Portaria 17653
Considerando a necessidade de publicar novas instruções de primeiros socorros a prestar em acidentes pessoais produzidos por correntes eléctricas, em substituição das revogadas pela Decreto 42895, de 31 de Março de 1960;Considerando a vantagem de utilização de um modelo oficial das referidas instruções para afixação nas instalações eléctricas em que os respectivos regulamentos de segurança o imponham;
Considerando que a comissão, nomeada por portaria de 30 de Julho de 1954, para o estudo e revisão dos regulamentos de segurança das instalações eléctricas elaborou novas instruções de primeiros socorros, com base no conhecimento das instalações existentes e em instruções similares seguidas no nosso país e noutros de elevado nível técnico:
Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Economia, por proposta da Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos e ouvida a Direcção-Geral de Saúde e nos termos do artigo 108.º do Regulamento de Segurança de Subestações, e Postos de Transformação e de Seccionamento, aprovado pelo Decreto 42895, de 31 de Março de 1960:
1.º São aprovadas as instruções para os primeiros socorros em acidentes pessoais produzidos por correntes eléctricas, que seguem anexas a esta portaria.
2.º É aprovado o modelo oficial das referidas instruções, com o n.º 488 do catálogo da Imprensa Nacional, em papel de formato 2 1/4 A3 (420 mm x 668 mm), para afixação obrigatória nas instalações eléctricas, sempre que o exijam os regulamentos de segurança respectivos.
Ministério da Economia, 31 de Março de 1960. - O Ministro da Economia, José do Nascimento Ferreira Dias Júnior.
Instruções para os primeiros socorros em acidentes pessoais produzidos por correntes eléctricas
A) Providências imediatas para subtrair a vítima à acção da corrente
Sem a mínima perda de tempo, que pode ser fatal para o sinistrado:
1.º Devem ser afastadas, com a maior decisão, do local do acidente todas as pessoas cuja presença não seja necessária e, sem prejuízo nem demora das providências a tomar, deve mandar-se chamar de urgência um médico e avisar a entidade fornecedora da energia eléctrica.
2.º A vítima deve ser subtraída, o mais ràpidamente possível, aos efeitos da corrente eléctrica. Para isso observar-se-á o seguinte:
a) No caso de baixa tensão:
Cortar imediatamente a corrente, recorrendo à manobra do órgão de corte mais próximo.
Se for demorado o corte da corrente, é preferível não perder tempo a cortá-la, e nesse caso há que afastar imediatamente os condutores da vítima e tomar as precauções seguintes, a fim de que a pessoa ou pessoas que procedam ao salvamento da vítima não sofram elas próprias acidentes de electrocussão, cujos riscos são mais graves se houver humidade ou se o terreno estiver molhado:
1) Antes de tocar na vítima, isolar-se da terra, colocando-se sobre uma superfície isolante, constituída por tábuas ou barrotes bem secos, ou por caixa de madeira, ou por panos ou peças de vestuário, bem secos, ou por tapete de borracha, ou por qualquer outro meio equivalente.
2) Procurar afastar os condutores da vítima, isolando as mãos por meio de luvas de borracha, panos secos ou peças de vestuário, ou utilizando varas compridas de madeira bem seca, cordas bem secas, etc.
b) No caso de alta tensão:
Neste caso a corrente deve ser imediatamente cortada. Se o não for, é necessária a intervenção de pessoa conhecedora do perigo para afastar a vítima dos condutores.
3.º Se a vítima ficou suspensa dos condutores, é necessário atenuar os efeitos da queda, preparando uma camada de palha, ou uma rede ou pano esticado, etc.
B) Socorros a prestar à vítima antes da chegada do médico
Logo que a vítima tenha sido afastada dos condutores e enquanto não chega o médico é da maior importância prestar à vítima os socorros seguintes, sem a mínima perda de tempo:
1.º Arejar bem o local em que se encontra a vítima. Não perder tempo a transportar a vítima para outro local, a menos que seja para a subtrair a uma atmosfera viciada.
Não permitir a permanência de mais de três ou quatro pessoas junto da vítima.
2.º Desapertar todas as peças de vestuário que comprimam o corpo da vítima: colarinho, cinto, casaco, colete, etc.
Deitar a vítima de costas, colocando-lhe debaixo dos ombros uma almofada, feita mesmo de peças de vestuário, de modo que a cabeça fique um pouco mais baixa.
