Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira n.º 5/2014/M
ESTRATÉGIA NACIONAL PARA A PROTEÇÃO DAS CRIANÇAS CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL E OS ABUSOS SEXUAIS
O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2013, dado a conhecer ao público em finais de Março de 2014, indica que há cada vez mais casos de abusos sexuais a menores a serem participados junto dos órgãos de polícia criminal em Portugal.
De acordo com os dados do RASI, os casos de abusos sexuais de crianças subiram de 1.074 para 1.227 entre 2012 e 2013, tal como os abusos sexuais de adolescentes que passaram de 127 para 161. Igual tendência tem sido verificada nos crimes de coação sexual, que subiram de 56 para 93, e de violação, de 459 para 473, em igual período.
No total nacional, o RASI aponta para 1.716 denúncias em 2012 e 1.954 em 2013, o que significa um aumento de 12%. Tratam-se de números manifestamente preocupantes e que não devem ficar sem uma necessária intervenção.
A Convenção do Conselho da Europa para a Proteção das Crianças contra a Exploração Sexual e os Abusos Sexuais, assinada em Lanzarote a 25 de outubro de 2007, entrou em vigor para a República Portuguesa no dia 1 de dezembro de 2012, depois de aprovada, por unanimidade, para ratificação, através da Resolução da Assembleia da República nº 75/2012, de 9 de março, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República nº 90/2012, de 28 de maio.
Trata-se de um importante passo jurídico que merece toda a valorização, dada a sua importância na defesa dos direitos das crianças, designadamente face ao flagelo da exploração sexual e do abuso sexual, merecendo igualmente toda a valorização a perspetiva de reforço da proteção das crianças contra qualquer forma de violência, abuso e exploração sexual.
Precisamente porque esta temática merece toda a valorização, faz todo o sentido a exigência de que deve acompanhar este avanço jurídico, um avanço firme na concretização de uma ação preventiva em Portugal, a adoção de medidas concretas de sensibilização, e o reforço da proteção e segurança das crianças vítimas de tráfico e de abuso e exploração sexual.
Considera-se que, para concretizar um combate eficaz e multidisciplinar a este flagelo, torna-se imperioso definir uma estratégia nacional de prevenção e combate dos abusos sexuais a crianças, pelo que é indispensável o reforço dos meios materiais e humanos de intervenção preventiva.
Em tempos de agravamento da pobreza e da exploração, de criação de novas formas de pobreza, as mulheres e as crianças estão na linha da frente desta realidade. Por isso, é urgente a criação de novos mecanismos de ação e prevenção, mecanismos esses que protejam, efetivamente, as vítimas mais vulneráveis, evitando a revitimização, muitas vezes promovida pelas políticas económicas e sociais existentes.
As duras medidas antissociais que estão em curso, a nível nacional, agravam a exploração e aumentam a pobreza, diminuindo nos salários e nas pensões, destruindo serviços públicos essenciais, empurrando para a pobreza milhares de pessoas.
Neste quadro económico e social, aumenta a pobreza entre os mais vulneráveis, nomeadamente as crianças. De acordo com recentes números estatísticos, verifica-se a prática de crimes contra três crianças por dia, não estando contabilizado o crime social a que estas políticas têm votado as nossas crianças: a insuficiência de infraestruturas públicas de apoio à infância, os problemas do abandono e insucesso escolar, o encarecimento brutal da Educação e, até mesmo, a denúncia de fome crescente entre as crianças.
Por estas razões, entende-se que constitui uma indeclinável incumbência do Estado Português a adoção de medidas específicas de prevenção, através de uma Estratégia Nacional específica de prevenção contra a exploração sexual e os abusos sexuais, para a sensibilização e educação cidadã nestas matérias; a criação de estruturas de apoio; a garantia de que, através do Direito e da Justiça, se edificará uma nova cultura dos direitos da Criança; o reforço das políticas contra o tráfico de seres humanos; garantir que nem mais uma criança é vítima de qualquer tipo de abuso, protegendo-as na lei e na vida.
Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, nos termos no disposto na alínea f) do nº 1 do artigo 227º da Constituição da República Portuguesa e na alínea b) do nº 1 do artigo 37º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei 13/91, de 5 de junho, com as alterações introduzidas pela Lei 130/99, de 21 de agosto e nº 12/2000, de 21 de junho, apresenta à Assembleia da República a seguinte Proposta de Lei:
Artigo 1º
Objeto
O presente diploma cria a Estratégia Nacional para a Proteção das Crianças contra a Exploração Sexual e os Abusos Sexuais, adiante designada por Estratégia Nacional.
