Resolução do Conselho de Ministros n.º 18/2015
A investigação médica, particularmente a de índole clínica, é uma atividade fundamental para o desenvolvimento do conhecimento e inovação na saúde, contribuindo, de forma estratégica, para a melhoria da saúde das populações e do desempenho das unidades de saúde, no domínio da qualidade dos cuidados de saúde prestados, no domínio educacional e científico e no domínio económico.
Portugal apresenta ainda uma produção aquém do desejável na área da investigação médica orientada para a clínica, a qual não tem acompanhado o ritmo de crescimento de áreas científicas afins, nomeadamente no que respeita à utilização e aplicação dos conhecimentos por estas produzidos.
Por este motivo, o XIX Governo Constitucional assumiu o compromisso de promover condições que possibilitem e maximizem a investigação clínica em Portugal.
Neste âmbito, a Lei 21/2014, de 16 de abril, aprovou a lei da investigação clínica, através da qual foi criado um novo quadro de referência para a investigação clínica com seres humanos em Portugal, bem como uma Rede Nacional das Comissões de Ética para a Saúde e um Registo Nacional de Estudos Clínicos. Por outro lado, o Decreto-Lei 110/2014, de 10 de julho, criou, no âmbito do Ministério da Saúde, o Fundo para a Investigação em Saúde e estabelece o seu regime jurídico.
Contudo, a escassez de médicos clínicos com formação e cultura científica adequadas tem contribuído significativamente para uma produção reduzida no âmbito da investigação clínica em Portugal.
Com o objetivo de inverter esta situação, urge delinear e implementar um programa de ação que contemple uma atuação transversal e integrada em diferentes componentes do Sistema Científico e Tecnológico Nacional que possa contribuir para a preparação de uma nova geração de médicos investigadores com capacidade para desFenvolver no tecido científico nacional a área da investigação clínica.
A concretização dos objetivos propostos implica uma política de incentivos dirigida, por um lado, à valorização curricular da componente de investigação nos internatos médicos e, não menos importante, às próprias instituições de saúde, instalando nelas uma cultura de estímulo a atividades de investigação.
Constitui, deste modo, um fator decisivo para o sucesso do referido programa e para a promoção da qualidade da investigação e da produção científica e tecnológica nacional neste domínio específico, o desenvolvimento de uma estreita colaboração entre os vários participantes.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Aprovar o Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica constante do anexo à presente resolução, e que dela faz parte integrante, com o objetivo de formar e apoiar o desenvolvimento de capacidades em investigação por médicos clínicos, em todas as fases do respetivo percurso profissional.
2 - Determinar que compete ao Ministério da Educação e Ciência, em colaboração com o Ministério da Saúde, o lançamento do Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica destinado a investigadores médicos clínicos, que integra as fases do respetivo percurso profissional relativas à formação inicial, ao doutoramento e à consolidação como investigador independente.
3 - Estabelecer que compete ao Ministério da Saúde promover as iniciativas legislativas e regulamentares necessárias à alocação de tempo adequado à realização de atividades de investigação por parte de médicos que sejam selecionados para o programa, bem como criar medidas de incentivo para as unidades de saúde que estimulem a maior e melhor produtividade científica.
4 - Determinar que o Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica é implementado e acompanhado por uma comissão que integra:
a) O presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P., em representação do Ministério da Educação e Ciência;
b) O presidente do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, I. P., e o presidente do INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P., em representação do Ministério da Saúde;
c) Duas personalidades de reconhecido mérito em investigação clínica, licenciadas em medicina, a designar pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da saúde e da ciência;
d) Representantes das entidades financiadoras, a designar pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da saúde e da ciência.
5 - Estabelecer que o exercício de funções no âmbito da comissão referida no número anterior não é remunerado.
6 - Determinar que o Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica é, ainda, acompanhado por um conselho consultivo internacional, ao qual compete a monitorização científica e o controlo de qualidade, constituído por personalidades de reconhecido mérito internacional nas áreas do referido programa, a designar pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da saúde e da ciência.
7 - Estabelecer que os membros do conselho consultivo internacional não são remunerados, sem prejuízo do direito ao pagamento das despesas com as deslocações e de um montante diário, a suportar pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P., sob proposta a autorizar pelo membro do Governo responsável pela área da ciência.
