Portaria 60/94
de 25 de Janeiro
Ao regular o licenciamento e a fiscalização do exercício da actividade das unidades de saúde que prestam serviços no âmbito da hemodiálise, através do Decreto-Lei 392/93, de 23 de Novembro, deu o Governo um passo decisivo numa área da saúde particularmente sensível.
Importa, naturalmente, a cabal regulamentação do diploma, em especial no que toca às condições em que é admissível o uso múltiplo de dialisadores para que os doentes hemodialisados tenham todas as garantias de qualidade dos tratamentos que lhes são prestados.
As regras agora consagradas correspondem, no essencial, às criteriosas recomendações formuladas pela Comissão Nacional de Diálise e Transplantação.
Assim, ao abrigo do artigo 31.º do Decreto-Lei 392/93, de 23 de Novembro, ouvida a Comissão Nacional de Diálise e Transplantação:
Manda o Governo, pelo Ministro da Saúde, aprovar o seguinte:
Regulamento do Uso Múltiplo de Dialisadores
Artigo 1.º
Casos em que é permitido
1 - A prática de uso múltiplo de dialisadores, adiante designada por UMD, é permitida em relação a todos os doentes, à excepção dos que se encontrem nas seguintes situações:
a) Sejam HBsAg positivos;
b) Apresentem valores séricos acima do dobro dos valores normais de enzimas indicadoras de hepatocitólise;
c) Apresentem anticorpos anti-HIV ou síndroma de imunodeficiência adquirida (sida);
d) Apresentem quadro febril de causa não esclarecida;
e) Apresentem sintomatologia atribuível ao uso múltiplo de dialisadores.
2 - Os doentes devem ter conhecimento expresso e esclarecido da aplicação do método do uso múltiplo de dialisadores na unidade de hemodiálise onde hajam de ser tratados.
Artigo 2.º
Pessoal
1 - O pessoal que exerça a prática de uso múltiplo de dialisadores deve obedecer aos seguintes requisitos:
a) Não ser portador de HBsAg, de anticorpos anti-HIV nem apresentar valores séricos de enzimas indicadoras de hepatocitólise superiores ao dobro dos valores normais;
b) Submeter-se semestralmente à pesquisa de HBsAg, de HCAc e de anticorpos anti-HIV e ao doseamento sérico de enzimas indicadoras de hepatocitólise.
2 - O pessoal deve ser previamente ensinado e treinado, de modo adequado, sobre a técnica de utilização múltipla de dialisadores, bem como sobre os riscos infecciosos e tóxicos e sobre a forma de os prevenir e actuar em caso de acidente.
3 - Quando em exercício, deve o pessoal usar sempre protecções oculares, das mãos e das mucosas nasal e bucal.
Artigo 3.º
Tipo de dialisadores
A prática de UMD apenas é permitida com dialisadores de tipo capilar.
Artigo 4.º
Utilização dos dialisadores
1 - Cada dialisador apenas pode ser usado num mesmo doente, só podendo voltar a ser usado passadas, pelo menos, vinte horas sobre a sua desinfecção.
2 - Em cada dialisador deve estar inscrito de forma indelével o nome do doente que o utiliza, o número de uso, a data e hora da sua desinfecção, bem como a sua capacidade após cada utilização.
3 - Antes de iniciar a prática de UMD a unidade deve efectuar, em laboratório oficialmente homologado, o exame bacteriológico do lavado com soro fisiológico de 20 dialisadores processados e de 20 dialisadores novos, cujo resultado não poderá revelar um número de bactérias não patogénicas superior a 10/ml e zero de bactérias patogénicas e micobactérias.
Mensalmente este exame será repetido em seis dialisadores processados e em seis novos.
4 - É prova suficiente da qualidade dos dialisadores a medição da sua capacidade, a qual não pode ser inferior a 80% do seu valor original. Pelo menos mensalmente efectuar-se-á a medição da capacidade original em seis unidades de cada um dos modelos de dialisadores submetidos a UMD.
