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Acórdão 579/99/T, de 21 de Fevereiro

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Texto do documento

Acórdão 579/99/T. Const. - Processo 955/98. - Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - José Fernandes Nunes Ricardo interpôs recurso da deliberação do Conselho Superior da Magistratura n.º 159/98, de 2 de Março de 1998 (Diário da República, 2.ª série, de 18 de Março de 1998), que procedeu à graduação dos candidatos no 7.º concurso curricular de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça (aviso publicado no Diário da República, 2.ª série, de 6 de Novembro de 1997).

O Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça emitiu parecer no sentido da intempestividade do recurso, considerando ter decorrido o prazo de 30 dias previsto no artigo 169.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Lei 21/85, de 30 de Julho, contado da data da publicação da deliberação de graduação no Diário da República.

Em resposta, o recorrente sustentou que o aludido prazo de 30 dias se conta da data em que a certidão autenticada da acta com o teor da respectiva deliberação é entregue ao impugnante, nos termos do artigo 169.º, n.º 2, alínea c), da Lei 21/85, de 30 de Julho, sob pena de se interpretar tal preceito num sentido inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 13.º, 18.º, n.os 1 e 2, e 268.º, n.º 3, da Constituição.

No Supremo Tribunal de Justiça, o relator emitiu parecer, sustentando que o prazo de 30 dias a que se refere o artigo 169.º, n.º 1, da Lei 21/85, de 30 de Julho, conta-se, nos termos do artigo 169.º, n.º 2, alínea c), da mesma lei, da data da publicação da deliberação, por extracto, no Diário da República. O relator considerou também que, não obstante a alínea a) do referido preceito não ter aplicação directa nos autos, a solução do caso haveria de ser idêntica à consagrada nessa disposição.

O Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 9 de Julho de 1998, julgou procedente a questão prévia da extemporaneidade do recurso, pelos fundamentos constantes do parecer do relator. Em consequência, decidiu não tomar conhecimento do objecto do recurso.

2 - José Fernandes Nunes Ricardo interpôs recurso de constitucionalidade do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 1998, ao abrigo do disposto nos artigos 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição e 70.º, n.º 1, alínea b), da lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição das normas contidas no artigo 169.º, n.º 2, alíneas a) e c), da Lei 21/85, de 30 de Julho.

Junto do Tribunal Constitucional, o recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:

"1.ª A deliberação 159/98 do Conselho Superior da Magistratura, de que foi introduzido recurso, consubstancia juridicamente um acto administrativo de gestão pública unilateral do Estado-Administração, até porque, contenciosamente, equipara-se aos 'actos do Governo', na medida em que '(c)onstituem fundamentos do recurso os previstos na lei para os recursos a interpor' desses actos (artigo 168.º, n.º 5, do EMJ).

2.ª'Os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei' (artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa); e, assim, a sua notificação é, hoje, constitucionalmente obrigatória, constituindo uma garantia constitucional para o interessado.

3.ª Conjugadamente com o n.º 3 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa, deriva daí a garantia constitucional que se traduz em atribuir ao interessado o direito de interpor recurso contencioso, com fundamento em ilegalidade do acto administrativo que lese os seus direitos ou interesses legalmente tutelados (artigo 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa).

4.ª A essa luz, é deveras irrazoável e desproporcionado o entendimento do acórdão recorrido, quando presume o conhecimento do acto administrativo na base de 'extracto' da publicação no Diário da República (sem menção do fundamento) da deliberação do Conselho Superior da Magistratura, cuja publicação oficial nem era obrigatória: é que, de iure, esse entendimento e o procedimento nele radicado, onde não se vê interesse público algum no modo de contagem do prazo que preconiza, equivale a infligir ao interessado na impugnação contenciosa do acto administrativo lesivo dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos um ónus que lhe torna particularmente oneroso o acesso à justiça contenciosa, como é notoriamente o caso daqui.

5.ª Os termos publicação, notificação e conhecimento, mencionados nas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 169.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, têm, quanto à contagem do prazo para recorrer conferido pela aplicação subsidiária do n.º 2 do artigo 31.º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, ex vi artigo 178.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a amplitude e o sentido de que 'o prazo para o recurso conta-se a partir da notificação ou da entrega da certidão requerida', quando esta não acompanhar aquela.

6.ª E este é um entendimento conforme o imperativo constitucional, sob ameaça das normas contidas naquelas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 169.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais estarem feridas de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 268.º, n.os 4 e 3, da Constituição da República Portuguesa.

7.ª Logo, a interpretação dada aqui pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de Julho de 1998 às disposições das alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 169.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, no sentido de mandar contar o prazo para o recurso contencioso a partir da data da publicação (não obrigatória) no Diário da República, 2.ª série, de 18 de Março de 1998, de um simples 'extracto' da deliberação 159/98 (sem menção sequer do fundamento) do Conselho Superior da Magistratura, fere, por causa de desigualdade e desproporção no tratamento de situações idênticas - como se apura, em face do procedimento do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF), a que se alude nos autos de recurso contencioso, e do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 489/97 -, os princípios fundamentais da igualdade e da proporção, consagrados nos artigos 13.º e 18.º, n.os 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, por um lado, e, mais incisivamente e por outro, viola flagrantemente o disposto no artigo 268.º, n.º 4 (conjugado com o n.º 3), da Constituição da República Portuguesa."

A entidade recorrida ofereceu o merecimento dos autos.

3 - Corridos os vistos, cumpre decidir.

