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Acórdão 505/2004/T, de 3 de Novembro

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Texto do documento

Acórdão 505/2004/T. Const. - Processo 370/2004. - Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 - SOCONCAL - Sociedade Construtora do Cávado, S. A., recorre para este Tribunal, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, do acórdão a fls. 407 e seguintes do Tribunal da Relação de Guimarães, pretendendo a apreciação da constitucionalidade das normas dos artigos 23.º, n.º 1, e 26.º, n.os 1 e 10, do Código das Expropriações, aprovado pela Lei 168/99, de 18 de Setembro, de ora adiante designado como CE.

Por despacho do relator, o objecto do recurso foi circunscrito à norma do artigo 26.º, n.º 10, do CE.

A recorrente reclamou para a conferência desse despacho, mas, pelo Acórdão 343/2004, o Tribunal indeferiu a reclamação.

Tendo, assim, em conta que o recurso tem apenas por objecto a norma do artigo 26.º, n.º 10, do CE, a recorrente alegou, formulando as seguintes conclusões:

"1 - A norma do artigo 26.º, n.º 10, do CE, na interpretação que lhe foi dada no recorrido acórdão, corresponde a uma disposição manifestamente inconstitucional, por violadora do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP) e do princípio da justa indemnização (artigo 62.º, n.º 2, da CRP).

2 - Ao considerar que a impugnada norma determina a aplicação de um factor correctivo máximo sobre o valor do solo apto para construção em virtude da inexistência dos riscos e esforço construtivo que o expropriado em condições normais supostamente teria de suportar num hipotético aproveitamento urbanístico do imóvel, o douto acórdão em apreço assume como correcta e aceitável face aos princípios inscritos na lei fundamental a presunção de que com a concretização da expropriação o expropriado ficaria 'favorecido' por receber uma indemnização pelo bem imóvel em causa sem ter de arcar com os custos de uma eventual iniciativa construtiva.

3 - Esta é, no entanto, uma presunção claramente desprovida de sustentáculo, o que logo se alcança se se pensar na realidade que emerge da experiência quotidiana das expropriações determinadas por razões de utilidade pública, revelando, além do mais, uma deformada e desequilibrada ponderação valorativa dos interesses em presença.

4 - Nesta perspectiva, a discutida norma do CE (artigo 26.º, n.º 10) ofende abertamente o princípio da igualdade plasmado no artigo 13.º da CRP, na medida em que é geradora de uma discriminação entre os cidadãos expropriados e os não expropriados, em desfavor dos primeiros.

5 - Isto porque um cidadão expropriado, além de obrigado a alienar o bem requerido por motivo de utilidade pública, vê-lhe ser subtraída uma percentagem de até 15% do valor indemnizatório atribuído pressupostamente em função do valor real e corrente do bem imóvel, enquanto um cidadão não expropriado nas mesmas circunstâncias e relativamente a um bem com idênticas características pode optar, entre outras coisas, por vender esse bem no mercado, sem qualquer risco ou esforço construtivo e sem ter de suportar a dedução de qualquer tipo de percentagem.

6 - Por identidade de razões, a citada norma do CE viola também o princípio da justa indemnização ínsito no n.º 2 do artigo 62.º da CRP, já que nas circunstâncias resultantes da aplicação daquele preceito o valor indemnizatório obtido em sede de expropriação não corresponderá nunca ao valor real e corrente do bem.

7 - Todavia, ainda que se entendesse no tocante aos enunciados aspectos que o versado preceito (artigo 26.º, n.º 10, do CE) era susceptível de ser compatibilizado com a CRP, o que não se concede nem se aceita, sempre a interpretação e aplicação dessa norma que é feita no acórdão recorrido continuaria enredada no vício de inconstitucionalidade, pois que aí se estabelece e determina a aplicação do discutido factor correctivo pelo valor máximo legalmente previsto (15%) como se se tratasse de uma taxa fixa e invariável que apenas cumprisse aplicar de forma indiscriminada e automática a todo e qualquer processo de expropriação em que estivesse em causa a valoração de solo apto para construção.

8 - Ora, é perfeitamente claro que o legislador, ao estatuir o normativo do n.º 10 do artigo 26.º do CE e ao abrir a possibilidade de introdução no cálculo do valor da parcela expropriada daquele factor correctivo, pretendeu estabelecer, em termos percentuais, a dimensão ou amplitude máxima da variação desse factor, quantificado em função do valor de avaliação atribuído ao solo apto para construção.

