Decreto 14/93
de 3 de Maio
Nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 200.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo único. É aprovado, para ratificação, o Acordo Quadro de Cooperação entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, assinado em Brasília, em 7 de Maio de 1991, cuja versão autêntica segue em anexo ao presente decreto.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 4 de Março de 1993. - Aníbal António Cavaco Silva - Jorge Braga de Macedo - Luís Francisco Valente de Oliveira - José Manuel Durão Barroso - Arlindo Marques da Cunha - Luís Fernando Mira Amaral - Joaquim Martins Ferreira do Amaral - Fernando Manuel Barbosa Faria de Oliveira - Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Ratificado em 2 de Abril de 1993.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 6 de Abril de 1993.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.
ACORDO QUADRO DE COOPERAÇÃO ENTRE A REPÚBLICA PORTUGUESA E A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
O Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil:
Conscientes de que os vínculos históricos e culturais que unem os povos dos dois países irmãos conferem uma dimensão especial às relações bilaterais entre Portugal e Brasil;
Considerando que o desejo de fortalecer os seculares laços de amizade se mantém vivo e actuante em todos os domínios desse relacionamento;
Conscientes de que a democracia e o respeito pela dignidade da pessoa humana são o único e legítimo meio de responder às necessidades e aspirações dos povos, com vista a alcançar o pleno desenvolvimento económico e a paz social em que se encontram empenhados;
Considerando que o crescimento económico de ambos os países contribui para a estabilidade política e social, para o fortalecimento das instituições democráticas e para a melhoria do nível de vida dos seus povos;
Considerando que a activa participação de Portugal e do Brasil nos distintos fora regionais, designadamente de Portugal nas Comunidades Europeias e do Brasil no processo de integração latino-americano, especialmente no âmbito do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul, contribui para a intensificação das relações e para a consolidação da aproximação entre a Europa e a América Latina;
Considerando que ambos os países encaram o desenvolvimento económico não só como um direito inalienável mas também como uma condição necessária para o progresso e a justiça social, para a consolidação das liberdades e para a preservação da paz internacional;
Conscientes de que a modernização das estruturas produtivas, comerciais e de serviços de ambos os países é condição essencial do desenvolvimento no mundo interdependente e multipolar em que nos encontramos;
Desejosos de promover o desenvolvimento e a diversificação das relações económicas entre os dois países;
Conscientes dos vínculos existentes entre dívida, comércio e investimento e de que a dívida externa tem constituído um dos principais factores que dificulta a estabilidade e o crescimento das economias latino-americanas;
Considerando que ambos os países julgam imprescindível desenvolver esforços a nível internacional para que seja alcançado o melhor nível de vida dos seus povos, erradicando a probreza e promovendo a protecção do meio ambiente;
Tendo em consideração as disposições do Acordo de Cooperação entre a Comunidade Económica Europeia e a República Federativa do Brasil, assinado em 18 de Setembro de 1980;
Inspirados no Tratado de Amizade e Consulta assinado em 16 de Novembro de 1953 e imbuídos da vontade de dinamizar e concretizar o quadro global do relacionamento bilateral existente;
convieram nas disposições seguintes:
CAPÍTULO I
Cooperação política
Artigo 1.º
As duas Partes acordam em:
a) Intensificar a realização de visitas recíprocas dos seus respectivos Chefes de Governo e ministros, tendo em vista o fortalecimento e a consolidação do diálogo político entre os dois países;
b) Realizar cimeiras anuais dos Chefes dos dois Governos, que poderão ser acompanhados por vários membros dos respectivos executivos, para debater questões de natureza bilateral e problemas internacionais de interesse comum;
c) Realizar encontros entre os responsáveis da política externa de ambos os países, quer em Portugal e no Brasil, quer no âmbito dos diversos organismos regionais e multilaterais, para analisar assuntos de índole bilateral ou internacional, bem como a cooperação entre a Comunidade Europeia e o Grupo do Rio e os processos regionais de integração europeia e latino-americana.
