de 24 de Novembro
A Lei 113/97, de 16 de Setembro - Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público - prevê, no seu artigo 26.º, no âmbito da relação entre o Estado e o estudante, o apoio do Estado a sistemas de empréstimos que tenham como objectivo possibilitar ao estudante a sua autonomização financeira, designadamente pela criação de taxas remuneratórias especialmente bonificadas.Tendo em conta a relevância social desta medida, o legislador da Lei 113/97 teve ainda o cuidado de referir que o empréstimo deve privilegiar os estudantes economicamente carenciados e com aproveitamento escolar satisfatório, estendendo mesmo a matéria aos estudantes do ensino superior particular e cooperativo e de direito concordatário, nos termos do seu artigo 34.º Ora, sendo certo que a formação de nível superior habilita, em regra, os que dela beneficiam a obter um nível de rendimento que permite recuperar o valor do investimento efectuado, o acesso ao crédito, durante o período da formação, afigura-se adequado à promoção da referida autonomização, desonerando as famílias, pelo menos em parte, do esforço financeiro que suportam e permitindo ao estudante uma maior dedicação na sua formação.
E é assim que, começando embora pela formação inicial, e numa primeira fase restringindo a aplicação aos alunos dos últimos anos dos cursos de bacharelato e licenciatura, a qual poderá ser alargada depois de uma avaliação completa dos resultados, se prevê, tal como o determina o n.º 5 do artigo 26.º da Lei 113/97, que o empréstimo possa ser estendido no futuro aos estudantes de pós-graduação que não exerçam qualquer actividade profissional.
O regime assim criado pelo presente diploma é essencialmente um regime de crédito bonificado, em que, além de contemplar a bonificação de taxas de juro aplicáveis aos estudantes, adopta diversas soluções, nomeadamente em matéria de renegociação dos contratos e de mudança de instituição de crédito, que tendem a favorecer os estudantes mutuários e são, do mesmo modo, tendentes à dinâmica do funcionamento dos mecanismos de mercado.
Por outro lado, o sistema conta com uma estrutura de gestão simples, baseada na acção das instituições de crédito, enquanto entidades vocacionadas para decidir em matéria de crédito a conceder, reservando-se o Estado um papel de controlo e de acompanhamento, além de garante da taxa de juro bonificada.
Assim:
No desenvolvimento da Lei 113/97, de 16 de Setembro, e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta, para valer como lei geral da República, o seguinte:
CAPÍTULO I
Do crédito bonificado aos estudantes do ensino superior
Artigo 1.º
Crédito bonificado aos estudantes do ensino superior
É criado um regime de crédito bonificado aos estudantes do ensino superior que se rege pelo disposto no presente diploma.
Artigo 2.º
Condições de acesso
Podem ter acesso ao regime de crédito bonificado previsto no presente diploma os estudantes do ensino superior que, à data da formulação do pedido de empréstimo, preencham, cumulativamente, as seguintes condições:a) Sejam cidadãos da União Europeia ou de país de língua oficial portuguesa ou ainda de país com o qual haja sido estabelecida reciprocidade de tratamento através de acordo internacional, desde que residam em Portugal há pelo menos dois anos e o respectivo agregado familiar tenha rendimentos tributáveis em Portugal;
b) Frequentem o penúltimo ou o último ano curricular de um curso superior reconhecido pelo Ministério da Educação que confira o grau de licenciado, não considerando como ano curricular o destinado predominantemente a estágio curricular;
c) O rendimento mensal bruto per capita do respectivo agregado seja igual ou inferior a duas vezes o salário mínimo nacional mais elevado do ano a que se reportam os rendimentos;
d) Tenham tido aproveitamento satisfatório no curso em que se encontram inscritos, nos termos de despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Educação;
e) Não sejam titulares de outro empréstimo bonificado contraído ao abrigo do presente regime;
f) Não sejam titulares do grau de licenciado.
2 - São dispensados da satisfação da condição prevista na alínea f) do número anterior os estudantes de ramos de cursos de licenciatura cujo acesso esteja condicionado à titularidade de outro ramo do mesmo curso.
3 - Podem ainda ter acesso ao regime de crédito bonificado previsto no presente diploma os estudantes que, à data da formulação do pedido de empréstimo, preencham, cumulativamente, as condições previstas nas alíneas a), c), d) e e) do n.º 1, frequentem o último ano de um curso superior reconhecido pelo Ministério da Educação que confira o grau de bacharel e não sejam titulares do grau de bacharel.