9 - Assim sendo, não faz qualquer sentido encarar a referida norma como uma espécie de via para a aplicação de uma dedução fixa e invariável e não dependente da demonstração ou prova de que o expropriado obteve com a concretização do processo expropriativo um benefício ou vantagem económica - máxime sob a forma de uma pretensa 'poupança' de custos - enquanto em cotejo com os resultados patrimoniais de uma virtual sujeição do imóvel expropriado a uma iniciativa construtiva da parte do próprio proprietário.

10 - Por conseguinte, a interpretação que no douto acórdão em crise é efectuada da mencionada norma implicaria a subsistência dos já citados princípios da igualdade e da justa indemnização, não apenas porque estaria em causa um tratamento não diferenciado de situações desiguais - maior ou menor 'poupança' em função da inexistência de risco ou esforço construtivo em caso de expropriação, consoante as características do imóvel e os demais factores que intervêm na determinação do valor de mercado dos bens imobiliários - mas também porque corresponderia a privar o expropriado de forma desproporcionada e injusta de uma parte do real valor do bem objecto de expropriação.

11 - Nesta conformidade, forçoso se torna que seja reconhecida e declarada a inconstitucionalidade da norma constante do n.º 10 do artigo 26.º do CE, na interpretação que lhe foi dada pelo Tribunal da Relação de Guimarães na referenciada apelação, uma vez que a mesma viola o princípio da igualdade e o princípio da justa indemnização consagrado na CRP, impondo-se por isso que seja afastada e recusada a sua aplicação ao caso em apreço nos autos."

Contra-alegou o Ministério Público, concluindo:

"1 - Não é inconstitucional a norma constante do artigo 26.º, n.º 10, do Código das Expropriações, enquanto consagradora de um factor correctivo destinado a 'compensar' o lucro do expropriado que - relativamente a terrenos para construção - recebe indemnização em dinheiro, compensatório do 'valor de mercado' de tais bens imóveis, sem ter de suportar os riscos e encargos inerentes à efectiva edificação no bem expropriado.

2 - As instâncias não interpretaram e aplicaram tal norma em termos de nele estabelecer um factor de correcção fixo e imutável, resultando antes que o valor alcançado (15%) decorreu de uma ponderação concreta e casuística, alicerçada na natureza e destino normal do prédio expropriado."

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

2 - No requerimento de interposição de recurso, a recorrente disse pretender que o Tribunal Constitucional apreciasse a constitucionalidade da norma do artigo 26.º, n.º 10, do CE - única que está agora em causa - "na interpretação acolhida pelo acórdão recorrido, que corrobora igualmente o entendimento adoptado pelo julgador de 1.ª instância, segundo a qual se impõe a aplicação de um factor correctivo máximo de 15% sobre o valor do solo apto para construção por forma a contrabalançar a inexistência no caso de expropriação de riscos, encargos, custos organizativos, impostos, etc., que o expropriado em condições normais teria de suportar num hipotético aproveitamento urbanístico do imóvel, sendo tal factor correctivo, supostamente, um instrumento necessário e adequado a proporcionar a igualdade entre cidadãos".

O despacho do relator que limitou o objecto do recurso ao conhecimento da referida norma teve naturalmente em conta a interpretação que a recorrente pretendia sindicar, de acordo com o requerimento de interposição de recurso, aceitando implicitamente que a norma fora aplicada na decisão recorrida com essa mesma interpretação.

Sucede que nas alegações apresentadas a recorrente reporta as conclusões 7.ª a 11.ª a um outro entendimento da norma, qual seja o de esta impor "uma taxa fixa e invariável que apenas cumprisse aplicar de forma indiscriminada e automática".

Trata-se, como bem se vê, de uma interpretação diversa daquela que a recorrente indicou no requerimento de interposição de recurso e que foi suposta no despacho do relator que delimitou o objecto do recurso.

Não podendo a recorrente, nas alegações, alargar ou alterar o âmbito do recurso, tal como este fora por ela própria delimitado e, neste ponto, aceite pelo aludido despacho do relator, não irá o Tribunal conhecer da constitucionalidade da norma do artigo 26.º, n.º 10, do CE naquela interpretação.

De resto, sempre se dirá que tal interpretação se não mostra sequer acolhida no acórdão recorrido, razão por que, também por esta via, e dado o disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, dela se não poderia conhecer.