CAPÍTULO II
Cooperação económica
Artigo 2.º
As duas Partes encorajarão e esforçar-se-ão por promover o desenvolvimento e a diversificação das relações económicas entre os dois países através da cooperação económica nas suas diversas vertentes, contribuindo assim para a dinamização e modernização das suas economias, sem prejuízo dos compromissos internacionais assumidos por cada uma delas.
Artigo 3.º
As duas Partes acordaram que, para impulsionar e fomentar as relações económicas e industriais entre os dois países, é necessário:
a) Realizar uma adequada e constante promoção e difusão das possibilidades e do potencial de cooperação económica e industrial bilateral;
b) Fomentar a cooperação económica e industrial com vista ao desenvolvimento dos sectores produtivos, designadamente das respectivas estruturas industriais e do progresso tecnológico, e de serviços, através da celebração de acordos de cooperação e de associação entre empresas portuguesas e brasileiras;
c) Promover a realização de projectos de investimento, co-investimento e transferência de tecnologia que permitam a ambos os países desenvolver actividades novas com o fim de situar as indústrias portuguesa e brasileira num avançado nível tecnológico e competitivo no plano internacional.
Artigo 4.º
Para alcançar os objectivos assinalados nos artigos anteriores, ambas as Partes decidiram promover, designadamente:
a) A realização conjunta de estudos e projectos de desenvolvimento industrial, de aproveitamento e valorização dos recursos naturais e de transformação de matérias-primas;
b) A cooperação entre instituições e empresas dos dois países, nomeadamente nas áreas da pesquisa e desenvolvimento tecnológico, da energia, da metrologia e qualidade e da propriedade industrial;
c) A coordenação das posições nos organismos internacionais sobre a estabilização de preços e mercados de matérias-primas;
d) O desenvolvimento da cooperação entre empresas e associações empresariais de ambos os países, tendo em vista a maximização das potencialidades das respectivas economias;
e) A difusão sistemática de informações e a realização de acções de sensibilização sobre as potencialidades que a realidade económico-financeira de Portugal e do Brasil oferece aos agentes económicos dos dois países, por forma a permitir a elaboração de estratégias de desenvolvimento das actividades empresariais a médio e longo prazos;
f) O intercâmbio sistemático e recíproco de informações sobre concursos públicos (concorrências públicas) nacionais e internacionais, mediante a criação de um mecanismo susceptível de facilitar o rápido acesso dos agentes económicos portugueses e brasileiros às informações em causa;
g) A realização de acções de divulgação e de promoção da capacidade da oferta de bens e de serviços de cada uma das Partes e das oportunidades de investimento nos dois países;
h) A colaboração entre empresas dos dois países para a realização de projectos conjuntos de investimento, com vista ao desenvolvimento dos sectores produtivos e de serviços, quer em Portugal e no Brasil, quer em terceiros mercados, designadamente através da constituição de joint-ventures, privilegiando as áreas de integração em que os dois países se enquadram.
Artigo 5.º
Tendo em vista a concretização dos artigos anteriores, as duas Partes comprometeram-se a:
a) Envidar esforços para promover a revisão dos acordos sectoriais ainda em vigor, de modo a adaptá-los à nova realidade que envolve os dois países, bem como, se necessário, encetar negociações para a celebração de novos acordos de enquadramento da cooperação económica, nomeadamente na área da promoção de investimentos;
b) Fomentar acções tendentes ao desenvolvimento dos meios de comunicação entre os dois países, nomeadamente nas áreas dos transportes e das telecomunicações;
c) Apoiar o desenvolvimento dos contactos entre as instituições financeiras de ambos os países, de forma a encontrar instrumentos adequados para dotar a cooperação económica;
d) Fomentar contactos entre instituições, organizações e empresas com atribuições nas áreas do comércio, da indústria e do investimento de ambos os países, de modo a definir formas, modalidades e condições para a cooperação.
