Sumário: Acórdão do STA de 24-01-2024, no Processo 152/23.1BALSB - Pleno da 2.ª Secção Uniformiza-se a jurisprudência nos seguintes termos: «A matéria colectável das mais-valias realizadas na venda de imóvel localizado no nosso país, por parte de sociedade não residente e sem estabelecimento estável em Portugal, incide sobre a sua totalidade, não sendo aplicável a redução de 50%, prevista no artigo 43.º, n.º 2, alínea b) do CIRS.».
Acórdão do STA de 24-01-2024, no Processo 152/23.1BALSB - Pleno da 2.ª Secção
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 - RELATÓRIO
"A... LLC", devidamente identificada nos autos, inconformada com a decisão proferida nos autos de processo arbitral - Proc. n.º 686/2022-T - que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral pela mesma deduzido tendo em vista o indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada relativamente ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas ("IRC") por si autoliquidado e vertido na declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, respeitante ao período de tributação de 2021, que deu origem ao documento de liquidação n.º ...47, veio interpor Recurso para Uniformização de Jurisprudência ao abrigo do disposto nos artigos 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) e no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do artigo 25.º, n.º 3 do RJAT, com base em oposição de acórdãos, apontando como decisão fundamento, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 23-06-2021, Proc. n.º 00258/17.6BECBR, www.dgsi.pt.
Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:
"[...]
A) O Recurso Para Uniformização de Jurisprudência previsto no artigo 152.º do CPTA tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o STA, no caso concreto, proceder à anulação da decisão recorrida e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição, firmando e consolidando o sentido do julgamento acertado desta matéria;
B) O presente recurso vem interposto da decisão arbitral proferida no Processo 686/2022-T, a qual considerou totalmente improcedente o pedido realizado pela aqui Recorrente, tendo por base, em síntese, os seguintes fundamentos:
i) A situação fiscal dos sujeitos passivos não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal é diferente da dos sujeitos passivos residentes ou com estabelecimento estável em território nacional, portanto, no seu entendimento, não constitui uma violação do princípio da igualdade ou da livre circulação de capitais, o facto de serem tributados de forma distinta, criando uma discriminação legalmente justificada;
ii) A jurisprudência nacional, incluindo a do STA, invocada pela aqui Recorrente, não é aplicável in casu uma vez que, as normas aí analisadas dizem respeito a pessoas singulares e, essa última, configura uma pessoa coletiva, devendo por isso ser sujeita às regras do CIRC e não do CIRS;
iii) Nessa mesma esteira, a remissão feita pelo CIRC para o CIRS deve somente ser interpretada como referente às regras de delimitação de matéria coletável, não abrangendo as regras de quantificação.
C) Ora, a Recorrente não se pode conformar com o entendimento propugnado por esse Tribunal, uma vez que em tudo divergente com o Acórdão do TCAN, do dia 23/06/2021, proferido no âmbito do processo 00258/17.6BECBR;
D) De facto, considerou o TCAN nessa sede, ao contrário do Tribunal Arbitral, ser aplicável a alínea b), do n.º 2, do artigo 43.º do CIRS, por remissão do n.º 1 do artigo 56.º do CIRC, tributando apenas 50 % das mais-valias realizadas por pessoas coletivas não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal.
E) Concluindo, mais concretamente que: "Consentânea com o desígnio da norma, de um ponto de vista objectivo e actual, é estender a limitação de 50 % a todas as mais valias quejandas (as das alªs a) c) e d) do artigo 10.º do CIRS), numa interpretação correctiva, não do legislador histórico e subjectivo, mas do legislador actual e objectivo (aqui, um sujeito meramente normativo) que se respiga da ordem jurídica comunitária e nacional no seu conjunto.
Assim, há que considerar como não escrito, no n.º 2 do artigo 43.º do CIRS [...] a expressão "por residentes", pelo que assistia à Recorrente o direito a ver considerados, para o efeito da determinação da mais valia à venda do prédio de... em 2015, apenas 50 %, não a totalidade da diferença entre o valor considerado como de aquisição e o de realização [...]" (realce e sublinhado nossos).
F) Ora, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos suscetível de recurso por oposição, é necessário que: i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas; ii) haja identidade na questão fundamental de direito; iii) se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta; e iv) a oposição decorra de decisões expressas e não apenas implícitas e v) que a orientação perfilhada na decisão recorrida não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo;
G) No caso sub judice, encontram-se reunidos os supra elencados requisitos para que se tenha por verificada a alegada oposição entre a Decisão arbitral n.º 686/2022-T e o Acórdão fundamento n.º 00258/17.6BECBR;
H) Desde logo, entre a Decisão Recorrida e a Acórdão fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto;
I) A decisão recorrida tem como objeto uma autoliquidação de IRC feita pela Recorrente no ano 2021, Recorrente essa que configura uma entidade não residente sem estabelecimento estável em Portugal;
J) A controvérsia desses autos envolve a quantificação da mais-valia gerada pela venda de um imóvel propriedade da Recorrente, em Portugal, tendo sido considerado na autoliquidação a totalidade do valor da mais-valia realizada, ao invés de apenas 50 %;
K) Por sua vez, no Acórdão fundamento estamos, também, perante uma entidade não residente e sem estabelecimento estável em Portugal que procedeu à venda de um imóvel situado em território nacional tendo-lhe sido emitida uma liquidação pela Autoridade Tributária e Aduaneira em que, também, foi considerado o valor total da mais-valia por si realizada ao invés de 50 %;
L) Liquidação essa que foi posteriormente impugnada pela entidade referida e que gerou o Acórdão em apreço;
M) Em resumo, a questão central nos dois casos é a forma de calcular e quantificar as mais-valias para efeitos de tributação, em sede de IRC, quando o sujeito passivo constitua uma pessoa coletiva não residente e sem estabelecimento estável em Portugal;
N) Existindo, assim, uma situação de facto substancialmente idêntica;
O) Por outro lado, no que importa a coincidência do mesmo normativo legal e questão fundamental de direito, entende a Recorrente estarem ambos, também, plenamente preenchidos;
P) Ambos os processos envolvem normas que regulamentam o cálculo e a quantificação de mais-valias para efeitos de tributação, em sede de IRC, ou seja, a alínea b), do n.º 2, do artigo 43.º, do CIRS, aplicável ex vi, n.º 1, do artigo 56.º do CIRC e alínea d), do n.º 1, do artigo 3.º, desse mesmo compêndio legal;
Q) A principal questão em ambos os processos é se deve ser aplicada a jurisprudência do TJUE, como por exemplo o Acórdão Hollmann (processo C-443/06, de 11/10/2007), tendo o mesmo considerado que as operações de liquidação de investimento imobiliário constituem movimentos de capitais, protegidos pelo artigo 63.º do TFUE, que proíbe discriminações na liberdade de circulação de capitais;
R) Tendo, nessa esteira, defendido que a tributação de 50 % das mais-valias, aplicável apenas a residentes em Portugal, constitui uma restrição aos movimentos de capitais proibida pelo TFUE;
S) Tendo por base esse entendimento a questão que se discute em ambos os processos é a de saber se o mesmo deverá também ser aplicável a pessoas coletivas, não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal, dada a remissão do artigo 56.º do CIRC, para o artigo 43.º do CIRS;
T) Enquanto o Tribunal recorrido decidiu contra a adoção dessa solução, o Acórdão fundamento decidiu a favor, aplicando a jurisprudência comunitária;
U) À face do supra exposto, verifica-se que, não obstante as duas decisões em comparação assentarem em pressupostos de facto idênticos, aplicarem o mesmo normativo legal e debaterem a mesma questão fundamental de direito, resultam em soluções jurídicas totalmente opostas que, pela sua gravidade, criam, na ordem jurídica Portuguesa, incertezas quanto ao direito a aplicar;
V) Verificando-se, deste modo, a plena contradição entre as decisões aqui em discussão;
W) Ora, não pode a aqui Recorrente entender como pode o Tribunal recorrido decidir como decidiu, tendo em conta que, com o devido respeito, em momento algum os argumentos por si invocados poderão ser procedentes;
X) Embora não seja um sujeito passivo de IRS, existe uma remissão legal direta do CIRC para o CIRS que estabelece que a quantificação e tributação de mais-valias de entidades não residentes sem estabelecimento estável em Portugal devem seguir as normas desse último código. Portanto, não devem subsistir dúvidas quanto à aplicabilidade da alínea b), do n.º 2, do artigo 43.º, do CIRS;
Y) Como se tal não bastasse entende a aqui Recorrente ser claramente restritiva e redutora a interpretação levada a cabo pelo Tribunal recorrido no que importa a remissão realizada pelo artigo 56.º do CIRC para as normas do CIRS;
Z) Se fosse intenção do legislador que fossem, no caso em apreço, apenas aplicáveis as normas do CIRS no que importa a categorização dos rendimentos imputáveis às entidades não residentes e sem estabelecimento estável em território nacional então o mesmo não teria expressado essa mesma intenção de forma literal?! Se era essa a sua intenção não teria o mesmo especificado que no que concerne a quantificação e cálculo do imposto permaneceria aplicável o CIRC?!;
AA) Impor uma interpretação diferente desvirtuaria completamente o propósito e o alcance da norma, restringindo-a a um contexto para o qual não foi originalmente criada;
BB) Ademais, tendo por base a jurisprudência reiterada do TJUE e que é vinculativa para os tribunais nacionais, a tributação de 50 % das mais-valias apenas para residentes em Portugal, e não para não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais proibida pelo TFUE. Portanto, a norma que impõe essa tributação apenas a residentes é ilegal e deve ser aplicada a todas as entidades não residentes em Portugal que obtêm mais-valias, pessoas singulares ou coletivas, incluindo-se nessa última categoria a aqui Recorrente;
CC) Por outro lado, no que importa a (suposta) inexistência de discriminação in casu, entende a Recorrente que esta afirmação não corresponde à verdade;
DD) Ora, desde logo, as taxas de imposto aplicáveis às entidades residentes e não residentes são divergentes - 21 % para os residentes e 25 % para os não residentes - sem qualquer tipo de justificação legal, existindo, assim, uma clara discriminação, vantajosa para os residentes;
EE) Adicionalmente, cumpre referir que as entidades residentes têm direito à dedução de prejuízos fiscais que, em momento algum, são dedutíveis por entidades não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal;
FF) Ou seja, não só efetivamente existe discriminação como a mesma está indubitavelmente presente na legislação nacional;
GG) Assim, também por esta via será falaciosa a argumentação do Tribunal recorrido, que parece, oportunamente, esquecer o restante regime jurídico, em sede de IRC, aplicável às entidades com a natureza da aqui Recorrente;
HH) Por tudo o exposto, deverá o presente recurso proceder, por verificados todos os seus pressupostos, devendo, em consequência, ser anulada a decisão arbitral emitida no âmbito do processo 686/2022-T, conforme amplamente fundamentado;
II) A título subsidiário, compreendendo a aqui Recorrente que o entendimento preconizado pelo Tribunal a quo viola o artigo 63.º do TFUE, na medida em que a questão em análise respeita à correta interpretação de uma norma interna (alínea b), do n.º 2, do artigo 43.º do CIRS, aplicável ex vi, n.º 1, do artigo 56.º do CIRC) que foi já decidido pelo TJUE ser uma premente violação do direito comunitário, a Recorrente solicita, o reenvio, a título prejudicial, ao TJUE;
JJ) Nesse sentido, caso subsistam dúvidas interpretativas, a Recorrente solicita a título subsidiário, ad cautelem, que, caso o Tribunal entenda necessário, suspenda a presente instância e submeta ao TJUE, ao abrigo do artigo 267.º do TFUE, a questão prejudicial infra, assim como de quaisquer outras que este douto Tribunal possa entender pertinentes:
Deve o entendimento preconizado pelo TJUE no âmbito de processos como o Acórdão Holmann, emitido dia 11/10/2007, no âmbito do processo C-443/06, ser também aplicável caso o sujeito da norma em causa, alínea b), do n.º 2, do artigo 43.º, do Código de IRS português, configure uma pessoa coletiva, ao invés de uma pessoa singular, por remissão direta da legislação nacional para a referida norma?
KK) Em suma, entre a decisão recorrida e a Acórdão fundamento existe uma patente contradição sobre as mesmas questões fundamentais de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que decida definitivamente a questão controvertida nos termos do entendimento e fundamentação que consta no Acórdão fundamento ora invocado;
LL) Por último, solicita a aqui Recorrente, tendo por base o disposto no n.º 7, do artigo 6.º, do RCP, a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, tendo em conta a reduzida complexidade da causa, principalmente em termos de prova, uma vez que apenas se discute direito e, também, o facto da sua conduta processual ter sido exemplar, como poderá este douto Tribunal aferir.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outra consentânea com o quadro jurídico vigente como é de Direito e Justiça."
A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de o presente recurso para uniformização de jurisprudência ser admitido e, subsequentemente, ser o mesmo julgado improcedente, com a consequente manutenção na ordem jurídica da decisão arbitral recorrida e, bem assim, fixada jurisprudência no sentido de que a matéria colectável das mais-valias realizadas na venda de imóvel localizado no nosso país, por parte de sociedade não residente e sem estabelecimento estável em Portugal, incide sobre a sua totalidade, não sendo aplicável a redução de 50 %, prevista no artigo 43.º, n.º 2, alínea b) do CIRS.
Cumprido o estipulado no n.º 2 do artigo 92.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, cumpre decidir, em conferência, no Pleno da Secção.
