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Parecer 2/2012, de 7 de Março

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Sumário

Emite parecer sobre Proposta de Revisão da Estrutura Curricular para o Ensino Básico e Secundário.

Texto do documento

Parecer 2/2012

Parecer sobre Proposta de Revisão da Estrutura Curricular para o Ensino Básico e

Secundário

Preâmbulo

No uso das competências que por lei lhe são conferidas, e nos termos regimentais, após apreciação do projeto de Parecer elaborado pelos Conselheiros Fernando Bexiga, Maria Arminda Bragança e Maria Emília Brederode Santos, o Conselho Nacional de Educação, em reunião plenária de 23 de fevereiro de 2012, deliberou aprovar o referido projeto, emitindo assim o seu primeiro Parecer no decurso do ano

de 2012.

Parecer

I - Introdução

Por solicitação do Ministério da Educação, o CNE pronuncia-se, através de parecer, sobre a Proposta de Revisão da Estrutura Curricular para o Ensino Básico e

Secundário, em discussão pública.

Trata-se da 6a revisão do currículo do Ensino Básico (2002, 2007, 2008, 2011 - agosto e dezembro) e do Ensino Secundário (2004, 2006, 2007, 2008 e 2011), sobre a organização estabelecida em 2001 que no essencial vigorou até ao presente.

As alterações propostas só poderão ser entendidas à luz da configuração que resultou destas várias revisões, pelo que o presente Projeto de Parecer faz anteceder a análise da atual Proposta de Revisão de uma síntese das características essenciais do currículo

em vigor e do sentido da sua evolução.

Esta análise é complementada com um breve esboço das tendências internacionais de desenvolvimento de currículos, aspetos do processo de ensino e resultados obtidos e com as recomendações que o CNE produziu anteriormente sobre matéria idêntica, pois se considera que constituem a expressão do consenso, em cada momento, entre os vários atores com interesses na educação, representados no Conselho.

As conclusões sintetizam os aspetos essenciais suscitados no decorrer da análise, mas também integram os valiosos contributos de personalidades ouvidas, representantes da administração, profissionais e especialistas em teoria e desenvolvimento curricular e

neurociências cognitivas.

II - Configuração e evolução do currículo A configuração curricular sobre que impendem as alterações propostas foi estabelecida em 2001 pelos Decretos-Leis n.os 6 e 7 de 18 de janeiro, em resultado de um processo de «revisão participada do currículo».

Esta configuração consagrava uma matriz comum aos ensinos básico e secundário, constituída por três componentes de natureza complementar - disciplinar, curricular não-disciplinar e transdisciplinar - além de um tempo específico de livre escolha da

escola.

A distribuição destas componentes pelos vários graus de ensino não era uniforme, porquanto obedecia a critérios de especialização progressiva das aprendizagens, concordantes com o estabelecido na lei de Bases.

Esta racionalidade subjaz a toda a organização curricular, mas é especialmente visível

em duas das suas dimensões:

1) Por um lado, a proporção da componente disciplinar progride até atingir o máximo da sua expressão no ensino secundário - 2.º ciclo 80 %; 3.º ciclo 83 %; ensino secundário 89 % -, enquanto cede lugar à componente não-disciplinar, que cresce em sentido inverso - 2.º ciclo 17 %; 3.º ciclo 14 %; ensino secundário 11 %;

2) Por outro lado, a organização interna da componente disciplinar inicia-se com um «ensino globalizante» no 1º ciclo, prossegue em «áreas interdisciplinares de formação básica» no 2º ciclo e «por disciplina ou grupo de disciplinas» no 3º, e culmina com uma organização essencialmente disciplinar no ensino secundário, em que «cada professor é responsável, em princípio, por uma só disciplina».

A vertente curricular não disciplinar é de gestão autónoma das escolas, não tem programas associados, e compreende as áreas de projeto, estudo acompanhado e formação cívica no ensino básico e apenas a primeira no ensino secundário. Assumia-se como uma componente de integração curricular, de «realização de aprendizagens significativas e formação integral dos alunos», a que o ensino secundário aliava objetivos de orientação escolar e profissional e aproximação ao mundo do trabalho.

Por sua vez, a vertente transdisciplinar, que deveria ser desenvolvida em todas as componentes do currículo, sendo da responsabilidade de todos, tinha por objeto a educação para a cidadania, a valorização da língua portuguesa e da dimensão humana do trabalho, além do desenvolvimento de competências no domínio das TIC, a que se foram progressivamente associando outras dimensões.

Evolução da configuração inicial

As revisões iniciais do currículo do ensino básico mantiveram praticamente intacto o racional descrito, mas a opção por ajustamentos esporádicos, em detrimento de práticas sistemáticas de diagnóstico e monitorização, acabou por introduzir alterações que progressivamente a privaram de elementos essenciais, desvirtuando o modelo e a

sua coerência interna.

Nestes ajustamentos insere-se, por exemplo, uma progressiva «disciplinarização» dos primeiros graus de escolaridade, com marcação de tempos para áreas específicas no 1.º ciclo, mas também o modo como a componente curricular não-disciplinar foi sendo apropriada pelas escolas, em alguns casos sancionado pela própria administração. No ensino secundário e no contexto de uma redução global do tempo atribuído a este nível de ensino, já a revisão de 2004 tinha alterado a proporção desta área de 11 % para 4

%.

Mais esbatidos os pressupostos do modelo, na revisão de 2011 a componente não disciplinar acabou por ser reduzida à sua expressão mínima, passando o 2.º ciclo a contar neste domínio com 9 % do currículo obrigatório, o que correspondia a pouco mais de metade do que lhe tinha sido atribuído em 2001 (17 %). No 3.º ciclo e ensino secundário a redução foi ainda superior, passando no primeiro caso de 14 % para 3 % e no segundo de 11 % para 4 % e mais recentemente para 1 %.

Esta redução deve-se à extinção da área de projeto em todos os graus de ensino e da

área de estudo acompanhado no 3.º ciclo.

Resumindo, em 2011, a componente curricular não-disciplinar viu mais reduzida a sua proporção no currículo obrigatório, ficou privada da dimensão de projeto, manteve o estudo acompanhado apenas no 2.º ciclo, mas reforçou a Formação Cívica, introduzindo-a pela primeira vez no ensino secundário (10º ano), com um tempo de 45 minutos semanais, amplamente comprometido com a integração obrigatória da educação para a saúde e a sexualidade nesse tempo letivo.

Por sua vez, o espaço curricular de livre decisão da escola, que ocupava 3 % do currículo obrigatório no 2.º ciclo, acabou por ser extinto em 2011, enquanto o do 3.º

ciclo veio a ser reforçado até aos 5 %.

A esta orientação correspondeu um maior investimento na componente disciplinar, com particular incidência nas disciplinas de língua portuguesa e matemática, o que vinha já acontecendo nas escolas, pela ocupação do espaço de área de projeto e de estudo acompanhado na aplicação institucional dos planos de matemática e de leitura. O aumento do tempo de contacto com estas duas disciplinas veio a ser legitimado em 2011 na posição que passaram a ocupar nos planos curriculares do ensino básico:

aumentou a carga horária em ambas as disciplinas, mas com uma evolução superior em Matemática que lhe permitiu atingir o mesmo nível de Português - 6 blocos semanais de 90 minutos no 2.º ciclo e 7,5 blocos no 3.º ciclo.

No ensino secundário, a componente de formação geral estabilizou a partir de 2004, relativamente à composição e carga horária das disciplinas, enquanto a de formação específica se situou em 2007 num elenco de opções composto por uma disciplina trienal, duas bianuais e duas anuais. A composição da formação geral apenas se alterou em 2004, para dar lugar às TIC no 10.º ano, mas logo se extinguiu na revisão seguinte,

em 2007.

A maior parte das alterações verificadas entre 2001 e 2011 podem, portanto, resumir-se a uma redução na componente não disciplinar, a uma aposta simétrica na especialização do saber, dando particular ênfase à língua materna e à matemática, e, por fim, à redução da carga horária global do 3º ciclo e do ensino secundário.

