Resolução do Conselho de Ministros n.º 89/2007
O Programa do XVII Governo Constitucional estabelece como objectivo prioritário da acção governativa ao nível do sistema rodoviário a resolução dos problemas de capacidade, financeira e técnica, de execução do Plano Rodoviário Nacional, baseada numa selecção de prioridades tendo em conta previsões de tráfego, requisitos de segurança e perspectivas de desenvolvimento.
A mobilidade representa um aspecto determinante da qualidade de vida das populações e um factor decisivo para a competitividade das regiões e para promover a coesão territorial e social. Neste contexto, o desenvolvimento do sistema rodoviário, enquanto parte integrante do sistema de transportes global e nacional visa satisfazer as necessidades de procura, quer em transporte individual, quer em transporte público, ao mesmo tempo que contribui para o combate à sinistralidade rodoviária. Da mesma forma, esse desenvolvimento pretende reforçar, através do aumento de fluxos de mercadorias, a posição competitiva e económica do País em articulação estreita com os outros sistemas de transportes.
Paralelamente, tendo em conta a selecção de prioridades a definir, e sem prejuízo das limitações de capacidade financeira acima referidas, importa prosseguir o objectivo de conclusão da rede de auto-estradas e da restante rede viária e avançar com o estabelecimento de um programa de monitorização, modernização e reparação das estradas nacionais e regionais existentes, bem como com a contratualização da sua manutenção, e proceder à conclusão da reestruturação institucional do sector, separando as funções de regulação, de licenciamento e de fiscalização.
Tal como em outras áreas da acção governativa, também no sector rodoviário, ou com impacte nele, têm vindo a ser adoptadas medidas conducentes à concretização destes objectivos.
Em Janeiro de 1997, o Governo criou, através do Decreto-Lei 9/97, de 10 de Janeiro, novas concessões rodoviárias em regime de portagem real, introduzindo no sistema rodoviário o regime de contratação em parceria público-privada.
Em Outubro desse ano, com a aprovação e publicação do Decreto-Lei 267/97, de 2 de Outubro, foi dado um novo e decisivo passo no sentido do aumento da oferta de infra-estruturas rodoviárias e da aceleração da execução do Plano Rodoviário Nacional, ao ser introduzido pela primeira vez em Portugal o regime que ficou conhecido como das concessões sem custos para o utilizador (SCUT).
O programa das novas concessões com e sem portagem real significou uma opção estratégica do Estado no reforço da coesão nacional e da competitividade e atractividade de regiões do País menos bem servidas do ponto de vista das acessibilidades, sendo já possível identificar sucessos importantes ao nível da qualidade de vida das populações, ao mesmo tempo que se registam significativos avanços em matéria de diminuição da sinistralidade rodoviária.
Em Julho de 1998, o movimento reformador do sector rodoviário nacional prosseguiu com a aprovação do novo Plano Rodoviário Nacional, definindo o quadro de desenvolvimento das vias de comunicação de carácter nacional, o qual constituiu um instrumento de planeamento essencial para o País.
Entretanto, e do ponto de vista da organização institucional no sector, foi, em 1999, refundada a antiga Junta Autónoma das Estradas (JAE), através da criação de três institutos que, já em 2002, foram consolidados no Instituto das Estradas de Portugal, I.
P. (IEP), transformado, em 2004, numa entidade de natureza empresarial, a EP - Estradas de Portugal, E. P. E., que iniciou a actividade em 1 de Janeiro de 2005.
Decorridos 10 anos sobre este intenso movimento de redefinição da intervenção e do papel do Estado no sector rodoviário, impõe-se agora desenvolver um novo modelo de gestão e financiamento, assente num maior aprofundamento da gestão empresarial do sector e num envolvimento mais profundo da iniciativa privada.