3 - A questão de constitucionalidade que a recorrente sujeita à apreciação deste Tribunal está em saber se a norma ínsita no artigo 26.º, n.º 10, do CE ofende os artigos 62.º, n.º 2 (princípio da justa indemnização), e 13.º (princípio da igualdade) da CRP.

O artigo 26.º do CE dispõe sobre o cálculo do valor do solo apto para a construção.

Depois de, no seu n.º 1, estabelecer que o valor do solo apto para construção se calcula "por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e regulamentos em vigor", o artigo 26.º do CE adopta dois critérios de cálculo daquele valor, o primeiro - que se pode qualificar como principal - regulado nos n.os 2 e 3 e o segundo - subsidiário - aplicável no caso de se não revelar possível a aplicação do primeiro, com a disciplina prevista nos n.os 4 e seguintes. Isto sempre sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 23.º do mesmo Código, que, assinalando o fim visado pelas regras que regulam o cálculo do valor dos bens expropriados (fazer corresponder este valor "ao valor real e corrente dos bens numa situação normal de mercado"), prevê a possibilidade de a entidade expropriante e o expropriado requererem, ou o tribunal decidir oficiosamente, que a avaliação se faça de acordo com outros critérios, quando, no caso, a que viesse a ser feita em conformidade com os critérios enunciados nos artigos 26.º e seguintes não permitisse a referida correspondência - é o que Alves Correia qualifica como "válvula de escape" ou "cláusula de segurança" ("A jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre expropriações por utilidade pública e o Código das Expropriações de 1999", Coimbra Editora, 2000, separata da Revista de Legislação e Jurisprudência, p. 128).

No caso, o critério adoptado para calcular o valor do solo, qualificado como apto para a construção, foi o que consta dos n.os 4 e seguintes do artigo 26.º, ou seja, o que se define pelas seguintes regras:

O valor do solo calcula-se em função do custo da construção em condições normais de mercado;

Este custo é determinado tendo em conta, como referencial, os montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada;

O valor do solo varia até 15% do custo de construção;

Nesta variação atender-se-á a vários factores, nomeadamente localização, qualidade ambiental e equipamentos existentes na zona;

A percentagem fixada (até 15% do custo de construção) pode, ainda, ser acrescida até ao limite de percentagens legalmente estabelecidas para diversos factores, que aumentam o valor do solo, referidos nas alíneas a) a i) do n.º 7 do artigo 26.º;

O custo de construção pode ainda ser acrescido ou diminuído se, pelas especiais condições do local, ele for substancialmente reduzido ou agravado;

Quando o aproveitamento urbanístico que serviu de base à avaliação implicar uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, deverá ter-se em conta (abater-se) no cálculo do montante indemnizatório as despesas necessárias ao reforço dessas infra-estruturas;

O valor determinado pelas regras enunciadas será corrigido (diminuído) com a aplicação de uma percentagem máxima de 15% daquele valor, "pela inexistência de risco e do esforço inerente à actividade construtiva" - sendo esta a regra cuja constitucionalidade vem questionada.

Como se deixou relatado, a recorrente invoca a violação dos artigos 62.º, n.º 2, e 13.º da Constituição.

Cabe, no entanto, evidenciar que tal invocação resulta da mesma base argumentativa, qual seja a de que a redução do montante indemnizatório coloca o expropriado numa posição de desigualdade face aos não expropriados; isto é, desde logo, patente na conclusão 6.ª das alegações, onde a recorrente, depois de nas conclusões anteriores se reportar à situação de suposto desfavor dos expropriados relativamente aos não expropriados, diz: "Por identidade de razões, a citada norma do CE viola também o princípio da justa indemnização ínsito no n.º 2 do artigo 62.º da CRP [...]."

Compreende-se, aliás, este entendimento, tendo em conta o que o Tribunal Constitucional tem vindo a expender sobre o princípio constitucional consagrado no artigo 62.º, n.º 2, da Constituição.

Escreveu-se a propósito no Acórdão 210/93, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 24.º vol., pp. 549 e segs.:

"9 - O artigo 62.º, n.º 2, da lei fundamental, ao estabelecer que a expropriação por utilidade pública só pode ser efectuada com base na lei e mediante o pagamento de 'justa indemnização', consagra claramente o princípio da indemnização como um pressuposto de legitimidade do acto expropriativo (cf. F. Alves Correia, As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, Coimbra, 1982, pp. 120-122 e 156-162) ou, por outras palavras, como 'um elemento integrante do próprio acto de expropriação' (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1984, p. 337. Cf. também F. Alves Correia, 'Formas de pagamento da indemnização na expropriação por utilidade pública - Algumas questões', separata do número especial do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra - Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor António de Arruda Ferrer Correia, 1984, Coimbra, 1991, pp. 15 e 16, nota 4).

