Decreto Legislativo Regional 31/2010/A
Medidas de prevenção, controlo e redução da presença de roedores invasores
e comensais
Considerando que a proliferação de roedores na Região Autónoma dos Açores constitui particularmente uma circunstância que afecta a sustentabilidade ambiental do ecossistema, pondo em risco a saúde pública, a saúde animal, as culturas e a biodiversidade;Considerando que este problema está intimamente relacionado com as características específicas das espécies de roedores presentes, dado que são espécies generalistas, com elevadas taxas de sucesso reprodutivo e grande capacidade de dispersão, com fracções populacionais silvestres e comensais que interagem entre si;
Considerando as características geomorfológicas e climáticas naturais do território, associadas à juventude do arquipélago, caracterizada por uma fauna pobre onde os endemismos são escassos, com baixos índices de predação e competição;
Considerando que as actividades humanas podem actuar como geradoras e distribuidoras de recursos e suporte de condições de proliferação dos roedores;
Considerando que, não obstante várias entidades e instituições, nos Açores, desenvolverem acções que, directa ou indirectamente, se relacionam com a problemática dos roedores e actuam sobre a dimensão das populações;
Considerando a necessidade de gestão integrada dos roedores, através de novos modelos de organização institucional e implementação de medidas e de instrumentos de controlo;
Considerando que as medidas de controlo implicam por vezes o recurso a produtos de acção rodenticida, sob pena do seu não uso poder ter consequências catastróficas para a saúde pública;
Considerando que, do acima exposto, se conclui que só com uma acção concertada e articulada entre todas as entidades com intervenção directa ou indirecta nesta matéria e com uma correspondente partilha de responsabilidades, conjugadas com uma participação activa da comunidade em geral, se poderão obter resultados positivos no combate a este problema:
Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa e do n.º 1 do artigo 37.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objecto
O presente diploma tem como objecto estabelecer normas de prevenção, controlo e redução dos riscos associados à presença das espécies de roedores de campo, invasores e comensais que comportam risco ecológico, e garantir o uso sustentado dos pesticidas de acção rodenticida, através da definição de um conjunto de procedimentos a aplicar às actividades humanas susceptíveis de contribuir, directa ou indirectamente, para a proliferação das referidas espécies.
Artigo 2.º
Objectivos
O regime instituído pelo presente diploma visa os seguintes objectivos:a) Sustentabilidade ambiental;
b) Protecção da saúde pública;
c) Protecção da saúde animal;
d) Protecção da biodiversidade;
f) Protecção de equipamentos e infra-estruturas.
Artigo 3.º
Âmbito
1 - O presente diploma aplica-se às actividades humanas dos vários sectores da economia (primário, secundário e terciário) cujos métodos de produção, transformação, distribuição e ou comercialização actuem como geradores de distúrbios no ecossistema e distribuidores de recursos, proporcionando atractivos à proliferação e dispersão de roedores.2 - Para efeitos do presente diploma, consideram-se actividades susceptíveis de potenciar a proliferação e dispersão de roedores toda e qualquer actividade estabelecida ou que venha a estabelecer-se que providencie condições de alimento e ou abrigo, nomeadamente:
a) Agricultura e actividades dos serviços relacionados;
b) Produção animal e actividades dos serviços relacionados (criação de gado bovino, ovino, caprino, cavalar, asinino e muar; suinicultura, avicultura, apicultura, cunicultura, criação de canídeos e felinos e outra produção animal);
c) Alojamento de animais;
d) Silvicultura, exploração florestal e actividades dos serviços relacionados;
e) Pesca, aquicultura e actividades dos serviços relacionados;
f) Indústrias transformadoras:
i) Indústrias alimentares (abate de animais, preparação e conservação de carne e de produtos à base de carne; indústria transformadora da pesca e da aquicultura; indústria de conservação de frutos e de produtos hortícolas; produção de óleos e gorduras animais e vegetais; indústria de lacticínios; transformação de cereais e leguminosas; fabricação de amidos, féculas e produtos afins; fabricação de alimentos compostos para animais; panificação e pastelaria; indústria do açúcar;
indústria do cacau, do chocolate e dos produtos de confeitaria; fabricação de massas alimentícias, cuscus e similares; indústria do café e do chá; fabricação de condimentos e temperos; fabricação de alimentos homogeneizados e dietéticos;
fabricação de fermentos, leveduras e adjuvantes para panificação e pastelaria;
fabricação de caldos, sopas e sobremesas; fabricação de outros produtos alimentares diversos);
ii) Indústria das bebidas;
iii) Indústria do tabaco;
g) Construção e engenharia civil;
h) Armazenagem, transporte e comércio por grosso e a retalho de produtos agrícolas, animais vivos, produtos alimentares, matérias-primas e alimento para animais, bebidas e tabaco;
i) Restauração (restaurantes e similares);
j) Alojamento com restauração incluída;
k) Recolha, transformação e tratamento de subprodutos e resíduos.
