Resolução do Conselho de Ministros n.º 21/2008
A política energética, nomeadamente na sua vertente de desenvolvimento da fileira dos biocombustíveis, é um factor importante do crescimento sustentado da economia portuguesa e da sua competitividade, na medida em que contribui para a diversificação das fontes de abastecimento energético e potencia o desenvolvimento agrícola e a fixação de populações no meio rural, bem como novos investimentos em áreas com uma elevada componente tecnológica.
A promoção da utilização de biocombustíveis nos transportes tem também um papel fundamental no combate às alterações climáticas, representando uma das principais medidas previstas no Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC), daí que o Governo tenha decidido aumentar para 10 % o objectivo de incorporação de biocombustíveis nos combustíveis fósseis de 5,75 %, em teor energético, em 2010, superando assim o valor indicativo da política energética da União Europeia, com evidentes ganhos ao nível ambiental, com destaque para o benefício decorrente da valorização dos resíduos.
Contudo, imperativos de ordem técnica, em particular a norma EN 590, para o gasóleo rodoviário e a norma EN 228, para a gasolina, impõem um limite de 5 %, em volume, quer para a incorporação de biodiesel sob a forma esteres metílicos de ácidos gordos (FAME) no gasóleo rodoviário de comercialização generalizada, quer para a incorporação de bioetanol na gasolina, normas que se encontram em revisão com vista a permitir maior incorporação nos combustíveis no médio prazo, possivelmente após 2010. Assim, a meta de 10 % já em 2010 representa um desafio para o qual importa desde já prever um conjunto de medidas que viabilizem o seu cumprimento.
Em primeiro lugar, o mecanismo de atribuição de isenção fiscal do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos previsto no artigo 71.º-A do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo, aditado pelo Decreto-Lei 66/2006, de 21 de Março, constitui uma das principais medidas de incentivo à introdução de biocombustíveis.
A Portaria 1554-A/2007, de 7 de Dezembro, que atribui a isenção para o período de 2008 a 2010, no âmbito do referido decreto-lei, prevê já um volume de isenção equivalente a 5,75 % dos combustíveis rodoviários em 2010. A referida portaria passa a considerar a incorporação de bioetanol nos combustíveis fósseis, como substituto da gasolina, esperando-se que, neste caso particular, a incorporação de matérias-primas seja, essencialmente, baseada em matérias-primas agrícolas endógenas. Com vista a garantir a viabilidade desta fileira e tendo em consideração a diferença do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos entre o gasóleo e a gasolina e a maior utilização de matérias-primas agrícolas endógenas, decidiu-se fixar o valor unitário da isenção de ISP para os biocombustíveis substitutos da gasolina para um intervalo entre os (euro) 400 e (euro) 420 por 1000 l.
Em segundo lugar, o gasóleo colorido e marcado representa uma parcela importante do consumo onde actualmente não está prevista a incorporação de biocombustíveis nem a isenção do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos. Tendo em consideração que este produto já beneficia de um imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos reduzido, a isenção não constitui medida eficaz de promoção, pelo que apenas o estabelecimento de um valor mínimo de biocombustíveis a incorporar nestes produtos constitui uma medida eficaz para a sua introdução e para a implementação desta política.
Independentemente das actuais especificações dos combustíveis aplicáveis a todas as viaturas, importa ter em atenção que alguns construtores automóveis estão a adaptar os seus motores e a permitir a incorporação de maiores percentagens de biocombustíveis, podendo atingir os 100 % em alguns veículos. Assim, importa criar condições para a comercialização de combustíveis com níveis de incorporação superiores de biocombustíveis, para viaturas que o permitam, garantindo uma adequada informação e responsabilização dos consumidores quanto à possibilidade da sua utilização e de adequadas regras de publicitação a cumprir pelos comercializadores.
Para atingir a meta de 10 % há ainda que ter em conta os desenvolvimentos tecnológicos que permitem já perspectivar novas soluções de produção de biocombustíveis compatíveis com as especificações para elevados níveis de incorporação, designadamente os biocombustíveis com base em óleos e gorduras hidrogenados e isomerizados que começam a estar comercialmente disponíveis.
Finalmente, a crescente incorporação de biocombustíveis não deve assentar apenas em mecanismos de atribuição de subsídios ou isenções, devendo procurar-se uma progressiva aproximação a mecanismos de mercado através da introdução de obrigações ou penalidades. Assim, a estratégia para o cumprimento das metas nacionais de incorporação de biocombustíveis nos combustíveis fósseis deve igualmente passar pela criação de um mecanismo de certificados de incorporação para os biocombustíveis não incluídos no regime de isenção de imposto sobre produtos petrolíferos e energéticos (ISP). A não apresentação de certificados será penalizada de forma a reflectir pelo menos o valor das emissões de CO2 adicionais que o Estado Português emitirá relativamente ao previsto no Programa Nacional para as Alterações Climáticas. O valor das penalizações será revertido para o Fundo Português de Carbono por forma a permitir ao Estado Português compensar as emissões adicionais.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Determinar a criação de especificações que permitam a comercialização de combustíveis com incorporações de biocombustíveis superiores às constantes nas normas vigentes, com níveis máximos de 20 % a partir de 2008, para os veículos compatíveis com essas especificações.
2 - Estabelecer que, para efeitos da comercialização dos combustíveis com incorporações de biocombustíveis superiores às constantes nas actuais normas nos termos do número anterior, apenas os volumes correspondentes até 15 % de incorporação poderão incluir biocombustíveis que beneficiem do regime de isenção de ISP previsto no Decreto-Lei 66/2006, de 22 de Março, enquanto este regime vigorar.
3 - Promover a criação de condições logísticas para a introdução no consumo dos volumes de biocombustíveis que beneficiam do regime de isenção de ISP, designadamente dos biocombustíveis substitutos da gasolina.
4 - Determinar a criação de um mecanismo de certificados de incorporação de biocombustíveis não incluídos no regime de isenção de ISP, juntamente com um regime de penalidades associadas à não entrega desses certificados, em:
a) 1,75 % da totalidade dos combustíveis introduzidos por cada comercializador em 2009;
b) 4,25 % da totalidade dos combustíveis introduzidos por cada comercializador em 2010;
c) 6,5 % da totalidade dos combustíveis introduzidos por cada comercializador em 2011;
d) 10 % da totalidade dos combustíveis introduzidos por cada comercializador em 2012 e anos posteriores, apenas excluindo aos volumes correspondentes a esta percentagem as quantidades provenientes da agricultura nacional, objecto de isenção parcial ou total.
5 - Determinar que a definição do valor para as penalidades previstas no número anterior será estabelecido com base no custo das emissões de CO2 não evitadas a nível nacional face às metas previstas no PNAC e noutros incentivos económicos que garantam a introdução dos níveis previstos.
6 - Estabelecer que a componente das penalidades relativa às emissões de CO2 não evitadas reverte para o Fundo Português de Carbono e que para o cálculo das verbas em causa se deve utilizar o valor médio de mercado dos mecanismos de flexibilidade do Protocolo de Quioto, que será determinado anualmente pelo comité executivo da Comissão para as Alterações Climáticas, criado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 33/2006, de 24 de Março.
7 - Definir incentivos económicos para os operadores de transporte público rodoviário em função dos impactes estimados do nível de incorporação de biocombustíveis substitutos do gasóleo, no exercício da sua actividade.
8 - Determinar que seja estabelecida uma quota mínima de 5 % de incorporação de biocombustíveis no gasóleo colorido e marcado a partir do 2.º trimestre de 2008.
Presidência do Conselho de Ministros, 17 de Janeiro de 2008. - O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.