Aquele preceito constitucional determina que a indemnização por expropriação deve ser justa, mas não define qualquer critério indemnizatório de aplicação directa e objectiva nem contém qualquer indicação sobre o método ou mecanismo de avaliação do prejuízo derivado da expropriação. É este um problema de técnica legislativa, cuja escolha foi deixada pela Constituição ao legislador ordinário (cf. F. Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Almedina, Coimbra, 1990, pp. 532-546).

Apesar disso, a expressão 'justa indemnização', inserta no artigo 62.º, n.º 2, da lei fundamental, não pode ser considerada como uma fórmula vazia. É, antes, uma fórmula carregada de sentido, na qual podem ser colhidos importantes limites à discricionariedade do legislador ordinário.

10 - Em obra recente, F. Alves Correia (cf. O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, cit., pp. 532 e segs.) defende que o conceito constitucional de 'justa indemnização' leva implicado três ideias: a proibição de uma indemnização meramente nominal, irrisória ou simbólica; o respeito pelo princípio da igualdade de encargos, e a consideração do interesse público da expropriação.

Atendo-nos apenas à primeira e à segunda dimensões - aquelas que têm a ver com o princípio da justiça da indemnização visto na direcção do expropriado -, dir-se-á, com o autor referido, que no conceito de justa indemnização vai implícito o sentido de que devem ser rejeitados por inconstitucionais os critérios conducentes a uma indemnização meramente nominal (blösse Nominalentschädigung), a uma indemnização puramente irrisória ou simbólica ou a uma indemnização simplesmente aparente. Estar-se-á perante uma indemnização meramente simbólica quando, por exemplo, a lei, baseando-se num critério abstracto, que não faça qualquer referência ao bem a expropriar e ao seu valor segundo o seu destino económico, permite indemnizações que não se traduzem numa compensação adequada do dano infligido ao expropriado.

Além disso, no conceito de justa indemnização vai implicada necessariamente a observância do princípio da igualdade, na sua manifestação de igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos. Uma indemnização justa (na perspectiva do expropriado) será aquela que, repondo a observância do princípio da igualdade violado com a expropriação, compense plenamente o sacrifício especial suportado pelo expropriado, de tal modo que a perda patrimonial que lhe foi imposta seja equitativamente repartida entre todos os cidadãos.

Segundo o autor citado, o princípio da igualdade, como elemento normativo inderrogável que deve presidir à definição dos critérios de indemnização por expropriação, desdobra-se em duas dimensões ou em dois níveis fundamentais de comparação: o princípio da igualdade no âmbito relação interna e o princípio da igualdade no domínio da relação externa da expropriação.

[...]

No domínio da relação externa da expropriação, comparam-se os expropriados com os não expropriados, devendo a indemnização por expropriação ser fixada num montante tal que impeça um tratamento desigual entre os dois grupos. A observância do 'princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos' na expropriação por utilidade pública exige que esta seja acompanhada de uma indemnização integral (volle Entschädigung) ou de uma compensação integral do dano infligido ao expropriado. Aquele princípio impõe que a indemnização por expropriação possua um 'carácter reequilibrador' em benefício do sujeito expropriado, objectivo que só será atingido se a indemnização se traduzir numa 'compensação séria e adequada' ou, noutros termos, numa compensação integral do dano suportado pelo particular."

É, pois, neste domínio da relação externa da expropriação que a recorrente situa a violação do princípio da igualdade, princípio este que - como se viu - vai implicado naqueloutro da "justa indemnização".

Ora, deve dizer-se, em primeiro lugar, que a tese sustentada pela recorrente não é nova na doutrina. Ela foi defendida com argumentação muito semelhante à da recorrente por Melo Ferreira, in Código das Expropriações Anotado, 2.ª ed., p. 126. Mas não deixa, também, de assinalar-se que Alves Correia, no n.º 3 do estudo citado, "A jurisprudência do Tribunal Constitucional ...", epigrafado como "A questão de constitucionalidade de algumas normas relativas ao conteúdo da indemnização", não refere a norma em causa como sendo uma das que, no Código de 1999, merecem um juízo de inconstitucionalidade.

Entende o Tribunal que a norma não enferma de inconstitucionalidade.

