Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma Dos Açores 25/2022/A, de 23 de Junho
- Corpo emitente: Região Autónoma dos Açores - Assembleia Legislativa
- Fonte: Diário da República n.º 120/2022, Série I de 2022-06-23
- Data: 2022-06-23
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Sumário
Revisão do regime da prestação do trabalho médico extraordinário nos serviços de urgência e de atendimento permanente das unidades de saúde de ilha com serviço de urgência
Texto do documento
Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 25/2022/A
Sumário: Revisão do regime da prestação do trabalho médico extraordinário nos serviços de urgência e de atendimento permanente das unidades de saúde de ilha com serviço de urgência.
Revisão do regime da prestação do trabalho médico extraordinário nos serviços de urgência e de atendimento permanente das unidades de saúde de ilha com serviço de urgência
Portugal e muitos países europeus debatem-se com crises sanitárias que, quer durante a pandemia, quer posteriormente, em pleno tempo de recuperação, vieram realçar a incapacidade de resposta do setor público e também, inclusivamente, do privado. A desorçamentação, a falta de estratégia e planeamento, o deficit de pessoal e o envelhecimento de classes profissionais estão possivelmente entre as causas fundamentais dessa crise no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
A Região Autónoma dos Açores (RAA) não foge a esta regra, agravada pelas condições geográficas em que se insere. Urge, pois, com celeridade, investir nas infraestruturas e no parque tecnológico, na fixação de profissionais e apelar a mais um esforço suplementar, se é que tal ainda é possível, do pessoal no ativo, para que, até à melhoria desta situação, continue a dar a melhor resposta possível à nossa comunidade em cuidados de saúde.
E ainda que as condições económicas e financeiras do Estado sejam, desde há muito, periclitantes, a ajuda europeia e as escolhas políticas devem centrar-se na melhoria deste panorama a médio prazo. A prioridade e consequentes opções políticas orçamentais só podem ser, pois, no sentido de privilegiar a saúde da nossa população. É o que se exige a quem nos governa.
Os médicos fazem parte de uma carreira especial da Administração Pública. Segundo o acordo coletivo de trabalho (ACT) médico em vigor, o período normal de trabalho médico é de 8 horas diárias e 40 horas semanais, organizadas de segunda-feira a sexta-feira, sendo o trabalho em serviços de urgência, externa e interna, unidades de cuidados intensivos, unidades de cuidados intermédios e prolongamentos de horário nos centros de saúde organizado de segunda-feira a domingo.
Ainda de acordo com o mesmo ACT, para os trabalhadores médicos integrados em serviços de urgência, externa e interna, unidades de cuidados intensivos, unidades de cuidados intermédios e prolongamentos de horário nos centros de saúde, considera-se «período de trabalho noturno» o compreendido entre as 20 horas e as 8 horas do dia seguinte.
Relativamente ao trabalho extraordinário, aquele que é feito para além do normal horário de trabalho, o trabalhador médico é obrigado a realizar a prestação de trabalho extraordinário, salvo quando, havendo motivos atendíveis e inadiáveis, expressamente solicite e obtenha a sua dispensa pelo tempo indispensável, sendo o limite anual da duração de trabalho extraordinário de 150 horas.
Nas instituições de saúde, habitualmente, o trabalho extraordinário, de acordo com o Decreto-Lei 62/79, de 30 de março, é efetuado em regime presencial ou em regime de prevenção, sendo este último remunerado a 50 % do valor anterior.
Os médicos acima dos 55 anos estão dispensados de realizar serviço de urgência e os que ultrapassem os 50 anos de idade de fazer trabalho noturno.
Por último, a legislação impede que os médicos prestem serviços, a título individual ou por empresa, nas mesmas instituições com as quais possuam uma relação jurídica de emprego.
A sustentação do nosso Serviço Regional de Saúde (SRS) sempre passou e passa, infelizmente, mas inevitavelmente, pelo recurso ao trabalho extraordinário, situação agravada pela falta de profissionais.
Genericamente, o trabalho extraordinário deve constituir apenas um regime de recurso, para situações excecionais e imprevisíveis, justificável quando tal seja imprescindível para o normal funcionamento de uma organização e não pode ser um modus operandi sistemático para evitar a contratação de pessoal.
No caso concreto dos médicos, acaba por ocorrer de uma forma previsível e regular, habitualmente ao nível do serviço de urgência, quer por escassez involuntária de profissionais, quer por escassez deliberada desses mesmos profissionais, neste caso, entenda-se, possivelmente pelo facto de não ser eficiente uma dotação excessiva de clínicos em determinados serviços e em determinadas instituições de saúde, exclusivamente para completar escalas dos serviços de urgência.
Na verdade, se o ratio de uma determinada especialidade para uma determinada população for tecnicamente de quatro ou cinco elementos, facilmente se entenderá que ou se admitem oito médicos, quatro ou três a mais do preconizado, o que é um número excessivo para desenvolver a atividade existente, mas que permite a cobertura dos dias de urgência em horário normal, ou se admitem somente os quatro ou cinco previstos e suficientes, mas então haverá necessidade de recurso ao trabalho suplementar para cobrir integralmente todos os sete dias da semana. Isto não ocorre por norma com outras classes.
A RAA é o paradigma desta crua realidade e haveria inúmeros exemplos a dar: seriam precisos oito médicos na Unidade de Saúde de Ilha (USI) do Corvo, com cerca de 400 habitantes e para um ratio recomendado de médico por habitante de um para 1500, para evitar o trabalho extraordinário, mudada a legislação, tal como, sabendo que deve existir uma urgência psiquiátrica para 250 000 habitantes, deveria haver oito psiquiatras no Hospital do Santo Espírito para apenas cerca de 60 000 habitantes, de modo a possibilitar essa mesma cobertura integral, ou seriam necessários oito gastroenterologistas no Hospital da Horta para este mesmo efeito, cobrindo uma população de apenas 35 000 habitantes, quando o ratio previsto nesta especialidade é de um para 30 000, etc.
