de 29 de Abril
1. Na metodologia por que logo se optou no Programa do Governo, prossegue-se na reforma do direito comercial marítimo, agora perdido na senectude do livro III do Código Comercial. Os diplomas legais que para esse fim vão sendo sucessivamente editados só formalmente constituem legislação avulsa; todos eles, sistematizadamente, se inscrevem num quadro coerente e unitário.É corrente a ideia de que no contrato de fretamento prepondera a autonomia da vontade; será mesmo esse um dos traços que mais caracteristicamente o demarcam do contrato de transporte de mercadorias; neste, a preocupação de proteger os carregadores deu causa a uma disciplina quase sempre imperativa.
As coisas não deixaram de ser assim, embora a realidade revele que ao contratar o fretamento as vontades recíprocas não se movem já com a mesma incólume disponibilidade; alarga-se a estandardização das cartas-partidas; noutro plano, desenvolve-se um crescente controle quanto a algumas das estipulações, como é o caso das que tenham a ver com a qualidade dos combustíveis utilizados, em vista a manter a boa condição das máquinas do navio.
2. Operada a autonomização conceitual do transporte e do fretamento, compartimenta-se este nas três clássicas modalidades: por viagem, a tempo e em casco nu.
Este o sistema legal francês de 1966, como também já era o do direito anglo-saxónico, onde são reconhecíveis três modalidades de charter-parties: voyage charter-party, time charter-party e charter-party by demise (lease of the vessel).
Tem-se por vezes feito coincidir a terceira modalidade (demise) com a bareboat charter; acontece, no entanto, que, nesta, o fretador nunca pode designar o capitão, enquanto naquela isso é possível.
Claro está que, para além desta trilogia, nitidamente configurada, a vida se tem encarregado de produzir outras modalidades, que as partes modelam a partir dos seus interesses. São tipos contratuais não definíveis more geometrico; aquilo que os Ingleses chamam de contratos «híbridos».
Assim, por exemplo, o fretamento por viagens sucessivas; dizendo quase sempre respeito a navios-tanques, é expresso em apólices-tipo como a «Shell-consec» e a «Interconsec». Abrangerá o fretamento um número determinado de viagens ou as que o navio possa realizar num certo período de tempo, contado desde o início da primeira sem poder exceder uma data fixada para o último carregamento.
Assim, também, a trip charter, em que o navio é fretado para uma viagem (eventualmente de ida e volta), mas durante um certo período de tempo. O modelo adoptado é o da time charter e a gestão comercial entregue ao afretador. Mas o objecto do contrato será, declaradamente, uma viagem.
Assim, ainda, e com grande relevo, o tonnage agreement, que em França recebe os nomes de contrat de tonnage ou de affrètement au tonnage. O núcleo da convenção está em que um empresário (industrial, comercial ou agrícola) estabelece com um armador que este assegurará a deslocação, em um ou vários navios, dentro de um certo período, de um volume determinado (ou determinável) de mercadorias, mediante o pagamento de um frete calculado por tonelada ou por qualquer outra unidade de medida. Não se estará perante um fretamento a tempo, já que o período estipulado valerá apenas como limite, sendo o frete fixado em função do volume de mercadorias transportado. O que o armador põe à disposição do outro contraente é uma certa capacidade de transporte. Tem-se entendido tratar-se de um fretamento por viagem, embora com uma vincada infixidez de enquadramento. Daí que já se tenha pensado que melhor será situá-lo como um contrato preliminar de ulteriores transportes sucessivos.
3. Constitui o fretamento um dos clássicos contratos de utilização ou exploração do navio para uma afectação marítima. Com esta pontualização poder-se-á distinguir o fretamento em casco nu do contrato de locação do navio; realmente a locação não terá a ver com a utilização do navio para fins relacionados com a navegação marítima. Assim, por exemplo, no caso da utilização de um navio como hotel flutuante. A relação contratual reger-se-á então pelas regras gerais do contrato de locação, e não pelas que especialmente valem para o direito marítimo.
Mas o fretamento em casco nu está na fronteira com a locação e daí que, subsidiariamente, se lhe possam aplicar, com as necessárias adaptações, não apenas as normas relativas ao fretamento a tempo como as que vigoram quanto ao contrato de locação.
