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Acórdão 172/2000/T, de 25 de Outubro

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Texto do documento

Acórdão 172/2000/T. Const. - Processo 762/98. - Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

Relatório

1 - Beiersdorf Portuguesa, Lda., deduziu, junto do Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Lisboa, impugnação judicial parcial contra a liquidação do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas respeitante ao exercício de 1992 e respectiva derrama.

O Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Lisboa, por sentença de 18 de Junho de 1997, julgou a impugnação improcedente. Para tanto, fez aplicação do artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, na redacção do artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março (que, nos termos do n.º 7 do mesmo artigo, tem natureza interpretativa), considerando, consequentemente, que a derrama não deve ser considerada como custo para efeitos de IRC. Nessa decisão, afirma-se o seguinte:

"Nestas circunstâncias seríamos levados a aderir à leitura interpretativa que o STA fez do artigo 41.º do CIRC no Acórdão de 1 de Fevereiro de 1995, recusando uma interpretação extensiva ou analógica do mesmo, não fosse a lei do Orçamento do Estado para 1996 - Lei 10-B/96, de 23 de Março, a qual, através do seu artigo 28.º, veio dar nova redacção, entre outros, à alínea a) do artigo 41.º do CIRC, onde hoje se lê: 'O imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) e quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros' (sublinhado nosso).

A mesma aditou ao Código do IRC, através do seu artigo 28.º, n.º 2, um novo preceito - o artigo 39.º-A em cujo n.º 7 se pode ler 'interpretativa': 'A redacção dada nos termos do n.º 1 à alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC tem natureza interpretativa' (sublinhado nosso).

É, pois, perante tais alterações legislativas, que não podem deixar de ser consideradas, que a sorte da presente acção se decide, necessariamente, contra as pretensões da impugnante e do Digno Magistrado do Ministério Público, pois que a natureza interpretativa atribuída à alteração introduzida ao n.º 1 do artigo 41.º do CIRC faz com que tenhamos de considerar que já na data da autoliquidação a que se referem os presentes autos as derramas não eram elegíveis como custo dedutível para apuramento da matéria colectável de IRC."

2 - Beiersdorf Portuguesa, Lda., interpôs recurso da sentença de 18 de Junho de 1997 para o Supremo Tribunal Administrativo. Nas respectivas alegações, a recorrente propugnou a aplicação da versão originária do artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, que permitia que as derramas fossem consideradas custos para efeitos de IRC, sustentando que, caso se considerasse aplicável à situação dos autos aquele preceito na redacção conferida pelo artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março (como se entendeu na sentença recorrida), o mesmo seria inconstitucional, por violação do princípio da não retroactividade das leis fiscais.

O Supremo Tribunal Administrativo, por Acórdão de 20 de Maio de 1998, negou provimento ao recurso, fazendo aplicação do artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, na redacção dada pelo artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março, à qual, como se referiu, é conferida natureza interpretativa pelo n.º 7 desse mesmo preceito. Nesse aresto, explicitou-se a fundamentação nestes termos:

"Se na redacção inicial do artigo 41.º do CIRC (o qual se reporta aos encargos não dedutíveis para efeitos fiscais e de entre estes aos impostos que não podem ser deduzidos) apenas se referia o IRC e não a derrama por força da Lei orçamental n.º 10-B/96, de 23 de Março, passou a estabelecer que não podiam ser deduzidos 'quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros'.

Nestes passou a estar incluída a derrama, já que tem a natureza de imposto sobre o rendimento, conforme se sustenta no acórdão que vimos acompanhando e lugares aí citados.

A referida lei orçamental acrescentou, ainda, no artigo 28.º, n.º 7, que 'a redacção dada nos termos do n.º 1 à alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC tem natureza interpretativa.'

Por força deste preceito legal estamos perante uma interpretação autêntica feita pela própria lei, a qual assume uma das orientações interpretativas assumida pela jurisprudência no sentido de que a derrama não era custo fiscal (STA, 23 de Setembro de 1992, recurso n.º 14 380) contrariamente à que entendia que a mesma era custo fiscal (STA, 1 de Fevereiro de 1995, CTF 379/308) (para uma leitura mais desenvolvida pode consultar-se o Acórdão deste Tribunal de 4 de Dezembro de 1996, recurso n.º 20 773, e de Maio de 1997, AD 427.º, 887).

E tal interpretação jurídica é a que melhor se coaduna com a natureza económica e financeira da derrama já que esta bem como o IRC não se tornaram indispensáveis para gerar receitas ou proveitos ou para produzirem aquelas ou estes uma vez que se traduzem, como no acórdão que vimos acompanhando se escreveu, 'numa extracção de uma fatia do próprio rendimento' ou na expressão do Acórdão de 14 de Maio de 1997, referido, 'numa real amputação do rendimento, da riqueza que se quer deixar disponível e isso só é plenamente alcançado com a não dedução do imposto sobre o rendimento a ele próprio'.

