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Assento DAS8/92, de 6 de Agosto

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Sumário

FORMULADAS VARIAS PRETENSÕES NO RECURSO, PODEM ALGUMAS DELAS REJEITAR-SE, EM CONFERENCIA, PROSSEGUINDO O RECURSO QUANTO AS DEMAIS, EM OBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA CINDIBILIDADE (OU PRINCÍPIO DA SEPARABILIDADE).

Texto do documento

Assento
Acordam, em plenário das secções criminais, os deste Supremo Tribunal de Justiça:

I - O digno magistrado do Ministério Público junto deste Supremo, à sombra do estatuído no artigo 437.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, veio interpor recurso extraordinário, para afixação de jurisprudência, do acórdão fotocopiado a fls. 6 e 6 v.º, no processo 41483, deste mesmo Tribunal, proferido a 3 de Maio de 1991.

É que nele, sobre a possibilidade de rejeição parcial do recurso penal, se optou por uma solução oposta àquela em que assentou o acórdão proferido em 15 de Novembro de 1989, no processo 40323, em fotocópia, a fls. 4 e 5.

Qualquer deles, na verdade, reconhece a admissibilidade da limitação do recurso a uma parte da decisão, desde que a parte recorrida e a não recorrida possam separar-se e assuma cada uma delas perfeita independência, por forma a tornar possível, de per si, uma apreciação e decisão autónomas, em consonância com o que estatui o artigo 403.º, n.º 1, do supracitado diploma legal.

Mas enquanto no acórdão recorrido se julgou que a rejeição do recurso deve ser total, e não parcial, foi, ao invés, decidido no acórdão fundamento rejeitar o recurso estritamente quanto à matéria de direito, prosseguindo o mesmo apenas na parte restante.

II - Está assegurada a legitimidade do recorrente, pelo despacho em que o recurso se admitiu, confirmando-se a sua tempestividade, a espécie e o regime adequados.

Cumprido que foi o que estatuem os artigos 439.º e 440.º do Código de Processo Penal, procedeu-se ao exame preliminar, após o que, indo os autos à conferência, se concluiu verificar-se a arguida oposição de julgados, e que qualquer das decisões transitou já.

III - Prosseguiu, por conseguinte, o recurso.
E uma vez colhido o visto simultâneo - a que alude o artigo 442.º, n.º 3, da mesma lei -, cumpre decidir.

Dir-se-á ser fora de dúvida que um e outro dos dois mencionados acórdãos assentaram em soluções opostas, sobre a mesma questão de direito, no domínio da mesma legislação.

Em ambos se admite, é claro, como aliás não podia deixar de ser, em obediência ao determinado no artigo 403.º, n.º 1, do Código de Processo penal, a limitação do recurso a uma parte da decisão, quando a parte recorrida pode cindir-se da que a não foi, possibilitando uma apreciação e uma decisão autónomas.

Só que enquanto no acórdão recorrido, de 3 de Maio de 1991, no processo 41483, se considerou que a rejeição do recurso só pode ser total, no acórdão fundamento, de 15 de Novembro de 1989, no processo 40323, julgou-se que, sendo o recurso relativo, ao mesmo tempo, à parte de facto e à de direito, a rejeição de uma delas não implicava a rejeição da outra, pelo que desta poderia conhecer-se e decidir-se.

O problema que se nos coloca não tem precedentes, e surgiu pela primeira vez no processo 40093, em que a despeito do Ministério Público neste Supremo Tribunal ter defendido a rejeição parcial do recurso, ao abrigo do princípio da sua acindibilidade, o acórdão de 14 de Junho de 1989 decidiu em sentido contrário como no acórdão ora recorrido - que o recurso devia prosseguir integralmente para julgamento - Actualidade Jurídica, ano 1, n.º 0, p. 6.

Esta corrente não foi, todavia, acolhida neste Supremo Tribunal e logo depois abandonada no acórdão de 15 de Novembro seguinte, em que precisamente intervieram como relator e primeiro adjunto os mesmos conselheiros que, como adjuntos, tinham votado aquele outro.

Este acórdão, no processo 40323, vem sumariado na Actualidade Jurídica, ano 1, n.º 3, p. 6, em que se lê:

1 - O princípio processual actualmente aceite é o da cindibilidade do recurso, aliás acolhido no n.º 1 do artigo 403.º do Código de Processo Penal em vigor desde 1 de Janeiro de 1988 e reafirmado nos seus artigos 410.º, n.º 1, e 412.º, n.º 2, princípio esse que funcionará sempre que a parte recorrida possa ser separada da parte não recorrida, por forma a tornar possível uma apreciação e uma decisão autónomas.