Ora, esta questão não se coloca com outras classes, pois a maioria mantém os serviços durante as 24 horas com trabalho por turnos, regime inviável na classe médica, sendo também mais fácil fazer as devidas dotações por posto de trabalho, como é o caso das dotações seguras dos enfermeiros.
Nestes múltiplos cenários, numa região arquipelágica de 240 000 habitantes, com três hospitais e várias USI com urgências básicas, a ineficiência e os custos para o erário público em salários médicos seriam inclusivamente superiores aos despendidos em horas extraordinárias, como facilmente se demonstra, e os próprios médicos deixariam de exercer a medicina de forma regular e eficaz, com consequências futuras no seu curriculum e desempenho técnico.
Isto constituiu sempre um problema de difícil solução, em geral, e é por isso que cada vez mais se advoga a existência de um staff próprio nos serviços de urgência, com formação especializada na área, com escalas organizadas de segunda-feira a domingos e feriados, libertando, assim, o pessoal dos outros serviços para as atividades programadas, onde já cumprem praticamente todo o seu horário normal, de forma a reduzir ao mínimo o trabalho suplementar.
Apesar de o horário médico normal ser cumprido apenas nos dias úteis, das 8 às 20 horas, como acima se mencionou, existem exceções, designadamente nos serviços de urgência, onde as escalas podem ser organizadas de segunda-feira a domingo e feriados para as 24 horas. Neste caso, os médicos, que teriam de ser igualmente em número suficiente, cumprindo as horas semanais nesses períodos não auferiam horas extraordinárias em dias úteis nem durante os fins-de-semana e feriados, apenas suplementos pelas horas incómodas, mas, como contrapartida, a priori, não exerceriam mais tempo que o do seu horário habitual.
A realidade é que os médicos têm acedido realizar trabalho extraordinário, voluntariamente, por motivos éticos e deontológicos e também porque, devido aos seus baixos salários, sempre encontraram nesse trabalho extraordinário alguma forma de compensação, sobretudo quando não optam pela simultânea atividade privada. No entanto, a melhoria remuneratória da atividade privada, outrora os cortes nos cálculos das horas extraordinárias, o baixo valor/hora aliado à não progressão nas carreiras e as más condições laborais levaram cada vez mais profissionais a efetuar estritamente o trabalho suplementar previsto na legislação.
Aliás, mais do que nunca, nos dias de hoje, se fosse adotado o cumprimento de horários normais durante as noites e fins-de-semana, em função das urgências, sem recurso ao trabalho extraordinário, haveria certamente uma disrupção grave nos serviços e nas suas atividades de rotina.
A situação atual é, pois, altamente preocupante, pois é uma classe envelhecida, os concursos públicos ficam desertos, os médicos abandonam o SNS e já muitos dos que se mantêm recusam prolongar os horários de trabalho no serviço de urgência, seja por idade, seja pelo limite legal atrás enunciado. Também é sobejamente sabido que a dificuldade em contratar médicos é francamente superior que noutras classes do setor da saúde.
Portanto, se é certo que o trabalho extraordinário nunca deve prevalecer sobre a contratação de profissionais e não deve ultrapassar involuntariamente o limite plasmado na legislação, então, a ser de facto mesmo necessário e continuado, pelo menos acima daquele limite, pode e deve ter outra forma majorada na remuneração, como forma de recompensar o esforço acrescido a que os profissionais estão sujeitos.
Entretanto, convém realçar que esta escassez de pessoal no SNS abriu as portas aos prestadores médicos, a título individual ou através de empresas, médicos que ou não concorrem para as vagas existentes no SNS ou simplesmente as abandonam, criando um autêntico círculo vicioso no sistema.
De facto, durante a última década, vem-se assistindo a uma desnatação preocupante do SNS, tal como já alvitrado, como consequência dos baixos salários médicos, congelamentos remuneratórios e estagnação das carreiras, más condições físicas e tecnológicas das instituições, excessiva carga de trabalho à medida que outros profissionais abandonam os serviços, inexistência de incentivos à fixação médica em determinadas áreas geográficas e à maior proliferação de unidades privadas no perímetro do SNS, mais atrativas em termos pecuniários e não pecuniários.
Por todos estes motivos, os serviços ficaram cada vez mais dependentes desses prestadores, nem sempre com a qualidade desejável, com os riscos inerentes à irregularidade e rotatividade dessa prestação, que supostamente auferem um maior valor hora, por vezes inflacionado, mas de acordo com as leis do mercado, apesar da tentativa governamental em estabelecer um limite remuneratório.
Estes prestadores têm outra liberdade, podem escolher os locais, horários e períodos mensais de trabalho, não estão fixos numa única instituição e, como tal, preferem este regime, mesmo que sem uma proteção social mais robusta, como a proporcionada no serviço público. Até em alguns destes aspetos o setor público não teve a devida flexibilidade concorrencial.
Na RAA, que tem sido muito afetada pela sua realidade insular e ultraperiférica, foi já aprovada uma nova legislação com vista a melhorar as condições de fixação de especialistas. Não podendo os hospitais e USI depender exclusivamente de prestadores, que nem sequer sempre estão disponíveis, é necessário aliciar os médicos residentes, sobretudo os mais jovens, a realizar trabalho suplementar, note-se bem, na medida do possível, de forma totalmente voluntária, salvaguardando sempre o direito às folgas e descansos compensatórios e, sobretudo, com uma recompensa justa. Esta questão dos prestadores é também praticamente exclusiva na classe médica.
Calcular uma recompensa justa pelo trabalho extraordinário não é fácil, por múltiplas nuances, entre elas o referencial do valor variável recebido pelos prestadores. A este propósito, desde logo, há uma desmistificação que é necessário efetuar: o prestador está longe de acarretar para as instituições, numa grande parte dos casos, um valor bruto muito superior ao do médico do mapa de pessoal, como habitualmente é suposto, para além de não ter direito a subsídios de férias e de Natal, férias, folgas, descansos compensatórios, licenças, apoio na formação ou na doença. E, como uma grande parte faz trabalho pontual ou através de empresas, a instituição não contribui para a sua segurança social, como compete à entidade empregadora (23,75 % sobre o valor total a pagar), cabendo-lhe liquidar, a posteriori, esta contribuição e o IRS.
