em conta a proporção da prestação do trabalho ajustado (trinta horas), relativamente a uma prestação de trabalho a tempo completo (quarenta horas), temos o surpreendente resultado de que o trabalhador das trinta horas semanais - TTP - receberá 112 500$00 (150 000$00x30:40) [...], enquanto o do horário inteiro apenas tem direito aos tabelares 100 000$00!"

2 - Interpôs então o Ministério Público recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, para que se aprecie "a inconstitucionalidade da norma do n.º 7 da cláusula 27.ª do contrato colectivo de trabalho" em causa, "tendo em conta o disposto no artigo 59.º, n.º 1, alínea a), e no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa".

O recurso foi admitido pelo Tribunal da Relação.

Nas alegações que apresentou neste Tribunal, e que foram apoiadas pela recorrida DISTRICAMPO - Supermercados, S. A., o Ministério Público sustentou, por um lado, a competência do Tribunal Constitucional para conhecer do objecto do recurso e, por outro, a inconstitucionalidade na norma não aplicada, pronunciando-se pela improcedência do recurso.

3 - Na redacção aplicada pelo acórdão recorrido, o n.º 7 da cláusula 27.ª do contrato tinha a seguinte redacção:

"Os trabalhadores de escritório em regime de tempo parcial receberão a retribuição calculada em proporção do tempo de trabalho ajustado, tendo por base a presente tabela, acrescida de 50%."

Note-se que o Tribunal da Relação de Évora, no seu acórdão, começa por observar que a sentença de 1.ª instância enfermou de um erro de julgamento ao aplicar à trabalhadora em causa, servente de limpeza, "a norma daquele n.º 7, pois na sua previsão estão apenas os 'trabalhadores de escritório'" (fl. 30 v.º).

Todavia, ao conhecer do recurso, não mais colocou esta questão, julgando o processo como se a norma a abrangesse. Houve, portanto, efectiva recusa de aplicação da norma objecto do presente recurso de constitucionalidade, condição indispensável para o respectivo conhecimento por parte deste Tribunal [alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro].

Diga-se, aliás, que os serventes de limpeza são abrangidos pelo contrato em causa, como decorre da sua integração no grupo A, A.4 (trabalhadores auxiliares) do anexo n.º 1 e do disposto na cláusula 5.ª

E acrescente-se que, na sequência das alterações ao contrato colectivo de 1984, atrás identificadas, veio a ser publicada uma nova portaria de extensão, por virtude da qual a cláusula 7.ª passou a ter a seguinte redacção:

"Os trabalhadores abrangidos por este contrato colectivo de trabalho em regime de tempo parcial receberão a retribuição calculada na proporção do tempo de trabalho ajustado, tendo por base a tabela constante do anexo IV acrescida de 50%."

O Tribunal da Relação não teve em conta este novo texto; dela não resultaria, aliás, qualquer diferença para a definição do regime aplicável ao caso concreto.

4 - O presente recurso tem, portanto, por objecto a norma constante da cláusula 7.ª acima transcrita, que define o modo de calcular o montante da retribuição devida aos trabalhadores em regime de tempo parcial.

Tem havido divergências neste Tribunal quanto à questão de saber se cabe ou não na respectiva competência o julgamento da eventual inconstitucionalidade de normas constantes de instrumentos convencionais de regulamentação colectiva do trabalho (cf. os Acórdãos n.os 172/93, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 24.º vol., pp. 451 e segs., e 637/98, ainda inédito, num sentido, e o Acórdão 214/94, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 27.º vol., pp. 1057 e segs., em sentido oposto).

Verifica-se, todavia, que, no caso presente, a norma em crise é aplicável ao litígio por força da portaria de extensão de 5 de Maio de 1982, atrás referida; considera-se, portanto, pelos motivos indicados no Acórdão 392/89 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13.º vol., t. II, pp. 1035 e segs.), que o Tribunal é competente para seu conhecimento do objecto do recurso.

5 - Passando-se, assim, à questão de fundo, cabe dizer, desde já, que se afigura clara a falta de fundamento do presente recurso.

Com efeito, e conforme tem sido afirmado por este Tribunal, o princípio "para trabalho igual, salário igual", consagrado na alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, proíbe que se retribua de maneira diferente trabalhadores que, com as mesmas habilitações, prestem trabalho da mesma natureza e com a mesma quantidade (Acórdãos n.os 313/89 e 303/90, publicados em Acórdãos do Tribunal Constitucional, respectivamente, 13.º vol., t. II, pp. 917 e segs., e 17.º vol., pp. 65 e segs.), sob pena de violação da proibição de arbítrio que encerra, em geral, o princípio da igualdade. E está em causa, como é evidente, uma sua aplicação aos trabalhadores em particular.

É óbvio que a quantidade de trabalho prestada por trabalhadores em regime de tempo completo e em regime de tempo parcial é diferente: no caso de que agora nos ocupamos, é este o ponto que distingue trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho com as mesmas habilitações. Assim, a aplicação do princípio referido implica que a diferença de remuneração corresponda à diferença de quantidade de trabalho prestado - regra que a cláusula em crise, manifestamente, não respeita.

É certo que a lei prevê que o regime de tempo parcial seja atribuído a trabalhadores em situações (pessoais) particulares, a saber, com responsabilidades familiares, com capacidade de trabalho reduzida ou que sejam trabalhadores-estudantes. Essas situações, todavia, se justificam (do ponto de vista dos valores que estão em causa e da protecção constitucional que merecem - cf. os artigos 67.º, 68.º, 71.º e 72.º da Constituição) que, nos instrumentos de regulamentação colectiva, lhes seja dada a preferência na admissão em regime de tempo parcial, já não explicam o privilégio em que são colocados face aos trabalhadores em tempo completo, no que toca ao cálculo da remuneração.

Nestes termos, decide-se:

a) Julgar inconstitucional a norma constante do n.º 7 da cláusula 27.ª do contrato colectivo de trabalho celebrado entre as Associações Comerciais de Portalegre e Elvas e o Sindicato dos Trabalhadores de Escritório, Comércio e Serviços do Distrito de Portalegre, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 9, de 8 de Março de 1982, com portaria de extensão de 5 de Maio do mesmo ano, publicada no mesmo Boletim, 1.ª série, n.º 19, de 22 de Maio de 1982, por violação do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição;

b) Consequentemente, negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida quanto à questão de constitucionalidade.

Lisboa, 5 de Maio de 1999. - Maria dos Prazeres Beleza - Messias Bento - José de Sousa e Brito - Alberto Tavares da Costa - Luís Nunes de Almeida.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1757451.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1971-09-27 - Decreto-Lei 409/71 - Ministério das Corporações e Previdência Social

    Estabelece o novo regime jurídico da duração do trabalho.

  • Tem documento Em vigor 1979-12-29 - Decreto-Lei 519-C1/79 - Ministério do Trabalho

    Estabelece o regime jurídico das relações colectivas de trabalho.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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