8 - Determinar que o Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica é assegurado por financiamento público, através do Ministério da Saúde e do Ministério da Educação e Ciência, e por financiamento privado, através de entidades privadas.
9 - Determinar que o Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica vigora por um período de cinco anos, com execução financeira até 2023, podendo ser renovado após avaliação.
Presidência do Conselho de Ministros, 19 de março de 2015. - O Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho.
ANEXO
(a que se refere o n.º 1)
Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica
I - Introdução
A produção e o desenvolvimento científico de Portugal nas últimas décadas registaram um crescimento significativo na generalidade das áreas do conhecimento. Observam-se, no entanto, indicadores de crescimento assimétricos nalgumas áreas científicas, e constatando-se que persistem nichos e oportunidades por explorar. Uma das áreas científicas onde os indicadores de produção se mantêm aquém do potencial existente é a área da investigação médica dirigida à clínica.
Este subaproveitamento deve-se, em larga medida, à escassez de médicos clínicos com uma formação científica abrangente e à inexistência de uma investigação clínica capaz de acompanhar o crescimento de áreas científicas afins e de utilizar e aplicar os conhecimentos por elas produzidos, traduzindo-os, de forma célere, em benefícios para a saúde dos doentes.
Neste sentido, é reconhecida a necessidade de criar um Programa Integrado de Promoção da Excelência em Investigação Médica (Programa) e coerente que visa ultrapassar as limitações existentes e promover a criação de uma nova geração de investigadores médicos, com capacidade para desenvolver, no tecido científico nacional, a área da investigação clínica.
Este Programa alicerça-se na experiência já adquirida em programas de formação para clínicos, quer nacionais quer internacionais, e pretende consolidar os programas de treino e formação científica para médicos, desenvolvidos até à data, alargar o leque de oportunidades de formação, introduzir novas iniciativas e garantir a indispensável internacionalização do programa, tendo em vista o desenvolvimento da investigação médica de alta qualidade.
Através deste Programa pretende-se ainda reforçar os instrumentos de apoio à investigação clínica e de translação que é efetivamente realizada em Portugal, assegurando uma racionalização de recursos e um maior retorno para as instituições portuguesas envolvidas no programa.
Por outro lado, a existência de módulos de formação inicial associada a uma maior diversificação da oferta formativa em ambiente de investigação, permite desenvolver programas mais abrangentes e mais ambiciosos, que contemplem as diferentes fases de formação de um investigador médico até à consolidação como investigador independente.
O Programa deve ser acompanhado de um reajustamento dos instrumentos de financiamento disponíveis, com a revisão de regulamentos e alterações legislativas que assegurem as condições necessárias à promoção, ao desenvolvimento e à consolidação de percursos científicos especialmente adaptados para investigadores médicos.
Importa, neste contexto, assegurar tempo indispensável para o desenvolvimento de atividades de investigação durante as diferentes fases do percurso científico.
II - Objetivos
O Programa visa promover o aparecimento de uma nova geração de investigadores médicos clínicos com potencial para transformar o panorama científico nacional numa área estratégica para o país.
III - Pressupostos
O Programa assenta nos seguintes pressupostos:
a) Corresponde a uma evolução de programas e iniciativas anteriores em investigação médica, designadamente clínica e de translação, pretendendo diversificar os modelos e os percursos de formação, bem como adicionar valor pela integração de instrumentos de apoio complementares (projetos e infraestruturas) necessários à investigação médica de grande qualidade;
b) Contempla uma forte componente de internacionalização, como resposta ao atraso científico e à escassez de modelos de referências em investigação clínica em Portugal, pelo que inclui um módulo de formação inicial internacional e um programa de treino inicial em investigação clínica, que combina atividades presenciais com seminários e tutoriais online;
c) Cria novas oportunidades para o desenvolvimento de atividades de investigação clínica e de translação em instituições de referência europeias e norte americanas;
d) Adota um modelo para formação e desenvolvimento contínuo, progressivo e aberto, de modo a formar em 6 a 8 anos 25 novos líderes médicos em investigação dirigida à clínica;
e) Reflete a dimensão internacional do programa nas suas estruturas de governo;
f) Mantém e promove consórcios ou outras formas de associação entre universidades, em particular as Faculdades de Medicina e as escolas médicas, os centros de investigação na área da saúde e da biomedicina, os hospitais e outras instituições assistenciais, para a realização de projetos de investigação conjuntos que suportem também as fases de formação e de consolidação da formação de investigadores clínicos;
g) Prevê um percurso continuado que inclui períodos de treino e formação em Portugal e no estrangeiro para o desenvolvimento de projetos de investigação com adequado enquadramento institucional, envolvendo unidades de investigação e instituições de saúde, que serão a base de retorno para os investigadores.