A carga horária do 2.º ciclo manteve-se inalterada nas várias revisões curriculares; a do 3.º ciclo sofreu em 2011 uma redução de 90 minutos semanais, e a do ensino secundário afeta o 12.º ano, tendo embora aumentado em 0,5 bloco semanal o tempo atribuído ao 10.º ano para abrir caminho à introdução da Formação Cívica.

III - Em que consiste a revisão proposta

A proposta em apreço assume-se como o primeiro passo para a introdução de reformas curriculares mais profundas, subordinando-se a propósitos de gestão racional de recursos e de melhoria dos resultados escolares. A estratégia traçada para alcançar os objetivos assenta, nesta fase, nos seguintes pressupostos: (1) «redução da dispersão curricular»; (2) reforço de «disciplinas essenciais»; (3) focalização em «conteúdos disciplinares centrais», associada à «definição de objetivos claros, rigorosos, mensuráveis e avaliáveis»; (4) «redução do controlo central do sistema educativo, apostando na autonomia gradual das escolas, no profissionalismo e na liberdade dos professores relativamente aos métodos de ensino».

Nos seus próprios termos, a Proposta em análise dá continuidade aos ajustamentos efetuados em 2011 na organização curricular dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico (Decreto-Lei 94/2011, de 3 de agosto) e do ensino secundário (Decreto-Lei n.º

50/2011, de 8 de abril).

Em relação a esta revisão mais recente, é de sublinhar a reafirmação do reforço da carga horária das disciplinas de língua portuguesa e matemática, assumidas como «conhecimento estruturante»; o reforço das ciências humanas e sociais, considerado essencial no 3.º ciclo; e o das ciências físicas e naturais, que recebem o maior aumento.

A confirmação do que já tinha sido atribuído a língua portuguesa e matemática e o atual reforço das restantes áreas mencionadas determina que a componente de línguas, matemática, ciências humanas e sociais e físico-naturais atinja no 3º ciclo uma percentagem de 81 % do currículo obrigatório, ocupando a educação artística,

tecnológica e física apenas 19 %.

A aposta no «conhecimento científico» constante da Proposta em apreço é também patente no «reforço de horas de ensino das ciências experimentais no 3.º ciclo do Ensino Básico, colmatando neste nível de ensino uma clara insuficiência de carga horária», e na intenção de alteração da sua organização que assim poderá seguir o exemplo do que atualmente se passa no 9.º ano, na disciplina de Físico-Química, possibilitando o desenvolvimento da atividade experimental dos alunos.

Continuando o desinvestimento na componente não disciplinar, assumido em 2011, a revisão em análise propõe a eliminação da formação cívica nos 2.º e 3.º ciclos e a oferta obrigatória e frequência facultativa da área de apoio ao estudo.

A eliminação de um espaço específico orientado para a formação cívica contrapõe-se à política desenvolvida nos últimos anos relativamente a este domínio, traduzida (i) na constituição de um grupo de trabalho para a elaboração de uma proposta curricular de educação para a cidadania para os 12 anos de escolaridade que contempla um tempo específico, (ii) na inserção da disciplina de formação cívica no ensino secundário (pela primeira vez em abril de 2011), e (iii) na elaboração de orientações curriculares dirigidas à nova disciplina do 10.º ano, homologadas em 23 de novembro do ano letivo

que decorre.

A redução desta área à sua dimensão transdisciplinar deixa de fora precisamente a vertente agora mais valorizada dos conceitos e conhecimentos, que não prescinde de um tempo dedicado para o seu ensino e assimilação.

Com estas opções extingue-se totalmente a componente curricular não-disciplinar, retirando, assim, à matriz de 2001 uma parte significativa dos seus elementos estruturantes. Esta medida indicia a opção por um outro conceito de organização curricular e, desde logo, a configuração de uma outra matriz, mais tendente a aprofundar as fronteiras dos saberes que a compõem.

A parcelização da área artística e tecnológica que agora se propõe para o 2.º ciclo (em educação visual e educação tecnológica), aliada à eliminação da área agregadora das disciplinas vem confirmar esta tendência e contraria as orientações da lei de Bases. A este propósito, haverá que ter em conta a formação de professores que, sendo um elemento crítico em qualquer processo de mudança no campo da educação, constitui um aspeto incontornável na análise das implicações desta medida, porquanto os programas de formação inicial se terão vindo a consolidar em sentido oposto, em

resultado da orientação anterior.

A antecipação das TIC para o 2.º ciclo, quando equacionada com a atribuição de um espaço curricular partilhado com a educação tecnológica e com as alterações avulsas a que a disciplina tem sido submetida, pode representar a desvalorização destas áreas e denota a ausência de uma política claramente assumida para este setor e em particular para o desenvolvimento da literacia mediática. Abstraindo desta inserção curricular, é justificada a iniciação às TIC num nível de escolaridade mais baixo, de forma a que os alunos adquiram competências básicas, apropriadas à sua faixa etária, mas sem descurar a sua continuidade no 3º Ciclo e Ensino Secundário, aprofundando sucessivamente os conhecimentos e competências correspondentes, de modo a serem rentabilizadas nas diversas áreas curriculares.

Esta revisão propõe também que o espaço específico de livre escolha da escola seja eliminado, em sentido contrário ao do reforço que lhe tinha sido atribuído quatro meses antes e à afirmação de aumento gradual da autonomia das escolas, contemplada no

documento em apreço.

O 2.º ciclo, cuja carga horária se tinha mantido inalterada nas várias revisões, passa agora a contar com menos 3 blocos semanais de 90 minutos; o 3.º ciclo, privado de um bloco em 2011, reduz agora mais 90 minutos; por sua vez, o ensino secundário, além de perder o meio bloco que tinha ganho na revisão anterior, reduz mais três blocos de

90 minutos no 12.º ano.

Esta redução no 12.º ano é devida à eliminação de uma das opções anuais da componente de formação específica. A este propósito, será de ter em conta que a eliminação de uma opção no ensino secundário poderá limitar o campo de experiências em que se baseia a escolha de percursos escolares e profissionais. Um leque mais alargado de disciplinas possibilita o contacto com uma maior variedade de conteúdos científicos, enquanto suporte de uma escolha mais informada e mais sólida, nomeadamente na opção por formações de nível superior.

Em suma, a revisão agora proposta, não só restringe o âmbito do currículo, como altera o seu equilíbrio interno, afeta a extensão e contradiz alguns dos seus próprios

pressupostos.

Não são explícitas na Proposta as razões que justificam a mudança, os fundamentos das opções preconizadas e a oportunidade de uma nova revisão num prazo tão curto

em relação à revisão anterior.

IV - Tendências internacionais

Desenho curricular

Em 2006, uma Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho (2006/962/EC) estabeleceu o Quadro de Referência Europeu sobre Competências Essenciais para a Aprendizagem ao Longo da Vida, apelando aos Estados-Membros para que proporcionassem a oportunidade de desenvolver um conjunto de competências essenciais, de forma a que os jovens as tenham adquirido no final da sua educação e formação inicial, a um nível que constitua uma base para a aprendizagem futura e para a vida profissional, e que os adultos as desenvolvam e atualizem ao longo da vida.

Este referencial é constituído por oito competências interrelacionadas, consideradas de igual importância e potenciadoras de efeitos recíprocos: (1) Comunicação em língua materna; (2) Comunicação em línguas estrangeiras; (3) Competência matemática e competências básicas em ciências e tecnologia; (4) Competência digital; (5) Aprender a aprender; (6) Cidadania; (7) Sentido de iniciativa e empreendedorismo; e (8) Consciência cultural e expressão.

Além destas, são definidas áreas transversais a todo o referencial, que igualmente se aplicam a qualquer das competências referidas. São estas: pensamento crítico, criatividade, iniciativa, resolução de problemas, avaliação do risco, tomada de decisão

e a gestão construtiva de sentimentos.

O referencial estabelecido constitui um currículo mínimo e é nesse sentido que tem vindo a influenciar as reformas curriculares de vários países, como consta do relatório de acompanhamento da Comunicação Improving competences for 21st Century: An Agenda for European Cooperation on Schools. No entanto, segundo este mesmo documento, já em 2002 um estudo da Eurydice sobre a mesma matéria tinha dado conta de que os currículos dos vários países estavam a centrar-se cada vez mais na aplicação de conhecimento e desenvolvimento de capacidades, com base no pressuposto de que esta perspetiva aumenta as probabilidades de transferência dos

conhecimentos.