Artigo 2º
Âmbito
1 - A Estratégia Nacional implementará em todo o território nacional orientações resultantes da Convenção do Conselho da Europa para a Proteção das Crianças contra a Exploração Sexual e os Abusos Sexuais, assinada em Lanzarote a 25 de outubro de 2007, nas matérias que se reportam às incumbências do Estado Português.
2 - A Estratégia Nacional tem por objetivo intervir contemplando as seguintes vertentes:
a) Prevenir e combater a exploração sexual e os abusos sexuais de crianças;
b) Proteger os direitos das crianças vítimas de exploração sexual e de abusos sexuais.
Artigo 3º
Definições
Para efeitos do presente diploma e em consonância com a Convenção do Conselho da Europa para a Proteção das Crianças contra a Exploração Sexual e os Abusos Sexuais, entende-se por:
a) "Criança": qualquer pessoa com idade inferior a 18 anos;
b) "Exploração sexual e abusos sexuais de crianças": todas as práticas qualificadas como infração penal nos termos do Direito Penal português;
c) "Vítima": qualquer criança afetada pela exploração sexual e por abusos sexuais.
Artigo 4º
Objetivos
A Estratégia Nacional corresponde aos seguintes objetivos:
a) Erradicar em Portugal os problemas de exploração sexual e abuso sexual de crianças;
b) Planificar a intervenção do Estado e a intervenção dos organismos públicos e da comunidade na prevenção da exploração e abusos sexuais a crianças;
c) Implementar medidas de intervenção eficazes destinadas a prevenir os riscos de atos de exploração sexual e de abusos sexuais contra crianças;
d) Organizar campanhas específicas de educação para a proteção e os direitos da Criança;
e) Concretizar ações de difusão de medidas administrativas, políticas e programas sociais com a finalidade de prevenir a ocorrência de atos de exploração sexual e de abusos sexuais das crianças;
f) Desenvolver programas de sensibilização das populações, através dos meios de Comunicação Social, sobre o fenómeno da exploração sexual e sobre os abusos sexuais das crianças;
g) Assegurar a dinamização, nomeadamente nos sectores da Justiça, Educação, Saúde e Serviços Sociais, de políticas de prevenção da exploração sexual e dos abusos sexuais das crianças;
h) Estabelecer e divulgar programas sociais eficazes de apoio às vítimas, aos seus familiares próximos e a qualquer pessoa a quem estejam confiadas;
i) Reforçar respostas sociais ativas e estruturas multidisciplinares destinadas a prestar apoio às vítimas, com as necessárias medidas de proteção e de assistência.
Artigo 5º
Tutela
A Estratégia Nacional é definida, coordenada e desenvolvida sob tutela do Ministério responsável pelas políticas sociais, que garante os meios físicos, humanos e financeiros necessários à sua implementação e lhe atribui as correspondentes dotações orçamentais.
Artigo 6º
Unidade de monitorização
Para acompanhamento e avaliação da eficácia da Estratégia Nacional e das medidas específicas a implementar no quadro do presente diploma, é criada a Unidade de Monitorização.
Artigo 7º
Composição
A Unidade de Monitorização é composta por:
a) Uma individualidade a indicar pela Assembleia da República, a ser eleita por dois terços dos deputados, e que presidirá ao organismo;
b) Uma individualidade a indicar pelo Procurador-Geral da República;
c) Uma individualidade a indicar pelo Provedor de Justiça;
d) Um representante da Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens em Risco;
e) Um representante da Direção-Geral da Segurança Social;
f) Um representante da Ordem dos Advogados;
g) Um representante da União das Misericórdias;
h) Um representante da União das Instituições Particulares de Solidariedade Social.
Artigo 8º
Instalação
A Unidade de Monitorização será instalada 90 dias após a entrada em vigor do presente diploma.
Artigo 9º
Relatório anual
A Unidade de Monitorização elabora e torna público, em cada ano de implementação da Estratégia Nacional, o Relatório de avaliação à eficácia dos impactos das políticas de prevenção e à proteção das crianças contra a exploração sexual e os abusos sexuais.
Artigo 10º
Debate anual
A Assembleia da República fixa, anualmente, por volta do "Dia da Criança" (1 de junho), um debate especial sobre tudo quanto se reporta à proteção das crianças e, em especial, às medidas de combate à exploração sexual e aos abusos sexuais.
Artigo 11º
Regulamentação
O Governo procederá, no prazo de 60 dias após a entrada em vigor do presente diploma, à sua regulamentação.
Artigo 12º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor após a publicação do Orçamento do Estado posterior à publicação deste diploma.
Aprovada em sessão plenária da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira em 6 de maio de 2014.
O Presidente da Assembleia Legislativa, José Miguel Jardim Olival de Mendonça.