2 - FUNDAMENTOS
2.1 - DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão arbitral recorrida o seguinte:
"...
a) A Requerente tem domicílio fiscal em 251...,...,...,...08,...,..., sendo não residente fiscal em Portugal sem estabelecimento estável neste país, conforme consta do cadastro da Requerente na AT. (PPA: 37.º).
b) Em 12-07-2021 a Requerente era proprietária de um prédio misto composto terra de areia com pinheiros e mato, e um edifício térreo, destinado a habitação, e logradouro com piscina, sito em..., na freguesia..., concelho..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o número...41, inscrito na matriz, a parte urbana sob o artigo...97, com o valor patrimonial tributável de (euro) 259.413,70, e a parte rústica sob o artigo...29, com o valor patrimonial tributável de (euro) 643,08. (PPA, 38.º: doc. 5).
c) Em 12-07-2021 a Requerente celebrou escritura de compra e venda do prédio identificado na alínea anterior, no cartório da Notária..., com cartório em..., pelo valor total de (euro) 3.000.000,00, atribuindo os outorgantes o valor de (euro) 500.000,00 ao imóvel correspondente ao artigo 2497 (rústico) e (euro) 2.500.000,00 ao imóvel correspondente ao artigo 2329 (urbano) (PPA: 39.º: doc..).
d) Em resultado da venda do prédio identificado, a Requerente apurou uma mais-valia no valor de (euro) 2.565.716,96, nos seguintes termos: (PPA, 40.º)
[IMAGEM]
e) No dia 18-08-2021, a Requerente submeteu a Declaração Modelo 22 de IRC do período de tributação de 2021, identificada com o n.º ..., na qual foi apurado um valor de imposto a pagar de (euro) 641.429,24 (PPA: 1.º; doc 1, p.5, campo 367).
f) Em 19-08-2021 a Requerente efetuou o pagamento do imposto autoliquidado no valor de 641.429,24 (euro) (PPA: 10.º; doc 3).
g) Em 22/04/2022, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra o ato de autoliquidação do IRC pago por si no período de tributação de 2021, onde peticionou "a anulação parcial da autoliquidação de IRC com o n.º ..., na parte correspondente ao acréscimo de tributação resultante da consideração total de mais-valias imobiliárias". (PPA: 2.º e 9.º; doc 2).
h) Na sua RG identificada a Requerente peticionou ainda o reembolso do imposto pago, acrescido dos devidos juros indemnizatórios. (PPA: 2.º e 9.º; doc 2).
i) Até 22-08-2022 a AT não se pronunciou sobre a RG apresentada pela Requerente (34.º PPA).
Factos dados como não provados
Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária, e em factos não questionados pelas partes.
Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
A matéria de facto foi fixada por este TAC e a convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes, bem como nos documentos juntos aos autos.
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, cf. n.º 1 do artigo 596.º e n.os 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, cf. n.º 2 do artigo 123.º Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Acórdão do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/133, "o valor probatório do relatório da inspeção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas".
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a decisão, em relação às provas produzidas, na íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC.
Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação."
Por sua vez, a decisão arbitral fundamento relevou a seguinte matéria de facto:
"[...]
A) A Impugnante é uma sociedade anónima de responsabilidade limitada, com sede em Gibraltar, encontrando-se aí registada no "Registry of Companies in Gibraltar" desde 02/07/1997, sob o n.º 61997-16 - cf. docs. de fls. 97 a 99 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
B) Em 14/08/1997, a Impugnante adquiriu, por 7.000.000$00 (sete milhões de escudos), o prédio urbano sito na Praia [...], omisso na respectiva matriz - cf. doc. de fls. 65 a 66 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
C) Em 1997, em dia e mês não concretamente apurados, mas após a data da venda identificada na alínea anterior, o prédio urbano ali identificado foi inscrito na matriz predial urbana da Freguesia e Concelho de Albufeira sob o n.º 9695 - cf. doc. de fls. 165 do PA; cf. relatório de inspecção (p. 19/39);
D) No ano de 2003 foi atribuído o Valor Patrimonial Tributário (VPT) de (euro)62.848,54 ao prédio urbano identificado em B) - cf. doc. de fls. 67 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
E) Em 13/02/2014 a Impugnante apresentou à AT, através da Internet, uma Declaração de Início de Actividade tendo aí indicado, além do mais, o seguinte:
[...]
[...] - cf. doc. de fls. 30 a 31 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
F) Em 15/08/2014 a Impugnante tinha como accionistas as sociedades "L." e a "E. Limited", ambas com sede em Gibraltar, e como Director F., com morada em [...] - cf. docs. de fls. 97 a 99 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
G) Com data de 13/10/2014, foi celebrado "Contrato de Arrendamento para Habitação com Prazo Certo" entre a Impugnante e E., G. e R., "pelo prazo certo de 5 anos, com início em 01 de Novembro de 2014, e termo em 31 de Outubro de 2019", prevendo-se aí uma renda mensal de (euro) 250,00, que deveria "ser paga [...] através de transferência bancária para o NIB 0036 0414 9910 6003 5475 5 do Banco Montepio", mais se estipulando que "o comprovativo bancário substitui o recibo de pagamento" - cf. doc. de fls. 33 a 34 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
H) Na sequência do contrato descrito no ponto anterior, a Caixa Geral de Depósitos registou, em 11/12/2014, 10/02/2015, 06/03/2015, 08/04/2015, 05/05/2015, 04/06/2015, 05/08/2015 e 08/09/2015, operações de transferência do montante de (euro) 250,00 da conta de G. para a conta atinente ao NIB identificado na alínea anterior - cf. doc. de fls. 34 (verso) a 38 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
I) A Impugnante não comunicou à AT o contrato de arrendamento identificado em G) - facto admitido por acordo;
J) Em 29/12/2014 a Impugnante apresentou à AT declaração de cessação de actividade em IRC e IVA, figurando como cessionário do estabelecimento F., titular do NIF [...], com morada em R [...], também seu representante em território nacional - cf. doc. de fls. 205 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
K) Pela AP 8/20141229 - "Criação de representação permanente e designação de representante", foi registada a deliberação de 18/12/2014 nos termos da qual a sociedade Impugnante passou a ter "representação permanente" no local "Rua [...] - cf. doc. de fls. 86 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
L) Em 30/01/2015 deu entrada no SF de Cantanhede um requerimento subscrito pelo Representante Legal da Impugnante, pelo qual esta requereu ao Chefe de Serviço de Finanças a alteração do seu enquadramento fiscal para "entidade não residente com estabelecimento estável em território português" - cf. doc. de fls. 87 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
M) Em 25/02/2015 integravam o património da Impugnante os seguintes imóveis:
a) Prédio urbano inscrito sob o artigo n.º 12 da União das Freguesias de Eiras e São Paulo de Frades (060335), com o VPT de (euro) 31.330,00;
b) Prédio urbano inscrito sob o artigo n.º 5-BP da União de freguesias de Santa Clara e Castelo Viegas (060336), com o VPT de (euro) 49.510,00;
c) Prédio urbano inscrito sob o artigo n.º 9695 da freguesia e concelho de Albufeira (080106), com o VPT de (euro) 224.430,00;
d) Prédio urbano inscrito sob o artigo 4721-BI, da freguesia de Quarteira, concelho de Loulé (080805), com o VPT de (euro) 64.900,00 - cf. doc. de fls. 43 do PA;
N) Em dia e mês não concretamente apurados do ano de 2015, a Impugnante arrendou a estudantes o imóvel inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias de Santa Clara e Castelo Viegas sob o n.º U-5 BP, contra o pagamento da renda mensal de (euro) 350,00 - cf. email enviado pela Representante Legal da Impugnante à AT, de fls. 41 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
O) O arrendamento referido no número anterior teve a duração de três meses - cf. email enviado pela Representante Legal da Impugnante à AT, de fls. 41 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido)
P) O arrendamento referido em N) não foi comunicado pela Impugnante à AT - facto admitido por acordo;
Q) Em 06/07/2015, a Impugnante vendeu o imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia e concelho de Albufeira sob o n.º 9695, pelo valor de (euro) 290.000,00 - cf. e-mail de fls. 139 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
R) Em 25.05.2016 foi emitida a Ordem de Serviço n.º OI201600737, ordenando a realização de uma acção de inspecção externa à contabilidade da Impugnante de âmbito parcial, em sede de IRC, ao exercício de 2015 - cf. fls. 7 do PA.
T) Em 21.06.2016 foi recebida a carta registada pela qual foi remetido ao legal representante da Impugnante e para a morada Rua [...], o ofício n.º 4779, com o assunto "CARTA AVISO" destinado a notificá-la de que, com referência à OI201600737 «[...] a muito curto prazo se deslocará(ão) à morada acima indicada, técnico(s) dos Serviços de Inspecção Tributária» ali constado ainda a menção «ANEXO: Folheto informativo contendo os direitos, deveres e garantias que assistem ao sujeito passivo.» - cf. fls. 1 e 2 do PA.
U) Com data de 13/10/2016 foi elaborado o ofício n.º 9038, sob o assunto "Carta-Aviso" e com referência à Ordem de Serviço n.º OI201601595, dirigido ao Representante Legal da Impugnante, para a morada Rua [...], no qual consta o seguinte:
«Nos termos da alínea l) do n.º 3 do artigo 59.º da lei geral tributária (LGT) e do artigo 49.º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária e Aduaneira (RCPITA) fica(m) notificado(s) de que, a muito curto prazo, se deslocará(ão) à morada acima referenciada, técnico(s) dos Serviços de Inspecção Tributária. A visita do(s) técnico(s) tem como finalidade a verificação do cumprimento das correspondentes obrigações tributárias e terá o âmbito e extensão a seguir indicados:
[...]
A eventual alteração, ao âmbito e extensão da acção inspectiva, resultará de despacho fundamentado da entidade que o ordenou (artigo 15.º do RCPITA). [...] ANEXO: Folheto informativo contendo os direitos, deveres e garantias que assistem ao sujeito passivo.» - cf. Carta-Aviso de fls. 5 do PA
V) A carta postal registada sob o n.º RD861557845PT, a coberto da qual foi remetido o ofício descrito no ponto anterior, foi devolvida ao remetente com a menção "desconhecido" - cf. registo postal registado sob o n.º RD861557845PT, de fls. 6 do PA;
W) As ordens de Serviço aludidas em R) e S) foram assinadas pelo representante fiscal da Impugnante, respectivamente, em 16.09.2016 e 21.10.2016 - cf. fls. 4 e 7 do PA, que se dão por integralmente reproduzidas.
X) Por ofício datado de 14/11/2016, na mesma data remetido para a morada do Representante Legal da Impugnante sob correio registado com n.º RD572381829PT e subscrito pelo Director de Finanças de Coimbra, foi comunicado à Impugnante o seguinte:
«De acordo com os elementos contabilísticos analisados em sede de IRC, há matéria com consequências ficais em sede de Imposto de Selo (IS), pelo que se procede à alteração do âmbito da acção ao abrigo da OI201601595 para que contemple IRC e IS, nos termos do artigo 15.º N.º 1 do RCPITA.
Junto se remete também a nota de diligência, prevista no artigo 61.º do Regime Complementar de Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira, relativa às ordens de serviço OI201600737 e OI201601595, dando por concluída a acção de inspecção, da qual resultam propostas de correcção." - cf. ofício de fls. 9 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
Y) No âmbito da mencionada acção inspectiva, com data de 14.11.2016 foi elaborado o projecto de relatório de fls. 13 a 24 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, sobre o qual recaiu o "PARECER DO CHEFE DE EQUIPA" com o seguinte teor:
A sociedade é uma entidade não residente, sem estabelecimento estável em que os rendimentos são imputáveis nos termos do art. 56.º do CIRC e de acordo com as regras estabelecidas para as categorias de IRS.
As correcções propostas encontram-se discriminadas no ponto III, propõe-se a matéria colectável de (euro)20132,43 e de (euro)194.166,62 para os anos de 2014 e 2015 referente a rendimentos da categoria F em ambos os períodos e da categoria G para 2015, resultante de correcções de Igual valor.
Encontra-se em falta imposto de selo no valor de (euro) 25,00 em 2014 e (euro)35,00 no ano de 2015 referente a um contrato de arrendamento, nos termos do art. 1.º e 2.º do CIS e verba 2 da TGIS.
[...].».
Z) No projecto de relatório mencionado no ponto antecedente consta, designadamente, o seguinte:
«1.3 - Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção
A sociedade G. Limited (doravante, sujeito passivo ou GPI) é uma entidade não residente, sem estabelecimento estável, com sede em território com regime de tributação privilegiada os rendimentos imputáveis são determinados nos termos do art.º 56º, n.º 1 e 2 do Código do IRC de acordo com as regras estabelecidas para as categorias correspondentes ao IRS.
1.3.1 - Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) - 2014 (Rendas de imóveis-categoria F)
Identificou rendas recebidas de imóvel no valor de (euro) 500,00. Não foi comprovado qualquer elemento que afaste a presunção do art. º 56º, n.º 2, do CIRC para o VPT de (euro) 338 884,0 338.840,0, que servirá para cálculo do rendimento predial bruto de (euro) 22.589,33. Há a deduzir aos rendimentos brutos acima identificados, o valor do IMI pago para os imóveis em questão no ano de 2014 de (euro) 981,37. A GPI documentou encargos que suportou no ano de 2014 relativas a condomínio, certificado energético e conservação, no valor de (euro) 1.975,53. Desta forma, vai ser proposta a correcção à matéria colectável para efeitos de IRC, nos termos dos artigos 56º, n.º 1 e 2 do CIRC, ao exercício fiscal de 2014, no valor total de (euro)20.132,43
1.3.2 - Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) - 2015
1.3.2.1 - Rendas de imóveis (categoria F)
Identificou rendas recebidas de imóveis no valor de (euro) 3.799,00. Não foi comprovado qualquer elemento que afaste a presunção do art.º 56º, n.º 2, do CIRC para o VPT de (euro) 257.955,0, que servirá para cálculo do rendimento predial bruto de (euro)11.807,67. A GPI documentou encargos que suportou no ano de 2014 relativas a certificado energético, no valor de (euro) 420,53. Desta forma, vai ser proposta a correcção no valor total de (euro) 15.186,67.