2 - Por esse princípio poderá o recorrente limitar a sua reacção a uma decisão judicial, contanto que observe a regra da autonomia da parte que pretende submeter à censura do tribunal, como acontece nos casos exemplificativamente enumerados no n.º 2 do artigo 403.º

3 - O recorrente pode limitar o recurso só à matéria de facto ou só à matéria de direito, já que se apresentam com perfeita e recíproca autonomia.

4 - Se o recurso envolver simultaneamente matéria de facto e de direito, a independência mantém-se, já que cada uma dessas facetas supõe uma decisão própria insusceptível de fundir-se numa só.

Do mesmo acórdão nos dará conta o Boletim do Ministério da Justiça, n.º 391, a publicar, e cujo sumário passamos a indicar:

I - No domínio dos recursos penais o princípio processual actualmente em vigor é o da cindibilidade do recurso, acolhido no artigo 403.º, n.º 1, e reafirmado nos artigo 410.º, n.º 1, e 412.º, n.º 2, todos do Código de Processo Penal.

II - Este princípio funciona sempre que a parte recorrida possa ser separada da parte não recorrida, por forma a tornar possível uma apreciação e uma decisão autónomas.

III - O recorrente pode limitar o seu recurso apenas à matéria de direito ou só à matéria de facto de uma decisão, já que elas se apresentam com perfeita e recíproca independência.

IV - Mas se recorrer, envolvendo simultaneamente estas duas facetas da decisão, nem por isso se perderá a referida autonomia, já que cada uma delas supõe uma decisão própria, insusceptível de fundir-se numa só.

V - Interposto recurso quanto à matéria de direito e quanto à matéria de facto e desrespeitando as conclusões, o disposto no artigo 412.º, n.º 2, do Código de Processo penal, designadamente não se tendo indicado a norma violada, há que rejeitar o recurso quanto à matéria de direito, prosseguindo aquele apenas na parte restante.

Semelhante tese já antes tinha sido defendida no acórdão de 25 de Outubro de 1989, no processo 40220, desde então se havendo iniciado a corrente, que pode considerar-se uniforme, do princípio da cindibilidade do recurso e da possibilidade da sua rejeição parcial.

Da mesma data - de 25 de Outubro de 1989 - com a mesma solução, é o decidido no processo 20243, sucedendo-se esta corrente jurisprudencial até ao acórdão ora recorrido, e o de 20 de Dezembro de 1989, no processo 40251, in Actualidade Jurídica, ano 2, n.º 4, pp. 9 e 10, em que se lê no n.º 6 do sumário:

6 - O princípio é hoje o da cindibilidade do recurso, sendo o recorrente quem decide o que pretende ver apreciado, e só isso (artigos 402.º, 403.º e 309.º do Código de Processo Penal), mas cumprindo-se sempre o disposto no artigo 412.º do mesmo Código.

No mesmo sentido se seguiram os acórdãos deste Supremo Tribunal de 7 de Novembro de 1990, no processo 41348, e de 26 de Setembro de 1991, no processo 41940.

As regras a que agora estão sujeitos os recursos em processo penal são em tudo distintas do regime do anterior Código de 1929, cujo princípio preponderante era, como é sabido, o da unidade do recurso.

Pode afirmar-se que, bem ao contrário, se nota actualmente um forte predomínio do princípio dispositivo no que toca aos recursos, com base na sua separabilidade ou cindibilidade, por efeito do disposto no artigo 403.º, n.º 1, reafirmado nos artigos 410.º, n.º 1, e 412.º, n.º 2, todos do Código de Processo Penal, em função da faculdade do recorrente, que pode impugnar uma ou mais parcelas da decisão, havendo, pois, uma parte recorrida e outra não recorrida, desde que se torne possível uma apreciação e uma decisão entre si independentes.

Pode o recorrente limitar o recurso tão-só à matéria de direito de uma decisão, ou simplesmente à matéria de facto, uma vez que se apresentem com inteira e recíproca independência.

Se, porventura, o recurso envolver simultaneamente os dois aspectos, nem por isso se perderá a mencionada autonomia, uma vez que cada um deles suporta uma decisão própria, com particular disciplina jurídica, por isso insusceptível de fundir-se numa só.