Integrando-se a lei interpretativa (de 1996) na lei interpretada, por força do artigo 13.º do Código Civil, e produzindo os seus efeitos desde a data da entrada em vigor do CIRC temos de concluir que em 1993 não era dedutível à matéria colectável a derrama a que se referem os presentes autos."

3 - Beiersdorf Portuguesa, Lda., interpôs recurso de constitucionalidade do Acórdão de 20 de Maio de 1998, ao abrigo do disposto nos artigos 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição, e 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional para apreciação da conformidade à Constituição da norma contida no artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96, de 23 de Março. A recorrente entende que tal norma, ao conferir natureza interpretativa (com eficácia ex tunc) à nova redacção do artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, é inconstitucional, por violação do artigo 103.º, n.º 3, da Constituição (no texto da 4.ª revisão).

Junto do Tribunal Constitucional, a recorrente alegou, tendo tirado as seguintes conclusões:

"1 - A alteração introduzida na alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC pela Lei 10-B/96 de 23 de Março, somente produz efeitos a partir da sua entrada em vigor.

Porquanto,

2 - Ainda que contendo uma norma de natureza interpretativa, aquele diploma, segundo os princípios gerais de direito fiscal, só pode aplicar-se a partir da sua publicação, o que significa que a derrama só não poderá aceitar-se como custo a partir do exercício de 1996 (sublinhado nosso).

Assim sendo,

3 - E em conformidade com o princípio da não retroactividade das leis tributárias valendo a alteração introduzida na alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC pela citada Lei 10-B/96, de 23 de Março, somente para o futuro, no exercício de 1992 ainda terá de se aceitar como custo desses exercício a derrama.

Uma vez que,

4 - De acordo com o supracitado princípio 'a obrigação tributária só pode ser regulada, na sua substância, pela lei vigente à data em que ocorrem os factos nela previstos' (v. Prof. Doutor Vítor Faveiro, in ob. cit., p. 315).

Pelo que,

5 - No caso dos autos ainda se aplica a primitiva redacção da alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC e, consequentemente, terá de se aceitar como custo do exercício de 1992 a quantia paga a título de derrama.

Ora,

6 - Salvo melhor opinião, o prescrito no n.º 7 do artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março, é inconstitucional, na medida em que contraria frontalmente o princípio da não retroactividade das leis fiscais, consagrado expressamente no n.º 3 do artigo 103.º da nossa Constituição da República Portuguesa.

Pelo que,

7 - Deverá esse venerando Tribunal declarar a inconstitucionalidade de tal preceito da lei do orçamento, por violação do princípio da não rectroactividade das leis fiscais.

8 - O artigo 13.º do Código Civil bem como a natureza interpretativa das leis aí consagrada se têm aplicação noutros ramos do direito, no direito fiscal não se aplica de certeza.

Porquanto,

9 - Tal lhe é vedado pela citada norma constitucional da nossa lei fundamental e, portanto, esta prevalece sobre todas as outras normas hierárquica e materialmente inferiores, como é o caso da mencionada norma contida no n.º 7 do artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março.

Assim,

10 - O entendimento do douto acórdão recorrido quando se afirma que integrando-se a lei interpretativa 'de 1996 na lei interpretada, por força do artigo 13.º do Código Civil, e produzindo os seus efeitos desde a data da entrada em vigor do CIRS viola a CRP, uma vez que a mencionada alteração legislativa' só poderá ser aplicável àquelas situações em que a determinação da matéria colectável e a liquidação ocorram posteriormente à vigência da citada norma da lei do orçamento que deu nova redacção ao artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC.

Isto porque,

11 - Apesar da cláusula de retroactividade contida no n.º 7 do artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março, tal preceito não poderá nunca aplicar-se à situação dos autos, sob pena de violação do princípio da não retroactividade das leis fiscais.

De modo que,

12 - O douto acórdão recorrido bem como a tese nele consagrada, no que respeita à invocada alteração legislativa, apenas deverão ter aplicação posteriormente à sua vigência e não também ao caso dos autos.

Pois,

13 - Quanto aos presentes autos, deverá aplicar-se a tese que mereceu acolhimento do douto Acórdão de 1 de Fevereiro de 1995 desse venerado Tribunal porquanto e, salvo melhor opinião em contrário, continua a ser aquela que se revela mais consentânea com a natureza da derrama.