Apesar de tudo isto, a perceção do pessoal do mapa de que, pelo mesmo período de tempo e o mesmo tipo de trabalho, recebe menos que um prestador é em muitas situações verdade, quer em termos líquidos devido aos impostos e contribuições retidos na fonte, quer em termos brutos, sobretudo quando em causa estão médicos especialistas em início de carreira.
Nos Açores, acrescem quase sempre a este custo as despesas de deslocação, alojamento e muitas vezes viatura, pagos pela instituição, cujos valores são variáveis, e, quando divididos pelas horas totais trabalhadas, se o volume de tempo não for elevado, agravam o valor hora final. Por exemplo, considerando uma viagem de 250 (euro) e um mínimo de 280 (euro) por sete dias de alojamento, para uma prestação de 96 horas, o valor hora agrava-se em, pelo menos, 5,50 (euro). São, pois, valores relevantes que devem ser considerados.
Assim, qualquer aumento remuneratório das horas extraordinárias do pessoal do mapa, que será sempre um último recurso, deve ter em conta a capacidade orçamental, equiparar-se pelo menos em termos brutos com o valor dos prestadores oferecido pelos concorrentes, públicos e privados, a logística associada, bem como o seu montante final não deve contribuir para inflacionar este mercado de trabalho, se for demasiado elevado. É este o exercício a efetuar.
Na Madeira, a opção de estabelecer um valor fixo de 50 (euro) para todas as horas pode ser simplista, mas traz à colação algumas questões pertinentes. Desde logo, estabelece um referencial inflacionado para os próprios prestadores; aplicado nos Açores acarreta um esforço financeiro governamental maior por haver mais profissionais envolvidos em três hospitais e múltiplas USI com urgência básica, fruto da maior descontinuidade territorial, agrava os custos institucionais com o acréscimo nas prestações sociais e não discrimina positivamente as noites e os fins-de-semana.
Fazendo algumas comparações com base nos índices remuneratórios atuais das horas extraordinárias presenciais com outras hipóteses, é possível alcançar um ponto de equilíbrio.
Em 2022, e com base nos índices de cálculo vigentes, o salário de um especialista na primeira posição remuneratória da carreira médica é de 2779,27 (euro), correspondente a 16,03 (euro)/h ilíquidos, mas na realidade o custo efetivo para a instituição, considerando 14 salários e a segurança social, é de 23,24 (euro)/h. Para um médico institucional, o seu referencial é o seu valor base e daí haver uma importante causa na preferência pela prestação de serviços, com um valor hora mais elevado.
Quanto ao trabalho extraordinário, considerando esse valor base de 16,03 (euro)/h, atualmente uma noite de 12 horas em dia útil (20-8 horas), um sábado de 24 horas (8-8 horas) e um domingo ou feriado de 24 horas (8-8 horas) corresponde a um valor total ilíquido, respetivamente, de 380,81 (euro), 821,76 (euro) e 797,70 (euro). Porém, se consideramos a despesa da instituição com a segurança social, aqueles valores são, respetivamente, 471,25 (euro), 1016,92 (euro) e 987,15 (euro).
Ora, um prestador auferindo 40 (euro)/h custa à instituição pelos mesmos períodos, respetivamente, 480 (euro), 960 (euro) e 960 (euro), sem a logística. Ou seja, neste exemplo concreto, para efeitos práticos, um prestador cobra mais que um médico hospitalar à instituição, mas nomeadamente nos fins-de-semana sai mais barato quando considerados os custos da segurança social.
Daqui se infere igualmente que poderia ser tentador majorar somente as horas extraordinárias semanais do pessoal do mapa hospitalar, com salários menores, pois a diferença com o prestador é mais notória, mas esta medida parcial poderia ser nociva para completar escalas de fim-de-semana ou feriados, mesmo que estes últimos dias confiram direito à folga.
À medida que subimos na diferenciação e, logicamente, no salário base médico, o custo do prestador vai-se tornando, em termos comparativos, menos oneroso para a instituição. Por exemplo, de acordo ainda com a nova tabela, para um salário base da sexta posição de um assistente a 3091,94 (euro), ou seja, 17,84 (euro)/h, o valor bruto daqueles mesmos períodos é 423,66 (euro) (524,27 (euro) com segurança social), 914,20 (euro) (1131,32 (euro) com segurança social) e 887,45 (euro) (1098,21 (euro) com segurança social).
Um médico externo auferindo 40 (euro)/h, como acima mencionado, continuará a custar à instituição pelos mesmos períodos, respetivamente, 480 (euro), 960 (euro) e 960 (euro). O diferencial fica mais reduzido, obviamente sem as prestações sociais. No entanto, se este valor hora do prestador alcançar os 50 (euro), os montantes serão de 600 (euro), 1200 (euro) e 1200 (euro), ou seja, os custos finais institucionais com esta contratação já serão superiores, mesmo considerando o efeito das prestações sociais e não incluindo sequer a logística associada. Porém, repita-se, a perceção do médico público é bastante diferente.
Ora, eliminando também o diferencial entre a primeira hora extraordinária e as seguintes, que é inexplicavelmente menor, majorando os sábados entre as 8 e as 13 horas, cujo índice passaria de 1,5 para 2, tendo o mesmo valor de que o das 13 às 20 horas, pois o sábado não faz parte do normal horário médico, majorando as noites de semana, cujo índice passaria de 2 para 2,125 das 20 horas de segunda-feira até às 8 horas de sábado e para 2,25 às segundas-feiras, das 0 às 8 horas, pois, na prática, apesar de ser já dia útil, não deixa de ser a continuação de um domingo, bem como, finalmente, calculando a hora base sobre a remuneração atribuída ao sexto escalão de assistente da nova tabela, passando de 2779,27 (euro) para 3091,94 (euro), um médico nestas condições e nos períodos atrás mencionados teria um aumento de 380,81 (euro), 821,76 (euro) e 797,70 (euro) para 428,11 (euro) (o que em 12 horas seria uma média de 35,6 (euro)/h), 963,26 (euro) (o que nas 24 horas seria de 38,27 (euro)/h) e 963,26 (euro) (o que em 24 horas seria de 38,27 (euro)/h), respetivamente.