Será ainda no fretamento em casco nu que por completo se esbate a vinculação, mesmo instrumental, entre o fretamento e o transporte de mercadorias. Como se assinala no artigo 39.º, n.º 1, poderá o afretador utilizar o navio em todos os tráfegos e actividades compatíveis com a sua finalidade normal e características técnicas. A única limitação estará em que o navio seja utilizado para fins de navegação marítima, não estando, de modo algum, implícita a ideia de que tal utilização se confine ao transporte de mercadorias por mar. Nesta medida, parece de convocar a ideia de que todo o fretamento pressuporá uma expedição marítima.
4. No artigo 21.º atribui-se ao fretador, no caso do fretamento por viagem, o direito de retenção sobre as mercadorias transportadas, para garantia dos créditos emergentes do contrato de fretamento. Justifica-se a solução pela «vizinhança» entre o fretamento por viagem e o transporte de mercadorias.
Proíbe o artigo 561.º do Código Comercial essa retenção, mas por um critério que, indo ao fundo da realidade, resulta equivalente. Com efeito, o n.º 3 do artigo 21.º do presente diploma remete para o que se dispõe sobre o direito de retenção no contrato de transporte marítimo de mercadorias, ou seja, para o preceituado nos n.os 3 e 6 do artigo 21.º (e, implicitamente, no artigo 22.º) do Decreto-Lei 352/86, de 21 de Outubro.
Trata-se, sem dúvida, de um sistema melhor articulado e dotado de maior praticabilidade.
Só que o exercício do direito de retenção deve ser mais expeditamente notificado ao destinatário ou consignatário; não é de esquecer que a conexão entre o direito e o contrato será aqui muito mais ténue. A relação contratual de fretamento não coincide com a relação contratual de transporte.
Questionar-se-á por que o direito de retenção e os mecanismos que comporta apenas valem para o fretamento por viagem e não para o fretamento a tempo. E dir-se-á que ao substituir-se o artigo 561.º do Código Comercial pelo actual sistema se está a limitar a amplitude de garantia do fretador quanto aos seus créditos. Não colherá, no entanto, a observação. Como tem sido observado, o legislador do Código de 1888 configurou apenas o transporte de mercadorias e o fretamento por viagem. Era esse o condicionalismo transitado da Ordenança de 1681, não substancialmente alterado quando surgiu o Código de Comércio francês de 1808, e ainda dominante na ponta final do século XIX.
5. O problema das estadias e sobrestadias (característico do fretamento por viagem) está precariamente resolvido no Código Comercial (artigo 545.º).
Não estando fixadas as estadias na carta-partida (como por regra acontece), a generalidade das legislações manda lançar mão dos usos locais ou dos usos do porto. Só que este critério supletivo é, por vezes, de difícil praticabilidade.
Daí que, sob influência do artigo 117.º do Código grego de 1958, se tenha remetido o fretador para critérios de razoabilidade, embora tendo em conta as circunstâncias do caso e os usos do porto.
Ao invés do que se passa em direito comparado, onde o pagamento do dispatch money não é previsto como uma regra legal, mas apenas como uma cláusula contratual, estipula-se no artigo 13.º o prémio de subestadia, e a sua taxa. Esta corresponde à geralmente adoptada a nível internacional, com raízes à vista no nosso direito.
De caso pensado, opta-se, no n.º 1 do artigo 13.º, pela configuração das sobrestadias como um suplemento do frete. Realmente, a ultrapassagem do tempo de estadia ou de prancha (laytime), se corresponderá a uma demora, não deverá ser entendida como uma situação de mora por parte do afretador. Diverge-se, pois, da teoria indemnizatória e dos seus implícitos corolários. É que, apuradas bem as coisas, a sobrestadia não integrará a violação de um dever contratual, mas o normal exercício de um direito do afretador; só que, obviamente, o fretador deverá ser compensado do sacrifício económico que daí lhe advém. Trata-se, aliás, de um específico instituto do direito marítimo, directamente ligado às operações de carregamento e de descarga. A transição do tempo de estadia para a fase da sobrestadia não significa uma mudança qualitativa; um salto de um período de cumprimento para outro de incumprimento. O que se processa é a transição de uma prestação fixa predeterminada (frete) do afretador para uma prestação variável (suplemento do frete). Esta, de resto, a solução doutrinal hoje prevalecente.