IV - Políticas interministeriais de incentivo à investigação clínica
1 - Em paralelo com este Programa deve ser desenvolvida uma clara política de incentivos, dirigida, por um lado, à valorização curricular da componente de investigação nos internatos médicos e, por outro, às próprias instituições de saúde, instalando nelas uma cultura de estímulo a atividades de investigação.
2 - Para a concretização dos objetivos propostos com o Programa compete ao Ministério da Saúde o desenvolvimento do seguinte conjunto de ações:
a) Promover as iniciativas legislativas e regulamentares necessárias à alocação de tempo adequado à realização de atividades de investigação por parte de médicos doutorados que sejam selecionados competitivamente como investigador médico, implicando esta alocação de tempo para a investigação, no âmbito do SNS, um esforço financeiro para o Ministério da Saúde;
b) Adotar medidas de incentivo, nomeadamente financeiras, à investigação em unidades de saúde, tendo como base o número de investigadores médicos que nelas exerçam funções, assim como o número de projetos de investigação médica financiados pelo Programa;
c) Utilizar parâmetros de produtividade científica nos critérios de diferenciação dos hospitais para alocação de financiamento público;
d) Efetuar o registo de progressos na qualidade clínica em função das atividades de investigação em curso.
V - Componentes do Programa
1 - É assegurada a criação de um Programa coerente, integrado e aberto destinado a investigadores médicos clínicos, compreendendo as diversas fases do percurso profissional, desde a formação de base até à consolidação como investigador independente, alicerçando-se em quatro componentes críticos: Pessoas, Ideias, Recursos e Valor.
2 - A componente pessoas foca-se essencialmente na qualificação dos recursos humanos e divide-se em três iniciativas distintas:
a) O Programa Avançado de Treino em Investigação Clínica (PATIC), que tem por objetivo providenciar quer o conhecimento, quer o pensamento crítico e analítico, ferramentas indispensáveis para que o médico-investigador possa idealizar e desenvolver propostas de investigação na área clínica. Este programa situa-se na base da estrutura que suporta a formação do investigador clínico.
Este programa prevê:
a) 125 admissões ao longo do Programa;
b) 2.5 M(euro) ao longo do programa (cinco anos), montante financiado pelo Ministério da Educação e Ciência nos termos constantes da tabela I em anexo.
b) O Programa de Doutoramento em Investigação Clínica, que pressupõe a abertura de um concurso para selecionar um ou dois programas de doutoramento em investigação clínica que:
i) Contemplem a participação de escolas médicas nacionais;
ii) Demonstrem uma forte componente de internacionalização, contando com a participação de escolas médicas de reconhecido mérito (não nacionais);
iii) Tenham a duração de cinco anos; e
iv) Respeitem os procedimentos legalmente estabelecidos para a criação e acreditação de novos ciclos de estudos.
Estes programas pretendem proporcionar a médicos clínicos oportunidades de educação em ciência e o desenvolvimento de projetos de investigação clínica de qualidade, com obtenção do grau de doutor. O financiamento inclui um salário que permite aos doutorandos dedicar, pelo menos, 75 % do seu tempo hospitalar para investigação. A seleção deste programa educacional de alto nível é feita por um júri internacional. O programa prevê:
- 10 admissões anuais durante o período de cinco anos, com apoio durante quatro anos em cada admissão;
- 5.5M (euro) para a totalidade do programa, montante financiado pelo Ministério da Educação e Ciência, nos termos constantes da tabela I em anexo.
c) O Programa Interno-Doutorando, que prevê:
- Concursos anuais no âmbito do atual estatuto de interno-doutorando;
- 20 admissões anuais durante o período de cinco anos;
- 6 M(euro) para a totalidade do Programa, montante financiado pelo Ministério da Educação e Ciência, nos termos constantes da tabela I em anexo.
d) O Programa Investigador Médico, no âmbito do qual devem ser abertas admissões anuais exclusivas para médicos especialistas com doutoramento. A seleção é feita por concurso nacional competitivo de médicos doutorados, avaliados em função do seu curriculum vitae, do projeto de investigação e do plano estratégico para o futuro.