1.3.2.2 - Mais-valia imóvel Algarve (categoria G)
Por análise à modelo 11, constatou-se que a GPI tinha procedido à alienação do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia e concelho de Albufeira sob o art.º 9695, em 06/07/2015, pelo valor de (euro)290.000,00, sem que tenha apresentado qualquer declaração de rendimentos. O valor de aquisição a considerar é o valor patrimonial de (euro) 62.848,54. Vai ser considerado a deduzir à mais-valia o encargo com a imobiliária que intermediou a alienação do imóvel e alguns registos que consideramos associados à venda, peio que vão ser considerados como despesas necessárias no valor de (euro) 18.004,21. Desta forma, é proposta a correcção à matéria colectável para efeitos de IRC, no valor total de (euro)178.979,95.
As correcções no período de 2014 e 2015 apuram uma matéria colectável de (euro)20.132,43 e (euro)194.166,62, conforme quadro abaixo:
As correcções acima propostas são puníveis pelo artigo 103º e 119º do RGTT.
1.3.3 - Imposto do selo
1.3.3.1 - Contrato em 2014
Pelo contrato de arrendamento a liquidação e pagamento do Imposto do Selo é competência do sujeito passivo (GPI), conforme dispõe o artigo 23º, n.º 1 e o artigo 41º ambos do CIS, nascendo a obrigação tributária na data em que seja apresentado o contrato perante qualquer sujeito passivo dos referidos na al. a), do n.º 1 do artigo 2.º - vide art.º 5.º, alínea n) do CIS. Nos termos do artigo 60º, n.os 1 e 2 do CIS, as entidades referidas no art.º 2.º do CIS estão obrigadas a comunicar os contratos de arrendamento "até ao fim do mês seguinte ao do início do arrendamento". Assim, a obrigação tributária ocorreu na data da obrigação de comunicação do contrato de arrendamento, mesmo que não comunicado, que na situação objecto de análise ocorreu no último dia útil de Dezembro de 2014, altura em que devia ter sido comunicado o contrato de arrendamento no serviço de finanças da área do imóvel - Coimbra 2.ª (3050), o que não aconteceu. O contrato estipula o valor de (euro) 250,00 para a renda e que devia ter sido entregue até Dezembro de 2014, há a liquidar o montante de (euro) 25,00, nos termos do artigo 1º, n.º 1, artigo 2º, n.º 1, alínea g) e verba 2 da TGIS para o período de Dezembro de 2014, ao qual vai acrescer os respectivos juros compensatórios nos termos do art.º 40º do CIS e art.º 35º da LGT. A correcção acima proposta é punível pelo art.º 114º do RGTT.
III.2.2 - Contrato em 2015
A GPI identificou um contrato de arrendamento verbal realizado com estudantes, pelo valor de (euro) 350,00 mensais, sem que tenha identificado o seu início nem quando terminou, apenas tendo informado que estiveram 3 meses no imóvel locado. Este facto - arrendamento, encontra-se sujeito a Imposto do Selo nos termos do artigo 1.º, n.º 1 e do art.º 2º, n.º 1, alínea g) do Código do IS (CIS) e da verba 2. da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) à taxa de 10 % e cabe a liquidação e pagamento ao sujeito passivo (GPI), conforme dispõe o artigo 23º n.º 1 e o artigo 41º, ambos do CIS, na data em que seja apresentado conforme a al. a), do n.º 1 do art.º o - vide artigo 5º, alínea n) do CIS, ocorrendo a obrigação de comunicar os contratos de arrendamento "até ao fim do mês seguinte ao do início do arrendamento" - art.º 60º n.º 1 e 2 do CIS. Assim, desconhecendo a data de início do contrato, vamos considerar que o primeiro mês terá sido Outubro, pelo que a obrigação tributária ocorreu, na data da obrigação legal de comunicação do contrato de arrendamento, mesmo que não comunicado, que na situação objecto de análise ocorreu no último dia útil de Novembro de 2015, altura em que devia ter sido comunicado o contrato de arrendamento no serviço de finanças da área do imóvel - Coimbra 2.ª (3050), o que não aconteceu. Considerando que o contrato verbal estipula o valor de (euro) 350,00 para a renda e a obrigação de comunicar o contrato ocorreu em Novembro de 2015, há a liquidar o montante de (euro) 35,00 para o período de Novembro de 2015, nos termos do art.º 1º, n.º 1, art.º 2º, n.º 1, alínea g) e verba 2. da TGIS, ao qual vai acrescer os respectivos juros compensatórios nos termos do art.º 40º do CIS e art.º 35º da LGT.
A correcção acima proposta é punível peio art. º 114º do RGTT.
[...]»
AA) Em 30/11/2017 a Impugnante apresentou requerimento de pronúncia em sede de audiência prévia sobre o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária do qual, para além do mais, consta o seguinte:
«[...]
B) No que se refere à proposta de apuramento da matéria colectável em sede de mais-valias para o ano de 2015:
Apresentados os documentos para provar as despesas de valorização e para alienação do imóvel, foram na sua maioria, desconsiderados pela inspecção tributária, o que desde já não se aceita.
Em 2014 foi decidido pelos accionistas a venda do imóvel identificado no ponto III 1.2. do Projecto de Relatório de Inspecção.
Para realizar a venda, era necessário que a sociedade inspeccionada (GPI) tivesse personalidade e capacidade jurídicas e estivesse activa no Register of Companies de Gibraltar (órgão de Registo), o que não era o caso. A sociedade encontrava-se dissolvida desde 2008, conforme o documento de páginas 68 e 69 do Projecto e o documento que agora se anexa como Direction to Restore the name of the Company e Application to Restore e Company (doc. 5 e 6). Para a restaurar e activar foi necessário proceder ao pagamento de 8445£, correspondendo a 10.314(euro) (conforme taxa do documento em anexo), conforme descrito no documento anexo 12 páginas 12 e 13 do Projecto, sem o qual não se poderia proceder à feitura da escritura de venda, por a GPI não ter poderes para o fazer nem existiram os poderes dela emanados (Doc. 7).
Foi também necessário que o notário público de Gibraltar apresentasse as devidas declarações (Doc 8). Seguidamente foi necessário proceder a tradução e certificação de documentos para a língua portuguesa (Doc 8).
Todas estas operações foram estritamente necessárias para apresentar no acto da escritura para atestar da existência e capacidade da sociedade vendedora GPI.
Assim devem ser consideradas como despesas para a realização da venda do imóvel.
Também não se compreende e não se aceita que tenha sido recusada como "encargo com a valorização do imóvel", porque na descrição matricial deste não consta a piscina, a substituição dos azulejos ervinel, 13 conforme consta da factura indicada como anexo 18, página 1.
Não podemos afirmar que a piscina sempre existiu, mas a verdade é que em 1997, data de aquisição do imóvel pela GPI, existia, como ainda existe, uma piscina na localização que se apresenta.
Conforme planta de projecto de arquitectura inicial ou de alterações apresentado à Câmara Municipal de Albufeira, com o n.º de processo 103/88 (Doc 9).
E ainda actualmente em 2014 pela notificação de reavaliação do VPT, que incide também uma piscina (Doc 10).
Pelo que se depreende do documento mod. 129 para inscrição e descrição dos imóveis nos serviços as de finanças, nessa data, a folha 13 - "composição, características gerais e outros elementos" - contemplava nove colunas, não sendo necessário a participação de piscina (Doc 11).
Deve, portanto, ser considerada como despesa a factura em questão pelo valor de 8261,14(euro).
Também se impugna a rejeição das facturas em anexo 12, folhas 19 e 20, que estão identificadas como serviços de manutenção, mas incidam sobre o embelezamento, rega e corte de relva do jardim e tratamento da piscina pelo que, o seu não tratamento desvalorizaria o imóvel.
O que assim, se considera que, a contrario, serviram para a valorização do mesmo.
Devendo também considerar-se como encargos os montantes aí indicados no total de 4441,32(euro).
Pelos mesmos motivos, para tratamento especial da piscina, a factura do anexo 12, página 30, no valor de 154,24(euro).
A factura do anexo 16, cujas obras foram directamente encomendadas pela sede em Gibraltar, por se tratarem (SIC) de elevado valor, e por isso, realizadas por uma empresa inglesa, devem considerar-se estruturais e assim, contribuíram para a valorização imóvel, pelo valor de 61105(euro). (...)» - cf. doc. de fls. 81 a 85 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
BB) Em anexo ao requerimento identificado na alínea anterior encontravam-se, designadamente, cópia dos seguintes documentos, que se dão aqui por integralmente reproduzidos:
1) Carta emitida pelo Município de Albufeira, data de 02.09.2014, sob o assunto "AVISO DE SUSPENSÃO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA", dirigida à Impugnante para a morada "Rua [...]" "" - cf. carta de fls. 91 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
2) Comprovativo da reinscrição da Impugnante, em 22/07/2014, no - "Registry of Companies of Gibraltar", com efeitos reportados a 2008 - cf. "doc. 5" de fls. 92 do PA;
3) Comprovativo da "Application to Restore a Company to the Register", emitida em 18/06/2014 - cf. "doc. 6", de fls. 93 do PA;
4) Factura emitida pela "U., S. A. "em 22/11/2016, a favor de cliente não identificado, com o valor a pagar de (euro) 54,96 - cf. "doc. 7", de fls. 94 do PA;
5) Certificação de documentos emitida em 26/09/2014, e cópia dos documentos certificados - cf. "doc. 8", de fls. 95 do PA;
CC) A Impugnante apresentou, ainda, os seguintes documentos:
i) Recibo n.º 302 emitido por "C., Lda." em 13/06/2015, a favor da Impugnante, relativo à factura n.º 305 emitida na mesma data, no valor de (euro) 420,0, respeitante a: Certificado Energético praia dos Aveiros 15, no valor de (euro)148.25; Taxa Registo-Adene-SCE-RHE-T5, no valor de (euro)55.00; Certificado Energético Av. [...], no valor de (euro)93.21 e Taxa Registo-Adene-SCE-REH-T2, no valor de (euro)45.00 - Cf. doc. "Anexo 12 - 1 e 2/37", de fls. 144 do PA;
ii) "Guia para pagamento de executado" emitido pela Agente de Execução M., referente ao processo 2650/13.6TBLLE que corre termos na Comarca de Faro, 1.ªSecção de Execução - J1 de Loulé, em que é identificado, como exequente, o Condomínio Edifício Nautilus e, como executada, a Impugnante, figurando aí indicado, como "valor devido pela Executada", a quantia de (euro) 2.519,91 - cf. doc. "Anexo 12 - 3 a 5/37", de fls. 145 a 146 do PA;
iii) Cópia de confirmação de pagamento de serviços agendado, em 07/07/2015, do montante referido no ponto anterior - cf. doc. "Anexo 12 - 6/37", de fls. 146 (verso) do PA;
iv) Factura/VD n.º 0582416, emitida pela C. em 20/07/2015, sem identificação do adquirente dos produtos, no valor de (euro) 17,99 - cf. doc. "Anexo 12 - 9/37", de fls. 148 do PA, que se dá por integralmente reproduzido;
v) Recibo emitido por terminal de multibanco, na qual figura o pagamento à C., em 20/07/2015, de uma compra no valor de (euro) 17,99, através do cartão do Banco Montepio titulado por "F." - cf. doc. "Anexo 12 - 9/37", de fls. 148 do PA;
vi) Factura-recibo emitida em 24/09/2014, relativa a um "Ato isolado", na qual consta o pagamento de honorários por serviços de tradução prestados à Impugnante, no montante de (euro) 98,40 - cf. doc. "Anexo 12 - 10/37", de fls. 148 (verso) do PA;
vii) Factura intitulada "Outstanding fees - G. Limited", emitida em 18/12/2013 pela sociedade E., em nome da Impugnante, na qual figura um "Amount to be pay" (valor a pagar) global de £8,445.00 - cf. doc. "Anexo 12 - 11 e 12/37", de fls. 149 do PA;
viii) Vale Postal emitido pelos Correios de Portugal em 19/04/2013, no valor de (euro) 41,75, tendo como remetente C. - Advogado e destinatário o Município de Albufeira, no qual consta a indicação "Cliente 81905 - G. Lda. Taxa de restabelecimento águas - [...]" - cf. doc. "Anexo 12 - 13 a 16/37", de fls. 150 a 151 do PA;
ix) Factura n.º 469531/2010 emitida pelo Município de Albufeira em 06/12/2010, relativo aos serviços de abastecimento de água e tratamento de resíduos sólidos do imóvel sito na Praia [...], nela constando como titular do contrato "F." e um "total a pagar" de (euro) 123,94 até ao dia 24/12/2010 - cf. doc. "Anexo 12 - 17/37" e "Anexo 12 - 31/37", de fls. 152 e 159 do PA;
x) Factura emitida pela EDP a favor da Impugnante pelos serviços de electricidade prestados no lote 15 da Urbanização Praia [...], com indicação de um "valor a pagar" de (euro) 576,30, com data limite de pagamento em 17/12/2010 - cf. doc. "Anexo 12 - 18/37" e "Anexo 12 - 32/37", de fls. 152 (verso) e 159 verso do PA;
xi) Factura-recibo n.º 190, emitida em 23/06/2008 pela sociedade "F., Lda. -, Lda." a favor da Impugnante, referente a serviços de "Manutenção da Vivenda Mynando", no valor de (euro) 241,40 - cf. doc. "Anexo 12 - 19/37", de fls. 153 do PA;
xii) Factura-recibo n.º 337, emitida em 08/10/2008 pela sociedade "F., Lda." a favor da Impugnante, referente a "Serviços prestados na vivenda Mynando", no valor de (euro) 62,92 - cf. doc. "Anexo 12 - 19/37", de fls. 153 do PA;