4 - Para os efeitos deste diploma consideram-se como cursos reconhecidos pelo Ministério da Educação:
a) Os cursos ministrados pelos estabelecimentos universitários públicos criados nos termos da legislação aplicável;
b) Os cursos ministrados pelos estabelecimentos de ensino politécnico público criados por portaria do Ministro da Educação;
c) Os cursos ministrados pelos estabelecimentos de ensino particular ou cooperativo cujo funcionamento haja sido autorizado e o grau reconhecido pelo Ministro da Educação, nos termos da lei;
d) Os cursos ministrados pela Universidade Católica Portuguesa criados pelos órgãos competentes, nos termos dos seus estatutos.
Artigo 3.º
Condição especial
1 - Beneficiam de tratamento mais favorável, em termos de prazo do empréstimo e de taxa de bonificação, os estudantes do ensino superior que, satisfazendo as condições previstas no artigo 2.º, à data da formulação do pedido de empréstimo, sejam deficientes, considerando-se como tal, para efeitos do disposto neste artigo, aquele que apresente um grau de incapacidade permanente, devidamente comprovado pela entidade competente, nos termos da legislação aplicável, igual ou superior a 60%.2 - Caso durante a vigência do empréstimo o mutuário passe a ser considerado deficiente, nos termos do número anterior, deve ser-lhe aplicável o tratamento mais favorável aí referido.
3 - A alteração prevista no n.º 2 deve ser considerada a partir da primeira prestação cujo período se inicie uma vez decorrido o prazo de 30 dias após a entrega da correspondente documentação comprovativa na instituição de crédito mutuante.
Artigo 4.º
Instituições de crédito competentes
São competentes para efectuar operações de crédito ao abrigo do presente diploma os bancos, a Caixa Geral de Depósitos, a Caixa Económica Montepio Geral e a Caixa Central do Crédito Agrícola Mútuo.
Artigo 5.º
Instrução dos pedidos
O pedido de empréstimo faz-se por requerimento apresentado junto de uma das instituições de crédito competentes para efectuarem operações de crédito ao abrigo do presente regime, acompanhado de:a) Declaração do interessado, prestada sob compromisso de honra, mencionando:
i) Não ser titular de outro empréstimo bonificado contraído nos termos do presente diploma;
ii) Não ser titular do grau de licenciado ou de bacharel, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 15.º; e iii) Autorizar as autoridades competentes para o acompanhamento, verificação e fiscalização do cumprimento do disposto neste diploma a acederem às informações referidas no diploma mencionado no artigo 18.º, n.º 3;
b) Última nota demonstrativa de liquidação do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, acompanhada da declaração de rendimentos que lhe diga respeito, referente ao agregado familiar em que o interessado se insere, ou, no caso de este estar dispensado da sua apresentação, de outros elementos oficiais comprovativos emitidos pela respectiva repartição de finanças;
c) Declaração emitida pelo estabelecimento de ensino superior frequentado pelo interessado comprovativa das condições previstas nas alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 2.º do presente diploma, bem como do montante da propina paga pelo interessado;
d) Outros documentos relevantes para instrução do processo.
Artigo 6.º
Decisão dos pedidos
As instituições de crédito, uma vez concluída a instrução do processo, em conformidade com as regras e condições fixadas no presente diploma e respectiva regulamentação, procedem à apreciação e decisão do mesmo, em prazo que não deverá ultrapassar 30 dias.
CAPÍTULO II
Da relação do empréstimo
Artigo 7.º
Montante dos empréstimos
1 - O valor do empréstimo não pode exceder um dos seguintes montantes:a) 24 vezes o salário mínimo nacional mais elevado, fixado à data em que é formulado o pedido de empréstimo, no caso de estudantes que se encontram a frequentar o penúltimo ano do curso;
b) 12 vezes o salário mínimo nacional mais elevado, fixado nos termos da alínea anterior, no caso de estudantes que se encontram a frequentar o último ano do curso.
2 - Na determinação do valor do empréstimo, as instituições de crédito devem atender à situação específica do mutuário, tendo em conta, designadamente, a sua situação económica, o valor da propina do curso frequentado, as despesas necessárias ao cumprimento dos programas curriculares e a distância entre o local da sua residência habitual e o local onde se situa o estabelecimento de ensino frequentado.