5 - O dialisador, antes de ser novamente usado, deve apresentar-se com um aspecto aceitável, não devendo apresentar coágulos nos topos do compartimento de sangue.
6 - O dialisador deve ser ainda rejeitado se, na prova de pressão, houver sugestão de rotura ou solução de continuidade entre o compartimento de sangue e o compartimento exterior.
7 - O número de utilizações não pode, em qualquer circunstância, ser superior a 10.
Artigo 5.º
Água para lavagem dos dialisadores
1 - A água utilizada na lavagem dos dialisadores deve ser previamente submetida a tratamento por osmose inversa.
2 - O seu exame bacteriológico, efectuado em laboratório oficialmente homologado, deve revelar uma contagem de bactérias inferior a 100/ml sem micobactérias. Este exame deve ser repetido mensalmente.
Artigo 6.º
Esterilizantes e desinfectantes
1 - São autorizados como esterilizantes ou desinfectantes:
Formol 2 - 4%;
Glutaraldeído 0,4% [por exemplo: Cidex (R)];
Ren-New-D [por exemplo: Alcide (R)];
Amuchina (R).
2 - As concentrações indicadas no número anterior devem existir em ambos os lados da membrana.
3 - Antes da utilização dos dialisadores processados deve fazer-se prova de que todos os dialisadores naquelas condições contêm o esterilizante ou desinfectante.
4 - Após aquela prova, será efectuado em todos os dialisadores o teste da «ausência» do desinfectante/esterilizante.
5 - No caso de se usar o formol, a concentração deverá ser inferior a 5 mg/ml.
Artigo 7.º
Armazenamento
1 - Os dialisadores devem ser protegidos da luz natural e a temperatura ambiente não deverá ultrapassar os 25ºC.
2 - Os dialisadores devem identificar claramente o doente a quem pertencem.
3 - O local de armazenamento deve manter-se limpo.
Artigo 8.º
Rejeição obrigatória de um dialisador
A rejeição obrigatória de um dialisador obedece aos seguintes critérios:
a) Ausência de identificação do doente no dialisador (ou não clara e inequivocamente perceptível), bem como a data e a hora da última desinfecção e a capacidade após a utilização imediatamente anterior;
b) Tempo de actuação do esterilizante/desinfectante inferior a vinte horas;
c) Capacidade inferior a 80% da capacidade original;
d) Aspecto não aceitável ou existência de coágulos visíveis nos topos do compartimento de sangue;
e) Suspeita ou constatação de rotura da membrana e ou solução de continuidade entre o compartimento de sangue e o compartimento exterior;
f) Comprovada inexistência de esterilizante/desinfectante.
Artigo 9.º
Suspensão da prática de UMD num doente
A prática de UMD num doente deve ser obrigatoriamente suspensa sempe que ocorra qualquer das seguintes circunstâncias:
a) Seja detectada uma positividade HBsAg, HCAc ou HIV-Ac, se verifiquem valores séricos de enzimas indicadoras de hepatocitólise superiores ao dobro do normal ou haja diagnóstico ou suspeita razoavelmente fundada de sida;
b) Exista qualquer quadro febril de causa não esclarecida;
c) Haja apresentação de sintomatologia ou patologia atribuível a UMD;
d) Se detecte o aparecimento de títulos significativos de anticorpos anti-N-like, no caso de utilização do formol.
Artigo 10.º
Suspensão da prática de UMD numa unidade
A prática de UMD numa unidade deve ser obrigatoriamente suspensa sempre que ocorra qualquer das seguintes situações:
a) Avaria do sistema de ventilação da área de processamento, temperaturas na zona de armazenamento superiores a 25ºC ou avaria no equipamento de processamento ou no de tratamento de água;
b) Água contaminada com micobactérias ou com uma contagem de bactérias superior a 100/ml;
c) Lavado de dialisadores processados contaminados com micobactérias ou bactérias patogénicas ou com uma contagem de bactérias superior a 10/ml;
d) Detecção de um ou mais dialisadores processados sem desinfectante/esterilizante.