Estes valores são idênticos aos exemplificados para os prestadores, pagos até 40 (euro)/h, que eram de 480 (euro), 960 (euro) e 960 (euro), mas são inclusivamente maiores quando consideradas as prestações sociais (529,76 (euro), 1192,03 (euro) e 1192,03 (euro), respetivamente, o que neste caso equivale a 44,14 (euro)/h, 49,66 (euro)/h e 49,66 (euro)/h também respetivamente), equivalendo a prestações semanais de até 45 (euro)/h e nos fins-de-semana e feriados até 50 (euro)/h. Note-se, uma vez mais, que no valor dos prestadores nunca foi incluída a logística da deslocação.
Esta majoração das horas extraordinárias através da modificação dos índices de cálculo, por uma questão de igualdade, deveria afetar todas as categorias médicas existentes, uma vez que também estas realizam trabalho suplementar, mas com base de cálculo nos seus atuais valores salariais, pois os profissionais mais diferenciados já têm valores hora superiores.
A escolha do sexto escalão de assistente, onde nenhum médico se encontra ou possivelmente se encontrará, pois demoraria 50 anos a alcançá-lo à razão de um ponto por ano trabalhado ou já teria feito o exame para graduado, salvaguarda esta última categoria que vence por 3248,27 (euro), um valor superior, mas por outro lado reduz a enorme e discutível disparidade no pagamento de horas extraordinárias entre médicos, cuja diferenciação já está desde logo refletida no salário base.
Concluindo, o pagamento das horas extraordinárias com base no sexto escalão de assistente aos médicos com salários base menores e a alteração nos índices de cálculo para todos eles poderia ser comportável, mais aliciante e introduzir alguma justiça remuneratória, pelo menos face aos prestadores pagos a 45 (euro)/h ou 50 (euro)/h.
Sem dispor de dados oficiais para calcular o impacto orçamental exato destas medidas, não incluindo as futuras progressões para a categoria de graduado e mantendo igual o número de elementos escalados habitualmente nos serviços de urgência, estima-se que a eliminação do diferencial entre a primeira hora e sucessivas e a majoração do período das 8 às 13 horas de sábado e das noites semanais em dia útil e das segundas-feiras, envolvendo todos os médicos, tenham, no imediato, um acréscimo anual estimado em cerca de 5,5 % na despesa com todas as atuais horas extraordinárias, enquanto o pagamento do trabalho extraordinário com base no sexto escalão de assistente, isoladamente, terá um aumento aproximado de 11 %, mas, note-se bem, neste caso exclusivamente em relação à minoria de médicos ainda posicionados nos primeiros escalões de assistente da nova tabela remuneratória, ou seja, os médicos mais jovens, até alcançarem o grau, dos quais desconhecemos o seu número. O acréscimo na despesa é, assim, temporário e, à medida que os quadros se preenchem e os médicos progridem na carreira, será cada vez mais residual.
Porém, em termos reais, é necessário ter em conta que existem importantes efeitos atenuantes nesta despesa, pelo que ela será inclusivamente menor: os cálculos apresentados não tiveram em conta as horas obrigatórias legais pagas a um valor inferior; parte da verba agora paga a prestadores (despesas com fornecimento de serviços externos) é desviada para os médicos do SRS (despesas com pessoal) com custos menores; são reduzidos os custos na logística da deslocação de prestadores; e há um aumento na receita do Estado por via das subidas dos escalões do IRS e das prestações sociais dos profissionais envolvidos.
Na tabela seguinte, apresenta-se um comparativo entre os índices de cálculo das horas extraordinárias atuais e os novos índices sugeridos.
Índices para cálculo das horas extraordinárias
(ver documento original)
Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores resolve, nos termos regimentais aplicáveis e ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 44.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, recomendar ao Governo Regional dos Açores que:
1 - Aplique uma majoração do trabalho extraordinário a partir do limite de horas previsto na lei em presença física e o dobro desse limite nas horas efetuadas em regime de prevenção.
2 - Acabe com a desconexa distinção vigente no pagamento da primeira hora extraordinária e as sucessivas, nas noites semanais, bem como todo o sábado, domingo e feriados.
3 - Passe a remunerar a todos os médicos as horas extraordinárias no período noturno semanal das 20 às 8 horas do dia seguinte a duas vezes o valor base e a 2,5 vezes o valor base das 0 à 8 horas de segunda-feira ou dia útil após um feriado.
4 - Majore o sábado das 8 às 13 horas a todos os médicos de modo a fazer equivaler o valor hora ao das 13 às 20 horas, isto é, passar o índice de todas as horas de 1,5 para 2 vezes o valor base.
5 - Mantenha os restantes índices para os demais períodos para todos os médicos.
6 - Tenha como base no cálculo do trabalho suplementar médico o valor da sexta posição remuneratória de assistente da nova tabela remuneratória (3091,94 (euro)), exceto quando o seu salário base auferido seja logicamente superior.
7 - Aplique este sistema aos serviços de urgência abertos 24 horas nos hospitais e USI, onde seja praticado trabalho extraordinário por extrema e imperiosa necessidade para o seu funcionamento e apenas quando estiverem esgotadas todas as alternativas de trabalho normal e esgotadas as horas extras legalmente permitidas entre todos os elementos que possam fazer parte das escalas.
Aprovada pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, em 11 de maio de 2022.