Acresce que,

14 - Até à referida alteração legislativa, derrama é, sem dúvida, um encargo fiscal para efeitos da determinação da matéria colectável em IRC.

Porquanto,

15 - Para determinação da matéria colectável em IRC a regra é a da dedutibilidade de todos os encargos fiscais como custos - artigo 23.º, alínea f), do CIRC.

E,

16 - Anteriormente à redacção introduzida na alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC (norma de excepção) somente o IRC não era dedutível.

Aliás,

17 - Se assim não fosse, o legislador não teria sentido necessidade de proceder à referida alteração daquele normativo legal de natureza excepcional.

Além disso,

18 - A derrama não cabe dentro do conceito de IRC.

Pelo contrário,

19 - IRC e derrama são conceitos perfeitamente distintos, nomeadamente quanto ao destino da receita, à normalidade ou excepcionalidade da incidência e aos seus sujeitos tributário activos.

Motivo pelo qual,

20 - Na matéria colectável sujeita a IRC respeitante ao exercício de 1992 deverá ainda considerar-se como custo dedutível a derrama no valor de 14 569 411$00.

Assim, sendo,

21 - Deverá ser declarada a inconstitucionalidade da norma contida no n.º 7 do artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março.

Na medida em que,

22 - Viola o princípio fundamental da nossa Constituição em matéria fiscal - o artigo 103.º -, ou seja, o princípio da não retroactividade das leis fiscais.

E, em consequência,

23 - Declarada a inaplicabilidade da mencionada alteração legislativa introduzida pelo artigo 28.º da Lei 10-B/96, de 23 de Março, à derrama referente a 1992, de modo a ser anulada a liquidação nos termos em que foi impugnada e a recorrente reembolsada da quantia de 14 569 411$00."

Por seu turno, a Fazenda Pública contra-alegou, sustentando a improcedência do recurso.

4 - Corridos os vistos, cumpre decidir.

II

Fundamentação

A

Delimitação do objecto do recurso

5 - A questão de constitucionalidade suscitada traduz-se na eventual contrariedade ao artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, do artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96, norma que realiza a interpretação autêntica do artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, prevendo a aplicabilidade daquela interpretação a factos anteriores ao momento da sua publicação.

A pertinência da questão de constitucionalidade deriva de a ratio decidendi da decisão recorrida ter sido a própria força vinculativa para os factos passados da norma interpretativa. Com efeito, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo pronunciou-se sobre um recurso cujo objecto foi exactamente a discussão da vinculatividade da norma interpretativa sub judicio em face do artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. Essa questão constituiu, na realidade, o objecto do recurso. O tribunal de 1.ª instância decidiu a questão controvertida da dedutibilidade como custos no IRC das derramas em sentido negativo com fundamento no artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96, reconhecendo, todavia, como acertada a interpretação contrária à resultante da lei interpretativa, propugnada por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 1 de Fevereiro de 1995.

Deste modo, não estará em causa a validade constitucional da interpretação que exclui as derramas dos custos dedutíveis no IRC, em si mesma, mas sim a validade da sua vinculatividade, nos termos da lei interpretativa, única razão da decisão de 1.ª instância recorrida e ratio decidendi do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo. Tudo o que foi referido pelo Supremo Tribunal Administrativo acerca da melhor interpretação do artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC não é mais que obiter dictum, na medida em que ainda se compagina como uma apreciação da bondade da solução legal, não interferindo com o fundamento da decisão e não constituindo, de modo assumido, fundamento alternativo da mesma.

Tem, assim, utilidade o presente recurso de constitucionalidade, porque um eventual julgamento de inconstitucionalidade esvaziaria de fundamentação o acórdão recorrido.

B

A delimitação da questão de constitucionalidade

6 - A questão de constitucionalidade suscitada pela recorrente refere-se à eventual violação da proibição de retroactividade em matéria fiscal (consagrada pelo n.º 3 do artigo 103.º da Constituição, no texto que resultou da 4.ª revisão constitucional) pelo artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96, de 23 de Março, norma que conferiu natureza interpretativa à nova redacção por ela consagrada do artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, e segundo a qual daquele preceito resultaria que as derramas não devem ser consideradas custos para efeitos de IRC. O Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre esta norma em anteriores acórdãos, nomeadamente no Acórdão 275/98, Diário da República, 2.ª série, de 24 de Novembro de 1998. Todavia, nesses casos, a decisão recorrida fez aplicação de tal norma em momento anterior à 4.ª revisão constitucional. Entendeu-se, por isso, que não estaria em causa, como parâmetro constitucional, o actual artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, que prevê explicitamente e sem restrições a proibição da retroactividade em matéria fiscal.

