Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º
4/2010/A
Não transferência do Governo da República para as autarquias açorianas do
financiamento correspondente a 5 % do IRS gerado no respectivo concelho
As autarquias dos Açores são, perante a lei e o Estado, iguais às do restante território nacional.
A relação financeira das autarquias dos Açores com o Estado não pode, assim, assentar em qualquer tipo de discriminação negativa decorrente da existência da autonomia e dos seus órgãos.
Na realidade, a autonomia é um meio de reconhecer, valorizar e distinguir as especificidades próprias da vida nestas ilhas, mas, não pode, nunca, servir como argumento para prejudicar os açorianos.
Ora, de acordo com o artigo 20.º da Lei 2/2007, de 15 de Janeiro, os municípios têm direito, em cada ano, a uma participação variável até 5 % no IRS dos sujeitos passivos com domínio fiscal no respectivo concelho, podendo determinar a redução de tal participação de modo a beneficiar, efectivamente, os cidadãos e as suas famílias, no sentido em que a diferença em causa é considerada como dedução à colecta do IRS a favor dos contribuintes.
Durante os anos de 2007 e 2008, bem como, nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2009, o Governo da República procedeu às adequadas transferências financeiras para os municípios da Região, nos termos legais referidos e conforme aprovado pela Assembleia da República e previsto no Orçamento do Estado.
Porém, a partir de Março de 2009, as autarquias açorianas depararam-se com o súbito fim de tais transferências, alegadamente, com base numa suposta interpretação centralista e completamente desajustada do sentido de Estado que deve nortear os titulares dos órgãos de soberania.
A interpretação em causa visou responsabilizar a Região pelas transferências financeiras em causa para as autarquias dos Açores, assim desresponsabilizando o Estado de uma obrigação financeira inalienável.
Perante o ataque claro e assumido às autarquias dos Açores e à autonomia, várias entidades foram manifestando o seu protesto, em especial, algumas autarquias, a Associação de Municípios da Região Autónoma dos Açores (AMRAA) e a Associação Nacional de Municípios.
Em 16 de Dezembro de 2009, o Governo Regional dos Açores assumiu publicamente que «o Governo da República aceitou uma proposta dos Açores, que irá permitir às autarquias açorianas a manutenção das receitas correspondentes à sua participação no imposto sobre o rendimento».
Adiantava o Governo Regional, que «com esta intervenção, que foi acompanhada pela AMRAA, o Governo dos Açores encontrou uma solução que permite resolver o diferendo entre os municípios açorianos e o Governo da República, tendo ficado definido na reunião da Comissão de Acompanhamento de Políticas Financeiras, hoje realizado, o enquadramento legal e financeiro a inscrever no Orçamento do Estado de 2010 para regularizar a situação».
Com o mesmo espírito, o Governo Regional congratulava-se afirmando que «ao conseguir a concordância do Governo da República na resolução desta divergência, contribuiu para reforçar a estabilidade financeira das autarquias açorianas, tendo intermediado com sucesso uma divergência de interpretação da legislação em vigor».
Porém, a 10 de Fevereiro de 2010, no âmbito do debate na generalidade do Orçamento do Estado, na Assembleia da República, o Ministro das Finanças contrariou expressamente aquilo que o Governo Regional havia assumido, reafirmando a posição centralista e desrespeitadora dos Açores que vigora desde Março de 2009, ao declarar: «não venham pedir ao Governo da República que pegue no IRS dos portugueses do continente para levar às Regiões, quando deve ser o IRS das Regiões a suportar essa receita dos municípios.
É isso que está na Lei das Finanças Locais.
É isso que nós estamos a cumprir e que continuaremos a cumprir.» Com tal declaração, o Ministro das Finanças de Portugal assume pública e expressamente um profundo ataque à autonomia, aos seus órgãos e financiamento, bem como, de forma directa, às autarquias dos Açores.
O Ministro das Finanças desrespeitou, ainda, o Governo dos Açores perante os compromissos que, conforme foi público, foram assumidos.
Com tal postura, o Governo da República, acaba por prejudicar todos os açorianos que deixam, assim, de poder beneficiar da redução de IRS que a posição assumida impede.
Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, nos termos do artigo 227.º, n.º 1, alínea v), da Constituição da República Portuguesa e dos artigos 7.º, n.º 1, alínea g), 34.º, alínea i), e 44.º, n.º 3, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores resolve o seguinte:
1 - A posição assumida pelo Governo da República, desde Março de 2009 e reiterada pelo Ministro das Finanças, no âmbito do debate na generalidade do Orçamento do Estado, não transferindo para as autarquias açorianas as verbas correspondentes a 5 % do IRS gerado no respectivo concelho, configura um grave e expresso ataque às autarquias dos Açores e concretiza um profundo desrespeito para com os açorianos que deixam de poder beneficiar da redução de IRS que a lei lhes concede.
2 - A consagração no Orçamento do Estado para 2010 das verbas necessárias e suficientes para garantir a transferência para as autarquias dos Açores dos valores correspondentes a 5 % do IRS gerado no respectivo concelho, relativamente aos anos de 2009 e 2010 configura um dever do Estado em respeito pela lei e pelos cidadãos açorianos, que não pode afectar as transferência para a Região Autónoma dos Açores ao abrigo da Lei das Finanças Regionais.
3 - Desta posição deve ser dado conhecimento à Assembleia da República e ao Governo da República.
Aprovada pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, em 12 de Fevereiro de 2010.
O Presidente da Assembleia Legislativa, Francisco Manuel Coelho Lopes Cabral.