Assente nestes princípios base, visa-se promover uma maior eficiência na afectação dos recursos e uma maior aproximação ao mercado, implementando princípios de gestão privada e transferindo de forma sistemática os riscos de projecto, de construção e financiamento, originariamente a cargo do Estado, para os operadores do sector.
Ao mesmo tempo, pretende-se centrar energias no reforço e consolidação dos conceitos base da solidariedade intergeracional, da coesão nacional, da transparência dos custos das funções do Estado e da auto-sustentabilidade do sector rodoviário.
Entende-se como essencial, para o sucesso da implementação deste novo modelo, dotar a EP, E. P. E., de uma maior agilidade e autonomia empresarial, fundamentais para o seu renovado papel, procedendo à sua transformação em sociedade anónima, com atribuição de objectivos de gestão mais ampla e operacional.
A nova natureza societária da EP - Estradas de Portugal, S. A. (EP, S. A.), permitirá associar, ao nível da estrutura accionista, capitais privados e capitais públicos no desenvolvimento do sector rodoviário e reforçar o princípio de que o Estado não garante ou avaliza, directa ou indirectamente, qualquer dívida ou obrigação desta sociedade, nem assume qualquer responsabilidade pelos seus passivos, seja qual for a sua natureza.
Adicionalmente, a relação entre o Estado e a EP, S. A., deve seguir e seguirá os princípios relativos ao bom governo societário, recentemente aprovados pelo Governo através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/2007, de 28 de Março.
A adopção destes princípios requer, da parte do Estado, uma alteração estrutural de fundo na sua relação com a rede rodoviária nacional e uma reorganização total das estruturas da Administração Pública que nela intervêm. Esta alteração essencial do paradigma histórico do sector rodoviário será consubstanciada na atribuição de uma concessão relativa à rede rodoviária nacional à EP, S. A., em termos a definir em decreto-lei.
Este novo modelo organizativo, traduzido num contrato de concessão de longo prazo a celebrar entre o Estado e a EP, S. A., representa uma modificação histórica do papel até aqui desempenhado pela EP, E. P. E., e, antes desta, pela JAE e pelo IEP, assegurando, de um só passo, um maior envolvimento de investidores e financiadores privados em moldes mais competitivos; a transparência nos custos e tarifas aplicadas no sector; o controlo público do desempenho e da eficiência da EP, S. A.; e a fixação de objectivos públicos e contratualizados no que se refere à qualidade de serviço das vias nacionais, à redução da sinistralidade, e um modelo de gestão empresarial que permitirá tornar o sector rodoviário auto-sustentável e geracionalmente equitativo.
Nesta reforma do sector, o Governo reafirma, uma vez mais, o compromisso de não aumentar a carga fiscal, já assumido aquando da apresentação do Plano de Estabilidade e Crescimento, em Junho de 2005.
Assim, e para além da cobrança de portagens aos respectivos utilizadores, no caso das actuais e futuras concessões de portagem real, quando aplicável, o referido modelo de financiamento passará a integrar uma Contribuição de Serviço Rodoviário, que constituirá receita própria da EP - Estradas de Portugal, S. A.
A Contribuição de serviço rodoviário deverá incidir sobre os utilizadores das infra-estruturas rodoviárias, tendo em conta o consumo de combustível.
Neste novo paradigma de relação entre o Estado, os utilizadores e a rede rodoviária nacional assume particular relevância a criação de um instituto público com funções de regulação - o Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I. P. (InIR), cuja lei orgânica e estatutos foram já publicados no Diário da República.