No aresto referido, o Tribunal Constitucional pronunciou-se pela não inconstitucionalidade da norma sub judicio por entender que a versão da Constituição com que tal norma deveria ser confrontada não impunha qualquer generalizada proibição da retroactividade em função da matéria fiscal, mas apenas a imporia quando a retroactividade ofendesse, de modo inadmissível, a confiança e a segurança jurídicas.

Na decorrência de tais pressupostos o Tribunal Constitucional veio a pronunciar-se no sentido da não inconstitucionalidade da norma contida no artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96.

7 - Nos presentes autos o contexto de aplicação no tempo da lei constitucional é diverso do que se verificava nos anteriores arestos do Tribunal Constitucional. Com efeito, embora a decisão da 1.ª instância date de 18 de Junho de 1997 e, por isso, seja anterior à entrada em vigor do texto da 4.ª revisão constitucional, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de que foi interposto recurso de constitucionalidade foi proferido em 20 de Maio de 1998, quando já estava plenamente em vigor a 4.ª revisão constitucional.

Não será, assim, possível deixar de utilizar como parâmetro do juízo de constitucionalidade o texto da última revisão constitucional, confrontando a norma sub judicio com o n.º 3 do artigo 103.º da versão agora vigente da Constituição. Na verdade, embora as novas versões da Constituição não possam ser, em princípio, critério do julgamento de constitucionalidade de normas já aplicadas anteriormente, salvaguardando-se, geralmente, o caso julgado quanto à aplicação do direito infraconstitucional, no caso sub judicio a decisão recorrida aplicou a norma em crise após a entrada em vigor do novo texto constitucional. O facto de estar em vigor o novo texto constitucional no momento da aplicação da norma implica, obviamente, a necessidade de o tribunal que a aplica se subordinar aos princípios e critérios vigentes consagrados no texto constitucional, não devendo aplicar lei inconstitucional (cf. artigo 204.º, no sentido de que o parâmetro de constitucionalidade após uma revisão constitucional é o texto constitucional vigente ao tempo da aplicação de norma que é questionada, cf. Acórdão 408/89, em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13.º vol., t. II, pp. 1147 e segs.).

Não estaria, deste modo, excluída genericamente a aceitação de inconstitucionalidade superveniente de normas retroactivas.

8 - Sendo o texto decorrente da 4.ª revisão constitucional o parâmetro pelo qual se há-de aferir a constitucionalidade da norma sub judicio, verificar-se-á, efectivamente, uma violação da proibição de retroactividade em matéria fiscal?

Contra uma resposta afirmativa, poderia ser sustentado que a norma que agora se julga não é retroactiva por ser meramente interpretativa de lei anteriormente vigente, explicitando apenas o sentido daquela e integrando-se consequentemente no seu texto. Todavia, poderá opor-se a este argumento que, sendo a lei interpretativa vinculativa de uma determinada interpretação e excludente de outras possíveis e já realizadas pelos tribunais, ela se tornará o critério jurídico decisivo da consagração da interpretação propugnada pela lei interpretativa, implicando, necessariamente, uma aplicação retroactiva da lei (sobre a questão da retroactividade das leis interpretativas, cf. Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, 10.ª ed., 1997, pp. 562 e segs., e Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 1989, pp. 245 e segs.).

Nos acórdãos do Tribunal Constitucional anteriormente citados, foi aceite a natureza retroactiva do n.º 7 do artigo 28.º, n.º 1, da Lei 10-B/96, de 23 de Março. O Tribunal não chegaria a discutir se a retroactividade da lei interpretativa está proibida pelo novo texto constitucional, por não ser esse texto o parâmetro de constitucionalidade no caso concreto.

Admitia-se, assim, implicitamente, algum espaço de discussão para a constitucionalidade da retroactividade das leis interpretativas em face da proibição constitucional da retroactividade em matéria fiscal. Por outras palavras, o Tribunal Constitucional admitia, implicitamente, como questão pertinente, a questão de saber se a proibição de retroactividade em matéria fiscal abrangeria as leis interpretativas que vinculassem retroactivamente, embora não se pronunciasse sobre ela, por ser irrelevante no caso então julgado.

9 - Deste modo, a questão que a jurisprudência anterior do Tribunal Constitucional sugere é a de saber se a proibição constitucional de retroactividade em matéria fiscal se refere apenas a uma retroactividade material, lesiva da confiança, e não admitirá, ainda, uma retroactividade que não viole em concreto a confiança protegida dos destinatários das normas.

De todo este enquadramento da questão de constitucionalidade, relativa à proibição de retroactividade em matéria fiscal, em confronto com as leis interpretativas, resulta, desde logo, que qualquer controvérsia doutrinária sobre a natureza verdadeiramente ou apenas aparente retroactiva das leis interpretativas não protagoniza a questão de constitucionalidade que aqui se formula.