3.º Abrir a boca, mesmo à força se necessário, introduzindo-lhe, com cuidado, entre os dentes qualquer objecto adequado (por exemplo, um bocado de madeira ou cabo de ferramenta).
Verificar se na boca existe algum corpo estranho (por exemplo, placa de dentes artificiais), retirando-o caso exista.
Limpar a boca e as narinas de sujidades.
4.º Agarrar a língua, por meio de um lenço, e puxá-la para fora lentamente, mas com força, encarregando outra pessoa de manter a língua de fora, ou, na sua falta, amarrar a língua ao queixo por meio de um lenço, dos suspensórios, etc.
5.º Tentar em seguida a respiração natural da vítima, roçando-lhe no nariz e na garganta com uma pena, com uma palha ou com uma erva, de modo a provocar cócegas, e borrifando com água fria o rosto e o peito, ao mesmo tempo que se aplica fricção enérgica ou pancadas com uma toalha ou trapo molhados, de modo a restabelecer a circulação.
6.º Se a tentativa da respiração natural não der resultado, trazendo a vítima à vida, não perder tempo em prolongá-la, pois pode ser fatal a perda de poucos minutos, pelo que se aplicará, sem demora, a respiração artificial.
7.º A respiração artificial deverá ser mantida até que a natural se restabeleça regularmente, devendo, porém, ainda depois disso, a vítima ser vigiada e observada durante muito tempo.
Caso não se consiga a respiração natural, deve manter-se a artificial até à chegada do médico, mesmo que ao fim de várias horas a vítima não dê sinais de vida.
8.º Quando a vítima se reanimar, evitar contrariar os primeiros movimentos respiratórios espontâneos, mas ficar pronto a recomeçar a respiração artificial se a natural afrouxar. Procurar-se-á activar a circulação do sangue, borrifando o rosto e o peito com água fria, friccionando-o com um pano molhado e excitando as regiões vizinhas do coração com pancadas secas com a base do polegar da mão direita.
Seguidamente deve transportar-se a vítima para uma cama, cobrindo-a bem e fazendo-a tomar algumas colheres de chá ou café bem quente ou de aguardente, logo que esteja em condições de engolir.
Importante não fazer: antes desta altura não tentar obrigar a vítima a tomar qualquer bebida.
9.º Desde que a vítima recupere completamente os sentidos, aguardar a chegada do médico.Nunca abandonar a vítima antes de haver sinais certos da sua morte, que só um médico pode verificar.
10.º Se o acidente for em alta tensão, observar ainda os seguintes cuidados, além dos anteriores:
a) Dar de beber à vítima, logo depois de esta recuperar os sentidos, uma colher (de chá) de bicarbonato de sódio dissolvido em 3 dl de água.
Além disso, convém dar a beber à vítima muita água ligeiramente salgada (uma colher de sopa para 1 l de água) ou açucarada (três colheres de sopa para 1 l de água), assim como chá, sumo de frutas, água alcalina (Vidago, por exemplo).
Salvo indicação médica em contrário, este regime deve prosseguir durante 5 ou 6 dias, ao passo que a administração de água bicarbonatada não passa das primeiras 24 a 36 horas.
b) Não perder a vítima de vista e convencê-la da necessidade de estar sob observação médica durante as 48 horas seguintes, em virtude dos efeitos nervosos ou renais que podem sobrevir durante esse período.
c) Durante o transporte da vítima para o hospital deve poupar-se esta a qualquer esforço físico e dar-lhe a beber, de hora a hora, uma dose idêntica à dose inicial de água bicarbonatada. Assinalar à chegada ao hospital a quantidade de água ingerida.
d) Recolher a urina da vítima, especialmente a da primeira micção, e pô-la à disposição do médico, a fim de que este possa analisá-la para descobrir o aparecimento eventual de mioglobina, que constitui sintoma importante de acidentes renais graves.
Importante evitar as seguintes causas de insucesso:
Demora a pôr em prática a respiração artificial. Esta demora constitui a causa da maioria dos insucessos, pelo que deve ter-se esta noção sempre bem presente no espírito.
Interrupção prematura da respiração artificial.
Má execução da respiração por:
1) Aceleração do ritmo além do da respiração natural.
2) Esquecimento de desapertar o vestuário, de libertar as vias respiratórias de mucosidades ou de puxar para fora a língua da vítima.