Os estudos realizados em 2004 e 2007, no âmbito do grupo de trabalho Key Competences-Curriculum Reform, vieram a confirmar esta tendência.

Coerência curricular

Por outro lado, o acompanhamento do impacto nas escolas de reformas curriculares baseadas nas competências essenciais também tem identificado elementos críticos que podem impedir ou enviesar as orientações traçadas. Referem-se essencialmente à preparação dos professores, ao grau de fechamento do currículo e à adequação dos

materiais de ensino.

Estes fatores de sucesso ou insucesso das mudanças curriculares têm sido amplamente estudados, sendo recorrente a chamada de atenção para a sua importância. Mais recentemente, esta preocupação emerge de novo em resultado da comparação entre os sistemas educativos dos países que revelam melhor desempenho nas avaliações internacionais do PISA, TIMSS e PIRLS (1), que constituem o referente, por exemplo,

da revisão em curso no Reino Unido.

Perante a diversidade de configurações curriculares destes países, o que transparece como comum, não é tanto o conteúdo ou a forma dos planos de estudo - que não podem ser dissociados dos contextos culturais em que ocorrem -, mas a capacidade de garantirem a coerência curricular a todos os níveis. Num estudo realizado na Universidade de Cambridge, Tim Oates (2) conclui que o que mais aproxima os países de melhor desempenho nas avaliações internacionais é uma atenção privilegiada a fatores de controlo que designa de fatores de coerência do currículo: «O sistema é considerado coerente quando o conteúdo do currículo nacional, os manuais, o que se ensina, a pedagogia, a avaliação e os incentivos estão alinhados uns com os outros e se

reforçam mutuamente» (p.15).

Evolução do desempenho na avaliação do PISA Desde que se iniciou o PISA (2000), é na edição de 2009 que pela primeira vez os alunos portugueses atingem pontuações que se situam na média da OCDE. Portugal foi, aliás, dos países que mais progrediu em leitura (entre os ciclos 2000 e 2009) e em Matemática (entre 2003 e 2009) e o segundo que mais progrediu em Ciências (entre os

ciclos 2003 e 2009).

Estes progressos resultam da redução da percentagem de alunos com baixos níveis de proficiência (níveis 1 e abaixo de 1) e aumento dos de desempenho médio e excelente (níveis 3, 4, 5 e 6). Mas também se devem ao facto de Portugal ter apresentado uma maior percentagem de alunos no ano modal, isto é, de alunos com 15 anos no 10º ano, que tradicionalmente atingem níveis próximos da média da OCDE. Ao aumentar a percentagem de alunos com 15 anos no ano que corresponde à sua idade - o que indicia a diminuição de retenções - aumentou a percentagem dos alunos envolvidos no PISA que estariam mais preparados para este tipo de provas.

É, no entanto, ao nível da equidade que Portugal apresenta os maiores ganhos: ocupa o sexto lugar no conjunto de 35 países, quanto à compensação das assimetrias económicas, tendo-se registado progressos consideráveis, entre 2000 e 2009, no desempenho dos jovens com índice económico, social e cultural mais baixo.

O PISA, porém, também confirma que a maior parte dos que apresentam fraco desempenho são de condição socioeconómica desfavorável, havendo, no entanto, alguns que, estando posicionados nos níveis mais baixos do índice socioeconómico do país de origem, conseguem mesmo assim obter pontuações dos níveis superiores da escala de proficiência - são os chamados alunos resilientes. Ora a este nível, para além de quatro primeiros países asiáticos com mais de 50 %, Portugal acompanha a Finlândia, o Japão, a Turquia, o Canadá e Singapura entre os países que obtêm maior percentagem de alunos resilientes (entre 39 % e 48 %).

Apesar dos progressos assinalados, persiste um considerável percurso a vencer em relação à percentagem de alunos que atingem os níveis superiores da escala de proficiência. Neste caso, Portugal apresenta percentagens sempre inferiores à média da UE e da OCDE, nas três áreas avaliadas: literacia de leitura, matemática e ciências.

V - Posições anteriores do CNE

O Conselho Nacional de Educação produziu entre janeiro de 2011 e janeiro de 2012 vários pareceres, recomendações e relatórios, que se cruzam com alguns dos pressupostos que estão presentes na Proposta de Revisão da Estrutura Curricular apresentada pelo Ministério da Educação e Ciência, agora em análise. Referimo-nos a:

Recomendação sobre O Estado da Educação 2010 - Percursos Escolares Parecer sobre a Reorganização Curricular do Ensino Básico;

Parecer sobre as Metas de Aprendizagem;

Parecer sobre a Reorganização Curricular do Ensino Secundário;

Recomendação sobre a Educação para o Risco;

Parecer sobre o Programa Educação 2015;

Recomendação sobre Educação para a Literacia Mediática;

Síntese do relatório O Estado da Educação 2011: A Qualificação dos Portugueses Recomendação sobre Educação para a Cidadania.

Como acima dito, a proposta de Revisão da Estrutura Curricular apresentada pelo Ministério da Educação e Ciência assenta, essencialmente, nos seguintes pressupostos:

«A melhoria dos resultados escolares dos nossos alunos»;

«Definição de objetivos claros, rigorosos, mensuráveis e avaliáveis. [...] Neste sentido, o desenvolvimento do ensino [...] terá como referência novas metas e novos

programas.»

«Uma gestão racional dos recursos».

A redução da dispersão curricular, «centrando mais o currículo nos conhecimentos fundamentais e reforçando a aprendizagem das disciplinas essenciais»;

«Esta revisão tem ainda, como um dos seus princípios a redução do controlo central do sistema educativo, apostando na autonomia gradual das escolas...» (3) Parece-nos relevante começar por referir algumas recomendações que constam do «Estado da Educação 2011 - A Qualificação dos Portugueses», no que diz respeito «à etapa da revisão da estrutura curricular que agora se inicia e abre caminho a reformas curriculares mais profundas» e à «gestão racional dos recursos» - que não significa necessariamente menos investimento na educação:

"A continuidade das políticas educativas é crucial para o desenvolvimento estratégico da Educação e Formação e não se coaduna com alterações avulsas na estrutura e

organização do sistema.

"Em tempos de crise, Educação e Ciência são garantia de futuro pelo que é fundamental que a Educação e Formação sejam encaradas como garante do desenvolvimento das pessoas e dos países e, como tal, não devem deixar de ocupar o centro das políticas e constituir uma prioridade do investimento público». (p. 270) Também os dois pareceres sobre a Reorganização Curricular do Ensino Básico (Parecer 1/2011) e a Reorganização Curricular do Ensino Secundário (Parecer 3/2011) referem explicitamente a necessidade de se evitarem as alterações curriculares avulsas e pontuais que geralmente se associam a uma lógica de mais normativos, que resultam na perda de coerência e de consistência do sistema educativo.

Referindo-nos, em seguida, aos outros pressupostos da proposta em análise, começaríamos pelo que diz respeito à melhoria dos resultados dos nossos alunos.