Com efeito, o cerne da questão de constitucionalidade aqui suscitada consiste, antes, no saber se as leis interpretativas que vinculem retroactivamente o intérprete contendem com a retroactividade proibida na Constituição.

Ora, os fundamentos de proibição da retroactividade respeitam à segurança dos cidadãos. Assim, tal segurança é afectada perante alterações legislativas que, no momento da prática ou ocorrência dos factos que os envolvem, nem poderiam ser previstas nem tinham de o ser. Mas tal segurança também é afectada onde o seja a vinculação do Estado pelo direito que criou, através de alteração de situações já instituídas ou resolvidas anteriormente.

Desta sorte, se é verdade que as leis autenticamente interpretativas não abalam, verdadeiramente, as expectativas concretas anteriores dos destinatários das mesmas, no caso de a interpretação tornada vinculativa já ser conhecida e tiver sido mesmo aplicada (cf., sobre essa natureza das leis autenticamente interpretativas, Baptista Machado, ob. cit., p. 247), todavia, mesmo nesses casos, a vinculação interpretativa que tais leis comportam, ao tornar-se critério jurídico exclusivo da aplicação do texto anterior da lei, modifica a relação do Estado, emitente de normas, com os seus destinatários. A exclusão pela lei interpretativa de outras interpretações propugnadas e já aplicadas noutros casos (como acontece na situação presente) leva a que o Estado possa a posteriori impedir que o direito que criou funcione através da sua lógica intrínseca comunicável aos destinatários das normas, permitindo que interfira na interpretação jurídica um poder imperativo e imediato que altera o quadro dos elementos relevantes da interpretação jurídica.

Nesta medida, poder-se-á entender que a lei interpretativa, ainda que autêntica, ao pretender vigorar para o período anterior à sua emissão, nos termos do artigo 13.º do Código Civil, altera o contexto de autovinculação dos órgãos de aplicação do direito ao direito e, consequentemente, afecta a segurança dos destinatários das normas protegida por uma proibição (constitucional) de retroactividade. Haverá, consequentemente, nesta última situação, uma garantia de segurança mais forte inerente à proibição de retroactividade.

Ora, a proibição constitucional explícita de retroactividade em matéria fiscal não pode ser interpretada de modo que exclua o sentido forte anteriormente referido de protecção da segurança, ou seja, restritivamente em termos semelhantes à jurisprudência anterior do Tribunal, como se não tivesse sido alterado o texto constitucional e apenas resultasse dos princípios gerais. Na expressa proibição de retroactividade não pode deixar de estar ínsita uma garantia forte de objectividade e autovinculação do Estado pelo direito.

10 - Deste modo, no caso sub judicio, ter-se-á que concluir pela violação da proibição da retroactividade em matéria fiscal (artigo 103.º, n.º 3, da Constituição) pela norma interpretativa que a si mesma confere eficácia relativamente a factos anteriores à sua entrada em vigor - o questionado artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96, de 23 de Março.

III

Decisão

11 - Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide julgar inconstitucional o artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96, de 23 de Março, por violação do artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, determinando, consequentemente, a reforma da decisão recorrida de acordo com o presente juízo de constitucionalidade.

Lisboa, 22 de Março de 2000. - Maria Fernanda Palma - Guilherme da Fonseca - Paulo Mota Pinto (vencido quanto à questão prévia, nos termos da declaração de voto junta) - Bravo Serra (vencido, nos termos da declaração de voto aposta pelo Exmo. Conselheiro Presidente) - José Manuel Cardoso da Costa (vencido, conforme declaração de voto que junto).

Declaração de voto. - Votei vencido apenas quanto à questão prévia do conhecimento do recurso (n.º 5 do acórdão), pelas razões que passo a expor:

