Resolução do Conselho de Ministros n.º 1/2001
A monitorização telemática posicional - adiante designada por vigilância electrónica - como método de controlo penal vem ganhando espaço ao nível de alguns sistemas penais europeus. Portugal, não ficando alheio aos resultados encorajadores de tais experiências, acolheu na revisão do Código de Processo Penal, operada pela Lei 59/98, de 25 de Agosto, a possibilidade de utilização de dispositivos técnicos de controlo a distância para fiscalizar o cumprimento da obrigação de permanência na habitação prevista no artigo 201.º daquele Código.
Tais dispositivos vieram, posteriormente, a ser consagrados na Lei 122/99, de 20 de Agosto, prevendo-se que a sua utilização, no âmbito do sistema sancionatório, seja progressiva e experimental.
A inovação das práticas penológicas que estes mecanismos tecnológicos comportam tem uma dimensão simbólica e encerra um potencial reformador de hábitos punitivos que não podem ser descurados numa estratégia político-criminal de criação de alternativas ao encarceramento.
Embora esta primeira experiência se destine a criar condições para uma diminuição das taxas de prisão preventiva, no futuro, e dada a natureza exploratória desta iniciativa, não se deve perder de vista a possibilidade de um eventual alargamento deste método de controlo penal a outras reacções criminais, através da ponderação dos indicadores que vierem a ser obtidos.
A responsabilidade de introduzir a vigilância electrónica no sistema sancionatório português foi cometida aos serviços de reinserção social, que, até à presente data, vêm prospectando as condições mais adequadas para o lançamento da experiência piloto, nomeadamente através do acompanhamento de casos idênticos em curso noutros países membros do Conselho da Europa e da preparação da fase prévia dos procedimentos de aquisição de equipamentos e serviços.
Importa agora desencadear uma nova etapa durante a qual se procederá à aprovação dos dispositivos regulamentares previstos na lei e ao processo de aquisição dos meios tecnológicos necessários ao início da experiência portuguesa.
Ora, a análise da concretização das reformas penais tem vindo a demonstrar que, quando se procura introduzir novas práticas e alterar hábitos punitivos, a estratégia mais eficaz assenta em mecanismos de prévia concertação entre os diversos responsáveis e intervenientes no sistema penal.
Tal concertação deve visar o desenvolvimento de relações de proximidade que facilitem a prossecução dos objectivos da experiência, procurando-se que todos os intervenientes, especialmente as magistraturas, estejam efectivamente motivados e empenhados no processo de aplicação e execução da medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica.
Por outro lado, a concretização desta experiência exige aos serviços de reinserção social, sobretudo nesta fase exploratória, um significativo esforço de investimento financeiro e tecnológico que só beneficiará do recurso à co-participação de empresas com capacidade técnica para o efeito.
O reconhecimento e a relevância que o Governo atribui a esta experiência justificam-se pela sua natural especificidade do ponto de vista penológico e tecnológico e pela necessidade de envolver quer os diversos operadores do sistema penal e as magistraturas quer entidades privadas.
Foram ouvidos o Conselho Superior da Magistratura, a Procuradoria-Geral da República e a Ordem dos Advogados.
Assim, nos termos da alínea d) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolveu:
1 - Criar, no âmbito do Ministério da Justiça, uma estrutura de missão com o objectivo de desenvolver as estratégias de implementação do sistema de monitorização electrónica de arguidos sujeitos à medida de coacção prevista no artigo 201.º do Código de Processo Penal, estabelecer as condições para a sua aplicação e acompanhar a execução experimental deste método de controlo penal, à qual compete, designadamente:
a) Propor a definição das áreas geográficas em que funcionará o regime experimental da vigilância electrónica;
b) Definir uma estratégia de concertação com as diversas entidades que intervêm no processo de aplicação e execução de medidas de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica que permita o desenvolvimento de um programa experimental;
c) Desenvolver, no âmbito do programa experimental, um sistema de monitorização electrónica de arguidos (SMEA);
d) Promover acções de sensibilização e formação das diversas entidades envolvidas no programa experimental, bem como organizar eventos para divulgação e debate público sobre o mesmo;
e) Adoptar medidas que visem o acompanhamento e avaliação do programa experimental;
f) Acompanhar o funcionamento de programas estrangeiros de vigilância electrónica de delinquentes;
g) Submeter ao Ministro da Justiça um plano de actividades especificando as acções a desenvolver, a respectiva calendarização e a metodologia a seguir;
h) Periodicamente e nos termos a definir no plano de actividades referido na alínea anterior, apresentar relatórios de execução.
2 - A estrutura de missão é constituída por uma comissão de acompanhamento, presidida por individualidade a designar pelo Ministro da Justiça, e por um núcleo executivo, dirigido por um encarregado de missão.