Já o Estado da Educação 2011 retoma recomendações anteriormente aprovadas e que «apontam para a necessidade de promover a melhoria das aprendizagens e intervir aos primeiros sinais de dificuldade, como forma de evitar a acumulação de repetências

[...]». (p. 271)

O CNE preferiu sempre utilizar «a melhoria das aprendizagens dos alunos», pois ela, necessariamente, se refletirá nos resultados que os alunos terão ao longo do ano letivo e na bateria de testes que terão de realizar durante o seu percurso escolar, no âmbito da escolaridade obrigatória. Por isso, no Parecer sobre o Programa Educação 2015 se

recomenda que:

"O Ministério da Educação se empenhe em assegurar a coerência e a articulação das alterações que se propõe introduzir no sistema educativo, de modo a focalizar o trabalho das escolas no cumprimento dos objetivos prioritários que permitam melhorar

as aprendizagens de todos os alunos.»(4)

Este Parecer está articulado com um outro, de data próxima, sobre as Metas de Aprendizagem. Logo no início das Recomendações se ressalta «[... ] a importância de que se reveste a construção de um dispositivo de apoio à gestão da atividade curricular destinado, sobretudo, a melhorar procedimentos de monitorização e avaliação das aprendizagens, com vista à regulação e readequação sistemáticas do trabalho curricular dos alunos e dos 'professores.», sublinhando a «necessidade de se utilizar no documento uma linguagem académica menos sofisticada, para que seja acessível não só aos professores, mas também aos alunos e às famílias [...].» (5) Não se pode desligar esta questão de definição de metas e de referenciais específicos do cumprimento das metas europeias consagradas na Estratégia 2020 para a Educação e do Programa Educação 2015. Como se viu anteriormente, pela referência a pareceres emitidos pelo Conselho Nacional de Educação, há um parecer específico sobre o Programa Educação 2015 e várias e frequentes referências às metas e

objetivos da Estratégia 2020.

Sobre um dos outros pressupostos da proposta que refere a necessidade de reduzir a «dispersão curricular» e centrar o currículo em «conhecimentos fundamentais», reforçando a aprendizagem das «disciplinas essenciais», a maioria dos documentos anteriormente mencionados defendem «a articulação das diversas áreas de formação do currículo num todo coerente e sequencial, com vista à integração dos saberes e à

melhoria dos resultados escolares.» (6)

Fazer o enfoque em «conhecimentos fundamentais» e referir disciplinas essenciais é perspetivar o currículo de um modo redutor. Diz o Parecer sobre Reorganização Curricular do Ensino Básico na alínea a) das recomendações: «[...] O CNE considera, por isso, que as áreas curriculares não disciplinares tiveram, ao longo da década de 2000, um papel significativo na aquisição e desenvolvimento de competências dos alunos e que a sua redução representa uma revisão que atinge o elo mais fraco da organização curricular. Trata-se, assim, de uma alteração curricular que, na sua essência, é determinada por critérios económicos e não por questões educativas e

pedagógicas.» (7)

Todos os demais documentos, acima referidos (Recomendações sobre a Educação para o Risco, sobre Educação para a Literacia Mediática e sobre a Educação para a Cidadania - Recomendações n.os 5 e 6 de 2011 e n.º 1 de 2012, respetivamente) têm como filosofia uma conceção curricular de integração dos saberes essenciais, no sentido de defender a equidade na atual sociedade do conhecimento. No que diz respeito, por exemplo, à Educação para a Cidadania, referimos o que é afirmado na sua introdução: «Pelo menos na modernidade ocidental, a promoção da cidadania foi sempre assumida como uma das missões essenciais da escola [...]»; e ainda nas recomendações deste documento «[...] Deve ser evitada, na organização curricular e em todas as atividades e práticas educativas, a separação entre a construção da excelência escolar em sentido restrito, a democracia na escola e a promoção das

cidadanias.» (8)

Finalmente, em relação ao reforço da autonomia das escolas, poderemos dizer que ela tem sido defendida e recomendada pelo CNE, desde sempre, pelo que referências à necessidade da sua implementação são constantes em todos os documentos emitidos

pelo Conselho.

VI - Apreciação e conclusões

É habitual considerar, na teoria do desenvolvimento curricular, pelo menos três fontes:

as necessidades sociais, as necessidades e aspirações do desenvolvimento individual e os contributos científicos, culturais, organizacionais.

A Lei de Bases do Sistema Educativo reconhece pelo menos duas destas fontes

quando estabelece:

«O sistema educativo responde às necessidades resultantes da realidade social, contribuindo para o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários, e valorizando a dimensão humana do trabalho.» (Art. 2.º-4) Neste mundo em mudança acelerada, tem sido consensual sublinhar a rapidez e profundidade dessa mudança, provocada sobretudo pelos avanços tecnológicos, o desenvolvimento subsequente de uma economia e de uma sociedade do conhecimento, a globalização da economia, ambiente, clima e movimentos populacionais e outras transformações demográficas provocadas pelo aumento da longevidade, por sua vez, relacionado com as conquistas e os progressos na saúde e na qualidade de vida.

Estas novas condições de vida colocam exigências maiores e diferentes à educação, desde logo, a exigência de uma muito mais prolongada escolarização, de uma educação ao longo de toda a vida, abrangente, atual e de qualidade e sobretudo de uma

Educação Para Todos.

Dados do CEDEFOP publicados em 2011 revelam que cerca de 38,5 % dos empregos na UE são serviços «de conhecimento intensivo» e que esta percentagem está a crescer. Em 2010, 83,3 milhões de trabalhadores na UE (ou 38,5 % do emprego total) estavam em serviços «de conhecimento intensivo», sendo que 49 % tinham uma educação de nível terciário, 40 % de nível médio e só 11 % menos que o Secundário (cf. base de dados on line do Eurostat a 5 de dezembro de 2011).

Daí que tenha existido um consenso em Portugal em torno do aumento do número de anos de escolaridade obrigatória de todos os alunos - consenso que tem em conta, tanto o direito à educação de todos os cidadãos numa sociedade democrática, como a preparação de uma força de trabalho capaz de assegurar o progresso económico do país. Donde decorre também a substituição da escola seletiva do passado por uma escola destinada por direito a todos os alunos. Esta alteração fundamental na função e finalidades da escola acarreta mudanças quer nos conteúdos do que a escola transmite, quer na forma como o faz, quer no mandato dos professores, quer na criação de vias diferentes, quer ainda na própria duração da escolaridade.

Esta mais prolongada escolarização trouxe para a escola portuguesa uma população cujos pais não a frequentaram e para a qual a escola não tinha sido concebida, o que tem implicado mudanças e ajustamentos: desde o ensino do Português como 2.ª língua para alunos recém-chegados de países não-lusófonos à introdução na escola de técnicos, como assistentes sociais, mediadores e psicólogos que ajudem na integração de jovens considerados com dificuldades. Mas os próprios conteúdos se alargam para que a escola proporcione a estes alunos contactos culturais e aprendizagens sociais aos

quais poderiam não ter acesso fora dela.

Acresce que esta mais prolongada escolarização e sobretudo a consciência da necessidade de «aprendizagem ao longo de toda a vida» requerem não só a aquisição de aprendizagens básicas, seguras e abrangentes - "Ler, escrever e contar», sendo essenciais, não chegam -, mas também a vontade e a disponibilidade para aprender - para continuarem a aprender ao longo de toda a vida. O que exige que a experiência escolar seja vivida de uma forma positiva - que os alunos aprendam a estudar e

recebam os apoios necessários para isso.

Novos conteúdos se revelam importantes: a crise financeira que vivemos tornou evidente a iliteracia financeira da maioria da população. Mas, mesmo antes, outros conteúdos, outros conhecimentos e capacidades se impunham como necessários e urgentes: numa sociedade cada vez mais dominada pela comunicação, a Educação para a Literacia Mediática é reconhecidamente necessária para que crianças e adultos possam assumir-se como utentes e autores, quer dos media tradicionais quer dos novos media digitais, com segurança, espírito crítico e sentido da responsabilidade. Outras aprendizagens surgem como indispensáveis para se sobreviver num mundo complexo e em acelerada mudança: uma iniciação ao Direito, Economia, Saúde, ao Desenvolvimento Sustentável... São as chamadas «Educações para» ou «aprendizagens de vida» que dificilmente encontram espaço na tradicional divisão dos curricula apenas

em disciplinas.

Mais vasta, a Educação para a Cidadania surge nos curricula portugueses como uma aprendizagem transversal, mas também com um tempo próprio de Formação Cívica, geralmente a cargo do diretor de turma, que tem aproveitado este espaço para tratar de conflitos e problemas da turma, conseguindo, por vezes, partir desse quotidiano social para desenvolver competências de relacionamento e gestão de conflitos e mesmo para promover aprendizagens próprias do estatuto de cidadania e da articulação entre a cidadania nacional e a cidadania europeia. Foi aliás a UE que esteve na origem das reformas curriculares da década de 2000 em muitos países europeus, como vimos atrás, propondo um quadro comum de competências para a aprendizagem ao longo da vida, que se tornou um quadro comum de competências para a Educação Básica, incluindo, justamente, entre essas oito competências fundamentais, a educação para a

cidadania.