xiii) Factura-recibo n.º 278, emitida em 28/08/2008 pela sociedade "F., Lda." a favor da Impugnante, referente a "Manutenção e limpeza da Vivenda Mynando conforme contrato", no valor de (euro) 4.110,00 - cf. doc. "Anexo 12 - 20/37", de fls. 153 (verso) do PA;
xiv) Venda a Dinheiro emitida pela empresa "C., Lda.", em 22/07/2000, favor da Impugnante, (sic) referente a materiais de construção, no valor de 4.671$00 - cf. doc. "12 - 21/37", de fls. 154 do PA;
xv) Factura-recibo n.º 041200215/002521, emitida pela empresa "C." a favor da Impugnante em 20/07/2015, relativa à compra de diversos artigos para o lar - cf. doc. "12 - 23/37", de fls. 155 do PA que se dá por integralmente reproduzido;
xvi) Factura-recibo n.º VOC 221/3118, emitida em 20/07/2015 pela empresa "D." a favor da Impugnante, relativa à compra de diversos artigos para o lar - cf. doc. "12 - 23/37" de fls. 155 do PA que se dá por integralmente reproduzido;
xvii) Factura-recibo n.º 2015/00409023543, emitida em 19/07/2015 pela empresa "L.", sem identificação do cliente, relativa à compra de diversos artigos para o lar/bricolagem, no valor global de (euro)126,53 - cf. doc. "12 - 24 e 27/37", de fls. 155 (verso) a 157 do PA, que se dá por integralmente reproduzido;
xviii) Cópia do recibo emitido pelo terminal multibanco, relativo ao pagamento da compra descrita no ponto anterior, através de cartão titulado por F. - cf. doc. "12 - 28/37" de fls. 157 (verso) do PA;
xix) Factura n.º 2011/V/6627, emitida em 31/12/2011 pela empresa "C." a favor M., relativa à compra de materiais de construção/bricolagem e taxa de deslocação ao local, no valor total de (euro) 186,84 - cf. doc. "12 - 29/37" de fls. 158 do PA;
xx) Factura n.º 2012/V/2219, emitida em 31/05/2012 pela empresa "C." a favor da Impugnante, relativa à compra de materiais de construção/bricolagem, taxa de deslocação ao local e serviços de reparação, no valor total de (euro) 154,24 - cf. doc. "12 - 30/37", de fls. 158 (verso) do PA;
xxi) Factura-recibo n.º 9081439694, emitida em 11/12/2005 pela empresa "M." a favor da Impugnante, relativa à venda de um colchão no valor de (euro) 117,95 - cf. doc. "12 - 33/37", de fls. 160 do PA;
xxii) Recibo n.º 1020051211181633, emitido em 11/12/2005 pela empresa "M. a favor da Impugnante, no valor de (euro) 117,95 - cf. doc. "Anexo 12 - 35/37", de fls. 161 do PA;
xxiii) Recibo n.º 1184030712191057, emitido em 12/07/2003 pela empresa "M." a favor da Impugnante, relativa à venda de móveis e equipamentos para o lar, no valor global de (euro) 737,70, conforme factura n.º 1080147913 emitida na mesma data - cf. doc. "Anexo 12 - 36 a 37/37" de fls. 161 (verso) a 162 do PA;
xxiv) Factura n.º 145 emitida pela empresa "S., SA" em 06/07/2015, a favor da Impugnante, relativa a serviços de "mediação na venda do prédio urbano sito na Praia [...]", no valor de (euro) 17.835,00 e o correspondente Recibo n.º 139, emitido na mesma data - cf. doc. "Anexo 15 - 1/8" e "Anexo 15 - 2/8", de fls. 166 e 166 verso do PA;
xxv) Factura n.º 2015/2457, emitida pelo Cartório [...] em 06/07/2015, a favor da Impugnante, relativa a honorários, no valor de (euro) 19,21 - cf. doc. "Anexo 15 - 3/8", de fls. 167 do PA;
xxvi) Talão n.º 4800/2015 emitido pela Conservatória do Registo Predial de Albufeira em 03/07/2015, aí sendo identificado como "Apresentante" M., comprovativo do pagamento de (euro) 50,00 pelos preparos atinentes ao cancelamento da penhora sobre o prédio n.º 278, sito em Albufeira - cf. doc. "Anexo 15 - 4/8", de fls. 167 (verso) do PA;
xxvii) Talão n.º 2851/2015 emitido em 19/06/2015 pela 2.ªConservatória do Registo Predial de Coimbra, a favor de C. - Advogado, NIF [...], comprovativo do pagamento de (euro) 50,00 pelos preparos atinentes ao cancelamento da penhora sobre o prédio n.º 9240 - fracção BI, sito em Loulé/Quarteira - cf. doc. "Anexo 15 5/8", de fls. 168 do PA;
xxviii) Recibo n.º 126217/201, emitido em 02/10/2014 pela Conservatória do Registo Predial de Lisboa, a favor de C., NIF [...], relativo ao pagamento de (euro) 100,00 pelos preparos atinentes ao cancelamento da penhora sobre o prédio n.º 278, sito em Albufeira - cf. doc. "Anexo 15 - 6/8", de fls. 168 (verso) do PA;
xxix) Factura emitida em 22/08/2010 pela empresa "K.", sem indicação da sua identificação fiscal e sem identificação do adquirente, relativa a obras efectuadas no imóvel identificado como "Villa Plus Mynando", no valor global de (euro) 61.105,00 - cf. doc. "Anexo 16", de fls. 170 a 171 do PA;
xxx) Factura n.º FC 4181 emitida pela sociedade "C., Lda." em 22/12/2007, a favor da Impugnante, relativa a serviços de "reparação da piscina" e "remoção de mosaicos e reboque. Preparação para novo reboque e instalação de novos mosaicos de piscina", no valor de (euro) 8.261,14 - cf. doc. "Anexo 18", de fls. 175 do PA;
DD) Com data de 13.12.2016 foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária já aludida, de fls. 103 a 122 do p.a., que se dá por integralmente reproduzido e do qual se destaca o seguinte:
«(-)
I.3. Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção
A sociedade G. Limited (doravante, sujeito passivo ou GPI) é uma entidade não residente, sem estabelecimento estável, com sede em território com regime de tributação privilegiada. Os rendimentos imputáveis são determinados nos termos do art.º 56º, n.º 1 e 2 do Código do IRC de acordo com as regras estabelecidas para as categorias correspondentes ao IRS.
1.3.1 - Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) - 2014 (Rendas de imóveis - categoria F)
Identificou rendas recebidas de imóvel no valor de (euro) 500,00. Não foi comprovado qualquer elemento que afaste a presunção do artº 56º, n.º 2, do CIRC para o VPT de (euro) 338.840,00, que servirá para cálculo do rendimento predial bruto de (euro) 22.58913. Há a deduzir aos rendimentos brutos acima identificados, o valor do IMI pago para os imóveis em questão no ano de 2014, de (euro) 981,37. A GPI documentou encargos que suportou no ano de 2014 relativas (sic) a condomínio, certificado energético e conservação, no valor de (euro)1.975,53. O valor proposto foi alterado de acordo com os elementos alegados em Direito de Audição, alterando-se a matéria colectável a corrigir, já considerada no valor que se descreve a seguir. Desta forma, vai ser proposta a correcção à matéria colectável para efeitos de IRC, nos termos dos artigos 56º, n.º 1 e 2 do CIRC, ao exercício fiscal de 2014, no valor total de (euro) 13.898,26.
I.3.2. - Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) - 2015
1.3.2.1 - Rendas de imóveis (categoria F)
Identificou rendas recebidas de imóvel no valor de (euro) 3.799,00. Não foi comprovado qualquer elemento que afaste a presunção do art.º 56º, n.º 2, do CIRC para o VPT de (euro)257.955,00, que servirá para cálculo do rendimento predial bruto de (euro) 11.807,67. A GPI documentou encargos que suportou no ano de 2014 relativas (sic) a certificado energético, no valor de (euro) 420,53. O valor proposto foi alterado de acordo com os elementos alegados em Direito de Audição, alterando-se a matéria colectável a corrigir, já considerada no valor que se descreve a seguir. Desta forma, vai ser proposta a correcção no valor total de (euro)7.875,67.
1.3.2.2 - Mais-valia imóvel Algarve (categoria G)
Por análise à modelo 11, constatou-se que a GPI tinha procedido à alienação do imóvel, inscrito na matriz predial urbana da freguesia e concelho de Albufeira sob o art.º 9695º, em 06/07/2015, pelo valor de (euro)290.000,00, sem que tenha apresentado qualquer declaração de rendimentos. O valor de aquisição a considerar é o valor patrimonial de (euro) 62.848,54. O valor proposto foi alterado de acordo com os elementos alegados em Direito de Audição, alterando-se a matéria colectável a corrigir, já considerada no valor que se descreve a seguir. Vai ser considerado a deduzir à mais-valia, o encargo com a imobiliária que intermediou a alienação do imóvel e alguns registos que consideramos associados à venda, pelo que vão ser considerados como despesas necessárias no valor de (euro) 26.419,59. Desta forma, é proposta a correcção à matéria colectável para efeitos de IRC, no valor total de (euro)170.564,57.
As correcções no período de 2014 e 2015 apuram uma matéria colectável de (euro) 13.898,26 e (euro) 178.440,24, conforme quadro abaixo:
(...)
I.3.3 - Imposto do selo
1.3.3.1 - Contrato em 2014
(...)
1.3.3.2 - Contrato em 2015
(...)
11.3.2 - Identificação do sujeito passivo
A sociedade G. Limited, NIPC [...], encontra-se inscrita no cadastro como uma empresa sem sede nem direcção efectiva em território português, pelo que é considerada em Portugal, para efeitos fiscais, como uma entidade "não residente sem estabelecimento estável".
Conforme a informação de que dispomos (anexo 1-2 fls), facultada pela Administração Fiscal de Gibraltar, o sujeito passivo tem sede naquele território (zona franca pertencente ao Reino Unido Grã-Bretanha e Irlanda Norte), o qual consta da lista dos países, territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada, claramente mais favorável definida pela Portaria 292/2011, de 08/11 (anexo 2- 3 fls).
A GPI, em 29/12/2014, e nos termos do art.º 126º do Código do IRC (CIRC) e do art.º 19º, n.º 4 da lei geral tributária (LGT) nomeou, como seu representante da cessação o Sr. F., NIF [...], com morada fiscal na Rua [...], o qual se encontra munido de procuração com poderes para representar a sociedade (anexo 3 - 4 fls).
Da análise aos elementos constantes no cadastro da GPI verifica-se que a declaração de início de actividade havia sido realizada em 13/02/2014, através da internet - anexo 4 (4 fls), com produção de efeitos em IRC e IVA a 01/01/2014, onde a GPI identifica como seu representante em IRC e IVA o Sr. F. já identificado no parágrafo anterior, mas desde 01/01/2009.
II.3.3 - Obrigações de registo e declarativas da GPI
Sendo a GPI uma sociedade não residente importa aferir se esta detém ou não estabelecimento estável em Portugal e quais as obrigações que lhe são impostas a nível declarativo. De acordo com os elementos obtidos e conhecidos, a GPI é detentora de imóveis em Portugal não lhe sendo conhecido qualquer actividade comercial, industrial ou agrícola. Importa agora saber se a GPI é obrigada, para efeitos fiscais, a estar registada no cadastro e em que situações.
Refere o artigo 2.º, n.º 1, alínea c) do CIRC que são sujeitos passivos de IRC "as entidades, com ou sem personalidade jurídica, que não tenham sede nem direcção efectiva em território português e cujos rendimentos nele obtidos não sejam sujeitos a IRS", incidindo o IRC sobre "os rendimentos das diversas categorias, consideradas para efeitos de IRS e, bem assim, os incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito por entidades mencionadas na alínea c) do n. º 1 do artigo anterior que não possuam estabelecimento estável ou que, possuindo-o, não lhe sejam imputáveis" - artigo 3.º, n.º 1, alínea d) do CIRC.
Nos termos do artigo 5º do Código do IRC "considera-se estabelecimento estável qualquer instalação fixa através da qual seja exercida uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola" e no artigo 3º, n.º 4 que "para efeitos do disposto neste Código, são consideradas de natureza comercial, industrial ou agrícola todas as actividades que consistam na realização de operações económicas de carácter empresarial, incluindo prestações de serviços".
Nos termos do artigo 4.º n.º 2, do CIRC, considerando-se obtidos em território português os rendimentos indicados nas diversas alíneas do art.º 4º, n.º 3 do CIRC, salientando-se a alínea a) "rendimentos relativos a imóveis situados no território português, incluindo os ganhos resultantes da sua transmissão onerosa".
Nos termos do art.º 118º, n.º 3 do CIRC "os sujeitos passivos não residentes e que tenham rendimentos não imputáveis a estabelecimento estável situado em território português relativamente aos quais haja lugar à obrigação de apresentar a declaração a que se refere o artigo 120.º são igualmente obrigados a apresentar a declaração de inscrição no registo, em qualquer serviço de finanças ou noutro local legalmente autorizado, até ao termo do prazo para entrega, da declaração periódica de rendimentos prevista no artigo 120.º".
Mais, considerando que a GPI tem sede em Gibraltar, que nos termos da Portaria 292/2011, de 08/11 (vide anexo 2), é considerado um território com um regime de tributação privilegiada e claramente mais favorável (doravante, territórios offshores), refere o art.º 56º n.º 2 do CIRC que "no caso de prédios urbanos não arrendados ou não afectos a uma actividade económica que sejam detidos por entidades com domicílio em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante da lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, considera-se como rendimento predial bruto relativamente ao respectivo período de tributação, para efeitos do número anterior, o montante correspondente a 1/15 do respectivo valor patrimonial'.