O Presidente da Assembleia Legislativa, Luís Carlos Correia Garcia.
115422013
Sumário: Revisão do regime da prestação do trabalho médico extraordinário nos serviços de urgência e de atendimento permanente das unidades de saúde de ilha com serviço de urgência.
Revisão do regime da prestação do trabalho médico extraordinário nos serviços de urgência e de atendimento permanente das unidades de saúde de ilha com serviço de urgência
Portugal e muitos países europeus debatem-se com crises sanitárias que, quer durante a pandemia, quer posteriormente, em pleno tempo de recuperação, vieram realçar a incapacidade de resposta do setor público e também, inclusivamente, do privado. A desorçamentação, a falta de estratégia e planeamento, o deficit de pessoal e o envelhecimento de classes profissionais estão possivelmente entre as causas fundamentais dessa crise no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
A Região Autónoma dos Açores (RAA) não foge a esta regra, agravada pelas condições geográficas em que se insere. Urge, pois, com celeridade, investir nas infraestruturas e no parque tecnológico, na fixação de profissionais e apelar a mais um esforço suplementar, se é que tal ainda é possível, do pessoal no ativo, para que, até à melhoria desta situação, continue a dar a melhor resposta possível à nossa comunidade em cuidados de saúde.
E ainda que as condições económicas e financeiras do Estado sejam, desde há muito, periclitantes, a ajuda europeia e as escolhas políticas devem centrar-se na melhoria deste panorama a médio prazo. A prioridade e consequentes opções políticas orçamentais só podem ser, pois, no sentido de privilegiar a saúde da nossa população. É o que se exige a quem nos governa.
Os médicos fazem parte de uma carreira especial da Administração Pública. Segundo o acordo coletivo de trabalho (ACT) médico em vigor, o período normal de trabalho médico é de 8 horas diárias e 40 horas semanais, organizadas de segunda-feira a sexta-feira, sendo o trabalho em serviços de urgência, externa e interna, unidades de cuidados intensivos, unidades de cuidados intermédios e prolongamentos de horário nos centros de saúde organizado de segunda-feira a domingo.
Ainda de acordo com o mesmo ACT, para os trabalhadores médicos integrados em serviços de urgência, externa e interna, unidades de cuidados intensivos, unidades de cuidados intermédios e prolongamentos de horário nos centros de saúde, considera-se «período de trabalho noturno» o compreendido entre as 20 horas e as 8 horas do dia seguinte.
Relativamente ao trabalho extraordinário, aquele que é feito para além do normal horário de trabalho, o trabalhador médico é obrigado a realizar a prestação de trabalho extraordinário, salvo quando, havendo motivos atendíveis e inadiáveis, expressamente solicite e obtenha a sua dispensa pelo tempo indispensável, sendo o limite anual da duração de trabalho extraordinário de 150 horas.
Nas instituições de saúde, habitualmente, o trabalho extraordinário, de acordo com o Decreto-Lei 62/79, de 30 de março, é efetuado em regime presencial ou em regime de prevenção, sendo este último remunerado a 50 % do valor anterior.
Os médicos acima dos 55 anos estão dispensados de realizar serviço de urgência e os que ultrapassem os 50 anos de idade de fazer trabalho noturno.
Por último, a legislação impede que os médicos prestem serviços, a título individual ou por empresa, nas mesmas instituições com as quais possuam uma relação jurídica de emprego.
A sustentação do nosso Serviço Regional de Saúde (SRS) sempre passou e passa, infelizmente, mas inevitavelmente, pelo recurso ao trabalho extraordinário, situação agravada pela falta de profissionais.
Genericamente, o trabalho extraordinário deve constituir apenas um regime de recurso, para situações excecionais e imprevisíveis, justificável quando tal seja imprescindível para o normal funcionamento de uma organização e não pode ser um modus operandi sistemático para evitar a contratação de pessoal.
No caso concreto dos médicos, acaba por ocorrer de uma forma previsível e regular, habitualmente ao nível do serviço de urgência, quer por escassez involuntária de profissionais, quer por escassez deliberada desses mesmos profissionais, neste caso, entenda-se, possivelmente pelo facto de não ser eficiente uma dotação excessiva de clínicos em determinados serviços e em determinadas instituições de saúde, exclusivamente para completar escalas dos serviços de urgência.
Na verdade, se o ratio de uma determinada especialidade para uma determinada população for tecnicamente de quatro ou cinco elementos, facilmente se entenderá que ou se admitem oito médicos, quatro ou três a mais do preconizado, o que é um número excessivo para desenvolver a atividade existente, mas que permite a cobertura dos dias de urgência em horário normal, ou se admitem somente os quatro ou cinco previstos e suficientes, mas então haverá necessidade de recurso ao trabalho suplementar para cobrir integralmente todos os sete dias da semana. Isto não ocorre por norma com outras classes.
A RAA é o paradigma desta crua realidade e haveria inúmeros exemplos a dar: seriam precisos oito médicos na Unidade de Saúde de Ilha (USI) do Corvo, com cerca de 400 habitantes e para um ratio recomendado de médico por habitante de um para 1500, para evitar o trabalho extraordinário, mudada a legislação, tal como, sabendo que deve existir uma urgência psiquiátrica para 250 000 habitantes, deveria haver oito psiquiatras no Hospital do Santo Espírito para apenas cerca de 60 000 habitantes, de modo a possibilitar essa mesma cobertura integral, ou seriam necessários oito gastroenterologistas no Hospital da Horta para este mesmo efeito, cobrindo uma população de apenas 35 000 habitantes, quando o ratio previsto nesta especialidade é de um para 30 000, etc.
Ora, esta questão não se coloca com outras classes, pois a maioria mantém os serviços durante as 24 horas com trabalho por turnos, regime inviável na classe médica, sendo também mais fácil fazer as devidas dotações por posto de trabalho, como é o caso das dotações seguras dos enfermeiros.