Talvez por isso, num seminário organizado pela Comissão Parlamentar da Educação e Ciência da Assembleia da República em colaboração com o CNE, em 2010, e subordinado ao título «Que currículo para o século XXI?», tenha sido possível constatar uma evolução em relação a um paradigma antes dominante, segundo o qual o currículo era um conjunto de disciplinas caracterizadas por conteúdos que eram definidos em programas e expressos em manuais escolares (o que é designado como o «paradigma tradicional de racionalismo académico» - o currículo como o conjunto das matérias a ensinar e a estrutura organizada dessa transmissão).

O papel da escola, segundo esse paradigma, consistia na transmissão de saberes e na preparação para a vida futura (vista como semelhante à presente). Toda a organização escolar está feita segundo este paradigma e orientada para esta conceção curricular: os professores organizam-se por disciplina, reúnem fundamentalmente para distribuir e calendarizar os conteúdos dos programas e avaliam as aprendizagens dos alunos por referência à aquisição desses conteúdos.

Ora a escola de que hoje se fala e que já vai existindo, ou melhor, coexistindo com a escola do passado, implica que se repense a sua organização e o seu currículo em

função de certas tendências recentes:

Centração nos resultados - ou seja, o que de facto os alunos aprendem, e não tanto o que o programa estabelece ou o que os professores ensinam...

Importância do currículo oculto (o que se aprende na escola para além do ensino formal, no que se faz e sobretudo no que se faz por opção) o que tem implicações na organização da escola e também no seu currículo explícito.

Ensino orientado para o desenvolvimento e aquisição de competências, querendo isto dizer que, por exemplo, o ensino básico, além de fornecer informação, deverá preparar os alunos para saberem procurar essa informação, saberem tratá-la, criticá-la, integrá-la, transformá-la, agirem em função dela - este é o ponto de partida para o conceito de competências que tão polémico tem sido, mas que, segundo a definição apresentada pela UE, é «o conjunto (se possível integrado) de conhecimento,

capacidades e atitudes».

O currículo atualmente deve viabilizar um paradigma de escola diferente onde todos aprendam e, para isso, tem de permitir a adaptação das propostas curriculares aos

contextos da escola e da turma.

O que coloca uma nova questão: quem define o currículo? A que nível? Certamente que a nível nacional deverá haver um conjunto comum de finalidades e competências -como é o caso em Portugal. Mas também deverão existir margens de adaptação e de complementaridade dos currículos:

A nível regional - como já é o caso da Região Autónoma dos Açores que há já alguns anos adotou o Currículo Regional do Ensino Básico (CREB) como Referencial Curricular do Ensino Básico para a Região Autónoma, que inclui, para além Quadro de Referência Europeu, das oito competências interrelacionadas, mais duas específicas - a Açorianidade e o Desenvolvimento Sustentável, tal como a Gestão Curricular adotada na Região Autónoma da Madeira, nomeadamente a escola a tempo inteiro, há já longos anos, com o Inglês integrado no currículo do 1.º ciclo.

A nível local - da própria escola e da turma, através do Projeto Educativo de Escola e dos projetos curriculares de escola e de turma.

Em contraponto a essa «Base Comum», a esse conjunto de aprendizagens comuns aos quais todos os cidadãos deverão não só ter acesso, mas dominar no final da escolaridade básica, reconheceu-se a necessidade de personalização, de

reconhecimento de percursos pessoais.

Pensar o currículo nesta perspetiva significa, pois, pensar como conseguir equilibrar um tronco comum de saberes, capacidades e atitudes indispensáveis ao cidadão de hoje, mas que inclua também a criatividade, a capacidade de escolha, a capacidade de ter e

exprimir uma marca pessoal.

Ora este currículo necessário não é compatível com um currículo reduzido a «disciplinas estruturantes», «fundamentais» ou «essenciais».

Mas mesmo em tais disciplinas o que se visa declaradamente é melhorar a qualidade da aprendizagem. Ora a análise feita pelo GAVE aos resultados do desempenho dos alunos portugueses de 15 anos nos testes do PISA, de leitura, matemática e ciências, revela que as suas fraquezas se manifestam relativamente às «higher order skills» e não aos níveis mais elementares, nas perguntas que apenas requerem memorização e

automatização das aprendizagens.

O desenvolvimento das neurociências cognitivas, área do conhecimento em plena expansão, tem vindo a trazer contributos que podem ter relevância para a organização do currículo escolar e alguma pertinência para a apreciação da revisão ora proposta.

Por exemplo, dados sobre a duração da atenção, sobre as melhores formas de consolidar uma aprendizagem, sobre a importância das pausas e do sono, não só na consolidação mas no «insight», os processos e vantagens da automatização e o necessário equilíbrio entre automatização e novidade - são informações que deveriam ser tidas em conta numa reestruturação curricular. Mais ainda: a existência de fases de plasticidade especiais para certas aprendizagens ao longo do crescimento do ser humano, a importância da socialização e da aprendizagem social, por exemplo, recomendariam que a organização da escola e o seu currículo formal e informal o

tivessem em conta.

Outros investigadores acentuam mesmo a importância das artes e das humanidades como forma de promover o desenvolvimento sócio-emocional e a sua relação com o desenvolvimento cognitivo e a tomada de decisões. António e Hanna Damásio, por exemplo, defendem que estas áreas no currículo são fundamentais quer como base do comportamento cívico quer como forma de desenvolver a imaginação e o pensamento intuitivo que levam à criatividade e à inovação (ver sua conferência «Brain, Art and Education» na abertura da Conferência da UNESCO em Lisboa) (9).

Estas fontes, em permanente mudança, implicam uma apreciação periódica, a nível nacional, dos curricula escolares, que permita a sua atualização e enriquecimento. Na maioria dos países europeus, a revisão ocorre com frequência variada, mas é objeto de uma discussão pública, sendo depois trabalhada por peritos em desenvolvimento curricular e consultados cientistas, psicólogos e professores. Assegura-se, assim, que as novas necessidades sociais são identificadas de forma tão ampla quanto possível, mas também que o seu atendimento nos curricula tem em conta o desenvolvimento infantil e as possibilidades e constrangimentos das escolas e dos professores. Assegura-se ainda que o processo de revisão curricular seja um processo coerente, seguindo várias etapas - da formulação de objetivos à organização escolar e à estrutura curricular, à revisão de programas e ao estabelecimento de metas de aprendizagem e critérios de avaliação da sua consecução, à formação dos professores e definição de outros recursos necessários e à delimitação do que é objeto de definição central e do que deverá ser decisão das escolas e dos professores - o que não parece ter sido o processo seguido na Proposta em apreço. Essa é uma das suas fragilidades, pois não parece haver inteira coerência entre os objetivos proclamados e as medidas concretas propostas e muito menos a participação dos agentes referidos nas mudanças curriculares dos países congéneres.

A escola portuguesa tem, ainda hoje, como grandes problemas identificados, o insucesso e a saída escolar precoce de uma boa parte dos alunos. A taxa de abandono escolar precoce, geralmente provocada por insucesso repetido, atingia 28,7 % em 2010, segundo dados publicados no Estado da Educação 2011. Apesar de ter decrescido 14,9pp desde o ano 2000, altura em que alcançara 43,6 %, mantém-se ainda em valores elevadíssimos, comparados com a média da União Europeia que se

cifra em menos de metade (14,1 %).

Se é verdade que a taxa real de escolarização em 2010 é de 83,9 %, o abandono que se gera implica que o trabalho desenvolvido pelas escolas seja, em certa medida,

perdido por infrutífero.

Ora para combater esta situação que tão cara sai aos indivíduos, às escolas e à sociedade, a opção agora tomada pela Revisão da Estrutura Curricular não parece adequada. De facto, não é claro como se propõe combater este problema dos custos da repetência e da exclusão dos alunos que à escola cabe ensinar e educar.