1 - Na decisão recorrida defende-se, por razões substanciais, a posição segundo a qual as derramas não são dedutíveis na matéria colectável do IRC, aplicando-se como ratio decidendi (pelo menos também) directamente a lei interpretada - isto é, os artigos 23.º, n.º 1, alínea f), e 41.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC. Não pode, na verdade, ignorar-se a diferença, essencial, entre a decisão de 1.ª instância e a decisão recorrida. Aquela baseou-se, como única ratio decidendi, no valor da lei interpretativa para o passado, isto é, na sua "retroactividade" {pois, disse-se, "seríamos levados a aderir à leitura interpretativa que o STA fez do artigo 41.º do CIRC no Acórdão de 1 de Fevereiro de 1995 [dedutibilidade das derramas], recusando uma interpretação extensiva ou analógica do mesmo, não fosse a lei do Orçamento do Estado para 1996 - Lei 10-B/96, de 23 de Março [...]" e sua natureza interpretativa (itálicos aditados). O Supremo Tribunal Administrativo, diversamente, a propósito da conclusão pela não dedutibilidade das derramas decidiu que "tal interpretação jurídica é a que melhor se coaduna com a natureza económica e financeira da derrama já que esta bem como o IRC não se tornaram indispensáveis para gerar receitas ou proveitos ou para produzirem aquelas ou estes uma vez que se traduzem, como no acórdão que vimos acompanhando se escreveu, 'numa extracção de uma fatia do próprio rendimento' ou na expressão do Acórdão de 14 de Maio de 1997, referido, 'numa real amputação do rendimento, da riqueza que se quer deixar disponível e isso só é plenamente alcançado com a não dedução do imposto sobre o rendimento a ele próprio'.

Integrando-se a lei interpretativa (de 1996) na lei interpretada, por força do artigo 13.º do Código Civil, e produzindo os seus efeitos desde a data da entrada em vigor do CIRC, temos de concluir que em 1993 não era dedutível à matéria colectável a derrama a que se referem os presentes autos." (Sublinhados aditados.)

A referência, pelo tribunal a quo, à melhor interpretação do Código do IRC não constituiu, pois, mero obiter dictum. Antes, sem deixar de referir também a lei interpretativa, a decisão recorrida adoptou, como preferível já antes desta e em face apenas da lei interpretada, a solução de não dedutibilidade das derramas, em termos de ter de se concluir que tal interpretação da norma do Código do IRC antes de 1996 já por si constitui ratio decidendi suficiente [nem se diga que esta norma não era, antes de 1996, susceptível de interpretação no sentido da não dedutibilidade das derramas, sob pena de violação do princípio da legalidade; é que, mesmo que este Tribunal pudesse em geral conhecer de tal questão, e que a aplicação de normas fiscais esteja condicionada pelos limites da interpretação extensiva, a verdade é que não está em causa neste recurso a constitucionalidade da norma que define custos dedutíveis - o artigo 41.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC -, mas apenas do artigo 28.º, n.º 7, da Lei 10-B/96, que atribuiu natureza interpretativa à nova redacção daquela].

Considero, pois, que mesmo sem a lei interpretativa - ou sem consideração da sua eficácia dita "retroactiva" - o tribunal a quo, e a jurisprudência que perfilha a orientação da decisão recorrida (ao contrário da decisão de 1.ª instância), chegaria à mesma solução, de não dedutibilidade das derramas. Pelo que um julgamento de inconstitucionalidade não só não "esvazia de fundamentação" a decisão recorrida como a deixa intacta, revelando-se inútil.

2 - Não creio, aliás, que seja impossível aplicar apenas a lei interpretada, mesmo depois da entrada em vigor da lei interpretativa - apurá-lo depende da interpretação da própria decisão recorrida.

A "retroactividade" da lei verdadeiramente interpretativa reside na força injuntiva para o passado do sentido que determina - e não na introdução substancial deste sentido (defendendo uma verdadeira retroactividade de tais leis, J. Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, 9.ª ed., p. 502, pois a lei não é uma declaração de ciência, mas uma determinação; cf. negando uma retroactividade substancial, J. Baptista Machado, Sobre a Aplicação no Tempo do Novo Código Civil, Coimbra, 1968, p. 285, nota 1, idem, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, 1983, p. 247).

A lei interpretativa, se o for verdadeiramente (isto é, se disser respeito a um sentido já atribuível à lei interpretada), esclarece obrigatoriamente o sentido para o futuro e, "integrando-se na lei interpretada" (artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil), determina igualmente, de forma vinculativa, o sentido para o passado. Ora, entendo que, se (e na medida em que) existir uma proibição constitucional de retroactividade, este efeito injuntivo para o passado está também proibido (J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, cit., p. 245; J. Oliveira Ascensão, O Direito. Introdução ..., cit., p. 504). Nesta hipótese, o julgador não pode, todavia - até para não frustrar o intento legislativo, de outra forma contrariado pela própria publicação da lei interpretativa -, ficar impedido de, como já podia fazer antes, aplicar apenas, para factos anteriores à lei interpretativa, a lei interpretada, com o sentido que veio a ser fixado por aquela, desde que, com base nos cânones interpretativos gerais, tal se lhe afigura(va) já a melhor solução (tal como não fica impedido de, para esses factos, optar pelo sentido contrário). Então, se o julgador aponta o que entende ser, e fundamenta como o melhor sentido da lei interpretada, a lei interpretativa constituirá, quando muito, mero argumento adjuvante. A lei interpretada, por si só, basta para chegar à decisão recorrida, desta forma tornando inútil a apreciação da constitucionalidade da lei interpretativa.