Nestes múltiplos cenários, numa região arquipelágica de 240 000 habitantes, com três hospitais e várias USI com urgências básicas, a ineficiência e os custos para o erário público em salários médicos seriam inclusivamente superiores aos despendidos em horas extraordinárias, como facilmente se demonstra, e os próprios médicos deixariam de exercer a medicina de forma regular e eficaz, com consequências futuras no seu curriculum e desempenho técnico.
Isto constituiu sempre um problema de difícil solução, em geral, e é por isso que cada vez mais se advoga a existência de um staff próprio nos serviços de urgência, com formação especializada na área, com escalas organizadas de segunda-feira a domingos e feriados, libertando, assim, o pessoal dos outros serviços para as atividades programadas, onde já cumprem praticamente todo o seu horário normal, de forma a reduzir ao mínimo o trabalho suplementar.
Apesar de o horário médico normal ser cumprido apenas nos dias úteis, das 8 às 20 horas, como acima se mencionou, existem exceções, designadamente nos serviços de urgência, onde as escalas podem ser organizadas de segunda-feira a domingo e feriados para as 24 horas. Neste caso, os médicos, que teriam de ser igualmente em número suficiente, cumprindo as horas semanais nesses períodos não auferiam horas extraordinárias em dias úteis nem durante os fins-de-semana e feriados, apenas suplementos pelas horas incómodas, mas, como contrapartida, a priori, não exerceriam mais tempo que o do seu horário habitual.
A realidade é que os médicos têm acedido realizar trabalho extraordinário, voluntariamente, por motivos éticos e deontológicos e também porque, devido aos seus baixos salários, sempre encontraram nesse trabalho extraordinário alguma forma de compensação, sobretudo quando não optam pela simultânea atividade privada. No entanto, a melhoria remuneratória da atividade privada, outrora os cortes nos cálculos das horas extraordinárias, o baixo valor/hora aliado à não progressão nas carreiras e as más condições laborais levaram cada vez mais profissionais a efetuar estritamente o trabalho suplementar previsto na legislação.
Aliás, mais do que nunca, nos dias de hoje, se fosse adotado o cumprimento de horários normais durante as noites e fins-de-semana, em função das urgências, sem recurso ao trabalho extraordinário, haveria certamente uma disrupção grave nos serviços e nas suas atividades de rotina.
A situação atual é, pois, altamente preocupante, pois é uma classe envelhecida, os concursos públicos ficam desertos, os médicos abandonam o SNS e já muitos dos que se mantêm recusam prolongar os horários de trabalho no serviço de urgência, seja por idade, seja pelo limite legal atrás enunciado. Também é sobejamente sabido que a dificuldade em contratar médicos é francamente superior que noutras classes do setor da saúde.
Portanto, se é certo que o trabalho extraordinário nunca deve prevalecer sobre a contratação de profissionais e não deve ultrapassar involuntariamente o limite plasmado na legislação, então, a ser de facto mesmo necessário e continuado, pelo menos acima daquele limite, pode e deve ter outra forma majorada na remuneração, como forma de recompensar o esforço acrescido a que os profissionais estão sujeitos.
Entretanto, convém realçar que esta escassez de pessoal no SNS abriu as portas aos prestadores médicos, a título individual ou através de empresas, médicos que ou não concorrem para as vagas existentes no SNS ou simplesmente as abandonam, criando um autêntico círculo vicioso no sistema.
De facto, durante a última década, vem-se assistindo a uma desnatação preocupante do SNS, tal como já alvitrado, como consequência dos baixos salários médicos, congelamentos remuneratórios e estagnação das carreiras, más condições físicas e tecnológicas das instituições, excessiva carga de trabalho à medida que outros profissionais abandonam os serviços, inexistência de incentivos à fixação médica em determinadas áreas geográficas e à maior proliferação de unidades privadas no perímetro do SNS, mais atrativas em termos pecuniários e não pecuniários.
Por todos estes motivos, os serviços ficaram cada vez mais dependentes desses prestadores, nem sempre com a qualidade desejável, com os riscos inerentes à irregularidade e rotatividade dessa prestação, que supostamente auferem um maior valor hora, por vezes inflacionado, mas de acordo com as leis do mercado, apesar da tentativa governamental em estabelecer um limite remuneratório.
Estes prestadores têm outra liberdade, podem escolher os locais, horários e períodos mensais de trabalho, não estão fixos numa única instituição e, como tal, preferem este regime, mesmo que sem uma proteção social mais robusta, como a proporcionada no serviço público. Até em alguns destes aspetos o setor público não teve a devida flexibilidade concorrencial.
Na RAA, que tem sido muito afetada pela sua realidade insular e ultraperiférica, foi já aprovada uma nova legislação com vista a melhorar as condições de fixação de especialistas. Não podendo os hospitais e USI depender exclusivamente de prestadores, que nem sequer sempre estão disponíveis, é necessário aliciar os médicos residentes, sobretudo os mais jovens, a realizar trabalho suplementar, note-se bem, na medida do possível, de forma totalmente voluntária, salvaguardando sempre o direito às folgas e descansos compensatórios e, sobretudo, com uma recompensa justa. Esta questão dos prestadores é também praticamente exclusiva na classe médica.
Calcular uma recompensa justa pelo trabalho extraordinário não é fácil, por múltiplas nuances, entre elas o referencial do valor variável recebido pelos prestadores. A este propósito, desde logo, há uma desmistificação que é necessário efetuar: o prestador está longe de acarretar para as instituições, numa grande parte dos casos, um valor bruto muito superior ao do médico do mapa de pessoal, como habitualmente é suposto, para além de não ter direito a subsídios de férias e de Natal, férias, folgas, descansos compensatórios, licenças, apoio na formação ou na doença. E, como uma grande parte faz trabalho pontual ou através de empresas, a instituição não contribui para a sua segurança social, como compete à entidade empregadora (23,75 % sobre o valor total a pagar), cabendo-lhe liquidar, a posteriori, esta contribuição e o IRS.