Artigo 6.º
Sem prejuízo do desenvolvimento da cooperação nos diversos domínios abrangidos pelo presente Acordo, as duas Partes identificaram os objectivos a alcançar nas seguintes áreas específicas de interesse mútuo:
a) Agricultura:
Intensificar o intercâmbio de informação, designadamente através do levantamento de documentação sobre agricultura tropical existente nos dois países, para divulgação nos meios técnicos;
Realizar estudos e projectos conjuntos nos domínios agrícola, da agro-indústria e da aquacultura;
Desenvolver acções de investigação nos domínios que ambas as Partes venham a identificar;
Promover acções de formação técnica e profissional;
Estimular a criação de joint-ventures nas áreas da exploração, da produção, da industrialização e da comercialização de produtos agrícolas, bem como a transferência de tecnologia;
b) Pescas:
Elaborar e executar projectos de desenvolvimento da pesca e de indústrias conexas com recursos a meios técnicos e financeiros de ambos os países ou fornecidos por terceiros países ou organizações internacionais;
Desenvolver acções conjuntas nos domínios da formação profissional e técnica e da pesquisa científica;
Promover relações empresariais no domínio das pescas, incentivando a criação de associações de interesses com vista à exploração dos recursos haliêuticos, à valorização e comercialização de produtos pesqueiros e em outras actividades complementares da pesca;
c) Recursos naturais e ambiente:
Promover a cooperação em matéria de planificação e gestão de parques naturais e nacionais e nos domínios da formação em matéria ambiental e do aproveitamento de energias alternativas;
Fomentar a troca de informações e a cooperação no seio de organizações internacionais competentes em matéria de ambiente;
d) Indústria:
Fomentar a troca de informações e a cooperação no seio de organizações internacionais competentes, no domínio da indústria extractiva;
Promover a elaboração conjunta de projectos no sector da construção, ampliação e modernização de unidades industriais, bem como o fornecimento de equipamento e execução de trabalhos de construção e montagem;
Promover a cooperação industrial no domínio da transformação de matérias-primas, produção conjunta de artigos manufacturados, fornecimento de peças e materiais e transferência de tecnologia destinados à produção de equipamentos e outros materiais não só em Portugal e no Brasil mas também em terceiros países;
Fomentar a troca periódica de informações estatísticas relativas aos investimentos sectoriais, bem como à evolução do mercado, no domínio siderúrgico;
e) Energia:
Promover a cooperação em matéria de planeamento energético, utilização racional de energia e aproveitamento de energias renováveis;
Fomentar a cooperação empresarial, promover investimentos recíprocos e desenvolver acções conjuntas em terceiros países;
Fomentar a troca de informação e de experiências, nomeadamente em matéria de combustíveis alternativos e de gás natural, e a transferência de tecnologia;
f) Turismo:
Fomentar a coordenação entre os órgãos oficiais, empresas, organizações e instituições de turismo dos dois países;
Promover a cooperação técnica no sector, incluindo actividades tais como intercâmbio de peritos no sector turístico, intercâmbio de informações diversas de utilidade para o sector, concessão de assistência mútua em campanhas de promoção turística, realização de estudos turísticos conjuntos e promoção de programas diversos, visando o fluxo turístico nos dois sentidos;
Oferecer vagas em instituições de ensino superior e médio na área de turismo, de modo a favorecer a formação de técnicos e de pessoal especializado em turismo;
Estimular investimentos recíprocos e formação de empresas mistas (joint-ventures), com vista a ampliar nos dois países a infra-estrutura turística e o fluxo turístico bilateral;
g) Comunicações:
Intensificar a cooperação no domínio das telecomunicações e dos serviços postais, tendo em vista a posição geoestratégica que cada país ocupa nos planos regional e internacional;
Estimular a cooperação empresarial na participação e exploração de serviços na área das telecomunicações no Brasil e em Portugal, bem como desenvolver acções conjuntas em terceiros países;