O InIR, na prossecução das suas atribuições, terá um papel regulador e fiscalizador do sector, assegurando uma maior transparência e escrutínio na relação do Estado com a EP, S. A., e maior transparência na formação de preços e tarifas, nomeadamente da Contribuição de Serviço Rodoviário, sempre na defesa do manifesto interesse público que esse controlo em si mesmo representa e no reforço de um mercado emergente que importa valorizar e credibilizar.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Determinar que o modelo de gestão e financiamento do sector das infra-estruturas rodoviárias, abrangendo a totalidade da rede rodoviária nacional, deverá assentar nos seguintes princípios gerais:
a) Coesão territorial, traduzido na assunção complementar de encargos pelo Estado, relativamente a infra-estruturas rodoviárias seleccionadas, sempre que tal se justifique atendendo aos indicadores de desenvolvimento socio-económico das regiões em causa e à ausência de alternativas viáveis;
b) Solidariedade intergeracional, traduzido na adequada distribuição dos custos da rede rodoviária nacional pelos respectivos beneficiários, presentes e futuros, atendendo à vida útil das mesmas, e favorecendo o ajustamento da respectiva amortização financeira à sua amortização económica;
c) Eficiência ambiental, traduzido na discriminação positiva dos veículos que, para um determinado nível de utilização das infra-estruturas permitam menores consumos de combustível ou recorram a fontes de energia menos poluentes;
d) Contratualização de longo prazo das responsabilidades decorrentes da concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional, traduzido, designadamente, na celebração de contrato de concessão entre o Estado e a EP - Estradas de Portugal, S. A.;
e) Definição do preço global do serviço representado pelo uso e disponibilidade da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, S. A., e assente na criação da Contribuição de serviço rodoviário como receita própria desta entidade;
f) Associação de investimento privado ao desenvolvimento da rede rodoviária nacional, traduzido no reforço das parcerias público-privadas, sem prejuízo da abertura do capital da EP - Estradas de Portugal, S. A., a entidades privadas, em termos a definir;
e g) Reforço da segurança rodoviária traduzido na contratualização de políticas activas para a segurança dos utilizadores, prevendo-se para o efeito, no contrato de concessão a celebrar com a EP - Estradas de Portugal, S. A., os instrumentos adequados.
2 - Determinar que, para além da cobrança de portagens aos utilizadores, no caso das actuais e futuras concessões de portagem real, quando tal se aplique, e das eventuais transferências orçamentais que, em regime complementar, se venham a revelar adequadas, o referido modelo de gestão e financiamento passará a integrar uma contribuição de serviço rodoviário que constituirá receita própria da EP Estradas de Portugal, S. A.
3 - Determinar que a contribuição de serviço rodoviário deverá incidir sobre os utilizadores das infra-estruturas rodoviárias, tendo por referência os quilómetros percorridos com base numa unidade de consumo de combustível, garantindo uma discriminação positiva dos utilizadores de veículos mais eficientes em termos ambientais, ou movidos a fontes de energias menos poluentes.
4 - Determinar que a contribuição de serviço rodoviário não implique oneração adicional dos utilizadores das infra-estruturas rodoviárias, tendo a sua criação contrapartida na redução do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos de forma a assegurar tal neutralidade.
5 - Incumbir o Ministro de Estado e das Finanças e o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações da adopção imediata das medidas necessárias à implementação dos princípios enunciados na presente resolução, procedendo à apresentação das iniciativas com vista, designadamente, a:
a) Rever o Plano Rodoviário Nacional e as correspondentes implicações no respectivo plano de investimentos e financiamento;
b) Implementar o modelo de regulação na sequência da recente criação do InIR, I. P.;
c) Apresentar um projecto de decreto-lei de transformação da EP - Estradas de Portugal, E. P. E., em EP - Estradas de Portugal, S. A.;
d) Apresentar uma proposta de bases da concessão a constituir sobre a rede rodoviária nacional;
e) Apresentar uma proposta de minuta de contrato de concessão a outorgar com a EP - Estradas de Portugal, S. A.;
f) Implementar a Contribuição de Serviço Rodoviário;
g) Proceder à negociação das actuais concessões rodoviárias.
6 - Determinar que a presente resolução produz efeitos desde a data da sua aprovação.
Presidência do Conselho de Ministros, 14 de Junho de 2007. - O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.