Apesar de tudo isto, a perceção do pessoal do mapa de que, pelo mesmo período de tempo e o mesmo tipo de trabalho, recebe menos que um prestador é em muitas situações verdade, quer em termos líquidos devido aos impostos e contribuições retidos na fonte, quer em termos brutos, sobretudo quando em causa estão médicos especialistas em início de carreira.
Nos Açores, acrescem quase sempre a este custo as despesas de deslocação, alojamento e muitas vezes viatura, pagos pela instituição, cujos valores são variáveis, e, quando divididos pelas horas totais trabalhadas, se o volume de tempo não for elevado, agravam o valor hora final. Por exemplo, considerando uma viagem de 250 (euro) e um mínimo de 280 (euro) por sete dias de alojamento, para uma prestação de 96 horas, o valor hora agrava-se em, pelo menos, 5,50 (euro). São, pois, valores relevantes que devem ser considerados.
Assim, qualquer aumento remuneratório das horas extraordinárias do pessoal do mapa, que será sempre um último recurso, deve ter em conta a capacidade orçamental, equiparar-se pelo menos em termos brutos com o valor dos prestadores oferecido pelos concorrentes, públicos e privados, a logística associada, bem como o seu montante final não deve contribuir para inflacionar este mercado de trabalho, se for demasiado elevado. É este o exercício a efetuar.
Na Madeira, a opção de estabelecer um valor fixo de 50 (euro) para todas as horas pode ser simplista, mas traz à colação algumas questões pertinentes. Desde logo, estabelece um referencial inflacionado para os próprios prestadores; aplicado nos Açores acarreta um esforço financeiro governamental maior por haver mais profissionais envolvidos em três hospitais e múltiplas USI com urgência básica, fruto da maior descontinuidade territorial, agrava os custos institucionais com o acréscimo nas prestações sociais e não discrimina positivamente as noites e os fins-de-semana.
Fazendo algumas comparações com base nos índices remuneratórios atuais das horas extraordinárias presenciais com outras hipóteses, é possível alcançar um ponto de equilíbrio.
Em 2022, e com base nos índices de cálculo vigentes, o salário de um especialista na primeira posição remuneratória da carreira médica é de 2779,27 (euro), correspondente a 16,03 (euro)/h ilíquidos, mas na realidade o custo efetivo para a instituição, considerando 14 salários e a segurança social, é de 23,24 (euro)/h. Para um médico institucional, o seu referencial é o seu valor base e daí haver uma importante causa na preferência pela prestação de serviços, com um valor hora mais elevado.
Quanto ao trabalho extraordinário, considerando esse valor base de 16,03 (euro)/h, atualmente uma noite de 12 horas em dia útil (20-8 horas), um sábado de 24 horas (8-8 horas) e um domingo ou feriado de 24 horas (8-8 horas) corresponde a um valor total ilíquido, respetivamente, de 380,81 (euro), 821,76 (euro) e 797,70 (euro). Porém, se consideramos a despesa da instituição com a segurança social, aqueles valores são, respetivamente, 471,25 (euro), 1016,92 (euro) e 987,15 (euro).
Ora, um prestador auferindo 40 (euro)/h custa à instituição pelos mesmos períodos, respetivamente, 480 (euro), 960 (euro) e 960 (euro), sem a logística. Ou seja, neste exemplo concreto, para efeitos práticos, um prestador cobra mais que um médico hospitalar à instituição, mas nomeadamente nos fins-de-semana sai mais barato quando considerados os custos da segurança social.
Daqui se infere igualmente que poderia ser tentador majorar somente as horas extraordinárias semanais do pessoal do mapa hospitalar, com salários menores, pois a diferença com o prestador é mais notória, mas esta medida parcial poderia ser nociva para completar escalas de fim-de-semana ou feriados, mesmo que estes últimos dias confiram direito à folga.
À medida que subimos na diferenciação e, logicamente, no salário base médico, o custo do prestador vai-se tornando, em termos comparativos, menos oneroso para a instituição. Por exemplo, de acordo ainda com a nova tabela, para um salário base da sexta posição de um assistente a 3091,94 (euro), ou seja, 17,84 (euro)/h, o valor bruto daqueles mesmos períodos é 423,66 (euro) (524,27 (euro) com segurança social), 914,20 (euro) (1131,32 (euro) com segurança social) e 887,45 (euro) (1098,21 (euro) com segurança social).
Um médico externo auferindo 40 (euro)/h, como acima mencionado, continuará a custar à instituição pelos mesmos períodos, respetivamente, 480 (euro), 960 (euro) e 960 (euro). O diferencial fica mais reduzido, obviamente sem as prestações sociais. No entanto, se este valor hora do prestador alcançar os 50 (euro), os montantes serão de 600 (euro), 1200 (euro) e 1200 (euro), ou seja, os custos finais institucionais com esta contratação já serão superiores, mesmo considerando o efeito das prestações sociais e não incluindo sequer a logística associada. Porém, repita-se, a perceção do médico público é bastante diferente.
Ora, eliminando também o diferencial entre a primeira hora extraordinária e as seguintes, que é inexplicavelmente menor, majorando os sábados entre as 8 e as 13 horas, cujo índice passaria de 1,5 para 2, tendo o mesmo valor de que o das 13 às 20 horas, pois o sábado não faz parte do normal horário médico, majorando as noites de semana, cujo índice passaria de 2 para 2,125 das 20 horas de segunda-feira até às 8 horas de sábado e para 2,25 às segundas-feiras, das 0 às 8 horas, pois, na prática, apesar de ser já dia útil, não deixa de ser a continuação de um domingo, bem como, finalmente, calculando a hora base sobre a remuneração atribuída ao sexto escalão de assistente da nova tabela, passando de 2779,27 (euro) para 3091,94 (euro), um médico nestas condições e nos períodos atrás mencionados teria um aumento de 380,81 (euro), 821,76 (euro) e 797,70 (euro) para 428,11 (euro) (o que em 12 horas seria uma média de 35,6 (euro)/h), 963,26 (euro) (o que nas 24 horas seria de 38,27 (euro)/h) e 963,26 (euro) (o que em 24 horas seria de 38,27 (euro)/h), respetivamente.