Nos termos do artigo 8, n.º 5, alínea b) do CIRC "a cessação de actividade ocorre: (...) b) relativamente às entidades que não tenham sede nem direcção efectiva em território português, na data em que (...) deixarem de obter rendimentos em território português" - sublinhado nosso. Nestes termos, considerando tudo o acima exposto e a título de resumo, a GPI é uma sociedade não residente, com sede num território offshore e sem estabelecimento estável proprietária de vários imóveis em território português. Para uma sociedade não residente sem estabelecimento estável que aufira rendimentos prediais relativos a imóveis situados em território nacional, apenas estariam obrigados a apresentar a inscrição cadastral até à data de entrega da modelo 22, esgotando-se a obrigação com entrega desta, contudo, para as sociedades residentes em offshores o legislador português consagrou uma presunção legal de rendimentos que, não sendo ilidida, faz com que a GPI tenha sempre, na perspectiva da AT, rendimentos tributáveis em sede de IRC e a consequente obrigação de se encontrar inscrito no cadastro da AT.
Veja-se, em abono do afirmado no parágrafo anterior, o disposto e atrás transcrito no artigo 8.º, n.º 5, alínea b) do CIRC, ao expressamente se prever que para os não residentes sem estabelecimento estável lhes ocorre a cessação de actividade quando estas "deixarem de obter rendimentos em território português".
Obviamente, se o legislador quis deixar expressa a possibilidade de os não residentes sem estabelecimento estável cessarem o seu registo fiscal, torna-se evidente que existe o inverso, ou seja, a obrigação de registo.
Encontrando-se a GPI cessada desde 29/12/2014 e considerando tudo exposto, é flagrante que tal cessação ocorreu sem que os pressupostos da sua realização tenham ocorrido, i.e., "deixarem de obter rendimentos em território português", pelo que é proposto neste relatório o reinício da actividade da GPI com a data comunicada de cessação, ou seja, a 29/12/2014.
III - Correcções Aritméticas
111.1 - Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) - rendimentos de não residentes
MI.1.1 - Rendas (categoria F)
111.1.1.1 - Exercício de 2014
Considerando os ponto 11.3.2 e 11.3.3 deste relatório e que este é uma entidade não residente, sem estabelecimento estável, os rendimentos imputáveis são "determinados de acordo com as regras estabelecidas para as categorias correspondentes para efeitos de IRS" - art. 56.º, n.º 1 do Código do IRC (CIRC) e tendo, como é o caso - Gibraltar, sede em território com regime de tributação privilegiada, claramente mais favorável definida pela Portaria 150/2004 de 13 de Fevereiro, encontra-se sujeito à presunção disposta no art.º 56º, n.º 2 do CIRC, onde se prevê que "no caso de prédios urbanos não arrendados ou não afectos a uma actividade económica que sejam detidos por entidades com domicilio em pais, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, considera-se como rendimento predial bruto relativamente ao respectivo período de tributação, para efeitos do número anterior, o montante correspondente a 1/15 do respectivo valor patrimonial."
Da análise ao sistema informático da AT, verificou-se que a GPI detém 4 imóveis em Portugal, com o Valor Patrimonial Tributário (VPT) global de (euro) 370.170,00, conforme imagem abaixo:
(...)
A GPI procedeu ao envio da declaração periódica de rendimentos - modelo 22 de IRC, para o exercício de 2014, contudo, não declarou quaisquer rendimentos tributáveis. (...).
(...)
Considerando o disposto na lei e o constante no contrato de arrendamento, foram recebidas rendas relativas a 2014 (meses de Novembro e Dezembro), para o imóvel sito no Monte Formoso, perfazendo o montante de (euro) 500,00.
Resulta que para os restantes imóveis não foi comprovado qualquer elemento que afaste a presunção referida, pelo que para cálculo do rendimento predial bruto vai ser considerado o VPT de (euro) 338.840,00, originando o valor de rendas de (euro) 22.589,33.
(...)
Há que deduzir aos rendimentos brutos acima identificados, o valor do IMI pago para os imóveis em questão no ano de 2014 e os encargos documentados que hajam sido pagos. (...)
Assim, deve ser considerado como encargo o valor pago no ano de 2014, correspondente aos 4 imóveis, constante nas 2 prestações pagas no valor global de (euro) 981.37. A GPI documentou encargos que podem ser aceites a deduzir aos rendimentos brutos nos termos do artº 41º, n.º 1 do CIRS, que suportou no ano de 2014 relativas a condomínio, certificado energético e conservação, nos valores constantes no quadro 1 abaixo:
Quadro 1
Dos valores descritos não foi comprovado o pagamento do montante de condomínio para o imóvel 08005 - U - 4721 - BI pelo que não vai ser considerado a deduzir.
De acordo com tudo e descrito vai (sic), no quadro 2 abaixo, vamos apurar o rendimento predial líquido do período:
(...)
A GPI-980137527 exerceu o Direito de Audição em 30/11/2016, produzindo alterações aos montantes propostos neste ponto do relatório. Do alegado, manteve-se o enquadramento da sociedade como não residente sem estabelecimento estável, tendo a GPI-980137527 feito prova que quanto ao imóvel, sito na Praia dos Aveiros - Albufeira, inscrito sob o artigo n.º 9695º, (...este "não é fruído por entidade com domicílio em território português" desde 30/07/2014, pelo que vamos considerar apenas rendimentos quanto ao período de Janeiro a Julho de 2014 como rendimentos nos termos do art.º 56º, n.º 2 e 3 do CIRC para este imóvel, ou seja, o valor de (euro) 8.727,83 e não o montante de (euro)14.962,00, sendo-lhe abatido o valor de (euro) 603,50 de IMI pago, apurando-se um valor líquido para este imóvel de (euro)8.124,33 em vez dos (euro) 14.358,50.
Nestes termos, vai ser proposta a correcção à matéria colectável para efeitos de IRC (categoria F), nos termos dos artos 56º, n.º 1 e 2 do CIRC, ao exercício de 2014, no valor total de (euro)13.898,26.
III.1.1.2 - Exercício de 2015
(...)
Assim, nos termos do art.º 56º, n.º 2 do CIRC, é afastada a presunção de rendimentos quanto aos dois imóveis identificados na resposta acima. (...).
Resulta que para o restante imóvel - art.º 4721-BI, urbano da freguesia predial urbana da Quarteira, concelho de Loulé, não foi comprovado qualquer elemento que afaste a presunção referida, pelo que para cálculo do rendimento predial bruto vai ser considerado o VPT sw (euro) 64.900,00, originando o valor de rendas de (euro) 4.326,67.
(...)
Desta forma, vai ser proposta a correcção à matéria colectável para efeitos de IRC (categoria F), nos termos dos artos 56º, n.º 1 e 2 do CIRC, ao exercício fiscal de 2015, no valor total de (euro)7.875,67.
III.1.2 - Mais-valias de alienação de imóvel - 2015 (categoria G)
Por análise à modelo 11, constatou-se que a GPI tinha procedido à alienação do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia e concelho de Albufeira sob o art. 09695º, em 06/07/2015, pelo valor de (euro) 290.000,00, sem que tenha apresentado qualquer declaração de rendimentos. Em 21/10/2016, foi a GPI notificada através de Notificação Pessoal (vide anexo 8) para:
"2 - Apresentar cópia de extractos bancários de conta(s) em nome da sociedade no território nacional para o ano completo, nomeadamente, para as contas com os números 0036 04149910 6003 5475 5 e "414.10.153231-8";
3 - Considerando que vendeu um imóvel em 2015, apresente elementos que documentem essa alienação e o destino dado ao montante recebido, tendo presente o disposto no art.º 88º do RGIT;
4 - Apresente documento relativo à aquisição do imóvel alienado - art.º 9695 da freguesia de Albufeira e Olhos de Água, concelho de Faro (080106)".
Através do seu representante legal - Sr. F. (vide anexo 3) a GPI, em resposta remetida por email (anexo 9-3 fls), informou que:
"Ponto 2:
Sobre a conta 414.10.153231-8 já foi apresentado o último extraio bancário existente (para 2014) pois essa conta foi cancelada e extinta na data aposta no último movimento.
No que se refere à conta terminada por 5475 5, foi a mesma penhorada pelo Serviço de Finanças de Lisboa 3 e o seu saldo ficou a zero. Os extractos bancários com movimentos anteriores a 6 meses devem ser previamente pagos ao banco para que estes possam emitir o extracto do ano 2015. Fui informado neste dia, que não foi emitido qualquer extracto por se verificar que a conta não tem saldo.
Após contacto com o advogado dos accionistas em Gibraltar, tentarei resolver a situação, mas como a sociedade tem a conta penhorada e não pode efectuar qualquer tipo de pagamento por culpa da AT, a sociedade está paralisada.
Ponto 3:
Junta-se cópia da escritura de venda do referido imóvel pelo valor de 290.000(euro). Desse montante 200.000(euro) foram entregues a Gibraltar para pagar todas as despesas existentes ao notário público, ao advogado, ao contabilista, aos serviços de registo e finanças em Gibraltar desde a sua constituição (1997), pois algumas nunca foram pagas por falta de verbas e se remanescente houve, teria sido partilhado pelas sociedades associadas.
Os restantes 90.000(euro), dos quais foi imediatamente deduzida e paga comissão da imobiliária de +_ 18.000(euro) (cuja cópia se anexa) e o valor de vários processos de execução em curso, serviram para pagar os valores em dívida em Portugal acumulados desde há muitos anos, ou para restituir os empréstimos feitos pela sociedade.
A sociedade, até 2014, não tinha qualquer fonte de rendimento, pois Gibraltar mantinha uma política de "património estático", que em 1997 (ano da compra) o imobiliário era, por si, um Investimento rentável.
Lembro que só de impostos juros e coimas) já pagos às Finanças desde 1997, com especial incidência de IRC dos anos 2009 a 2013; foram pagos quase 20.000C.
Os IMI "normais" foram pagos. Vários registos foram efectuados e pagos. Verificaram-se vários processos de execução dos respectivos condomínios dos imóveis da GPI, com despesas acumuladas de agente de execução, e penhoras, que, entretanto, foram pagos. Muitos pagamentos diversos, que não se conseguem indicar, em tão pouco tempo, como a promoção de arrendamentos em 2014, promoção de venda, deslocações ao Algarve onde situavam 2 imóveis e deslocações a Gibraltar, hotéis, portagens, refeições, deslocações a assembleias de condomínio, obras nos imóveis (muitas delas não se consegue factura, como foi o caso na vivenda Minando), substituição de equipamento e mobiliário, despesas de consumos de água e electricidade.
Informo que a dívida actual a AT é de +-94.000(euro) (sem juros, no contexto PERES) e o valor patrimonial dos imóveis dados em garantia é de 145.740(euro), enquanto que o valor de mercado poderá aproximar-se 200.000(euro).
Ponto 4:
A GPI não possui o documento de compra do referido imóvel, nem nenhuma indicação onde se possa ter efectuado a escritura.".
Para além da resposta escrita a GPI apresentou diversos documentos no intuito de documentar os encargos suportados que mais à frente neste relatório iremos valorar ou justificar porque não são considerados - anexo 12 (37 fls).
Considerando os pontos 11.3.2 e 11.3.3 deste relatório e que este é uma entidade não residente, sem estabelecimento estável, os rendimentos imputáveis são "determinados de acordo com as regras estabelecidas para as categorias correspondentes para efeitos de IRS" - art.º 56º, n.º 1 do CIRC, que nos termos do art.º 10º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS (CIRS), a venda do imóvel aqui analisada é tributada de acordo com as regras constantes neste código para as mais-valias.
A mais-valia obtém-se do saldo apurado da diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição artigo 10º, n.º 4, alínea a) CIRS, sendo este último "corrigido pela aplicação de coeficientes" à data que constar no título de aquisição - artigo 50.º, n.º 1 e n.º 2 do CIRS. Os factores de actualização encontram-se aprovados pela Portaria 400/2015, de 06/11. Ao valor de aquisição acresce os encargos com a valorização do imóvel alienado, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação - artigo 51º, alínea a) do CIRS.
O artigo 44º, n.º 2 do CIRS define o valor de realização como sendo o valor considerado para a liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas - (euro) 290.000,00 (valor considerado na escritura). Como valor de aquisição a título oneroso, é considerado o montante que tiver servido para efeitos de liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de imóveis (IMT), nos termos da redacção do artigo 46º, n.º 1, do CIRS, contudo a GPI na resposta à nossa notificação acima transcrita, mais concretamente no ponto 4, refere que desconhece a data de aquisição e o cartório notarial onde terá ocorrido.
Consultado o registo do prédio no Serviço de Finanças de Albufeira, no suporte em papel para a inscrição do art.º urbano 9695 da freguesia e concelho de Albufeira, verifica-se que a aquisição do imóvel foi realizada por escritura pública realizada no 2º C.N. de Coimbra, em 14/08/1997. Desta forma, foi contactada a notária - M. para obter informação sobre a escritura realizada, tendo-se obtido cópia (anexo 13-4 fls), onde se pode ver que o valor de aquisição foi de (euro) 34.915,85 e o imóvel se encontrava omisso (ainda sem inscrição matricial nem a correspondente avaliação). Com a inscrição na matriz do imóvel, a avaliação revelou que o valor patrimonial tributário era superior ao valor declarado de aquisição, sendo aquele o valor de aquisição a considerar para a liquidação do IMT (na altura sisa), ou seja, o valor patrimonial de (euro) 62.848,54 (anexo 14-1.ª folha).
Quanto a todos os documentos apresentados, apenas vão ser considerados os que preenchem o descrito no art.º 51º; alínea a) do CIRS, ou seja, as despesas inerentes à aquisição e encargos com a valorização do imóvel. Analisados que foram todos os documentos apresentados em anexo 12, constata-se que nenhum destes preenche os requisitos do art.º 51º do CIRS, pois na sua grande maioria são despesas que podem ser considerados como gasto na actividade normal de uma empresa (encargos com o contabilista, pagamentos de água, luz, manutenção de edifícios, compra de bens móveis para o recheio do imóvel, encargos com condomínios, impostos, etc.) mas essa actividade é a declarada em Gibraltar, não em Portugal. Destes constatou-se ainda que alguns estavam em nome do Sr. C. - vide por ex. pág. 24 e 30 do anexo 50, entre outros, pelo que também não seriam aceites na contabilidade da GPI.