Artigo 8.º
Prazo dos empréstimos
1 - O prazo dos empréstimos não pode exceder oito anos, salvo o disposto no número seguinte.2 - No caso de o mutuário preencher e comprovar a situação prevista no artigo 3.º ou no n.º 3 do artigo 15.º, o prazo do empréstimo não pode exceder 10 anos.
Artigo 9.º
Taxa de juro contratual e bonificação
1 - A taxa de juro contratual é negociada entre as partes.
2 - Nos empréstimos sujeitos a taxa de juro variável, no caso de variação da taxa de juro contratual, a nova taxa aplica-se a partir do período subsequente de contagem de juros.
3 - Os empréstimos beneficiam de uma bonificação de 50% da taxa de referência para o cálculo das bonificações criada pelo Decreto-Lei 359/89, de 18 de Outubro, ou da taxa contratual, se esta for inferior, sendo de 70% para a situação prevista no artigo 3.º 4 - A bonificação é calculada sobre o saldo em dívida no início de cada período de contagem de juros, utilizando-se para o efeito:
a) O método das taxas proporcionais até ao final do período previsto no n.º 3 do artigo 11.º;
b) O método das taxas equivalentes para a fase restante do empréstimo.
5 - A taxa de juro a cargo do mutuário é a resultante da diferença entre a taxa de juro contratual e a bonificação a conceder pelo Estado.
Artigo 10.º
Garantia do empréstimo
1 - Os empréstimos são garantidos por fiança, podendo ainda, em alternativa, ser prestada garantia real ou outra garantia considerada adequada pela instituição de crédito ao risco do empréstimo.2 - Em reforço da garantia prestada pode ser constituído seguro de vida do mutuário.
Artigo 11.º
Utilização do empréstimo
1 - O empréstimo é disponibilizado mensalmente aos mutuários durante um período de um ou dois anos, consoante estes se encontrem, respectivamente, no último ou no penúltimo ano do curso, em montantes de igual valor.2 - No caso de o mutuário se encontrar na situação prevista no n.º 3 do artigo 2.º, o período estabelecido no número anterior tem sempre a duração de um ano.
3 - Após o período previsto no n.º 1, os mutuários beneficiam de um período de um ano antes do termo do qual não tem início a amortização do empréstimo.
4 - Os juros a cargo do mutuário, determinados pelo método das taxas proporcionais, são capitalizados até ao momento do início da amortização do empréstimo, salvo se este optar pelo respectivo pagamento.
5 - A periodicidade de contagem de juros é acordada entre as partes.
Artigo 12.º
Amortização do empréstimo
1 - As prestações de capital e do juro a cargo do mutuário são calculadas pelo método das prestações constantes, aplicando-se o método das taxas equivalentes.2 - A periodicidade de pagamento das prestações é acordada entre as partes.
Artigo 13.º
Amortização antecipada
1 - O mutuário pode antecipar, total ou parcialmente, a amortização do empréstimo.2 - Em caso de amortização antecipada, total ou parcial, as comissões ou outros encargos da mesma natureza previstos contratualmente, a suportar pelo mutuário, não podem ser superiores a 0,5% do capital a amortizar.
3 - Até ao final do período previsto no n.º 3 do artigo 11.º apenas se pode verificar a amortização antecipada pela totalidade do saldo em dívida.
Artigo 14.º
Comprovação da conclusão do curso
O mutuário tem de comprovar junto da instituição de crédito a conclusão do curso superior até ao final do período previsto no n.º 3 do artigo 11.º, sob pena de cessar o direito à bonificação dos juros.
Artigo 15.º
Renegociação
1 - Os empréstimos concedidos podem ser renegociados com respeito das regras estabelecidas no presente capítulo.2 - Quando da renegociação resultar um alargamento do prazo do empréstimo para além dos limites estabelecidos no artigo 8.º, e relativamente ao período que exceda tais limites, cessa o direito à bonificação, salvo o disposto no número seguinte.
3 - Quando no final do período previsto no n.º 3 do artigo 11.º o mutuário esteja desempregado, o empréstimo poderá ser renegociado por forma que o início da sua amortização seja dilatado até dois anos, resultando no correspondente alargamento do prazo do empréstimo para além dos limites estabelecidos no artigo 8.º 4 - No caso de o mutuário ter beneficiado de um empréstimo de um ano por ter preenchido o requisito previsto no n.º 3 do artigo 2.º e ter prosseguido de imediato estudos para o 2.º ciclo de curso bietápico de licenciatura, pode renegociar o montante e o prazo previstos para o empréstimo inicial por mais um ano.