CAPÍTULO II
Estratégias de controlo de roedores
Artigo 4.º
Medidas de controlo
As estratégias de controlo de roedores consistem na aplicação das seguintes medidas:a) Boas práticas;
b) Planos de controlo integrado de roedores;
c) Intervenções oficiais.
Artigo 5.º
1 - Para efeitos da aplicação da medida prevista na alínea a) do artigo anterior será elaborado um manual de boas práticas que definirá procedimentos de natureza genérica e específica adequados às actividades referidas no artigo 3.º 2 - As pessoas individuais ou colectivas, públicas ou privadas, que exerçam alguma das actividades referidas no artigo 3.º ficam obrigadas a aplicar um conjunto de procedimentos dirigidos ao seu sector de actividade definidos no manual de boas práticas, sem prejuízo de poderem, cumulativamente, adoptar outras medidas adequadas que visem a prossecução dos objectivos visados pelo presente diploma.3 - O manual de boas práticas será objecto de aprovação conjunta dos membros do Governo com tutela nas áreas de actividade a que respeite.
Artigo 6.º
Planos de controlo de roedores
Sem prejuízo do referido no artigo anterior, as entidades públicas ou privadas que exerçam alguma das actividades referidas no artigo 3.º, em instalações fixas e que estejam sujeitas a aprovação oficial, ficam ainda obrigadas à implementação de um plano de controlo de roedores, cujos requisitos técnicos serão definidos por portaria conjunta dos membros do Governo competentes em matéria de saúde, agricultura, ambiente e da respectiva actividade.
Artigo 7.º
Intervenções oficiais
Nas situações em que as medidas previstas nos artigos anteriores se mostrarem ineficazes, as entidades oficiais, no domínio das suas competências, poderão intervir de forma concertada adoptando medidas de emergência adequadas e especificamente direccionadas à situação em causa.
CAPÍTULO III
Entidades intervenientes
Artigo 8.º
Cooperação institucional
1 - A prossecução dos objectivos previstos no presente diploma pressupõe uma actuação concertada entre todas as entidades com responsabilidade em matéria de controlo de roedores, quer por tutelarem áreas que possam potenciar a proliferação dos roedores ou ser ameaçadas por estes, quer por terem competência a nível da aquisição e divulgação do conhecimento, designadamente:a) Departamento governamental competente em matéria de agricultura e florestas;
b) Departamento governamental competente em matéria de ambiente e mar;
c) Departamento governamental competente em matéria de ciência e equipamentos;
d) Departamento governamental competente em matéria de saúde;
e) Departamento governamental competente em matéria de inspecção das actividades económicas, do trabalho e solidariedade social;
f) Departamento governamental competente em matéria de economia;
g) Departamento governamental competente em matéria de educação e formação;
h) Instituição responsável em matéria de alimentação e mercados agrícolas;
i) Instituição responsável em matéria de ordenamento agrário;
j) Autarquias locais.
2 - Cada uma das entidades referidas no número anterior fica obrigada a avaliar, propor e ou introduzir as necessárias alterações à regulamentação existente nas áreas do seu domínio, com vista a adaptá-la aos objectivos do presente diploma.