VII - Recomendações

Em consequência do que fica exposto, convirá:

Promover regularmente apreciações do currículo de forma participada, metódica, sistemática e fundamentada de modo a assegurar maior coerência interna e externa e a

aumentar a sua comunicabilidade e eficácia

A opção por ajustamentos esporádicos não alicerçados em práticas sistemáticas de diagnóstico e monitorização aumenta as probabilidades de incoerência interna e não

promove a eficácia.

As revisões curriculares deverão ser mais consistentes com políticas claramente assumidas em relação aos domínios sobre que incidem: (i) formação cívica, agora extinta, mas antes reforçada com elaboração de um currículo específico e a criação de um tempo específico no ensino secundário; (ii) o espaço curricular de decisão da escola, reforçado na revisão anterior e cuja proposta de mudança deveria ser definida de forma participada; (iii) as TIC antecipadas para o 2º ciclo, em espaço partilhado com outra área, quando já anteriormente tinham sido introduzidas como componente obrigatória no ensino secundário e logo retiradas na revisão seguinte.

Deverá também ser acautelada a coerência interna da proposta, para que as medidas preconizadas possam contribuir de forma mais consistente para os objetivos enunciados. Com efeito a redução da dispersão curricular (se entendida como redução do número de disciplinas) e a redução do controlo central do sistema educativo, não são compatíveis com (i) parcelização das áreas disciplinares; (ii) o fechamento do currículo na sua componente disciplinar, mais controlada a priori por planos e programas e menos suscetível de gestão autónoma institucional e profissional; (iii) a extinção de uma oportunidade de opção dos alunos e de livre conceção curricular da

escola.

Acresce que a coerência do currículo terá de ser assegurada pela preocupação com a compatibilidade entre os vários elementos que intervêm no seu desenho e desenvolvimento: não só o conteúdo, os manuais e os materiais de apoio, mas também a avaliação, a formação e desenvolvimento profissional dos professores e a governação

das escolas e do sistema educativo.

Clarificar em que medida as novas propostas contribuem para que mais alunos

aprendam e aprendam mais

Não são explícitas na Proposta as razões que justificam a mudança do currículo, a oportunidade de uma nova revisão, ou os fundamentos das opções preconizadas.

As alterações propostas eliminam elementos estruturantes do currículo vigente, o que indicia a adoção de um modelo diferente, mas não se explicita o verdadeiro alcance da

mudança.

Não são conhecidas as fontes que a alicerçam: as necessidades sociais que o determinam, as necessidades e aspirações do desenvolvimento individual e os contributos científicos, culturais, organizacionais que lhe deram corpo.

É necessário clarificar em que medida as alterações profundas na composição social das escolas foram tidas em conta nesta reformulação; as potencialidades ou limites da proposta para conseguir que todos aprendam, independentemente da sua condição

social.

Uma visão mais clara sobre o que se pretende poderá aumentar as probabilidades de

coerência e a eficácia das ações.

Garantir uma dimensão de abertura no currículo, o equilíbrio das suas componentes e uma maior autonomia das escolas na sua gestão Quanto mais flexível o currículo, maior é a probabilidade de atender à diferença. O fechamento em componentes controladas a nível central, a limitação da oferta a um determinado tipo de conhecimento (determinadas disciplinas e conteúdos considerados fundamentais), aliados a uma restrição dos espaços de decisão das escolas não facilitam a resposta adequada a exigências diferentes e são, portanto, mais compatíveis com populações homogéneas e mais previsíveis.

Na atualidade o currículo deve viabilizar um paradigma de escola onde todos possam aprender e, para isso, tem de permitir a adequação das propostas curriculares aos

contextos da escola e da turma.

Uma organização do currículo por ciclos, com a correspondente definição de metas e tempos também por ciclo, e não por ano, aumenta as possibilidades de acomodação a diferentes estádios de aprendizagem e à gestão diferenciada do ensino conforme as

necessidades concretas dos alunos.

Pensar o currículo nesta perspetiva significa, também, pensar como conseguir equilibrar um tronco comum de saberes, capacidades e atitudes indispensáveis ao cidadão de hoje, mas que inclua também a criatividade, a capacidade de escolha, a capacidade de ter e exprimir uma marca pessoal. Há inclusivamente investigadores que acentuam mesmo a importância das artes e das humanidades como forma de promover o desenvolvimento sócio-emocional e a sua relação com o desenvolvimento cognitivo e a

tomada de decisões.

Este currículo mais equilibrado nas suas finalidades e nas suas componentes deveria ser definido nacionalmente, mas deixando às escolas a liberdade de definirem a sua

concretização e gestão.

Visar a qualidade com equidade

O sistema de ensino português deu provas de ter conseguido compensar os efeitos das assimetrias económicas, tendo-se registado grandes progressos, entre os ciclos do PISA de 2000 e 2009, no desempenho dos jovens com índice económico, social e

cultural mais baixo.

Estes progressos resultaram da redução da percentagem de alunos com baixos resultados e aumento dos de desempenho médio e excelente. Mas devem-se sobretudo ao facto de Portugal ter apresentado uma maior percentagem de alunos no ano adequado à sua idade, o que indicia a diminuição de retenções, aumentando a percentagem dos participantes potencialmente mais preparados para a exigência das

provas internacionais.

Não se pode, no entanto, iludir o facto de a percentagem de alunos que atingem os níveis superiores da escala ser mais baixa em Portugal do que na média da UE ou da

OCDE.

Há, portanto, um caminho a vencer para melhorar o sucesso das aprendizagens, mas parece arriscado avançar-se para alterações tão radicais não tendo em conta as características do modelo curricular que possibilitou uma maior equidade.

Não basear a construção das mudanças numa conceção dicotómica entre

conhecimento e competências

A escola que parece ser necessária e que já vai existindo, ou melhor, coexistindo com a gramática da escola que agora se pretende reforçar, implica que se repense a sua organização e o seu currículo em função de certas tendências recentes: (i) Centração na melhoria das aprendizagens; (ii) Importância do currículo oculto; (iii) Ensino orientado para o desenvolvimento e aquisição de competências (segundo a UE, «o conjunto, se possível integrado, de conhecimento, capacidades e atitudes»), o que não pode ser entendido como a atribuição de uma menor importância à aquisição de conhecimentos, querendo isto dizer que, por exemplo, o ensino básico, além de fornecer informação, deverá preparar os alunos para saberem procurar essa informação, saberem tratá-la, criticá-la, integrá-la, transformá-la, agirem em função dela.

Seja qual for a orientação, o que se visa declaradamente é melhorar a aprendizagem.

Ora a análise feita pelo GAVE aos resultados do desempenho dos alunos portugueses de 15 anos nos testes do PISA de literacia de leitura, matemática e ciências revela que as suas fraquezas se manifestam relativamente às «higher order skills» e não aos níveis mais elementares, nas perguntas que apenas requerem memorização e automatização

das aprendizagens.

Assegurar um tempo próprio de Formação Cívica, em complementaridade com a dimensão transdisciplinar da Educação para a Cidadania A Educação para a Cidadania surge nos curricula portugueses como uma aprendizagem transversal, mas também com um tempo próprio de Formação Cívica, geralmente a cargo do diretor de turma, que poderá aproveitar este tempo para, a partir do quotidiano social da escola, desenvolver competências de relacionamento e gestão de conflitos e mesmo promover aprendizagens próprias do estatuto de cidadania e da articulação entre a cidadania nacional e a cidadania europeia.

Foram, aliás, as orientações da UE que estiveram na origem das reformas curriculares da década de 2000 em muitos países europeus, propondo um quadro comum de competências para a aprendizagem ao longo da vida, que por isso se tornou um quadro comum de competências para a Educação Básica, que incluía, justamente, entre essas oito competências fundamentais, a educação para a cidadania.

A redução desta área à sua dimensão transdisciplinar deixa de fora a vertente dos conceitos e conhecimentos, que não prescinde de um tempo dedicado para o seu

ensino e assimilação.

Manter o leque de oferta no secundário para facilitar a tomada de decisão quanto a

opções de futuro

A redução agora proposta da carga horária no ensino secundário deve-se à eliminação de uma das opções anuais da componente de formação específica.