Em anexo 15 (8 fls), encontramos o encargo com a imobiliária que intermediou a alienação do imóvel e alguns registos que consideramos associados à venda, pelo que vão ser considerados como despesas necessárias no valor de (euro) 18.004,21.
Em anexo 16 (3 fls), um documento denominado de "Invoice" emitido em 22/08/2010 por "K.", sem qualquer número de contribuinte, nacional ou estrangeiro, nem identificando o adquirente. Há uma referência ao local "property: Villa Plus Mynando" e descreve o que nos parece ser uma proposta de alterações/obras a realizar, contudo, desconhece-se se foram realizadas as obras pois não foi participado à matriz predial obras de beneficiação que tivessem sido realizadas no imóvel, pois o montante em causa (cerca de (euro) 60.000,00) indiciava alteração que exigia participação à matriz pela alteração de valor do imóvel. Mais, não foi também comprovado o pagamento deste montante, pelo que não vai ser considerado este montante no apuramento da mais-valia.
Em anexo 17 (5 fls), documento apresentado pela GPI onde é documentado um "Pedido de registo de estabelecimento de alojamento local" à Câmara Municipal de Albufeira, datado de 16/07/2009, que estaria a ser desenvolvido por escritório de advogados a quem pagou para o efeito. Ora, a GPI nunca declarou quaisquer rendimentos auferidos pelo imóvel aqui alienado facto que motivou uma acção de inspecção ao ano de 2009, pelo que este encargo seria lá considerado e não agora em sede de alienação do imóvel pois efectivamente não se enquadra nos termos expedidos no art. 51.º do CIRS, pelo que não vão ser considerados.
Em anexo 18 (3 fls.), factura de 22/12/2007 relativa a obras de reparação de piscina, no valor de (euro) 8.261,14 e cópia de certidão de teor do art.º 1 7609 urbano, da freguesia e concelho de Albufeira. Da análise à descrição matricial verifica-se que não consta na descrição do imóvel qualquer piscina, logo, não pode a AT aceitar obras de melhoramento realizadas a parte de imóvel em imóvel que não contém a parte melhorada.
De tudo o descrito vamos agora fazer o apuramento da mais-valia no quadro 3 abaixo:
(...)
A GPI-980137527 exerceu o Direito de Audição em 30/11/2016. Do alegado, manteve-se o enquadramento da sociedade como não residente sem estabelecimento estável, tendo-se concluído que das despesas apresentadas relativos a obras de valorização do imóvel, são agora aceites considerando os elementos agora apresentados os montantes de (euro) 154,24 e (euro) 8.261,14 nos termos do art.º 51º, n.º 1, alínea a) do CIRS, alterando-se as conclusões deste ponto do relatório, aumentando as despesas/encargos aceites de (euro)18.004,21 para (euro) 26.419,59. Nestes termos a mais-valia contabilística é de (euro) 200.731,87 e uma mais-valia fiscal de (euro) 170.564.57.
Desta forma, vai ser proposta a correcção à matéria colectável para efeitos de IRC, nos termos dos artigos 56º, n.os 1 e 2 do CIRC, ao exercício fiscal de 2015, no valor total de (euro) 170.564.57.
(...)
VIII - Outros elementos relevantes
VIII.1 - Reinício de actividade
A GPI procedeu à cessação de actividade em 29/12/2014, contudo, considerando que se mantêm em nome de sociedade diversos imóveis, e sendo uma entidade não residente sem estabelecimento estável como melhor se detalha no ponto II.3.3, não se nos afigura como plausível a cessação de actividade, nos termos do art.º 118º, n.º 6 do CIRC, pois os imóveis continuam a ser geradores de rendimentos, ainda que presumidos, originando a obrigação de entregar a declaração periódica prevista no art.º 120º do CIRC e a declaração anual prevista no art.º 121º do CIRC. Nestes termos, é proposto o reinício de actividade para a GPI na data de 29/12/2014.
VIII.2 - Representante legal
Foi identificado como director (vide anexo 1) e procurador (vide anexo 2) da sociedade o Sr. F., NIF [...].
(...)
IX - Direito de audição - Fundamentação
(...)
1 - Enquadramento da sociedade como entidade não residente sem estabelecimento estável ao considerar que tem pelo menos desde 2014 (29/12) uma sucursal em Portugal
(...)
Desta forma e considerando tudo o exposto, a AT considera que a Casa-Mãe não detém qualquer estabelecimento estável em Portugal a que se possa imputar as rendas auferidas.
2 - Considera que Gibraltar já não preenche os requisitos para ser considerada na lista constante na Portaria 150/2004
(...)
Nos termos expendidos, Gibraltar continua a estar listado na Portaria 292/2011, pelo que se considera um território com um regime Fiscal claramente mais favorável.
3 - Sendo considerada não residente com estabelecimento estável ou porque não se enquadra o local da sede na Portaria 150/2004 já não é passível de lhe ser aplicado o disposto no art.º 56º, n.º 2 e 3 do CIRC mesmo porque a submissão a estes números não foi fundamentada
(...)
De tudo o descrito nos pontos 1 e 2 desta análise ao DA, fica claro que (...) estamos perante uma entidade não residente sem estabelecimento estável com sede em regime fiscal claramente mais favorável, os denominados países ou território "offshore". Contudo discorda também das correcções propostas à matéria colectável para os anos de 2014 e 2015, a título de rendas, por considerar que a AT não fundamenta a sujeição ao disposto no art.º 56º, n.º 2 e 3 do CIRC.
Ora, as matérias controvertidas resultam descritas nos pontos III.1.1.1 e III.1.1.2, respetivamente para os anos de 2014 e 2015. Analisando os pontos do relatório referidos constata-se que estes remetem para um enquadramento realizado (...) nos pontos II.3.2 e II.3.3, para onde remetemos porque se mantêm válidos todos os argumentos expendidos para enquadramento da GPI(...).
(...)
4 - Quanto ao apuramento da mais-valia, discorda da não consideração de algumas despesas que considera indispensáveis para a sua obtenção
(...)
Importa agora saber se os encargos/despesas elencados cumprem os requisitos dispostos na norma para que sejam aceites. Ora, para os montantes de (euro) 154,24 e de (euro) 8.261,14, em face dos elementos agora apresentados, nomeadamente o DOC 8, vão ser aceites como encargos elegíveis para a valorização do imóvel e como tal de acrescer ao custo de aquisição, corrigindo-se no ponto MI.1.2 o cálculo da mais valia.
(...)
5 - Discorda da infracção indicada pela falta de entrega do Modelo 22 do ano de 2015
(...)
6 - Discorda do Reinício de actividade proposto
(...)
Conclusão
A GPI-980137527 exerceu o Direito de Audição em 30/11/2016. Do alegado, manteve-se o enquadramento da sociedade como não residente sem estabelecimento estável, tendo a GPI-980137527 feito prova que quanto ao imóvel, sito na Praia [...], este "não é fruído por entidade com domicilio em território português" desde 30/07/2014, pelo que vamos considerar apenas rendimentos quanto ao período de Janeiro a Julho de 2014 como rendimentos nos termos do art.º 56º, n.º 2 e 3 do CIRC para este imóvel, ou seja, o valor de (euro) 8.727,83 e não o montante de (euro)14.962,00, sendo-lhe abatido o valor de (euro) 503,50 de IMI pago, apurando-se um valor liquido para este imóvel de (euro) 8.124,33 em vez dos (euro) 14.358,50 referidos no ponto MI.1.1.1, alterando-se os montantes apurados. Para o ano de 2015 não vai ser considerado para este imóvel qualquer montante a título de rendas nos termos do art.º 56º, n.º 2 e 3 do CIRC, alterando-se as conclusões do ponto NI.1.1.2 deste relatório.
Conclui-se também que das despesas apresentadas relativos a obras de valorização do imóvel, são agora aceites considerando os elementos agora apresentados os montantes de (euro) 154,24 e (euro)8.261,14 nos termos do art.º 51º, n.º 1, alínea a) do CIRS, alterando-se as conclusões do ponto III.1.2 deste relatório. As restantes despesas não são aceites por não terem documento de suporte válido, por não serem obras que valorizem o imóvel e porque as despesas identificadas, ainda que necessárias, não eram inerentes à alienação do imóvel para que fossem consideradas nos termos do artigo 51.º, n.º 1, al. a), do CIRS.
Assim, nos termos entre outros dos art.º 118º, n.º 3; art.º 56º, n.º 2 e art.º 8.º, n.º 5, alínea b) a contrário, todos do CIRC, a GPI é uma sociedade não residente, com sede num território offshore e sem estabelecimento estável, proprietária de vários imóveis em território português, o legislador português consagrou uma presunção legal de rendimentos que, não sendo ilidida, faz com que tenha sempre, na perspectiva da AT, rendimentos tributáveis em sede de IRC e a consequente obrigação de se encontrar inscrito no cadastro da AT, sendo mantida a proposta de reinício efectuada neste relatório.»
Cf. doc. de fls. 103 a 122, e respectivos anexos, de fls. 123 a 207 todas do PA;
EE) Em 27/12/2016 foram emitidas em nome da Impugnante as liquidações de IRC e juros compensatórios, referentes aos exercícios de 2014 e 2015, de fls. 63 e 64 do processo físico, que se dão por integralmente reproduzidas.
A convicção do Tribunal baseou-se no teor dos documentos identificados em cada uma das alíneas antecedentes»."
2.2 - DE DIREITO
2.2.1 - Dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos
O presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência, interposto ao abrigo do disposto nos artigos 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) e no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do artigo 25.º, n.º 3 do RJAT, respeita à decisão arbitral proferida no processo 686/2022-T - que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral pela mesma deduzido tendo em vista o indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada relativamente ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas ("IRC") por si autoliquidado e vertido na declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, respeitante ao período de tributação de 2021, que deu origem ao documento de liquidação n.º ...47, com base em oposição de acórdãos, apontando como decisão fundamento, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 23-06-2021, Proc. n.º 00258/17.6BECBR, www.dgsi.pt.
Nos termos do n.º 2 do referido art. 25.º do RJAT, na redacção aplicável, «[a] decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é [...] susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo»; dispõe o n.º 3 do mesmo artigo que a esse recurso «é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no art. 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral».
Como já foi enunciado, o presente recurso tem fundamento na oposição de julgados, impondo-se aferir previamente da verificação dos pressupostos substantivos de que depende o conhecimento do seu mérito. Que são, esquematicamente, os seguintes:
[1.º] que a decisão recorrida tenha apreciado o mérito da pretensão deduzida e tenha posto termo ao processo arbitral (artigo 25.º, n.º 2, primeira parte, do Regime Jurídico da Arbitragem em matéria Tributária - doravante identificado pela sigla "RJAT");
[2.º] que exista oposição quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo (artigo 25.º, n.º 2, segunda parte, do mesmo diploma);
[3.º] que a orientação perfilhada na decisão arbitral não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo [artigo 152.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável a coberto do n.º 3 do artigo 25.º daquele outro diploma].
[4.º] que o acórdão fundamento tenha transitado em julgado (artigo 688.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), situação que se verifica neste caso, não existindo qualquer dissídio em relação a este elemento.
Avançando, diga-se ainda como se refere no Ac. deste Tribunal (Pleno) de 4 de Junho de 2014, Proc. n.º 01763/13, www.dgsi.pt, para apurar da existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito é exigível "que se trate do mesmo fundamento de direito, que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica e que se tenha perfilhado solução oposta nos dois arestos: o que, como parece óbvio, pressupõe a identidade de situações de facto, já que sem ela não tem sentido a discussão dos referidos pressupostos. Sendo que a oposição também deverá decorrer de decisões expressas, que não apenas implícitas. (Cfr., neste sentido, os acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 25/3/2009, rec. n.º 598/08 e do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo, de 22/10/2009, rec. n.º 557/08; bem como Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3.ª ed., Coimbra, Almedina, 2010, pp. 1004 e ss.; e Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. IV, 6.ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 44 ao art. 279.º pp. 400/403.)".
Tal significa que para apurar da existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento devem adoptar-se os critérios já firmados por este STA, quais sejam:
- Identidade da questão de direito sobre que recaíram as decisões em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
- Que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica;
- Que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
- A oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.
Analisando:
A Recorrente começa por identificar a questão fundamental de direito, objecto de contradição entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão fundamento com referência à forma de calcular e quantificar as mais-valias para efeitos de tributação, em sede de IRC, quando o sujeito passivo do tributo seja uma pessoa colectiva não residente e sem estabelecimento estável em Portugal.
Nesta sede, a decisão arbitral recorrida tem como objecto uma autoliquidação de IRC feita pela pessoa colectiva A... LLC no ano 2021, sendo a ora recorrente uma entidade não residente e sem estabelecimento estável em Portugal, relativamente à quantificação da mais-valia gerada pela venda de um imóvel em Portugal, tendo sido considerado na autoliquidação a totalidade do valor da mais-valia realizada, ao invés de 50 %, como pretendido pela recorrente, verificando-se que a decisão arbitral recorrida entendeu que a remissão realizada pela alínea d), do n.º 1 do artigo 3.º do CIRC para o CIRS diz respeito somente à delimitação da matéria colectável, pelo que, tratando-se de pessoa colectiva, os rendimentos são considerados na sua totalidade, independentemente de se tratar de sujeito passivo residente ou não residente.
Para o efeito, ponderou que:
"...