Estes valores são idênticos aos exemplificados para os prestadores, pagos até 40 (euro)/h, que eram de 480 (euro), 960 (euro) e 960 (euro), mas são inclusivamente maiores quando consideradas as prestações sociais (529,76 (euro), 1192,03 (euro) e 1192,03 (euro), respetivamente, o que neste caso equivale a 44,14 (euro)/h, 49,66 (euro)/h e 49,66 (euro)/h também respetivamente), equivalendo a prestações semanais de até 45 (euro)/h e nos fins-de-semana e feriados até 50 (euro)/h. Note-se, uma vez mais, que no valor dos prestadores nunca foi incluída a logística da deslocação.
Esta majoração das horas extraordinárias através da modificação dos índices de cálculo, por uma questão de igualdade, deveria afetar todas as categorias médicas existentes, uma vez que também estas realizam trabalho suplementar, mas com base de cálculo nos seus atuais valores salariais, pois os profissionais mais diferenciados já têm valores hora superiores.
A escolha do sexto escalão de assistente, onde nenhum médico se encontra ou possivelmente se encontrará, pois demoraria 50 anos a alcançá-lo à razão de um ponto por ano trabalhado ou já teria feito o exame para graduado, salvaguarda esta última categoria que vence por 3248,27 (euro), um valor superior, mas por outro lado reduz a enorme e discutível disparidade no pagamento de horas extraordinárias entre médicos, cuja diferenciação já está desde logo refletida no salário base.
Concluindo, o pagamento das horas extraordinárias com base no sexto escalão de assistente aos médicos com salários base menores e a alteração nos índices de cálculo para todos eles poderia ser comportável, mais aliciante e introduzir alguma justiça remuneratória, pelo menos face aos prestadores pagos a 45 (euro)/h ou 50 (euro)/h.
Sem dispor de dados oficiais para calcular o impacto orçamental exato destas medidas, não incluindo as futuras progressões para a categoria de graduado e mantendo igual o número de elementos escalados habitualmente nos serviços de urgência, estima-se que a eliminação do diferencial entre a primeira hora e sucessivas e a majoração do período das 8 às 13 horas de sábado e das noites semanais em dia útil e das segundas-feiras, envolvendo todos os médicos, tenham, no imediato, um acréscimo anual estimado em cerca de 5,5 % na despesa com todas as atuais horas extraordinárias, enquanto o pagamento do trabalho extraordinário com base no sexto escalão de assistente, isoladamente, terá um aumento aproximado de 11 %, mas, note-se bem, neste caso exclusivamente em relação à minoria de médicos ainda posicionados nos primeiros escalões de assistente da nova tabela remuneratória, ou seja, os médicos mais jovens, até alcançarem o grau, dos quais desconhecemos o seu número. O acréscimo na despesa é, assim, temporário e, à medida que os quadros se preenchem e os médicos progridem na carreira, será cada vez mais residual.
Porém, em termos reais, é necessário ter em conta que existem importantes efeitos atenuantes nesta despesa, pelo que ela será inclusivamente menor: os cálculos apresentados não tiveram em conta as horas obrigatórias legais pagas a um valor inferior; parte da verba agora paga a prestadores (despesas com fornecimento de serviços externos) é desviada para os médicos do SRS (despesas com pessoal) com custos menores; são reduzidos os custos na logística da deslocação de prestadores; e há um aumento na receita do Estado por via das subidas dos escalões do IRS e das prestações sociais dos profissionais envolvidos.
Na tabela seguinte, apresenta-se um comparativo entre os índices de cálculo das horas extraordinárias atuais e os novos índices sugeridos.
Índices para cálculo das horas extraordinárias
(ver documento original)
Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores resolve, nos termos regimentais aplicáveis e ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 44.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, recomendar ao Governo Regional dos Açores que:
1 - Aplique uma majoração do trabalho extraordinário a partir do limite de horas previsto na lei em presença física e o dobro desse limite nas horas efetuadas em regime de prevenção.
2 - Acabe com a desconexa distinção vigente no pagamento da primeira hora extraordinária e as sucessivas, nas noites semanais, bem como todo o sábado, domingo e feriados.
3 - Passe a remunerar a todos os médicos as horas extraordinárias no período noturno semanal das 20 às 8 horas do dia seguinte a duas vezes o valor base e a 2,5 vezes o valor base das 0 à 8 horas de segunda-feira ou dia útil após um feriado.
4 - Majore o sábado das 8 às 13 horas a todos os médicos de modo a fazer equivaler o valor hora ao das 13 às 20 horas, isto é, passar o índice de todas as horas de 1,5 para 2 vezes o valor base.
5 - Mantenha os restantes índices para os demais períodos para todos os médicos.
6 - Tenha como base no cálculo do trabalho suplementar médico o valor da sexta posição remuneratória de assistente da nova tabela remuneratória (3091,94 (euro)), exceto quando o seu salário base auferido seja logicamente superior.
7 - Aplique este sistema aos serviços de urgência abertos 24 horas nos hospitais e USI, onde seja praticado trabalho extraordinário por extrema e imperiosa necessidade para o seu funcionamento e apenas quando estiverem esgotadas todas as alternativas de trabalho normal e esgotadas as horas extras legalmente permitidas entre todos os elementos que possam fazer parte das escalas.
Aprovada pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, em 11 de maio de 2022.
O Presidente da Assembleia Legislativa, Luís Carlos Correia Garcia.
115422013
Anexos
- Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/4966344.dre.pdf .
Ligações deste documento
Este documento liga ao seguinte documento (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):
-
1979-03-30 -
Decreto-Lei
62/79 -
Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios das Finanças e do Plano e dos Assuntos Sociais
Disciplina o regime de trabalho e sua remuneração nos Estabelecimentos Hospitalares.
Aviso
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