II - Fundamentação. - 4 - No presente recurso de constitucionalidade, o recorrente submete à apreciação do Tribunal Constitucional as normas contidas no artigo 169.º, n.º 2, alíneas a) e c), da Lei 21/85, de 30 de Julho. É a seguinte a redacção desse preceito:

"Artigo 169.º

Prazo

...

2 - O prazo n.º 1 conta-se:

a) Da data da publicação da deliberação, quando seja obrigatória;

...

c) Da notificação, conhecimento ou início da execução da deliberação, nos restantes casos.

..."

O tribunal recorrido interpretou estas disposições legais no sentido de o prazo de 30 dias para a impugnação de um concurso curricular de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça se dever contar da data da publicação do extracto da respectiva deliberação de graduação e não da data em que ao impugnante é entregue, a pedido deste, certidão da acta completa (da qual consta a fundamentação da deliberação).

O recorrente sustenta que tal interpretação dos preceitos impugnados viola o disposto nos artigos 13.º, 18.º, n.os 1 e 2, e 268.º, n.os 3 e 4, da Constituição.

5 - A questão de constitucionalidade normativa objecto do presente recurso consiste na apreciação da norma que estabelece o início da contagem do prazo de impugnação do acto administrativo. Concretamente, a norma em causa determina que o prazo de impugnação se conta da data da publicação do extracto da deliberação no Diário da República, independentemente da respectiva notificação ao interessado.

O Tribunal Constitucional, no Acórdão 489/97, de 2 de Julho de 1997 (Diário da República, 2.ª série, de 18 de Outubro de 1997), ao apreciar a conformidade à Constituição da norma contida no artigo 29.º, n.º 1, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, afrontou uma questão substancialmente idêntica à dos presentes autos. Nesse aresto, o Tribunal considerou que "após a revisão constitucional de 1989 [...], os actos administrativos devem ser sempre notificados aos interessados, mesmo quando tenham de ser oficialmente publicados", uma vez que "a notificação é um elemento essencial para o exercício, em tempo útil, do recurso contencioso ou dos demais meios procedimentais admitidos no âmbito da jurisdição administrativa".

O Tribunal entendeu, também, que, "sendo a notificação do acto administrativo essencial para o efectivo conhecimento pelos interessados dos actos da Administração susceptíveis de os atingir na sua esfera jurídica, seria irrazoável e claramente excessivo contar o prazo para o recurso contencioso da publicação de tais actos, quando esta seja obrigatória, em vez de tal contagem se fazer a partir da notificação". Estar-se-ia, então, e ainda no entendimento do Tribunal, a "impor aos interessados na eventual impugnação contenciosa dos actos administrativos lesivos dos seus direitos ou interesses um ónus que poderia tornar particularmente oneroso o acesso à justiça administrativa", pois "esse modo de contagem do prazo obrigá-los-ia a manterem-se atentos à publicação desses actos [...] sem que se descubra qualquer interesse público" nessa solução.

O Tribunal Constitucional, por último, afirmando que "a notificação é, hoje, constitucionalmente obrigatória", concluiu pela inconstitucionalidade da norma contida no artigo 29.º, n.º 1, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, por violação do disposto no artigo 268.º, n.º 4, conjugado com o n.º 3, da Constituição.

6 - A publicação no Diário da República do acto administrativo impugnado no presente processo não é obrigatória.

Por outro lado, na 2.ª série do Diário da República de 18 de Março de 1998 foi apenas publicado um extracto da deliberação 159/98 do Conselho Superior da Magistratura, pelo que o recorrente só tomou conhecimento de todos os elementos do acto, nomeadamente da sua fundamentação, no momento em que lhe foi entregue certidão autenticada da acta com o teor da respectiva deliberação (que ele próprio requereu).

Ora, como se referiu, o conhecimento global do acto afigura-se fundamental para que o particular possa avaliar o alcance integral do seu conteúdo, a fim de poder decidir do recurso aos meios de impugnação adequados (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., 1993, p. 935).

Nessa medida, e uma vez que o prazo de impugnação deve ser contado da data em que o particular é notificado do acto (o que, in casu, apenas aconteceu quando ao recorrente foi entregue a acta com o conteúdo completo da deliberação, incluindo a respectiva fundamentação), há que concluir que a interpretação do artigo 169.º, n.º 2, alíneas a) e c), do Estatuto dos Magistrados Judiciais, acolhida na decisão recorrida, segundo a qual o prazo a que se refere o n.º 1 do artigo 169.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais se conta da data da publicação do extracto da mencionada acta, se afigura inconstitucional, por violação do disposto no artigo 268.º, n.os 3 e 4, da Constituição.

7 - Alcançada esta conclusão, torna-se inútil apreciar os demais argumentos de inconstitucionalidade invocados pelo recorrente, nomeadamente a eventual violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição.

III - Decisão. - 8 - Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide julgar inconstitucional, por violação do disposto no artigo 268.º, n.os 3 e 4, da Constituição, a norma resultante da interpretação conjugada das alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 169.º da Lei 21/85, de 30 de Julho, norma que determina que o prazo a que se refere o n.º 1 do mesmo artigo se conta da data da publicação do extracto da deliberação do Conselho Superior da Magistratura no Diário da República e não da respectiva notificação, concedendo, consequentemente, provimento ao recurso e revogando a decisão recorrida que deverá ser reformulada de acordo com o presente juízo de inconstitucionalidade.

Lisboa, 20 de Outubro de 1999. - Maria Fernanda Palma (relatora) - Guilherme da Fonseca - Paulo Mota Pinto - Bravo Serra (com declaração de voto idêntica à que apus no Acórdão 489/97) - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1754287.dre.pdf .

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