Será de ter em conta que a eliminação de uma opção neste nível de ensino poderá limitar o campo de experiências em que se baseia a escolha de percursos escolares e profissionais. Um leque mais alargado de disciplinas possibilita o contacto com uma maior variedade de conteúdos científicos, enquanto suporte de uma escolha mais informada e mais sólida, nomeadamente na opção por formações de nível superior.

Repensar a escolaridade obrigatória de 12 anos, como um todo coerente, de forma

participada e com prazos adequados

A Proposta faz silêncio sobre a organização curricular do 1º ciclo, a não ser para reafirmar a continuidade do apoio ao estudo e das outras atividades de enriquecimento curricular, e não explicita as razões da urgência de novas alterações ao currículo do ensino básico, num prazo excecionalmente curto, nem os fundamentos das medidas

selecionadas.

Houve um consenso em Portugal em torno do aumento do número de anos de escolaridade obrigatória de todos os alunos que encontrou expressão legal em 2009 e que transforma o ensino secundário em etapa de frequência obrigatória (até ao limite de 18 anos de idade) a partir do próximo ano letivo.

Este consenso tem em conta, tanto o direito à educação de todos os cidadãos numa sociedade democrática, como a preparação de uma força de trabalho capaz de assegurar o progresso económico do país. Donde decorre também a substituição de uma escola seletiva por uma escola que sabe acolher todos os alunos. Esta alteração fundamental na função e finalidades da escola acarreta mudanças quer nos conteúdos do que a escola transmite, quer na forma como o faz, quer no mandato dos professores, quer na criação de vias diferentes, quer na própria duração do dia escolar.

Daí que novas alterações só ganhem sentido no contexto de um pensamento claro sobre a nova escolaridade obrigatória, que resulte de um consenso alargado capaz de assegurar massa crítica e evitar inconsistências e recuos frequentes.

Estes processos não se compadecem com prazos curtos e muito menos se envolverem

mudanças radicais de paradigma.

Por todas estas razões e ainda porque seria conveniente tratar das questões curriculares relativas a outros níveis e setores do sistema educativo, como por exemplo o 1º ciclo, o ensino profissional e artístico, para além dos casos específicos dos Cursos de Educação Formação (CEF), Percursos Curriculares Alternativos (PCA) e os Programas integrados de Educação Formação (PIEF), o CNE recomenda que seja atribuído tempo a este debate possibilitando uma participação mais alargada e intensa e um repensar destas matérias de forma mais fundamentada.

O processo de revisão curricular deverá ser um processo coerente, percorrendo as diversas etapas, desde a formulação de objetivos à organização escolar e da estrutura curricular à revisão de programas, ao estabelecimento de metas de aprendizagem e critérios de avaliação da sua consecução, sem esquecer a formação dos professores, a definição de outros recursos necessários e a delimitação do que é objeto de definição central e do que deverá ser decisão das escolas e dos professores. No sentido de reordenar a carga curricular deve apontar-se para os mínimos e não continuar a manter a lógica de controlo a partir do centro em vez de entregar a gestão à escola. Aqui ganha outro alcance a autonomia das escolas podendo prestar a devida atenção aos processos, como elemento fundamental para alcançar melhores resultados. Reitera-se a necessidade de integrar a participação dos agentes intervenientes nas mudanças

curriculares na definição do seu sentido.

23 de fevereiro de 2012. - A Presidente, Ana Maria Dias Bettencourt.

Declaração de voto

Abstenho-me de aprovar este Parecer por não ver nele refletida a preocupação principal que é assumida nesta proposta de Revisão da Estrutura Curricular, nomeadamente a redução da dispersão curricular, centrando mais o currículo nos conhecimentos fundamentais e reforçando a aprendizagem nas disciplinas essenciais. O Parecer vê na proposta uma conceção dicotómica entre conhecimento e competências que lá não está. De facto a atenção é ali focada na aquisição de conhecimentos que a sociedade exige e que o Parecer reconhece necessária ao aceitar que a (surpreendente) subida nos indicadores médios do último exercício PISA mantém ainda muito baixos desempenhos para os níveis superiores de proficiência. O abandono da ênfase na aquisição de conhecimentos causou prejuízos que se esperava ver compensados por uma aquisição de competências definidas por uma retórica insuscetível de aferição. Por outro lado, não está demonstrado que as competências que todos reconhecemos importantes não possam ser adquiridas numa escola que associe a exigência académica a uma rica vivência comunitária. Outra preocupação é a de visar a qualidade com equidade, preocupação que é partilhada por todos mas que não pode ser ultrapassada por um discreto abaixamento da exigência. A população escolar é certamente mais heterogénea hoje do que em décadas passadas e a ambição desta população é mais diversa. A escola terá de saber responder a esta nova procura com uma oferta mais diferenciada de modo a satisfazer as opções dos jovens, contribuindo para que todos possam atingir o seu máximo potencial. É isso que os alunos e as famílias esperam; é isso que a sociedade precisa para construir um tecido mais complexo e diversificado.

José Ferreira Gomes

Declaração de voto

Confrontado com o Projeto de Parecer sobre a «Proposta de Revisão da Estrutura Curricular para o Ensino Básico e Secundário», decidi votar contra pelos seguintes

motivos:

1 - Em meu juízo, a Proposta apresentada pelo Governo não coloca em causa a visão democrática da escola pública, parecendo-me infundadas as suspeitas de elitismo, por

várias vezes referidas no Parecer.

2 - A Proposta não afeta a dimensão transversal dos saberes, sendo esta compatível

com o reforço sadio da disciplinaridade.

3 - Ao contrário do que se sustenta no Parecer, não parece poder deduzir-se da Proposta a menorização curricular da área das Artes e Humanidades.

4 - Encaro a Proposta do Ministério como uma tentativa de reagir contra uma situação que classifico como profundamente negativa e que requer intervenção urgente e concertada, devendo estender-se ainda a outros planos. - José Augusto Cardoso

Bernardes.

Declaração de voto

Tive oportunidade na sessão plenária do CNE de felicitar os autores do projeto de Parecer sobre a «Proposta de Revisão da Estrutura Curricular para o ensino básico e secundário» e informar o Plenário de que o facto de o documento não integrar algumas propostas concretas da FENPROF não me impedia de, em representação daquela Federação, votar favoravelmente o referido projeto de Parecer. Desde logo, porque o Parecer, tal como a FENPROF, lê de um modo inequivocamente reticente a Proposta de Revisão da Estrutura Curricular para o Ensino Básico e Secundário apresentada

pelo MEC.

Das reservas assumidas pelo Parecer do CNE, permito-me sublinhar algumas que coincidem com a leitura da FENPROF e que a meu ver se revestem de uma clara

relevância:

1 - Uma revisão curricular coerente e consistente deveria alicerçar-se num pensamento claro e numa argumentação objetivamente explicitada acerca do que se pretende com uma escolaridade obrigatória que se estende até ao ensino secundário, abrangendo alunos até aos 18 anos de idade, o que não se verifica na proposta do MEC.

2 - A proposta do MEC não explicita as razões que justificam as alterações da Estrutura Curricular, nem a oportunidade desta rapidíssima revisão, tão próxima no tempo da anterior, nem expressa os fundamentos das opções preconizadas.

3 - Esta revisão não promove a coerência interna do currículo nem incrementa a sua eficácia, porque não passa de mais um ajustamento não alicerçado «em práticas sistemáticas de diagnóstico e monitorização».

4 - As alterações propostas eliminam elementos estruturantes do currículo vigente, desenhando portanto um modelo diferente sem, todavia, mostrar, fundamentadamente, o verdadeiro alcance da mudança, porque, como se afirma no anteprojeto de Parecer, não são conhecidas as fontes que alicerçam a mudança: as necessidades sociais que determinam este currículo, as necessidades e aspirações do desenvolvimento individual e os contributos científicos, culturais, organizacionais que lhe deram corpo.

5 - Por outro lado, não é claro em que medida as alterações profundas operadas na composição social das escolas foram tidas em conta nesta proposta do MEC.