6. Na contagem das estadias, não inclui o § 2.º do artigo 545.º do Código Comercial os «domingos e dias santificados». Isto no pressuposto, que ainda hoje tem razão de ser, de que a actividade portuária se interrompe, pelo menos tendencialmente, nos domingos e feriados. Por análogo pressuposto poder-se-iam excluir também os sábados, já que neles não se cumpre, quase sempre, um dia normal do trabalho.
Parece, no entanto, não se dever manter tal critério supletivo. Desde logo, porque não será um dado inalterável que a actividade dos portos se suspenda, necessariamente, nos domingos e feriados. Aliás, a inclusão ou não inclusão dos sábados na tradicional fórmula inglesa working days tem dado motivo a frequentes controvérsias doutrinais e jurisprudenciais; o working time (ou running time) é hoje muitas vezes contado já não por dias, mas por horas. Melhor será não fazer uma concreta tipificação legal, até porque as partes se encarregam de a fazer, nas cartas-partidas. Assim, por exemplo, a cláusula «Sundays and holidays excepted» e outras do mesmo estilo.
Sucede, por outro lado, que a actividade portuária se poderá suspender por razões ocasionais, como o mau tempo, as greves, as perturbações sociais, etc.
Opta-se, assim, por uma cláusula geral, inspirada ainda no artigo 117.º do Código grego de 1958: não são considerados para a contagem das estadias os dias em que, por interrupção legal da actividade portuária ou por quaisquer outros factos objectivamente relevantes, as operações de carregamento e de descarga não se possam realizar.
7. O fretamento em casco nu não coincide com o leasing de navios, como poderia resultar da escolha terminológica que fez carreira desde o Decreto-Lei 287/83, de 22 de Junho, e que aqui não será caso de corrigir.
Não se pode confundir o fretador (em casco nu) com a sociedade de locação financeira.
Assim, o Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Contrato de fretamento
Artigo 1.º
Noção
Contrato de fretamento de navio é aquele em que uma das partes (fretador) se obriga em relação à outra (afretador) a pôr à sua disposição um navio, ou parte dele, para fins de navegação marítima, mediante uma retribuição pecuniária denominada frete.
Artigo 2.º
Forma
Designa-se carta-partida o documento particular exigido para a válida celebração do contrato de fretamento.
Artigo 3.º
Regime
O contrato de fretamento é disciplinado pelas cláusulas da carta-partida e, subsidiariamente, pelas disposições do presente diploma.
Artigo 4.º
Modalidades
O contrato de fretamento pode revestir as modalidades seguintes:a) Por viagem;
b) A tempo;
c) Em casco nu.
CAPÍTULO II
Contrato de fretamento por viagem
Artigo 5.º
Noção
Contrato de fretamento por viagem é aquele em que o fretador se obriga a pôr à disposição do afretador um navio, ou parte dele, para que este o utilize numa ou mais viagens, previamente fixadas, de transporte de mercadorias determinadas.
Artigo 6.º
Carta-partida
1 - A carta-partida deve conter os elementos seguintes:a) A identificação do navio, através do nome, nacionalidade e tonelagem;
b) A identificação do fretador e do afretador;
c) A quantidade e a natureza das mercadorias a transportar;
d) Os portos de carga e os de descarga;
e) Os tempos previstos para o carregamento e para a descarga, denominados estadias;
f) A indemnização convencionada em caso de sobrestadia;
g) O prémio convencionado em caso de subestadia;
h) O frete.
2 - Os danos resultantes da omissão de qualquer dos elementos referidos no número anterior são imputáveis ao fretador, salvo prova em contrário.
Artigo 7.º
Obrigações do fretador
Constituem obrigações do fretador:a) Apresentar o navio ao afretador na data ou época e no local acordados;
b) Apresentar o navio, antes e no início da viagem, em estado de navegabilidade, devidamente armado e equipado, de modo a dar integral cumprimento ao contrato;
c) Efectuar as viagens previstas na carta-partida.
Artigo 8.º
Gestão náutica e gestão comercial
A gestão náutica e a gestão comercial do navio pertencem ao fretador.
Artigo 9.º
Obrigações do afretador
Constituem obrigações do afretador:a) Entregar ao fretador as quantidades de mercadoria fixadas na carta-partida;
b) Efectuar as operações de carregamento e de descarga do navio dentro dos prazos estabelecidos na carta-partida;
c) Pagar o frete.