Artigo 11.º
Protocolos descritivos
Cada unidade de hemodiálise deve possuir informação escrita sobre o UMD, que conterá, necessariamente, as seguintes indicações:
a) Programa de ensino e treino dos técnicos de processamento de dialisadores;
b) Enumeração e descrição pormenorizada dos protocolos obrigatórios;
c) Enumeração pormenorizada dos motivos de rejeição dos dialisadores;
d) Enumeração pormenorizada dos motivos de suspensão da UMD num doente;
e) Enumeração pormenorizada dos motivos de suspensão na unidade do programa de UMD;
f) Descrições pormenorizadas da técnica de UMD de onde conste, nomeadamente, o seguinte:
Pré-lavagem na sala de hemodiálise;
Lavagem;
Limpeza;
Teste de capacidade;
Teste de pesquisa de roturas;
Desinfecção/esterilização;
Inspecção;
Registos;
Acondicionamento e armazenamento;
Identificação;
Certificação da qualidade do dialisador;
Prova da existência do desinfectante/esterilizante;
Lavagem pré-uso;
Prova da inexistência do desinfectante/esterilizante;
g) Descrição dos acidentes e complicações do UMD, nomeadamente o quadro de intoxicação aguda pelo desinfectante/esterilizante;
h) Actuação perante acidentes e complicações do UMD.
Artigo 12.º
Registos obrigatórios
1 - As unidades que praticam o UMD devem ter permanentemente actualizados e com acesso imediato os seguintes registos:
a) Identificação dos técnicos que processam os dialisadores e nota das datas das pesquisas biológicas que lhes dizem respeito;
b) Resultados dos exames bacteriológicos, iniciais e de controlo, da água utilizada no processamento dos dialisadores;
c) Resultados dos exames bacteriológicos, iniciais e de controlo, do lavado dos dialisadores;
d) Resultados da medição das capacidades dos modelos de dialisadores submetidos a UMD.
2 - Os originais dos resultados das pesquisas e dos exames devem ser conservados pela unidade.
3 - As unidades devem ainda dispor de registos por doente, por sessão hemodialítica e por dialisador processado.
4 - No registo a efectuar por doente deve constar o seguinte:
a) Data do início do UMD;
b) Resultados das pesquisas de HBsAg e de anti-HIV, bem como dos doseamentos séricos de enzimas indicadoras de hepatocitólise;
c) Datas de interrupção do UMD e razões justificativas;
d) Datas de reinício do UMD;
e) Datas de transfusões efectuadas;
f) Resultados das pesquisas de anticorpos anti-N-like, se usado o formol;
g) Acidentes relacionados com UMD;
h) Dialisadores utilizados, número de utilizações por dialisador e motivos de rejeição, com referência, pelo menos, aos últimos seis meses.
5 - Os resultados das pesquisas de HBsAg, anti-HC e anti-HIV, bem como os doseamentos séricos de enzimas indicadoras de hepatocitólise, devem ser guardados em condições que acautelem o sigilo profissional, sob a responsabilidade do director clínico.
6 - No registo a efectuar por sessão hemodialítica deve constar o seguinte:
a) Dialisador usado;
b) Número de uso;
c) Motivo de rejeição, caso esta se tenha verificado;
d) Intercorrências.
7 - No registo a efectuar por dialisador processado deve constar o seguinte:
a) Doente a quem respeita;
b) Usos efectuados e respectiva data;
c) Capacidade em cada utilização.
Ministério da Saúde.
Assinada em 25 de Novembro de 1993.
Pelo Ministro da Saúde, José Martins Nunes, Secretário de Estado da Saúde.