Este concurso caracteriza-se por uma alta seletividade, sendo esperada uma taxa de sucesso a rondar os 15 %. O financiamento inclui um salário para 5 anos o que permite ao médico dedicar, pelo menos, 75 % do seu tempo hospitalar para investigação. O financiamento inclui também uma verba para financiamento de investigação no valor de 0.125 M(euro) por investigador médico, para cinco anos. O programa prevê:
- 25 admissões, ao longo de cinco anos, e inclui 0.125 M(euro) para projetos, por investigador médico;
- 6.9 M(euro) (Recursos Humanos) + 3.1 M(euro) (projetos), dos quais 7 M(euro) são financiados pelo Ministério da Educação e Ciência e 3 M(euro) são financiados pelo Ministério da Saúde, nos termos constantes da tabela I em anexo.
3 - A componente ideias está centrada na necessidade de distinguir os projetos de investigação clínica que tradicionalmente têm sido avaliadas conjuntamente com os projetos de investigação fundamental, criando painéis de avaliação específicos e integra um concurso de projetos temáticos em investigação clínica, que prevê:
- Cinco projetos anuais de duração de cinco anos (com avaliação intercalar ao fim de três anos), e o montante de 250 mil euros por projeto;
- 6.25 M(euro) para a totalidade dos projetos, dos quais 1.75 M(euro) são financiados pelo Ministério da Educação e Ciência e 4.5 M(euro) são financiados pelo Ministério da Saúde, nos termos constantes da tabela I em anexo.
4 - A componente recursos visa capacitar a comunidade de investigadores médicos com os recursos necessários para a concretização dos seus projetos em investigação clínica, através do financiamento de ferramentas que permitam a criação e o desenvolvimento de estruturas partilhadas essenciais para a competitividade e a capacidade de internacionalização da investigação clínica. Neste âmbito, prevê-se um concurso de projetos para o desenvolvimento de recursos e infraestruturas críticas para apoio a investigação clínica, incluindo armazenamento e manutenção de amostras biológicas, sistemas logísticos de apoio à investigação clínica e sistemas de informação integrada, que permitam o acesso rápido e a partilha de bases de dados adequadas ao apoio a investigação clínica. A estes projetos são afetos:
- 2 M(euro) ao longo do programa (0.4 M(euro) por ano), dos quais 0.5 M(euro) são financiados pelo Ministério da Educação e Ciência e 1.5 M(euro) são financiados pelo Ministério da Saúde, nos termos constantes da tabela I em anexo.
5 - A componente valor está focada na promoção de investigação com alta taxa de probabilidade de, num curto espaço de tempo, resultar em produtos ou processos de elevado impacto socioeconómico. Neste âmbito, está previsto um concurso de projetos temáticos cofinanciados com a indústria, ao qual são afetos:
- 0.75 M(euro) ao longo do programa (0.15 M(euro) por ano), montante financiado pelo Ministério da Educação e Ciência, nos termos constantes da tabela I em anexo.
6 - O contributo do Ministério da Saúde para o Programa nos termos da tabela I em anexo é assegurado por verbas inscritas no orçamento do INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P.
7 - Ao contributo do Ministério da Saúde e do Ministério da Educação e Ciência para o Programa nos termos da tabela I em anexo é deduzido, de forma proporcional ao esforço financeiro de cada Ministério, o financiamento que for obtido no quadro da União Europeia.
8 - O financiamento do Programa através de entidades privadas é importante para a sua sustentabilidade, sendo, nestes casos, o montante deduzido em parte iguais ao financiamento público do Programa previsto na tabela I em anexo.
TABELA I
Sumário dos instrumentos de financiamento e compromissos plurianuais assumidos
(ver documento original)