6 - A Estrutura Curricular proposta visa menos um paradigma de escola onde todos possam aprender e mais o reforço de uma escola seletiva impulsionada por «disciplinas estruturantes», «fundamentais» ou «essenciais».

7 - Aliás o Parecer do CNE assinala que o fechamento em componentes controladas a nível central e a limitação da oferta a um determinado tipo de conhecimento, aliados a uma restrição dos espaços de decisão das escolas, não facilitam uma resposta adequada às diferentes exigências que emergem numa escola heterogénea.

8 - O Parecer sublinha, e bem, que as radicais alterações curriculares se arriscam a pôr em causa a melhoria da equidade que o modelo curricular anterior possibilitou.

São estes alguns dos aspetos substantivos do Parecer que fundamentaram o meu voto o que não obsta a que explicite algumas das posições da FENPROF não contempladas no documento do CNE, razão todavia insuficiente para determinar outra orientação de

voto.

a) Suspensão do processo de Revisão da Estrutura Curricular lançado pelo MEC.

b) Defesa da abertura de um período de debate nacional, ao longo de um ano, envolvendo não só a comunidade educativa mas a sociedade em geral, tendo em vista a construção de um modelo curricular consistente e consensual, não sujeito a constrangimentos que imponham uma revisão da estrutura curricular falha de lógica e de

fundamentação que não seja a financeira.

c) Apresentação pelo MEC de uma nova proposta de Reforma Curricular que tenha em conta o novo enquadramento da escolaridade obrigatória e uma adequada qualificação dos portugueses e portuguesas que permita assegurar o progresso

económico, cívico e cultural do país.

d) Negociação final com os parceiros educativos.- Paulo Sucena.

Declaração de voto

Apesar da qualidade do trabalho dos Conselheiros que analisaram a proposta em causa, considero que há aspetos estruturantes que não foram contemplados nessa análise. Assim sendo, passo a expor as razões que estiveram na origem da minha abstenção: concordo com o reforço do Português e da Filosofia, porque o mesmo faculta melhores condições de aprendizagem à generalidade dos alunos; defendo a inevitabilidade da redução da carga horária, por razões conjunturais óbvias; entendo que essa redução em algumas disciplinas pode ainda permitir maior concentração de esforços em áreas fundamentais, quando continuamos com um défice acentuado particularmente em Português e Matemática. - Mariana Cascais.

Declaração de voto

Centrando as razões do meu voto nos pressupostos apresentados na Proposta de Revisão Curricular - (a) «redução da dispersão curricular»; (b) reforço de «disciplinas essenciais»; (c) focalização em «conteúdos disciplinares centrais», associada à «definição de objetivos claros, rigorosos, mensuráveis e avaliáveis»; (d) «redução do controlo central do sistema educativo, apostando na autonomia gradual das escolas...» -, destaco aspetos que no Parecer se afiguram relevantes e outros que se afiguram polémicos. Considero como particularmente relevante:

1 - A necessidade reiterada no Parecer de melhorar o sucesso da aprendizagem.

Efetivamente, o reconhecimento dessa necessidade será um passo importante para a mobilização de esforços dos diversos agentes educativos.

2 - A recomendação de «promover a apreciações do currículo de forma participada, metódica, sistemática e fundamentada de modo a assegurar maior coerência interna e externa e aumentar a sua comunicabilidade e eficácia». De facto, a escassez deste tipo de apreciações tem constituído uma fragilidade na tomada de decisões curriculares, o que discorda da pertinência que lhe é reconhecida.

3 - A recomendação para se assegurar a coerência do currículo através da «compatibilidade entre os vários elementos que intervêm no seu desenho e desenvolvimento: não só o conteúdo, os manuais e os materiais de apoio, mas também a avaliação, a formação e desenvolvimento profissional dos professores e a governação das escolas e do sistema educativo.». Na verdade, recorrentes incoerências aos níveis referidos têm dificultado a operacionalização e gestão curricular aos diversos níveis

desse sistema.

Não obstante o acima referido, assinalo aspetos que entendo como polémicos:

1 - Considero relevante na Proposta o reforço da Língua Portuguesa e da Matemática, pelo facto de, reconhecidamente, serem duas áreas disciplinares estruturantes da aprendizagem nas restantes áreas curriculares.

2 - Não vejo como o reforço de disciplinas essenciais impede a flexibilização curricular.

Ora, a continuação da aposta na autonomia das escolas, um dos pressupostos da Proposta, poderá constituir uma janela de oportunidade para essa mesma flexibilização, permitindo a adequação a especificidades individuais e, em última instância, atender a

diferenças.

3 - Em sequência, noto que essa flexibilização não ganhará em ser confundida com adequações curriculares aos «contextos da escola e da turma» que comprometam a aprendizagem basilar, prejudicando a igualdade de oportunidades, que se propõe

combater.

4 - Não vejo como poderá a Proposta contrariar os desígnios da escola em sociedades democráticas, a qual, ainda que atendendo a especificidades individuais e contextuais, deve pugnar para que todos adquiram um conjunto de conhecimentos e desenvolvam um núcleo de capacidades com a extensão e profundidade que só a educação formal

permite.

5 - Não vejo também o acima referido reforço de disciplinas essenciais como um fechamento do currículo, incompatibilizando a integração doutras componentes curriculares, nomeadamente das que são designadas por «Educações para.» ou

«aprendizagens para a vida».

6 - Encaro como importante a individualização da Educação Visual, restituindo a esta área curricular uma identidade e dignidade próprias, permitindo a sua consolidação

como componente educativa principal.

7 - Entendo que a Educação para a Cidadania tem a ganhar em ser efetivamente assumida em termos transversais, contribuindo para a coesão curricular.

8 - Não vejo como a Proposta, pelo facto de acolher a lógica disciplinar na organização do currículo possa excluir as lógicas inter, pluri e multidisciplinares porquanto se trata de lógicas que podem e devem coexistir, complementando-se.

9 - Não vejo como a Proposta veicule «uma conceção dicotómica entre conhecimentos e competências», pelo facto de nela se salientarem precisamente esses dois eixos de estruturação curricular: o que é preciso aprender (conteúdos/conhecimentos) e para que é preciso aprender (objetivos/competências).

10 - Por último, e com base no que foi explicado pelo Diretor do Gave em reunião preparatória, guardo reservas relativamente a dados do PISA 2009 difundidos, à altura, de forma animadora. - Maria Helena Lopes Damião da Silva.

(1) PISA - Programme for International Student Assessment - Programa da OCDE que avalia o desempenho de alunos de 15 anos, em literacia de leitura, matemática e ciências; TIMSS - Trends in International Mathematics and Science Study - Programa da IEA (International Association for the Evaluation of Educational Achievement) que avalia o desempenho em matemática e ciências no 4.º e 8.º anos; PIRLS - Progress in International Reading Literacy Study - Programa da IEA que avalia a literacia de leitura

no 4.º ano de escolaridade.

(2) OATES, T. (2010). Could do better: using international comparisons to refine the National Curriculum in England. Cambridge Assessment.

(http://www.cambridgeassessment.org.uk/ca/Viewpoints/Viewpoint?id=135502,

acedido em 20 de fevereiro de 2012).

(3) Revisão da Estrutura Curricular, Ministério da Educação e Ciência, 2011.

(4) Parecer sobre o Programa Educação 2015, Diário da República, 2.ª série, n.º 5, de

7 de janeiro de 2011.

(5) Diário da República, 2.ª série, n.º 1, de 3 de janeiro de 2011.

(6) Diário da República, 2.ª série, n.º 1, de 3 de janeiro de 2011.

(7) Ibidem.

(8) Diário da República, 2.ª série, n.º 17, de 24 de janeiro de 2012.

(9) World Conference on Arts Education «Building creative capacities for the 21st

century», Lisboa, 6-9 de março de 2006.

205807363

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2012/03/07/plain-289700.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/289700.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 2011-08-03 - Decreto-Lei 94/2011 - Ministério da Educação e Ciência

    Altera (quarta alteração) e republica em anexo o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro, que aprova a reorganização curricular do ensino básico e que revê a organização curricular dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico.

Ligações para este documento

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