Criação de classes de ensino diferenciado
O sistema escolar vigente não contempla, em termos de adequação a todas as suas modalidades, o problema da inadaptação escolar, em larga escala existente a diferentes níveis de ensino. Sem querer minimizar o que a este respeito se passa nos graus de ensino pós-primário, que aí releva a necessidade de criação de serviços especiais de orientação escolar e vocacional, é, porém, no ensino primário que a questão se põe com acuidade maior e mais nefastas consequências, visto não terem ainda nele funcionado os mecanismos de selecção que esbatem o insucesso escolar a níveis de escolaridade mais elevados.
O presente decreto regional visa, pois, o ensino primário, onde numerosos alunos não alcançam hoje o rendimento desejado, sofrendo injustas reacções da própria escola e ambiente familiar, do que resulta quedarem-se incapazes de qualquer futura integração sócio-profissional minimamente dignificante. Trata-se, na sua maioria, de alunos não integráveis no ensino especial para deficientes sensoriais nem claramente classificáveis como débeis mentais, ainda que tal possam aparentar. Inferiorizados por distúrbios neurológicos, por vezes de difícil diagnóstico e avaliação (perturbações instrumentais), ou por transtornos afectivo-emotivos de origem ambiencial, a maioria das vezes por situações de etiologia mista e complexa, estes alunos precisam de métodos pedagógicos adequados, de uma assistência médico-escolar continuada e de tempo de observação suficiente e eficaz.
São estas condições que se pretende agora criar na Região, institucionalizando classes de ensino diferenciado, complementares do ensino primário e nele integradas, mantendo-lhes todas as vantagens do convívio com os seus companheiros melhor dotados, enquanto modelos de desenvolvimento úteis e, simultaneamente, permitindo a sua eventual reintegração na escolaridade normal ou, na pior das hipóteses, nalguma das referidas modalidades de ensino especializado. A criação destas classes de ensino diferenciado terá ainda outras consequências benéficas, como a melhoria das condições didáctico-pedagógicas, a minimização de problemas disciplinares no ensino primário, com vantagens para docentes e discentes, e uma maior dignificação deste ensino.
Finalmente, reconhecem-se os riscos inerentes à pormenorização de normas de actuação neste sector e num diploma legal como o presentemente proposto, pelo que, no seu articulado, se contemplam apenas alguns princípios fundamentais que a respectiva regulamentação desenvolverá em termos de concretização, dentro do espírito constante deste preâmbulo.
Assim:
A Assembleia Regional da Madeira decreta, nos termos do artigo 229.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, o que segue:
Artigo 1.º Na Região Autónoma da Madeira é obrigatória a criação de classes de ensino diferenciado em todos os núcleos do ensino primário que tal justifiquem e tornem viável.
§ único. Excepcionalmente, ponderados os inconvenientes resultantes da deslocação de alunos para fora dos seus respectivos núcleos, poderá verificar-se a criação de salas de ensino diferenciado a nível de freguesia.
Art. 2.º A decisão de abertura das referidas classes de ensino diferenciado compete à direcção escolar, por sua iniciativa ou sob proposta do professor responsável pelo núcleo escolar interessado, mas, em qualquer dos casos, com o parecer favorável da Secretaria Regional da Educação e Cultura.
Art. 3.º Os alunos integrados nas classes de ensino diferenciado beneficiarão dos métodos pedagógicos adequados e possíveis e de apoio médico-escolar continuado, mantendo formas de convívio apropriadas com os seus companheiros das demais classes normais, nomeadamente comparticipando os mesmos recreios e todas as actividades compatíveis de carácter circum-escolar.
Art. 4.º As classes de ensino diferenciado terão um máximo de dez alunos com problemas de inadaptação escolar, traduzidos em insucesso escolar, e visam a sua recuperação e reintegração em classes normais ou a sua eventual orientação para as modalidades do ensino especial existente na Região.
Art. 5.º Terão prioridade absoluta na transferência para classes de ensino diferenciado os alunos na 1.ª fase do ensino primário e, de entre estes, os de menor tempo de frequência escolar.
Art. 6.º Para efeitos do preceituado nos artigos precedentes, os alunos aí referidos permanecerão matriculados nas classes de origem, delas transitando para as classes de ensino diferenciado ou vice-versa, conforme os respectivos progressos nas condições de aprendizagem, por decisão dos professores interessados nestas transferências, que, para o efeito, reunirão, lavrando acta justificativa das decisões tomadas.
Art. 7.º Compete à Secretaria Regional da Educação e Cultura promover a realização de cursos de preparação de professores do ensino primário para a docência nas classes de ensino diferenciado, tomando a iniciativa de sensibilizar o professorado para a necessidade destas, nomeando os seus monitores e indicando os respectivos programas.
Art. 8.º Sem prejuízo de futuras soluções de superior eficácia, os cursos de preparação acima referidos serão de carácter intensivo, a cargo de um elenco docente de que farão obrigatoriamente parte um médico com prática em saúde escolar, um professor do ensino especial de débeis, um professor do ensino primário, um psicólogo e um professor de Educação Física.
Art. 9.º Também, sem prejuízo de futuros aperfeiçoamentos, a programação dos cursos referidos no artigo precedente incluirá obrigatoriamente os seguintes temas:
a) Dificuldades de diagnóstico e fronteiras da debilidade mental;
b) Normalidade e patologia com reflexos na capacidade de aprendizagem no domínio da afecto-emotividade;
c) Normalidade e patologia com reflexos na capacidade da aprendizagem no domínio da psicomotricidade;
d) Pedagogia e didáctica relativas aos inadaptados escolares não débeis;
e) Actividade física como estímulo e correcção do desenvolvimento psicomotor.
Art. 10.º A abertura das classes de ensino diferenciado poderá verificar-se em qualquer momento do ano lectivo, devendo entrar já em funcionamento as que sejam viáveis no decurso do ano lectivo de 1980-1981.
Art. 11.º O presente decreto regional entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Aprovado em sessão plenária de 27 de Maio de 1980.
O Presidente da Assembleia Regional, Emanuel do Nascimento dos Santos Rodrigues.
Assinado em 30 de Junho de 1980.
O Ministro da República, Lino Dias Miguel.