3 - Atenta a função instrumental do recurso de constitucionalidade, e considerando, pelas razões expostas, que a decisão deste, qualquer que seja, não terá a virtualidade de alterar a decisão recorrida, com a fundamentação que nela ficou expressa, não teria tomado conhecimento do presente recurso. - Paulo Mota Pinto.

Declaração de voto. - 1 - Votei vencido por entender, desde logo, que o parâmetro constitucional que devia ser considerado no caso era o anterior à última revisão da Constituição e não o resultante desta revisão (Lei Constitucional 1/97, de 25 de Setembro), a qual passou a conferir dignidade constitucional expressa ao princípio da não retroactividade dos impostos (artigo 103.º, n.º 3), ou seja: por considerar que a hipótese em apreço não deveria ter tido tratamento diverso do que tiveram as versadas nos Acórdãos n.os 275/98, 540/98 e 620/98 - em que, analisando-se a norma sub judicio tão-só à luz daquele primitivo parâmetro constitucional sobre a matéria, o Tribunal não se pronunciou pela sua inconstitucionalidade.

Concluindo assim, dispensado entretanto fiquei de averiguar se, por outro lado, o referido princípio da proibição de impostos retroactivos, agora expressamente consagrado pela Constituição em termos genéricos, deve ser entendido como abrangendo mesmo o simples "efeito retroactivo" de uma norma de imposição "interpretativa". É esta - creio - uma pergunta com sentido, e que não deverá afastar-se liminarmente: não chegando, porém, na hipótese sub judicio, e na minha perspectiva, sequer a colocar-se, ficará a correspondente resposta para quando houver de ser. Por agora, cingir-me-ei, por isso, ao ponto que comecei por enunciar.

2 - Ora, a respeito desse ponto, tudo está em que ele tem a ver ou se perfila como um problema de aplicação da Constituição no tempo, e em que é meu entendimento que um tal problema não só há-de equacionar-se nos mesmos moldes, como há-de obedecer, na sua solução, a princípios, e aos critérios estruturais em que estes se plasmam, idênticos ou semelhantes aos que regem para o problema da aplicação da lei no tempo.

Pois bem: desde logo se contando entre esses princípios, como princípio regra, o da não retroactividade - isto é, o de que as leis só valem, em princípio, para o futuro -, também desde logo o mesmo princípio se aplicará às normas constitucionais. E, que assim é, evidencia-o o próprio texto da Constituição Portuguesa de 1976, no n.º 2 do seu artigo 282.º - cujo alcance, a esse respeito, se afigura inequívoco. Face a este texto, na verdade, bem se deverá concluir que uma aplicação "retroactiva" da lei fundamental há-de ser excepcional e apenas ocorrer em situações ou domínios específicos, por força de normas ou princípios também específicos dela (esse poderá ser, paradigmaticamente, o caso do domínio penal, quando aí caiba aplicar o princípio consignado na parte final do artigo 29.º, n.º 4, ainda da Constituição). Como regra, as normas constitucionais e suas alterações não se aplicarão retroactivamente.

Entretanto, da regra da não retroactividade já emerge que o momento determinante para a escolha da lei aplicável (quando duas leis se sucedam e conflituam no tempo) não é necessária e automaticamente o da decisão judicial (de uma qualquer decisão judicial) do caso, em termos de este dever ser resolvido de harmonia com a lei então em vigor; e se essa regra, de todo o modo, consente que em muitas situações seja assim (isto é, que se aplique a norma vigente no momento da decisão), a verdade é que, a tal respeito, tudo dependerá da matéria e do tipo de situações em presença, e dos critérios estruturais, postulados pela mesma regra (e desenvolvidos a partir dela), aplicáveis justamente a cada matéria e situação típica. Daí que segundo a premissa inicial de que parto - também estes mesmos critérios hajam de observar-se quando, numa dada situação concreta, importe determinar o padrão constitucional relevante.