Note-se, a título exemplificativo, que as exigências contidas no n.º 2 do citado artigo 412.º se referem tão-só às pretensões do recurso que versem matéria de direito, como se específica logo no início dessa disposição, de modo que, interposto recurso tanto da matéria de facto como da matéria de direito - por inobservância do n.º 2 do artigo 412.º -, pode o recurso vir a ser rejeitado quanto àquela e prosseguir quanto à parte restante, a matéria de facto.

Se assim não fosse, e aceitando todo o recurso, não obstante haver pretensões que seriam de rejeitar, estaríamos, afinal, caídos no domínio do princípio da unidade que imperava no Código de 1929 e, em vez de só se rejeitar as pretensões que o devessem ser, passar-se-ia a conhecer de todo o recurso, desta arte, com integral desrespeito pela lei.

Bastaria, com efeito, qualquer invocação sobre a matéria de facto como a sua insuficiência, erro ou contradição, para que o recurso, em que também se discutia o direito, como o enquadramento jurídico dos factos e a medida da pena, prosseguisse também nesta parte, com total violação da lei expressa.

Mais não será preciso acrescentar para se concluir dever pôr-se de parte, por menos correcta e até ilegal, a orientação seguida no acórdão recorrido, por contrariar o princípio da separabilidade do recurso, antes se devendo - na hipótese de autonomia das pretensões do recurso - apreciá-las separadamente quanto à possibilidade da sua rejeição e prosseguimento.

IV - Por tudo o que se expôs, decide-se solucionar o conflito de jurisprudência suscitado entre os acórdãos deste Supremo Tribunal de 3 de Maio de 1991, o proferido no processo 41483 e o prolatado a 15 de Novembro de 1989, no processo 40323, fixando a jurisprudência pelo modo seguinte:

Formuladas várias pretensões no recurso, podem algumas delas rejeitar-se, em conferência, prosseguindo o recurso quanto às demais, em obediência ao princípio da cindibilidade.

Deve, oportunamente, a decisão recorrida ser alterada pelo tribunal que a proferiu, em cumprimento da jurisprudência acabada de estabelecer.

Lisboa, 24 de Junho de 1992. - José Alexandre Lucena Vilhegas do Valle - Jorge Celestino da Guerra Pires - Bernardo Guimarães Ficher Sá Nogueira - Fernando Faria Pimentel Lopes de Melo - José Saraiva (vencido, com os fundamentos da declaração de voto junta) - José Henriques Ferreira Vidigal - Manuel da Rosa Ferreira Dias - Armando Pinto Bastos - Vítor Manuel Lopes de Sá Pereira - Luís Vaz de Sequeira - Agostinho Pereira dos Santos - Noel Silva Pinto - António Cerqueira Vahia - (Tem a concordância do conselheiro Abranches Martins, que não assina por não estar presente.)


Declaração de voto
O artigo 403.º, n.º 1, do Código de Processo Penal permite ao recorrente limitar o recurso a uma parte da decisão, quando a parte recorrida puder ser separada da não recorrida, por forma a tornar possível uma apreciação e uma decisão autónomas.

Mas a rejeição do recurso, como resulta da letra dos artigos 412.º, n.º 2, e 420.º, n.os 1 e 3, do mesmo Código - rejeição «do recurso» -, há-de ser total, e não parcial.

É o que está de acordo com a economia e celeridade processual, de que o novo Código está imbuído.

E a rejeição parcial do recurso, obrigando a duas decisões, retarda o andamento do processo, contra o espírito do diploma em causa, sem vantagens que se vejam.

A tese da cindibilidade do recurso afigura-se-me legalmente inadmissível, com o devido respeito.

O que é cindível é dentro da decisão a «parte recorrida» da «parte não recorrida», se forem susceptíveis de decisão autónoma - como é expressa a letra do artigo 403.º, n.º 1, citado.

A lei não se refere a separação ou cindibilidade das matérias ou questões suscitadas no recurso, que é só um, um no seu todo.

A autonomia a que se refere a lei é entre a parte recorrida e não recorrida, e não entre as várias partes ou questões da parte recorrida.

A cindibilidade prevista na lei é da decisão recorrida e não do recurso; mesmo que este contenha várias questões autónomas, o recurso não deixa de ser um só e único.

Por estas razões, e salvo o devido respeito, fixaria a jurisprudência no sentido inverso ao do presente e douto acórdão. - José Saraiva.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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