Na base da questão está a conformidade do artigo 43.º, n.º 2, alínea b) do CIRS à tributação das mais valias das pessoas coletivas não residentes, situação sobre a qual não se conhece jurisprudência dos tribunais arbitrais ou do STA, pois todas as decisões que se referiram, foram tiradas em processos propostos por pessoas singulares. Excetua-se o acórdão do TCA-N de 23-06-2021, no âmbito do processo 00258/17.6BECBR, em que o SP era uma pessoa coletiva, julgou-se diretamente aplicável à situação o CIRS, sem se questionar a aplicação deste por via das disposições do CIRC.
Ficou provado que a Requerente esta, nas suas declarações de rendimentos relativas aos exercícios em causa, declarou ser uma entidade residente sem estabelecimento estável em Portugal.
Não se aceita a afirmação de que a aplicação de regras distintas de tributação às entidades residentes e às não residentes constitui violação dos princípios da igualdade e da livre circulação de capitais.
Em Direito Fiscal, o princípio mais basilar da igualdade não significa que todos devam ser tributados por aplicação das mesmas regras, mas sim que, como é uso dizer, "se trate igualmente o que é igual e diferentemente o que é diferente".
Ora a situação fiscal dos residentes e não residentes é manifestamente diferente:
. os primeiros estão sujeitos, no país onde residem, a uma tributação que, em princípio, incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, independentemente do lugar onde foram obtidos (worldwide income);
. os segundos apenas são tributados em Portugal com base num critério estrito de territorialidade, ou seja, o imposto (no caso, o IRC) apenas incide sobre os rendimentos com fonte em Portugal.
Assim se compreende que, até por razões evidentes de praticabilidade, a tributação dos não residentes sem estabelecimento aconteça em regra por retenção na fonte, sendo a exceção mais relevante precisamente a das mais-valias imobiliárias.
A violação do princípio da livre circulação de capitais (que a jurisprudência do TJUE considera aplicável relativamente a países terceiros) não pode ser entendida como consequência necessária da diferenciação fiscal entre residentes e não residentes. A invocação de tal princípio implicaria a alegação de factos de onde se possa concluir pela existência de uma discriminação injustificada, o que não foi feito no presente caso.
Não se pode aceitar, também, o entendimento da Requerente de que as mais-valias imobiliárias que obteve só deveriam ser consideradas em 50 %. Em IRC este tipo de rendimentos é considerado na sua totalidade, quer estejam em causa residentes ou não residentes.
A jurisprudência citada pela requerente, nomeadamente o ac. do STA de 09-12-2020, proc. n.º 075/20, refere-se a normas do CIRS que, relativamente a pessoas físicas residentes, mandam considerar, no cálculo da matéria coletável deste imposto, apenas 50 % do ganho obtido e, relativamente às pessoas físicas não residentes, a sua totalidade.
Tal nada tem a ver com a situação da Requerente pois que esta, independentemente de dever ser havida como residente ou não residente, enquanto pessoa jurídica, está sujeita a IRC e não a IRS.
A remissão para as normas do CIRS operada pelo artigo 3.º, n.º 1, al. d), do CIRC cinge-se à delimitação da matéria coletável: as sociedades não residentes sem estabelecimento estável apenas são sujeitas a imposto, no nosso país, pelos rendimentos que o CIRS considera tributáveis e não pelo seu rendimento global (lucro), como sucede relativamente à generalidade dos sujeitos passivos de IRC. Tal remissão é apenas para as regras de incidência, stricto sensu, do IRS e não, também, para as regras deste código relativas à quantificação da matéria colectável de cada uma das categorias.
Pelo que deve improceder o presente pedido arbitral, com as legais consequências. ...".
Por seu lado, o Acórdão fundamento considerou que, "por força da supremacia das normas dos Tratados da União Europeia sobre a lei ordinária nacional, constitucionalmente consagrada no artigo 8.º n.º 4 da Constituição, o artigo 43.º n.º 2 do CIRS, interpretado no sentido de que a redução da matéria tributável das mais valias a 50 % do respectivo saldo apenas se aplica a residentes, viola o princípio da livre circulação de capitais entre estados membros e entre estados membros e estados não membros, consagrado no artigo 56.º do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia", tendo revogado a sentença de 1.ª instância que considerou a relevância de 100 % e não de 50 %, da mais-valia obtida em 2015 com a venda do prédio urbano, para a matéria tributável de IRC em 2015, com fundamento no facto de a impugnante ter a sua sede em... e não ter estabelecimento estável em Portugal.
Nesta sequência, considerou o seguinte:
"...
Em todo o caso, a sentença recorrida, ao confirmar a relevância de 100 %, não apenas de 50 %, da mais valia obtida em 2015 com a venda do prédio inscrito sob o artigo...95 da matriz urbana da freguesia..., para a matéria tributável de IRC em 2015, com fundamento no facto de a Impugnante ter a sede em... e não ter estabelecimento estável em Portugal e, por isso, não lhe ser aplicável o n.º 2 do artigo 43.º n.º 2 do CIRS, na redacção então em vigor (ex vi artigo 56.º n.º 1 do CIRC), padece de erro de julgamento por violação do artigo 56.º do tratado que instituiu a União Europeia e, actualmente, do artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da UE, normas que proscrevem qualquer restrição aos movimentos de capitais entre estados membros e até entre estados membro e não membros e que, por força do artigo 8.º n.º 4 da Constituição, prevalecem sobre a Lei Ordinária nacional, a menos que atentem contra os princípios fundamentais do Estado de Direito Democrático?
Desta feita, ao abordar esta questão, vamo-nos substituir ao Tribunal a quo, que, como vimos, indevidamente, ficou silente quanto a ela.
Fá-lo-emos ao abrigo do artigo 665.º n.º 1 do CPC, porém, sem necessidade de abrir contraditório nos termos do n.º 2 do referido artigo porque, como se vê nas conclusões do recurso da Impugnante, esta questão fez parte do objecto do recurso, pelo que o contraditório sobre ela já foi exercido ou susceptível de o ser.
Aqui a Recorrente, ainda que subsidiariamente, prescinde da alegada existência de estabelecimento estável em território português e arrima-se no artigo 43.º do CIRS, na redacção anterior à dada pela Lei 71/2018 de 31/12, aplicável ex vi artigo 56.º n.º 1 do CIRC, não para se ficar por uma determinação do rendimento colectável nos termos dos n.os 1, 3 e 4, enquanto não sediada em território nacional, mas para reivindicar a aplicação, a si, do n.º 2 do mesmo artigo 43.º, que reduz a 50 % o valor do incremento patrimonial a tributar no caso de mais valais realizadas, entre o mais, com a venda de imóveis.
Sustenta que a restrição da redução dos 50 % aos residentes é violadora do Tratado Da União, designadamente do livre movimento de capitais instituído pelo artigo 56.º, e invoca jurisprudência do STA, veiculada pelo acórdão tirado em 3/2/2016 no processo 01172/14, por sua vez subsidiário de decisão do TJUE (acórdão de 11 Outubro de 2007 in processo C 443/06), em julgamento, precisamente, de questão prejudicial com esse objecto, suscitada pelo próprio STA.
O Acórdão do STA procede de um recurso da Autoridade Tributaria, relativamente a uma sentença que julgara parcialmente procedente a impugnação de uma liquidação de IRS, precisamente por julgar aplicável a redução de 50 % prevista no n.º 2 do artigo 43.º do CIRS a dois residentes na Inglaterra. Está integrado numa precedente corrente jurisprudencial e é redutível aos seguintes termos da sua fundamentação de direito:
«A recorrida pugna pela manutenção do decidido reiterando que o entendimento perfilhado pela recorrente vai contra jurisprudência já firmada do STA e afronta a jurisprudência do TJCE designadamente a sustentada no acórdão de 16 03 1999 Trummer e Mayer C.222/97, não podendo os residentes na União e os residentes em território português ter tratamento diferente.
No fundo aquilo que o recurso questiona é a compatibilidade da norma constante do artigo 43/2 do CIRS como artigo 56 do Tratado CE hoje artigo 63 do TFUE que a sentença considerou incompatível por violação do princípio de livre circulação de capitais.
Esta questão, como bem salienta o Mº Pº no seu parecer, foi até objecto de reenvio prejudicial por parte do STA e sobre ela se pronunciou TJCE no acórdão de 11 Outubro de 2007 in processo C 443/06 aí se deixando exarado:
"O artigo 56.º CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, no caso vertente em Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado-Membro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel."
Tendo em conta a doutrina deste acórdão e o estabelecido no artigo 72 n.º 1 do CIRS no qual a AT se fundamentou para não aplicar a redução dos 50 % à impugnante por a mesma não ser residente em território nacional, no mesmo sentido se pronunciou também o STA por diversas vezes designadamente nos acórdãos de 16 01 2008 in processo 439/06.
Aí se deixou dito:
Os n.os 1 e 2 do art. 43.º do CIRS estabelecem que "o valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes» e que «o saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efectuadas por residentes previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50 % do seu valor". (Redacção da Lei 109-B/2001, de 27 de Dezembro.)
A administração tributária, na liquidação impugnada, interpretou este n.º 2 como aplicando-se apenas a residentes em Portugal, entendendo que, em relação a cidadãos residentes no estrangeiro, inclusivamente num Estado-Membro da União Europeia, deve ser considerado, para efeito daquela tributação, 100 % do saldo referido.
Este entendimento consubstancia-se num tratamento diferenciado dos cidadãos da União Europeia residentes e não residentes em Portugal.
Como se vê pelo acórdão do T.J.C.E., a operação de liquidação de um investimento imobiliário, como a que está em causa neste processo, constitui um movimento de capitais, à face da jurisprudência daquele Tribunal (Acórdão de 16 de Março de 1999, Trummer e Mayer, C-222/97, Colect., p. I-1661, n.º 24), sendo, por isso, abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 56.º do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia.
Este artigo 56.º estabelece o seguinte:
1 - No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.
2 - No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos pagamentos entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.
De harmonia com o decidido pelo T.J.C.E. no acórdão junto aos autos «o artigo 56.º CE proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros, sem prejuízo das justificações previstas no artigo 58.º CE»;
«as disposições conjugadas do CIRS prevêem, para as mais-valias realizadas aquando da alienação onerosa de um bem imóvel sito em Portugal, regras fiscais diferentes consoante os sujeitos passivos residam ou não nesse Estado-Membro»;
«nos termos do artigo 43.º, n.º 2, do CIRS, o montante das mais-valias realizadas por residentes aquando da alienação de bens imóveis em Portugal é apenas considerado em 50 % do seu valor. Ao invés, para os não residentes, o CIRS prevê que a tributação do valor das mais-valias realizadas no caso de alienação dos referidos bens incide sobre a totalidade deste valor»;
«Daqui decorre que, nos termos das disposições pertinentes do CIRS, a tributação das mais-valias realizadas não é a mesma para residentes e não residentes. Assim, no que diz respeito à venda de um mesmo bem imóvel sito em Portugal, no caso de realização de mais-valias, os não residentes estão sujeitos a uma carga fiscal superior àquela que é aplicada a residentes, encontrando-se, portanto, numa situação menos favorável que estes últimos.
«(...) uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal tem por efeito tornar a transferência de capitais menos atractiva para os não residentes, dissuadindo-os de efectuar investimentos imobiliários em Portugal e, consequentemente, operações relacionadas com estes investimentos, tal como a venda de um bem imóvel.
Nestas condições, cabe concluir que o facto de se prever uma limitação da tributação a 50 % das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pelo artigo 56.º CE.
Assim, à face do decidido neste acórdão do T.J.C.E., o n.º 2 do art. 43.º do CIRS, ao limitar a residentes em território nacional, para efeitos de determinação da matéria tributável de IRS, a redução a 50 % do saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas em cada ano é incompatível com o referido art. 56.º
Nos termos do art. 8.º, n.º 4, da CRP «as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático».
Desta norma decorre, por força da Constituição, que as disposições do Tratado referido, que rege a União Europeia, prevalecem sobre as normas de direito ordinário nacional, nos termos definidos pelos órgãos do direito da União, desde que respeitem os princípios fundamentais do Estado de direito democrático."
Ora foi alicerçada nesta doutrina e jurisprudência que se impõe ao Tribunal que a sentença perfilhou ao julgar a impugnação judicial parcialmente procedente por o acto impugnado que aplicou o artigo 43/2 do CIRS ser incompatível como citado artigo 56.º do Tratado CE, o que traduz violação de lei.
Por isso a sentença não merece censura.
A tese formulada, da incompatibilidade da discriminação entre cidadãos residentes e não residentes e da consequente restrição à circulação de capitais, com a ordem jurídica da União Europeia colhe o nosso acordo, quando por mais não seja por força da decisão, vinculativa para o STA, do TJUE.
Quid juris, porém, quanto às consequências práticas da desconformidade.
O acórdão invocado deixa por esgotar a questão de saber qual a solução metodológico-jurídica para a desconformidade do n.º 2 do artigo 43.º sub judicibus com o artigo 56.º do Tratado. Na verdade, da anulação do acto emitido com fundamento em ter por fundamento uma norma ilegal não resulta a emergência de uma qualquer nova norma legal, apenas se segue a desaplicação da norma ilegal, tendo o caso concreto que ser regulado pelo que resta da ordem jurídica...
Dir-se-ia, então, que a desconformidade da norma nacional em causa deveria dar lugar à sua desaplicação, atentos os termos do citado artigo 8.º n.º 4 da Constituição, e da desaplicação resultaria, simplesmente, o desaparecimento do limite de 50 % para residentes, de maneira que por aplicação dos restantes n.os do artigo 43.º do CIRS (redacção sub juditio) todas as mais valias referidas nas alíneas a) c) e d) do artigo 10.º do CIRS passariam a ser tributadas na totalidade.
A ser assim, a Recorrente não teria qualquer direito a ser tributado a 50 %.
Mas isso significaria erigir a excepção em regra, ou aquilo que o legislador supôs ser minoria, em maioria, desvirtuando por completo o desígnio legislativo.