Artigo 10.º
Não apresentação da mercadoria para embarque
O afretador é obrigado a pagar o frete por inteiro, ainda que não apresente a totalidade da mercadoria para embarque, no prazo e no local fixados.
Artigo 11.º
Embarque de mercadoria que exceda a convencionada
Se o navio carregar quantidade de mercadoria superior à convencionada, o afretador é obrigado ao pagamento de um frete suplementar proporcional à quantidade excedente.
Artigo 12.º
Estadias
1 - Se a carta-partida nada dispuser sobre estadias, compete ao fretador fixá-las segundo critérios de razoabilidade, tendo em conta as circunstâncias do caso e os usos do porto.2 - Se a carta-partida fixar, autonomamente, as estadias para as operações de carregamento e de descarga, estas não são cumuláveis e devem ser contadas em separado.
3 - Excluem-se da contagem das estadias os dias em que, por interrupção legal da actividade portuária ou por quaisquer outros factos objectivamente relevantes, as operações de carregamento e de descarga não se possam realizar.
4 - A contagem das estadias inicia-se no primeiro período de trabalho normal que se siga à entrega ao afretador do aviso de navio pronto, desde que este aviso tenha sido entregue até ao termo do período de trabalho normal antecedente.
5 - Considera-se horário de trabalho normal o que, nesses termos, seja praticado pelos trabalhadores portuários do respectivo porto.
6 - O momento a partir do qual é legítima a entrega do aviso de navio pronto é definido pelos usos do porto.
Artigo 13.º
Sobrestadias e subestadias
1 - Quando for ultrapassado o tempo de estadia, o navio entra em sobrestadia; esta dá lugar ao pagamento pelo afretador ou fretador de um suplemento do frete proporcional ao tempo excedente.2 - Quando não for utilizado inteiramente o tempo de estadia, o afretador tem direito a um prémio de subestadia proporcional ao tempo não gasto.
3 - A taxa de subestadia corresponde a metade da taxa de sobrestadia.
Artigo 14.º
Impedimento à viagem não imputável às partes
Se a viagem ou viagens não puderem ser iniciadas nas datas ou épocas previstas por causa não imputável ao fretador ou ao afretador, qualquer das partes pode resolver o contrato, sem que impenda sobre elas responsabilidade alguma quanto aos danos sofridos.
Artigo 15.º
Impedimento à viagem por causa imputável ao fretador
1 - Tornando-se a viagem ou viagens impossíveis, nas datas ou épocas previstas, por causa imputável ao fretador, torna-se este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento.
2 - Independentemente do direito à indemnização, o afretador pode resolver o contrato, exigindo a restituição da parte ou totalidade do frete já pago correspondente à viagem ou viagens não realizadas.
Impedimento à viagem por causa imputável ao afretador
1 - Tornando-se a viagem ou viagens impossíveis nas datas ou épocas previstas por causa imputável ao afretador, torna-se este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento.
2 - No caso previsto no número anterior, o fretador tem a faculdade de resolver o contrato e o direito a uma indemnização que não pode exceder o montante do frete correspondente à viagem ou viagens não efectuadas, deduzido das despesas que deixou de suportar.
3 - O portador tem direito a fazer seu o frete já recebido, até ao limite fixado no número anterior.
Artigo 17.º
Impedimento prolongado à entrada do navio no porto de descarga
1 - Se, por facto não imputável ao fretador, se verificar no porto de descarga impedimento prolongado à entrada do navio ou ao normal desenvolvimento das suas operações comerciais, tem aquele a faculdade de desviar o navio para um porto próximo que ofereça condições idênticas e efectuar aí a descarga, com o que se considera cumprido o contrato; o afretador deve ser informado de imediato.
2 - Considera-se impedimento prolongado o que se apresente superior a cinco dias.
3 - As despesas e encargos adicionais resultantes da situação prevista no n.º 1 são suportados pelo afretador.
4 - Se da situação prevista no presente artigo resultar benefício para o fretador, deve este entregar ao afretador o respectivo montante.
Artigo 18.º
Impedimento definitivo ao prosseguimento da viagem
Se, por facto não imputável ao fretador, ocorrer durante a viagem qualquer causa que impeça definitivamente o seu prosseguimento, o afretador deve pagar o frete proporcional à distância percorrida.
