Portaria 18441
1. A Federação Nacional dos Industriais de Lanifícios tomou a iniciativa de propor aos seus membros uma reforma profunda da indústria que exercem, apoiada no facto de que esta, pela dispersão das unidades, pela vetustez de parte do equipamento, pela carência de organização administrativa e comercial, não reúne condições de concorrência para sobreviver no mercado livre em que Portugal trabalhará dentro de alguns anos.
Não interessa repetir aqui os números e argumentos com que a Federação defende o seu, ponto de vista; são elementos conhecidos, que não trazem surpresa relativamente ao que se verifica na generalidade das indústrias portuguesas.
A atitude da Federação, trazendo a lume matéria de fundo que constitui uma das mais sérias preocupações do Ministério da Economia, só merece louvor; a organização corporativa não deve ser mero centro de rotina e de actos formais, a viver à custa da indústria, mas factor dinâmico de progresso, fonte de soluções novas para os problemas, sempre diferentes, que a conjuntura oferece.
Verifica-se, porém, que a proposta da Federação, como seria de esperar da decisão com que ataca o conformismo reinante, não obteve o acordo de grande número de industriais, o que obriga o Ministério a tomar posição.
2. Em dois pontos de pormenor se não perfilha o pensamento da Federação.
O primeiro refere-se à intenção de fixar por decreto, nos termos da base V da Lei 2052, de 11 de Março de 1952, novo regime da indústria dos lanifícios, com fundamento em que, à sombra dá base IV da Lei 1956, de 17 de Maio de 1937, se publicou o Decreto 28132, de 13 de Novembro de 1937, que regulamentou esta indústria; mas as imposições que então se fizeram foram tão brandas que teria sido ridícula qualquer veleidade de reclamação - a não ser contra a brandura.
É hoje diferente a posição; o que se pretende - e pretende-se fundamentalmente - não é um simples regulamento, mas uma profunda reorganização, nos termos da Lei 2005, de 14 de Março de 1945; sem deixar de se afirmar desde já que uma forte política de concentração e modernização tem de ser seguida, não quer tirar-se aos interessados o direito de debater em ambiente calmo os possíveis caminhos a seguir, nomeando uma comissão reorganizadora nos termos daquela lei. O trabalho da Federação constituirá óptima base de discussão.
O segundo ponto em que não se perfilha o pensamento da Federação é o da proibição, durante três anos, da ampliação das fábricas existentes com máquinas que não resultem da transferência de outras já instaladas ou da substituição destas.
Aguardando o resultado das diligências da Federação junto dos inscritos nos grémios de industriais, já este Ministério vem retardando há meses as suas decisões sobre os pedidos pendentes. Compreende-se que o estudo de qualquer reorganização se realiza com uma geometria mais perfeita se, a partir de dada época, se suspendem todas as alterações ao equipamento existente; é certo que a própria lei, na sua base XXI, procura evitar que novas autorizações de montagem contrariem o objectivo em vista, obrigando a ouvir as comissões, enquanto durarem os seus trabalhos, sobre os pedidos pendentes ou que venham a apresentar-se; é ainda certo que, em alturas de remodelação, se apresentam pedidos oportunistas pretendendo tirar partido do período de transição. Mas estes factos, perfeitamente conhecidos e largamente ponderados, não invalidam o princípio de que não é possível travar toda a evolução numa actividade de tão grande desenvolvimento como esta; por isso o Ministério irá seleccionar com o maior rigor os pedidos em curso, mas não deverá manter a posição doutrinária de os suspender ou indeferir a todos. Tem de se proceder de tal maneira que a venda de alvarás ou máquinas velhas não seja negócio de tentar; e não deve impedir-se a montagem de máquinas novas só porque desvaloriza as máquinas velhas, dado o sobreequipamento que já se verifica.
Em matéria afim com a ampliação das unidades existentes propõe a Federação que, pelo prazo de três anos, se negue autorização à montagem de novas unidades; não se vê motivo para recusar esta protecção à indústria existente, se a propuser a comissão adiante nomeada, desde que a concentração e modernização das unidades actuais se processem em termos convenientes.
3. O primeiro alvo a atingir pelo projecto da Federação é o de forçar à concentração de empresas no prazo de seis meses, de forma a conseguir que as 210 unidades do sector da tecelagem, que é o sector central desta indústria, se agrupem num número de empresas não superior a 50. Apesar dos estímulos legais, nunca os industriais tomaram voluntàriamente este caminho.
É inegável a vantagem de tal providência como primeiro factor de simplificação e primeira fase de reforma; é também inegável que ela provocará, como consequência, a posterior concentração das unidades fabris, alvo final que, uma vez alcançado, permitirá atingir as melhorias de preço e qualidade que fundamentalmente se procuram. Deixa, porém, a Federação esta segunda fase ao jogo natural dos interesses de cada empresa, dentro de regras que propõe; mas tem-se dúvida de que, feita desta forma, ela resulte suficiente e harmónica.
Talvez seja útil pensar até onde poderão eliminar-se certos condicionamentos comerciais que a Federação propõe. Já o Decreto 28132 fixou numerosos desses condicionamentos, cuja supressão ou redução parece que daria à indústria maior naturalidade; sujeição a regras apertadas de estrutura industrial e liberdade nos actos de comércio parece a solução que envolve menos artifício, mais solidez e mais respeito pela economia do mercado.
4. O que precede presta-se a largo debate. A definição do mínimo equipamento de cada concentração: a vantagem ou inconveniente de separar essa concentração em duas fases - primeiro das empresas e posteriormente das fábricas; o tipo de concentração mais aconselhável - horizontal, vertical ou mista; o equilíbrio das diversas modalidades desta indústria; o regime normal de trabalho - um ou mais turnos de pessoal; os critérios de especialização das unidades; os preços da matéria prima e a posição das lãs nacionais; as limitações que deverão impor-se ao comércio dos produtos intermédios; as regras de comercialização dos tecidos que permitam que o artigo chegue ao consumidor sem ser indevidamente agravado no preço por intermediários numerosos, com pouco mérito e muito apetite - tudo isto e o mais que a lei refere merece o estudo atento dos peritos.
Para este efeito:
Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Economia, nos termos da base XVII da Lei 2005, de 14 de Março de 1945, nomear uma comissão reorganizadora da indústria dos lanifícios, constituída por um presidente e por representantes, respectivamente, da Direcção-Geral dos Serviços Industriais, do Instituto Nacional de Investigação Industrial e da Junta Nacional dos Produtos Pecuários e três representantes da indústria a indicar pelo conselho geral da Federação Nacional dos Industriais de Lanifícios.
A esta comissão serão ainda agregados três representantes, respectivamente, do Ministro da Defesa Nacional e dos Ministérios do Ultramar e das Corporações e Previdência Social. A comissão apresentará o seu relatório no prazo de seis meses, a contar da nomeação dos comissionados.
Ministério da Economia, 28 de Abril de 1961. - O Ministro da Economia, José do Nascimento Ferreira Dias Júnior.