Considerar residentes, para efeitos da norma, apenas os residentes na união é solução interpretativa que, além de prescindir totalmente do elemento histórico e subjectivo da interpretação das Leis, ignora a irrestrição de movimentos de capitais mesmo entre estados membros e estados não membros, preconizada no citado artigo 56.º do Tratado, actualmente artigo no 63.º do Tratado de funcionamento da União Europeia.
Consentânea com o desígnio da norma, de um ponto de vista objectivo e actual, é estender a limitação de 50 % a todas as mais valias quejandas (as das alªs a) c) e d) do artigo 10.º do CIRS), numa interpretação correctiva, não do legislador histórico e subjectivo, mas do legislador actual e objectivo (aqui, um sujeito meramente normativo) que se respiga da ordem jurídica comunitária e nacional no seu conjunto.
Assim, há que considerar como não escrito, no n.º 2 do artigo 43.ºº do CIRS (redacção em vigor em 2015) a expressão "por residentes", pelo que assistia à Recorrente o direito a ver considerados, para efeito da determinação da mais valia correspondente à venda do prédio de... em 2015, apenas 50 %, não a totalidade da diferença entre o valor considerado como de aquisição e o de realização, como considerou o acto da liquidação de IRS de 2015, aqui impugnado.
Resulta do exposto que o recurso da Impugnante haverá de proceder quanto à parte da liquidação do IRS de 2015 resultante da consideração da mais valia proveniente da venda do prédio de... em 100 % do seu valor. ...".
A partir daqui, temos que a situação fáctica é semelhante, uma vez que se trata de venda de imóvel localizado no nosso país, por parte de sujeito passivo não residente e sem estabelecimento estável em Portugal, sujeito a tributação em sede de IRC, sendo incontroverso que a solução jurídica adoptada na decisão arbitral recorrida e no acórdão fundamento é contraditória, uma vez que a primeira considerou que a matéria tributável das mais-valias proveniente da venda dos imóveis é de 100 %, enquanto o segundo considerou que apenas se deve considerar 50 % das mesmas, sendo que o normativo legal em apreço, em ambos os processos, respeita às normas que prevêem o regime de cálculo e quantificação das mais-valias (o Acórdão do TCA Norte reportou-se ao disposto no artigo 43.º n.º 2 do CIRS, na redacção vigente), sendo que a redacção do artigo 43.º n.º 2, alínea b) do CIRS, apesar de ter sido alterada pela Lei 71/2018, de 31-12, manteve a mesma previsão legal, o que significa que a questão jurídica em discussão é a mesma, na decisão recorrida e no acórdão fundamento, além de que a factualidade essencial é, de igual modo, idêntica nas duas decisões, verificando-se também preenchido o requisito da contradição de julgados ser expressa.
Por último, diga-se que em qualquer das situações não se pode afirmar que a orientação perfilhada no acórdão arbitral recorrido esteja de acordo com jurisprudência recente e consolidada do S.T.A., no que diz respeito à questão de direito que ora nos ocupa.
Em conclusão, em qualquer dos casos, mostram-se reunidos os requisitos do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no art. 25.º n.º 2 do R.J.A.T. e no art. 152.º do C.P.T.A., pelo que se passará ao conhecimento do mérito do recurso.
2.2.2 - Do Mérito do Recurso
Como já ficou dito, a Recorrente identifica a questão fundamental de direito, objecto de contradição entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão fundamento com referência à forma de calcular e quantificar as mais-valias para efeitos de tributação, em sede de IRC, quando o sujeito passivo do tributo seja uma pessoa colectiva não residente e sem estabelecimento estável em Portugal.
Nesta matéria, e considerando a matéria vertida nas aludidas decisões, tem de dizer-se que a jurisprudência deste Supremo Tribunal é inequívoca no sentido da aplicação do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 43.º do CIRS a não-residentes (residentes em outros estados-membros ou em países terceiros) que sejam pessoas singulares (Acórdãos deste Supremo Tribunal (Pleno) de 09-12-2020, Procs. n.os 064/20.0 BALSB e 075/20.6BALSB e de 24-02-2021, Proc. n.º 58/20.6BALSB, todos disponíveis em www.dgsi.pt)
Por outro lado, pode dizer que tal jurisprudência constitui um acto claro, à luz da jurisprudência do TJUE, tal como resulta do acórdão do TJUE de 11-10-2007, Hollmann, C-443/06 apontado pela Recorrente e do acórdão do TJUE, de 18-03-2021, MK, C-388/19, sendo que tem de ser salientado que tais arestos referem-se a mais-valias imobiliárias obtidas em Portugal por não residentes que sejam pessoas singulares.
Avançando, diga-se que a análise da realidade em apreço depende da questão de saber se a jurisprudência enunciada deverá também ser aplicável a pessoas colectivas, não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal, dada a remissão do artigo 56.º do CIRC, para o artigo 43.º do CIRS.
Num primeiro momento, temos que, de acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do IRC, as sociedades residentes e os estabelecimentos estáveis de não residentes são tributadas pelo lucro, sendo que relativamente às sociedades não residentes, sem estabelecimento estável, o CIRC remete para o CIRS pois o legislador terá considerado não se justificar o fenómeno de atracção, dado o carácter esporádico da obtenção de rendimentos no nosso país, por um lado, e não existir, à normal disposição da AT, contabilidade que permita identificar todos os rendimentos obtidos e proceder ao cálculo do lucro tributável a partir das regras contabilísticas, por outro.
Assim, o já referido art. 56.º n.º 1 do CIRC dispõe que "os rendimentos não imputáveis a estabelecimento estável situado em território português, obtidos por sociedades e outras entidades não residentes, são determinados de acordo com as regras estabelecidas para as categorias correspondentes para efeitos de IRS".
Nesta sequência, cabe notar que só integram a matéria colectável destes sujeitos passivos os rendimentos, obtidos em Portugal, tipificados nas diferentes categorias do IRS, o que é particularmente relevante no caso das mais-valias uma vez que este imposto só considera tributáveis algumas mais-valias, entre as quais as imobiliárias, quando, estando em causa a tributação do lucro, todas as mais-valias concorrem para o cálculo da matéria colectável e as regras de quantificação aplicáveis (no caso, para o cálculo do valor da mais-valia obtidas) são as previstas no CIRC e não as regras contabilísticas com eventuais ajustes ditados por normas fiscais como sucede relativamente às sociedades residentes e aos estabelecimentos estáveis de sociedades não residentes.
Assim sendo, tem de afirmar-se que as sociedades não residentes sem estabelecimento estável não são, nem passam a ser por força do artigo 56.º do CIRS, sujeitos passivos de IRS, continuando a ser sujeitos passivos de IRC, como resulta claro do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea c) do CIRC, pois que apenas o âmbito da incidência real, em sentido amplo, incluindo as normas relativas à quantificação matéria colectável, é determinado por aplicação das regras do CIRS (artigo 3.º, alínea d) do CIRC).
Além disso, e com referência à razão pela qual, por regra, as mais-valias imobiliárias apenas são consideradas em 50 % para efeitos da sua integração na matéria colectável de IRS nos termos do art. 43.º n.º 1 alínea b) do CIRS, crê-se pertinente a alusão à declaração do Sr. Cons. Gustavo Lopes Courinha no âmbito do Acórdão deste Supremo Tribunal (Pleno) de 09-12-2020, Proc. n.º 064/20.0 BALSB, www.dgsi.pt quando refere que "...esta solução de consideração a 50 % de tais valores para efeitos da base tributável foi pensada - e só nessa medida faz que o legislador entendido - para casos de aplicação das taxas progressivas e no pressuposto do englobamento da generalidade dos rendimentos obtidos pelo sujeito passivo, pois só nesses casos se verifica o risco de as muito elevadas taxas dos escalões superiores de IRS se estenderem às demais categorias de rendimentos. Não havendo, manifestamente, um tal risco no caso dos sujeitos não residentes, não faz sentido a aplicação obrigatória deste regime a tais sujeitos. ...".
Deste modo, resulta claro que a alínea b) do n.º 2 do artigo 43.º do CIRS não cabe na remissão operada pelo artigo 56.º do CIRC, pois não integra as normas de incidência real, em sentido amplo, as regras de determinação, no dizer de tal norma, deste imposto, sendo que também não está em causa um benefício fiscal, pois a redução da tributação das mais-valias obtidas por pessoas singulares não surge ditada por quaisquer motivações extra-fiscais, que dificilmente se justificariam, atenta a natureza deste tipo de rendimento, assumindo a natureza de desagravamento estrutural, no sentido de que é uma medida normativa que estabelece uma limitação negativa da incidência normal (art. 4.º n.º 2 do EBF), visando eliminar "perversões" (no caso, situações de sobre tributação ofensivas do princípio da capacidade contributiva) que, de outro modo ocorreriam no imposto em que se insere.
Em suma, por ser uma medida que integra a estrutura do IRS, aí necessária por estar causa um tipo de rendimento - mais-valia imobiliária - obrigatoriamente sujeito a englobamento e, consequentemente, à aplicação de taxas progressivas, a mesma não pode ser estendida ao IRC, o qual não a prevê dado que a sua diferente estrutura (inexistência de taxas progressivas) o torna desnecessário.
Nesta matéria, importa ainda salientar que o acórdão Holmann, invocado pela Recorrente é claro quanto à sua razão de decidir: o facto de se prever uma limitação da tributação a 50 % das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pelo artigo 56.º CE [actual artigo 63.º TFUE] [não existindo] objectivamente nenhuma diferença de situação que justifique a desigualdade de tratamento fiscal no que respeita à tributação de mais-valias entre as duas categorias de sujeitos passivos, sendo evidente que o decidido pelo TJUE assenta numa comparação entre a situação das pessoas singulares residentes e não residentes relativamente a tributação do tipo de rendimento em causa, mais-valias imobiliárias.
Pois bem, fazer equivaler a situação fiscal das pessoas singulares e a das pessoas colectivas - como pretende a Recorrente - não é o melhor caminho, na medida em que estão em causa impostos diferentes, assentes em princípios diferentes e, consequentemente, com normas diferentes, não sendo controvertido que a Recorrente é uma sociedade não residente e, por tal razão preenche a incidência pessoal do IRC, o que significa que a sua situação tem que ser comparada com a das sociedades residentes, também sujeitas a IRC, verificando-se que as sociedades residentes são tributadas pela totalidade do saldo líquido das mais-valias (imobiliárias e mobiliárias) obtidas em cada exercício, por consideração dos valores assim obtidos como rendimento, havendo, também, lugar à dedução dos gastos por tal implicados, ou seja, as sociedades residentes não integram no seu rendimento tributável apenas 50 % do valor dos rendimentos qualificáveis como mais-valias imobiliárias, mas sim a totalidade.
Nesta medida, mostra-se inviável o pedido de reenvio prejudicial formulado pela Recorrente, pois que a adopção da sua pretensão, implica que as sociedades não residentes ficariam colocadas numa inaceitável situação de discriminação favorável, relativamente às sociedades residentes, se lhes fosse permitido incluir na sua matéria colectável 50 % do valor deste tipo de rendimento, porquanto, a discriminação negativa que acontecia relativamente às pessoas singulares, sujeitos passivos de IRS, que deu causa ao acórdão Hollmann e aos que se lhe seguiram, não existe relativamente à obtenção de mais-valias por sociedades residentes e sociedades não residentes, ou seja, os elementos alinhados nesta sede não podem ser transpostos para o caso das sociedades, sujeitos passivos de IRC, por manifesta falta de analogia estre as duas situações tributárias.
2.2.3 - Conclusão
A matéria colectável das mais-valias realizadas na venda de imóvel localizado no nosso país, por parte de sociedade não residente e sem estabelecimento estável em Portugal, incide sobre a sua totalidade, não sendo aplicável a redução de 50 %, prevista no artigo 43.º, n.º 2, alínea b) do CIRS.
2.2.4 - DA DISPENSA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
Nos termos do n.º 7 do art. 6.º do RCP, «[n]as causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento».
Mais tem vindo a considerar a jurisprudência constitucional que «os critérios de cálculo da taxa de justiça, integrando normação que condiciona o exercício do direito fundamental de acesso à justiça (art. 20.º da Constituição), constituem, pois, a essa luz, zona constitucionalmente sensível, sujeita, por isso, a parâmetros de conformação material que garantam um mínimo de proporcionalidade entre o valor cobrado ao cidadão que recorre ao sistema público de administração da justiça e o custo/utilidade do serviço que efectivamente lhe foi prestado (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da mesma Lei Fundamental), de modo a impedir a adopção de soluções de tal modo onerosas que se convertam em obstáculos práticos ao efectivo exercício de um tal direito».
É certo que o juízo de proporcionalidade entre a taxa cobrada e o valor do serviço prestado se apresenta como problemático, pois envolve a ponderação de diversas variáveis, nem todas objectivas. Mas nem por isso o tribunal se pode eximir do mesmo.
Assim, aplicando a referida interpretação normativa ao caso dos autos, ponderada a tramitação dos autos e o comportamento processual da ora Recorrente, mas também o elevado valor da causa (mais de seiscentos mil euros) e a utilidade económica dos interesses a ela associados, a complexidade da questões submetidas a juízo - que se situa na média -, considera-se adequado dispensar a Recorrente e Recorrida do pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que corresponderia ao excesso sobre o valor tributário de (euro) 275.000.
3 - DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em tomar conhecimento do mérito do recurso e, nesta sequência, negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão arbitral recorrida, uniformizando-se a jurisprudência nos termos descritos em 2.2.3..
Custas pela Recorrente, com dispensa de ambas as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça, pelo montante superior a (euro) 275.000.
Notifique-se. D.N..
Comunique ao CAAD.
Lisboa, 24 de Janeiro de 2024. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Anabela Ferreira Alves e Russo - Fernanda de Fátima Esteves.
117400974