Artigo 19.º
Alteração do porto de destino
Se o afretador pretender descarregar toda a mercadoria ou parte dela em porto que não seja o de destino, é responsável pelo pagamento das despesas adicionais, havendo-as, e não tem direito a qualquer redução do frete na hipótese inversa.
Artigo 20.º
Despesas que cabem ao fretador
São suportadas pelo fretador todas as despesas inerentes ao navio, designadamente com:a) O combustível e os lubrificantes;
b) A água;
c) Os mantimentos;
d) Os seguros relativos ao navio, independentemente da sua natureza;
e) Os custos da tripulação.
Artigo 21.º
Direito de retenção
1 - Para garantia dos créditos emergentes do fretamento, o fretador goza do direito de retenção sobre as mercadorias transportadas.2 - Sempre que pretenda exercer este direito, o fretador deve notificar o destinatário ou consignatário, dentro das 48 horas imediatas à chegada do navio ao porto de descarga.
3 - Em tudo o mais observar-se-á o disposto sobre direito de retenção no contrato de transporte de mercadorias por mar.
CAPÍTULO III
Contrato de fretamento a tempo
Artigo 22.º
Noção
Contrato de fretamento a tempo é aquele em que o fretador se obriga a pôr à disposição do afretador um navio, para que este o utilize durante certo período de tempo.
Artigo 23.º
Carta-partida
Além dos elementos referidos nas alíneas a), b) e h) do n.º 1 do artigo 6.º, a carta-partida deve ainda conter os seguintes:a) O período de duração do fretamento;
b) Os limites geográficos dentro dos quais o navio pode ser utilizado;
c) A indicação das mercadorias que o navio não pode transportar.
Artigo 24.º
Obrigações do fretador
Constituem obrigações do fretador as indicadas nas alíneas a) e b) do artigo 7.ºArtigo 25.º
Gestão náutica
A gestão náutica do navio pertence ao fretador.
Artigo 26.º
Gestão comercial
A gestão comercial do navio pertence ao afretador.
Artigo 27.º
Combustível
1 - É suportada pelo afretador a despesa com o combustível do navio.2 - O afretador deve fornecer o combustível apropriado, que corresponda às características e especificações técnicas indicadas pelo fretador.
Artigo 28.º
Capitão
Em tudo quanto se relacione com a gestão comercial do navio, o capitão deve obedecer às ordens e instruções do afretador, dentro dos limites da carta-partida, sem prejuízo do cumprimento das obrigações específicas da sua função.
Artigo 29.º
Início e vencimento do frete
1 - O frete inicia-se a partir do dia em que o navio é posto pelo fretador à disposição do afretador, nas condições definidas pela carta-partida.2 - O frete vence-se em cada quinzena e deve ser pago adiantadamente.
3 - O afretador pode deduzir nos pagamentos a fazer nos termos do número anterior as despesas que haja realizado por conta do fretador.
4 - O afretador tem a faculdade de deduzir, nos últimos pagamentos, as quantias que, atendendo à data da reentrega do navio, razoavelmente possam ser consideradas em dívida, nessa data, pelo fretador.
Artigo 30.º
Suspensão do frete
Não é devido frete durante os períodos em que se torne impossível a utilização comercial do navio, por facto não imputável ao afretador.
Artigo 31.º
Prolongamento do fretamento
1 - O fretador não é obrigado a iniciar uma viagem cuja duração previsível exceda a fixada na carta-partida; porém, se o fizer, apenas terá direito ao frete proporcional ao prolongamento do fretamento.2 - Se, por facto imputável ao afretador, o afretamento exceder a duração prevista na carta-partida, o fretador tem direito, pelo tempo excedente, ao dobro do frete estipulado.
Artigo 32.º
Responsabilidade por avarias
O afretador é responsável pelas avarias causadas ao navio em resultado das operações comerciais.
CAPÍTULO IV
Contrato de fretamento em casco nu
Artigo 33.º
Noção
Contrato de fretamento em casco nu é aquele em que o fretador se obriga a pôr à disposição do afretador, na época, local e condições convencionados, um navio, não armado nem equipado, para que este o utilize durante certo período de tempo.
Artigo 34.º
Carta-partida
A carta-partida deve conter os elementos mencionados nas alíneas a), b) e h) do n.º 1 do artigo 6.º e na alínea a) do artigo 23.ºArtigo 35.º
Gestão náutica e gestão comercial
A gestão náutica e a gestão comercial do navio pertencem ao afretador.