Ampliar o intercâmbio de informações técnicas sobre a exploração de serviços postais e telecomunicações, bem como de quaisquer outros sectores técnicos, administrativos, económicos e jurídicos relacionados com tais actividades;
Promover a concertação de posições no âmbito dos organismos internacionais de correios e telecomunicações;
h) Pesquisa científica e tecnológica:
Apoiar a cooperação científica e tecnológica desenvolvida no âmbito de convénios ou acordos entre instituições portuguesas e brasileiras;
Intensificar o intercâmbio e estimular a formação avançada de cientistas, pesquisadores e tecnólogos de ambos os países nas respectivas instituições;
Fomentar a participação de institutos de pesquisa e empresas em programas de cooperação no domínio da ciência e tecnologia e estabelecer programas concretos em áreas científicas predeterminadas por interesses comuns, nomeadamente nos de tecnologias da informação, biotecnologia, microelectrónica, ciência e tecnologia dos materiais, detecção remota e informação geo-referenciada, energia e ciências agrárias;
Promover o acesso do Brasil aos programas europeus de pesquisa e desenvolvimento, através de acções concretas e de colaboração com Portugal, bem como estreitar a cooperação no âmbito de organizações de carácter multilateral, em especial no Programa Ibero-Americano de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento (CYTED-D);
Manter e aprofundar a colaboração no domínio de informação científica e técnica, tendo por base a utilização e difusão da terminologia científica e técnica em língua portuguesa;
Desenvolver as iniciativas acima, levando em consideração, inter alia, o disposto no Acordo de Cooperação Científica e Tecnológica vigente entre as duas Partes.
Artigo 7.º
Para assegurar a execução do presente Acordo Quadro de Cooperação, as duas Partes decidiram instituir a Comissão Ministerial de Cooperação Luso-Brasileira, presidida pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal e pelo Ministro das Relações Exteriores do Brasil, que funcionará como órgão de coordenação da cooperação bilateral.
A Comissão Ministerial de Cooperação terá por funções zelar pelo cumprimento dos objectivos fixados neste Acordo, analisar e avaliar as relações bilaterais nos domínios da cooperação já estabelecidos e propor novos domínios de cooperação em que as Partes acordem, fazendo uso, sempre que necessário, das comissões mistas e grupos de trabalho existentes entre os dois países.
Com vista a atingir esta finalidade, poderão ser criadas subcomissões, de nível ministerial, para análise de formas de cooperação e de projectos em domínios específicos e cujas conclusões serão submetidas à Comissão Ministerial de Cooperação.
A Comissão Ministerial de Cooperação reunir-se-á pelo menos uma vez por ano, alternadamente em Portugal e no Brasil, ou sempre que alguma das Partes o considere oportuno.
A composição das delegações que participam nas reuniões da Comissão Ministerial de Cooperação, bem como a data, local e respectiva ordem de trabalhos, serão estabelecidos por via diplomática.
Artigo 8.º
O presente Acordo Quadro de Cooperação será válido por um período de cinco anos, contados a partir da data da sua entrada em vigor. A menos que uma notificação de denúncia seja feita por uma Parte à outra Parte seis meses antes do termo daquele período, o Acordo renovar-se-á por tácita recondução por períodos sucessivos de um ano. Neste caso, poderá ser denunciado por aviso prévio de três meses, contados a partir do termo do período para o qual haja sido reconduzido.
Artigo 9.º
O presente Acordo Quadro entrará em vigor 30 dias após a data da recepção da segunda das notas pelas quais as duas Partes comunicarem reciprocamente a sua aprovação em conformidade com os processos constitucionais de ambos os países.
Feito em Brasília, aos 7 dias do mês de Maio de 1991, em dois exemplares originais em língua portuguesa, sendo ambos autênticos.
Pelo Governo da República Portuguesa:
João de Deus Rogado Salvador Pinheiro.
Pelo Governo da República Federativa do Brasil:
Francisco Rezek.