Artigo 9.º
Comissão de gestão integrada de pragas - Roedores
Para efeitos de coordenação da aplicação das medidas previstas no presente diploma será criada, por resolução do Conselho do Governo, no prazo máximo de 60 dias após a publicação do presente diploma, uma comissão de Gestão integrada de pragas - roedores, que integrará representantes das entidades responsáveis e à qual competirá:
a) Coordenar a actuação das diferentes entidades intervenientes;
b) Propor a criação de grupos de trabalho, nos quais se incluem organizações não governamentais com actividade na Região Autónoma dos Açores e a Federação Agrícola dos Açores, para a elaboração do manual de boas práticas no âmbito da temática dos roedores no arquipélago;
c) Criar ou propor alterações ou aditamentos às listas de verificação a serem utilizadas pelas entidades fiscalizadoras, introduzindo especificações destinadas à verificação do cumprimento dos planos de controlo e das regras constantes do manual de boas práticas;
d) Emitir parecer sobre propostas de alteração à regulamentação existente ou sobre nova regulamentação que incida sobre a matéria prevista no presente diploma;
e) Propor às entidades competentes regulamentação e legislação específica e ou acções a desenvolver.
CAPÍTULO IV
Fiscalização e incumprimento
Artigo 10.º
Fiscalização
1 - Sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades a fiscalização do cumprimento do presente diploma e da respectiva regulamentação relativamente a cada actividade referida no artigo 3.º cabe à respectiva entidade inspectiva.2 - Esta fiscalização é integrada nas actividades inspectivas normais das entidades referidas no número anterior, salvo em casos de denúncia ou noutras situações em que seja necessária uma intervenção especificamente direccionada para o efeito.
Artigo 11.º
Contra-ordenações
1 - Constitui contra-ordenação, punível com coima cujos montantes mínimos são de (euro) 250 e (euro) 500 e máximos de (euro) 3750 e (euro) 10 000, respectivamente, consoante se trate de pessoa singular ou colectiva:a) A não implementação do plano de controlo de roedores nos casos em que tal seja obrigatório nos termos definidos no artigo 6.º;
b) O não cumprimento das boas práticas definidas no artigo 5.º, por parte das entidades públicas ou privadas que exerçam alguma das actividades referidas no artigo 3.º;
c) O não acatamento, integral ou parcial, das determinações das entidades fiscalizadoras relativamente às correcções das boas práticas e ou do plano de controlo;
d) A criação de obstáculos ou impedimentos na realização de acções de fiscalização e controlo para verificação do cumprimento das normas do presente diploma e respectiva regulamentação.
2 - A negligência e a tentativa são puníveis.
Artigo 12.º
Sanções acessórias
1 - Consoante a gravidade da contra-ordenação e a culpa do agente, podem ser aplicáveis, cumulativamente com a coima, as seguintes sanções acessórias:a) Perda de objectos pertencentes ao agente;
b) Interdição do exercício de uma profissão ou actividade que dependa de título público, de autorização ou de homologação de autoridade pública;
c) Privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades ou serviços públicos;
d) Privação do direito de participar em exposições, feiras ou mercados;
e) Encerramento de estabelecimento cujo funcionamento esteja sujeito a autorização ou licença de autoridade administrativa;
f) Suspensão de autorizações, licenças ou alvarás.
2 - As sanções referidas nas alíneas b) a f) do número anterior têm a duração máxima de dois anos a contar da data da decisão condenatória definitiva.
Artigo 13.º
Processos de contra-ordenação
1 - Compete às entidades com competências inspectivas nas áreas de actividade definidas no artigo 3.º a instrução dos processos de contra-ordenação.2 - Compete aos membros do Governo Regional que tutelam as entidades mencionadas no número anterior, ou em quem os mesmos deleguem, a aplicação das coimas e sanções acessórias.
CAPÍTULO V
Disposições finais
Artigo 14.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
Artigo 15.º
Produção de efeitos
1 - A produção de efeitos do presente diploma, no que se refere à matéria relativa ao manual de boas práticas e aos planos de controlo de roedores, inicia-se na data de entrada em vigor da regulamentação prevista nos artigos 5.º e 6.º 2 - A produção de efeitos do presente diploma, no que se refere à matéria constante do capítulo iv, inicia-se no prazo de 180 dias após a entrada em vigor da regulamentação prevista no número anterior.Aprovado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, em 21 de Outubro de 2010.
O Presidente da Assembleia Legislativa, Francisco Manuel Coelho Lopes Cabral.
Assinado em Angra do Heroísmo em 10 de Novembro de 2010.
Publique-se.
O Representante da República para a Região Autónoma dos Açores, José António Mesquita.