3 - A comissão de acompanhamento é composta pelos seguintes elementos:
a) Um representante do Conselho Superior da Magistratura;
b) Um representante da Procuradoria-Geral da República;
c) Um representante da Ordem dos Advogados;
d) Um representante da Polícia de Segurança Pública;
e) Um representante da Guarda Nacional Republicana;
f) Um representante da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais;
g) O encarregado de missão, em representação do Instituto de Reinserção Social.
4 - À comissão de acompanhamento compete, designadamente:
a) Acompanhar os procedimentos necessários ao lançamento e implementação do programa experimental, emitindo pareceres sempre que para tal for solicitada;
b) Assegurar o envolvimento e a articulação entre as entidades responsáveis pela promoção, aplicação e execução das medidas de permanência na habitação com vigilância electrónica;
c) Participar em acções de mobilização junto das magistraturas e dos operadores do sistema penal, bem como em iniciativas de sensibilização da opinião pública;
d) Emitir parecer sobre o plano de actividades e os relatórios de execução previstos nas alíneas g) e h) do n.º 1.
5 - O núcleo executivo é composto por funcionários do Instituto de Reinserção Social e compreende uma unidade de apoio e coordenação técnica e uma unidade operativa.
6 - Ao núcleo executivo compete, designadamente:
a) Desenvolver o programa operativo de monitorização electrónica de arguidos sujeitos à medida de coacção de obrigação de permanência na habitação;
b) Proceder à elaboração de propostas de medidas regulamentares no âmbito das atribuições da estrutura de missão;
c) Coordenar o programa experimental, bem como a instalação e o funcionamento do SMEA, preparando e acompanhando os procedimentos de aquisição dos bens e serviços necessários;
d) Elaborar o plano de actividades e os relatórios de execução previstos nas alíneas g) e h) do n.º 1;
e) Assegurar os procedimentos necessários à aplicação e execução da medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica;
f) Assegurar a permanente articulação entre as magistraturas e os demais operadores envolvidos na aplicação e execução da medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica.
7 - Compete à unidade de apoio e coordenação técnica desenvolver as actividades referidas nas alíneas a) a d) do número anterior.
8 - Compete à unidade operativa desenvolver as actividades previstas nas alíneas e) e f) do n.º 6.
9 - A unidade operativa é integrada por técnicos das equipas de reinserção social abrangidas pela área geográfica de implantação do programa experimental, coordenada por dois elementos a designar de entre o pessoal que integra a unidade de apoio e coordenação técnica e funcionará vinte e quatro horas por dia.
10 - A entrada em funcionamento da unidade operativa é fixada por despacho do presidente do Instituto de Reinserção Social.
11 - O núcleo executivo poderá, ainda, recorrer a peritos nas áreas das telecomunicações, informática e dos contratos públicos, nomeadamente para a elaboração de pareceres e participação em reuniões de trabalho.
12 - É atribuída aos membros que integram a comissão de acompanhamento, à excepção 13 - É nomeado encarregado de missão o licenciado Luís Filipe Moreira Isidro, sendo equiparado a director de serviços para efeitos remuneratórios e de representação.
14 - O exercício de funções do encarregado de missão a que se refere o número anterior considera-se, para efeitos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 19.º da Lei 49/99, de 22 de Junho, de reconhecido interesse público.
15 - O restante pessoal do núcleo executivo é nomeado por despacho do presidente do Instituto de Reinserção Social no qual se estabelecerão, igualmente, as correspondentes competências e dependências hierárquicas e funcionais.
16 - Os responsáveis pela coordenação da unidade operativa são equiparados a coordenadores de equipa de reinserção social para efeitos remuneratórios, a partir da data fixada no despacho previsto no n.º 10.
17 - O pessoal que integra as unidades de apoio e coordenação técnica e operativa deve estar disponível permanentemente para o desempenho das respectivas funções, sendo-lhes devida compensação pelo trabalho extraordinário que prestar fora do período normal de laboração, nos termos da lei.
18 - Os peritos previstos no n.º 11, até ao máximo de três elementos, podem ser nomeados, nos termos da lei, em regime de comissão de serviço, requisição ou destacamento, de entre funcionários e agentes da administração pública central, regional ou local ou técnicos de empresas públicas e privadas, podendo haver recurso à celebração de contratos de prestação de serviços ou contratos de trabalho a termo, os quais caducarão automaticamente com o fim do mandato da estrutura de missão.
19 - O pessoal da estrutura de missão tem direito a ajudas de custo e subsídio de transporte sempre que se desloque em serviço, nos termos da lei geral.
20 - O apoio logístico e administrativo ao funcionamento da estrutura da missão é assegurado pelo Instituto de Reinserção Social.
21 - Os encargos orçamentais decorrentes da criação e funcionamento da estrutura de missão são suportados pelo Instituto de Reinserção Social.
22 - O prazo para a execução da missão não ultrapassará a duração do período experimental estabelecida nos termos do artigo 10.º da Lei 122/99, de 20 de Agosto, salvo determinação em contrário do Ministro da Justiça.
Presidência do Conselho de Ministros, 14 de Dezembro de 2000. - O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.