C) Tratamento das queimaduras
Quando de qualquer acidente resultem queimaduras, por contacto ou por arco eléctrico, deve chamar-se um médico, mesmo que as queimaduras não pareçam graves. Enquanto ele não chega, proceder como segue:
1.º A pessoa que tratar as queimaduras deve primeiramente lavar e esfregar cuidadosamente as suas mãos e antebraços com água quente e sabão. Aconselha-se mesmo esfregá-las com um pano limpo embebido em álcool.
2.º Se não há feridas nem bolhas, isto é, se as queimaduras só se manifestam por manchas avermelhadas ou por dores, limpar a pele da vítima à volta da queimadura, com uma compressa seca, se aquela se encontra muito suja e pincelar com mercurocromo o contorno da queimadura. Aplicar sobre esta uma compressa esterilizada, que se cobre com algodão, envolvendo o conjunto com uma ligadura ligeiramente apertada. Não utilizar pós, óleos ou pomadas.
3.º Se há queimaduras mais graves, manifestadas por feridas e bolhas, nunca rebentar estas.
Não aplicar tratamento local de qualquer espécie, protegendo simplesmente as partes queimadas com compressas esterilizadas e evitar que a vítima arrefeça, cobrindo-a. A coberta não deve tocar na parte queimada.
D) Métodos de respiração artificial
I) Respiração por movimento dos braços (método de Sylvester-Brosch):
1.º Deita a vítima de costas, colocando-lhe debaixo dos ombros uma almofada (peças de vestuário, por exemplo), de modo que a cabeça fique um pouco baixa e de lado.
2.º Seguidamente ajoelhar atrás da cabeça da vítima, voltado para esta, agarrar-lhe os braços, abaixo dos cotovelos, e puxá-los para trás, por cima da cabeça, até tocarem o chão (Inspiração - fig. 1).
(ver documento original)
Figura 1
Método de Sylvester - Brosch
Inspiração
3.º Conservar os braços nesta posição durante dois a três segundos (contando, por exemplo, em voz alta os números, seguidos, 151 152).
4.º Após esta pausa, mover os braços da vítima em sentido contrário, apertando os cotovelos, com o próprio peso do corpo, contra os lados do peito da vítima (Expiração - fig. 2).
(ver documento original)
Figura 2
Método de Sylvester - Brosch
Expiração
5.º Fazer nova pausa de dois a três segundos (contando, por exemplo, em voz alta 153 154).
6.º Repetir estes movimentos até a respiração natural da vítima se manter.
II) Respiração por compressão periódica do tórax (método de Schaefer):
1.º Deitar a vítima de bruços, com os braços estendidos para a frente e ao lado da cabeça, com esta virada de lado e uma face assente no solo, de modo que o nariz e a boca da vítima fiquem livres.
2.º Seguidamente sobrepor-se à vítima, com os joelhos no chão, à altura da bacia, voltado para a vítima e com as mãos sobre as costas desta, de modo que os polegares assentem a 3 cm ao lado da coluna vertebral. As mãos são colocadas em leque, com a ponta dos dedos alcançando as costelas inferiores.
3.º Aplicar progressivamente durante dois a três segundos (contando, por exemplo, em voz alta os números, seguidos, 151 152) o peso do corpo sobre a parte inferior da caixa torácica da vítima, de modo a provocar a expiração (fig. 3).
(ver documento original)
Figura 3
Método de Schaefer
Expiração
4.º Em seguida, deixando de aplicar o peso do corpo, endireitar-se ràpidamente, aliviando as mãos: a inspiração produz-se então pela elasticidade do tórax (fig. 4).
(ver documento original)
Figura 4
Método de Schaefer
Inspiração
5.º Fazer uma pausa de dois a três segundos (contando, por exemplo, em voz alta 153 154).
6.º Repetir estes movimentos até a respiração natural da vítima se manter.
III) Escolha do método de respiração a adoptar:
No método de Sylvester-Brosch os movimentos empregados estão mais próximos dos movimentos respiratórios do que os empregados no método de Schaefer.
O método de Schaefer é, no entanto, menos penoso para quem o aplica, apresentando ainda a vantagem de poder a vítima, pela sua posição, espectorar fàcilmente quaisquer mucosidades que a incomodem.
No caso, porém, de existirem fracturas ou ferimentos graves, empregar o método, de entre ambos, que, pela sua aplicação, não dê lugar a um agravamento dessas fracturas ou ferimentos.
Ministério da Economia, 31 de Março de 1960. - O Ministro da Economia, José do Nascimento Ferreira Dias Júnior.