Artigo 36.º
Armamento e equipagem
Compete ao afretador armar e equipar o navio.
Artigo 37.º
Reparação, manutenção e seguros
São suportados pelo afretador:a) As despesas de conservação e reparação necessárias à navegabilidade do navio e todas as que não estejam abrangidas no artigo 38.º;
b) Os seguros relativos ao navio, independentemente da sua natureza.
Artigo 38.º
Vício próprio do navio
1 - São suportadas pelo fretador as despesas com as reparações e substituições resultantes de vício próprio do navio.2 - Durante o período das reparações e substituições previstas no número anterior não é devido frete.
Artigo 39.º
Utilização do navio
1 - O afretador pode utilizar o navio em todos os tráfegos e actividades compatíveis com a sua finalidade normal e características técnicas.2 - Pode igualmente o afretador usar os materiais de bordo, devendo, no termo do contrato, restituir o navio com a mesma quantidade e qualidade de tais materiais, salvo o desgaste próprio do seu uso normal.
Artigo 40.º
Reentrega do navio
O afretador deve, no termo do contrato, restituir o navio ao fretador no mesmo estado e nas mesmas condições em que o recebeu, salvo o desgaste próprio do seu uso normal.
Artigo 41.º
Direitos de terceiro contra o fretador
O afretador deve reembolsar o fretador de todas as importâncias que este seja obrigado a pagar a terceiros em consequência da exploração comercial do navio.
Artigo 42.º
Direito subsidiário
São aplicáveis subsidiariamente a este contrato, com as necessárias adaptações, as normas relativas ao contrato de fretamento a tempo e a disciplina da lei geral sobre o contrato de locação.
CAPÍTULO V
Disposições gerais
Artigo 43.º
Sobrecarga
1 - Durante o tempo de duração do fretamento por viagem ou a tempo, o afretador tem o direito de manter a bordo um representante seu, designado sobrecarga, para acompanhar a execução do contrato.2 - O sobrecarga não pode interferir directamente na execução do contrato, mas tem a faculdade de fazer recomendações ao capitão do navio em tudo quanto se relacione com a administração da carga.
3 - O fretador é obrigado a fornecer alojamento ao sobrecarga, mas as despesas de alimentação são suportadas pelo afretador.
Artigo 44.º
Conduta do capitão
Quando a actuação do capitão do navio for de molde a prejudicar os interesses comerciais do afretador, tem este a faculdade de exigir ao fretador a sua substituição.
Artigo 45.º
Subfretamento e cessão da posição contratual do afretador
1 - O subfretamento ou a cessão da posição contratual pelo afretador carecem de autorização escrita do fretador.
2 - São aplicáveis ao subfretamento as disposições legais que regulam o contrato de fretamento.
Artigo 46.º
Regime da responsabilidade
O direito de indemnização decorrente da violação do contrato de fretamento deve ser exercido no prazo de dois anos a partir da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete.
Artigo 47.º
Tribunal competente
1 - Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para o julgamento das acções emergentes do contrato de fretamento ou subfretamento em qualquer dos casos seguintes:a) Se o porto de carga ou de descarga se situar em Portugal;
b) Se o contrato de fretamento ou subfretamento tiver sido celebrado em Portugal;
c) Se o navio arvorar a bandeira portuguesa ou estiver registado em Portugal;
d) Se a sede, sucursal, filial ou delegação do fretador eu subfretador, ou do afretador ou subafretador, ou do carregador, ou do destinatário ou consignatário, se localizar em território português.
2 - Nas situações não previstas no número anterior a determinação da competência internacional dos tribunais para julgamento das acções emergentes do contrato de fretamento ou de subfretamento é feita de acordo com as regras gerais.
Artigo 48.º
Âmbito de aplicação
O disposto no presente diploma não se aplica a navios de tonelagem de arqueação bruta inferior a 10 t.
Artigo 49.º
Legislação revogada
São revogados os artigos 541.º a 562.º do Código Comercial.
Artigo 50.º
Vigência
O presente diploma entra em vigor 30 dias após a sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 26 de Março de 1987. - Aníbal António Cavaco Silva - Mário Ferreira Bastos Raposo - João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Promulgado em 16 de Abril de 1987.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 21 de Abril de 1987.
Pelo Primeiro-Ministro, Eurico Silva Teixeira de Melo, Ministro de Estado.