Qualificado o solo expropriado como apto para a construção e exigindo a lei (artigo 23.º, n.º 5, do CE) que o resultado da avaliação corresponda ao valor real e corrente, numa situação normal de mercado, daquele bem, os critérios impostos para tal avaliação - que tem como referencial o custo de construção possível - assentam necessariamente em factores concretos que permitam alcançar tal resultado, ou seja, nem uma subavaliação nem uma sobreavaliação do bem expropriado.

E é por isso que, ao lado de factores que determinam aumentos à percentagem máxima do custo de construção, outros há que vão implicar uma redução do montante indemnizatório.

Nestes últimos se incluem, nomeadamente, o reforço das infra-estruturas necessário para o aproveitamento urbanístico que serviu de base ao cálculo do valor do solo (n.º 8 do artigo 26.º do CE) e o risco e esforço inerente à actividade construtiva, encargos que o expropriado, em ambos os casos, não teve de suportar, mas que suportaria se não fosse expropriado e pretendesse o mesmo aproveitamento.

Quer um quer outro dos factores significa a concretização da pretensão de igualar a situação de expropriados e não expropriados, de modo a evitar um benefício ilegítimo dos primeiros.

Ora, tal como Alves Correia (estudo citado, p. 143) se refere ao primeiro factor ("A consideração das despesas necessárias ao reforço das infra-estruturas existentes, nas situações referidas nesta norma, no cálculo do montante da indemnização é perfeitamente compreensível, pois sem o seu custeamento pelo expropriado não seria possível a realização do aproveitamento urbanístico que serviu de base à determinação do montante da indemnização"), também se poderá dizer, no caso, que, para obter no mercado normal, o preço equivalente ao valor por que bem idêntico é avaliado para efeitos de expropriação (de acordo com a sua aptidão edificativa e tendo como referencial o custo de construção), um não expropriado teria de suportar o risco e o esforço inerentes à actividade construtiva.

É evidente que nos situamos, como não podia deixar de ser, num campo de prognose; mas trata-se de um juízo plausível e sem arbítrio de que não decorre um tratamento discriminatório entre expropriados e não expropriados.

Por outro lado, importa, ainda, ter em conta que a correcção a efectuar ao valor da avaliação, nos termos da norma em causa, se dimensiona em termos flexíveis (até 15%), o que sempre permitirá a ponderação de circunstâncias particulares do caso, de modo a, tanto quanto possível, ajustar a previsão dos referidos custos ou encargos à realidade hipotética.

Em suma, pois, a norma do artigo 26.º, n.º 10, do CE não viola o princípio da igualdade e, nesta medida, o princípio da justa indemnização, consagrados nos artigos 13.º e 62.º, n.º 2, da CRP.

4 - Decisão:

Pelo exposto e em conclusão, decide-se negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.

Lisboa, 13 de Julho de 2004. - Artur Maurício - Rui Moura Ramos - Pamplona de Oliveira (vencido, conforme declaração em anexo) - Maria Helena Brito - Luís Nunes de Almeida.

Declaração de voto

A norma impugnada - o n.º 10 do artigo 26.º do Código das Expropriações aprovado pela Lei 168/99, de 18 de Setembro - tem a seguinte redacção:

"10 - O valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos n.os 4 a 9 será objecto da aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação."

Esta norma ofende claramente o princípio da justa indemnização que a Constituição adopta no seu artigo 62.º, n.º 2, pois destina-se a introduzir, sob a capa de "correctivo", um factor totalmente arbitrário de redução do montante indemnizatório, e assim contornar a jurisprudência que este Tribunal Constitucional vinha construindo em torno do conceito de "justa indemnização" acolhido na Constituição (v. o aresto citado no próprio acórdão, que é anterior à aprovação da norma em apreço).

Face a esta evidência, o acórdão tem - a meu ver - a maior dificuldade em tornar convincente a tese que sufragou, razão pela qual busca apoio argumentativo na situação "de igualdade" daqueles a quem chama "não expropriados" esquecendo que estes "não expropriados" são, afinal, os intervenientes no livre comércio jurídico, que, ao contrário do que se passa na expropriação, intervêm em plena liberdade na decisão de concretizar o negócio e na fixação do preço.

Votei, portanto, no sentido de se conceder provimento ao recurso. - Pamplona de Oliveira.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2255748.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga ao seguinte documento (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1999-09-18 - Lei 168/99 - Assembleia da República

    Aprova, e publica em anexo, o Código das Expropriações.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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