Artigo 16.º
Mudança de instituição de crédito mutuante
1 - O mutuário pode optar por outra instituição de crédito mutuante, desde que a mesma seja competente para efectuar operações de crédito ao abrigo do presente diploma.
2 - Na situação prevista no número anterior, o montante do novo empréstimo não pode ser superior ao saldo em dívida do empréstimo na data da alteração nem o respectivo prazo superior ao tempo em falta para o termo do prazo do empréstimo vigente.
3 - No caso previsto no n.º 1, a anterior instituição de crédito fornecerá à nova instituição de crédito todos os elementos necessários à verificação das condições decorrentes do presente artigo, designadamente o saldo em dívida, o período de tempo do empréstimo já decorrido e o tempo em falta para o termo do prazo do empréstimo vigente.
CAPÍTULO III
Disposições finais e transitórias
Artigo 17.º
Pagamento das bonificações
1 - As bonificações a pagar nos termos deste diploma serão suportadas por dotação inscrita no capítulo 60 do Orçamento do Estado, através da Direcção-Geral do Tesouro.2 - As instituições de crédito só poderão reclamar as bonificações a cargo do Estado desde que os mutuários cumpram as obrigações que emergem do presente regime e tenham as suas prestações devidamente regularizadas.
Artigo 18.º
Acompanhamento e verificação
1 - A Direcção-Geral do Tesouro e o Fundo de Apoio ao Estudante acompanham e verificam o cumprimento das obrigações subjacentes ao regime de crédito regulado no presente diploma por parte das instituições de crédito e dos mutuários.2 - Para efeito do disposto no número anterior, as instituições de crédito devem remeter à Direcção-Geral do Tesouro e ao Fundo de Apoio ao Estudante, até ao final de cada mês, informação sobre o número e montante total dos contratos celebrados no mês anterior.
3 - As condições em que se desenvolverá o acompanhamento e verificação do regime por parte da Direcção-Geral do Tesouro e do Fundo de Apoio ao Estudante em matéria de disponibilização da informação relevante para o efeito são definidas por decreto-lei, ouvida a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
4 - Os poderes de fiscalização e o regime sancionatório por violação das normas do presente diploma são aprovados por diploma próprio.
5 - A solicitação do Ministro das Finanças, a Inspecção-Geral de Finanças promoverá inspecções regulares e por amostragem para verificação do cumprimento do disposto no presente diploma e respectiva regulamentação.
Artigo 19.º
Fixação e publicação das condições
1 - As instituições de crédito devem afixar e tornar públicas as condições dos empréstimos a conceder ao abrigo do presente decreto-lei, mencionando, designadamente, os seguintes elementos:
a) Prazo do empréstimo e período de utilização;
b) Esforço financeiro por cada 100 contos mutuados;
c) Preço dos serviços prestados, comissões e outros encargos a suportar pelos mutuários.
2 - As instituições de crédito devem dar conhecimento ao Banco de Portugal, à Direcção-Geral do Tesouro e ao Fundo de Apoio ao Estudante, no prazo de 20 dias úteis a contar da data da sua fixação, das condições a que se refere o número anterior e de quaisquer alterações.
Artigo 20.º
Regulamentação
1 - Serão estabelecidos por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Educação:a) O modelo de declaração a que se refere a alínea a) do artigo 5.º;
b) Os documentos relevantes para a instrução do processo a que se refere a alínea d) do artigo 5.º;
c) As condições e termos da renegociação do empréstimo previstas no n.º 3 do artigo 15.º 2 - Podem ser estabelecidas por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Educação outras condições a que deva obedecer a mudança de instituição de crédito mutuante.
3 - Por portaria do Ministro da Educação é fixada a forma de determinar a satisfação das condições previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º para as diferentes formas de organização de cursos, bem como o modelo da declaração prevista na alínea c) do artigo 5.º, a preencher pelos estabelecimentos de ensino superior.
Artigo 21.º
Entrada em vigor
O presente diploma produz efeitos no dia imediato ao da entrada em vigor do diploma mencionado no n.º 3 do artigo 18.º e das portarias a que se referem as alíneas a) e b) do n.º 1 e o n.º 3 do artigo anterior.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 23 de Setembro de 1999. - António Manuel de Oliveira Guterres - João Carlos da Costa Ferreira da Silva - Eduardo Carrega Marçal Grilo.
Promulgado em 4 de Novembro de 1999.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 11 de Novembro de 1999.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.