Ora, em matéria fiscal, e no tocante a normas "substantivas" de tal domínio jurídico, o critério aplicável é o de que sob o império de tais normas caem as situações (só elas, mas todas elas) cujo facto gerador (o "facto gerador" ou o "pressuposto de facto" da imposição) tenha ocorrido durante a sua vigência - sendo o momento ou a época desse facto, ou pressuposto, pois, o decisivo, para a escolha da lei aplicável ratione temporis (e não, seguramente, o da aplicação administrativa ou judicial da lei). É esta a doutrina indiscutida, em toda a parte (entre nós, v., classicamente, Oliveira Salazar, "Da não retroactividade dos impostos", no Boletim da Faculdade de Direito, Coimbra, vol. IX, pp. 87 e segs.): impõe-na razões de segurança jurídica, mas também razões de igualdade (a que alguns chegam, aliás, a atribuir a primazia); por outro lado, é a que corresponde ao critério, tido como de âmbito geral, plasmado no artigo 12.º do Código Civil (cf. J. M. Cardoso da Costa, Curso de Direito Fiscal, 2.ª ed., 1972, pp. 231 e segs.), e, por último, é (salvo alguma rara voz discordante) uma doutrina que cumprirá aplicar ainda quando a lei fiscal "nova" seja de conteúdo mais favorável ao contribuinte (quanto a este preciso aspecto, v., decididamente, Teixeira Ribeiro, "Anotação", na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 106.º, pp.74 e segs.).

Mas, se é assim, então - uma vez que os critérios estruturais de resolução do problema da aplicação no tempo de normas constitucionais e de normas legais não hão-de diferir entre si -, os mesmos princípios acabados de referir valerão também para a determinação das normas ou princípios da "Constituição fiscal" relevantes numa dada situação tributária. O que significa que também essas normas e princípios constitucionais outros não poderão ser senão os vigentes à data em que ocorreu o "facto gerador" dessa situação.

3 - Posto isto, torna-se claro que a norma constitucional em que expressamente passou a consignar-se, em termos genéricos, o princípio da proibição da retroactividade dos impostos, introduzida em 1997, só pode valer para eventuais normas tributárias retroactivas "futuras", isto é, emitidas e entradas em vigor após essa revisão da Constituição, e não para as que o hajam sido antes. É que, no tocante à "dimensão retroactiva" de uma norma tributária - quer dizer, à sua aplicação a situações anteriores ao início da sua vigência - o "facto gerador" da imposição ocorre no momento da sua mesma entrada em vigor, pois é esta última, na verdade, que, conjugada com essas situações ou factos anteriores, gera a obrigação de imposto. Por consequência, e de acordo com o antecedentemente exposto, é à luz da "Constituição" então vigente que caberá apurar da admissibilidade e legitimidade de uma tal dimensão normativa. Fazê-lo à luz de uma "Constituição" ulterior (v. g., a vigente no momento da apreciação ou reapreciação contenciosa da legalidade da liquidação do imposto) equivalerá a conferir a essa nova "Constituição" eficácia retroactiva - o que é, como se disse, contrário ao princípio regra básico da aplicação da Constituição no tempo.

Assim sendo, claro é também que a questão da legitimidade constitucional da norma do n.º 7 do artigo 28.º da Lei 10-B/96 - a qual, ao qualificar como "interpretativa" a nova redacção dada pelo n.º 1 desse mesmo artigo ao preceito da alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRC, confere a essa nova redacção eficácia retroactiva - nunca haverá de ser aferida e decidida por referência ao que actualmente se consigna, de modo expresso, na parte final do artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, mas sempre (e independentemente do momento em que ocorra a aplicação administrativa ou judicial dessa norma) por referência ao que antes (antes da revisão de 1997) se entendia ser o parâmetro constitucional a considerar em matéria de normas fiscais retroactivas.

4 - Eis por que discordei - e, desta vez, com grande força de convicção - da orientação que fez vencimento no precedente acórdão. Resta-me, todavia, aduzir duas notas complementares.

A primeira será para destacar a possibilidade de o ponto de vista que ora perfilho encontrar afinal ainda algum arrimo, contra todas as aparências, no próprio Acórdão 408/89 (a matriz de onde arranca a solução que veio a prevalecer), em certas suas passagens. Mas certamente o não encontra na fórmula chave desse aresto - a do relevo, para a decisão das questões de inconstitucionalidade "material" das normas ou princípios constitucionais "que estiverem em vigor no momento em que esse confronto [o confronto da lei com a Constituição] houver de ser feito" -, esclarecido, como depois se esclarece, que tal momento é o da "aplicação da norma que é questionada". O que justamente entendo é que não basta recorrer à distinção entre os diferentes tipos de vícios de inconstitucionalidade, conjugada com a regra tempus regit actum, para delimitar o âmbito de aplicação de duas normas constitucionais que se sucedem no tempo, e decidir sobre qual delas será a aplicável na espécie: penso antes, pelas razões que atrás expendi, que ainda situações de eventual inconstitucionalidade "material" haverá que devem ser apreciadas à luz da "Constituição" do tempo em que a norma legal questionada entrou a vigorar.

A segunda nota complementar será para dizer que se o Acórdão 275/98 e, no seguimento dele, o Acórdão 540/98 - em que se apreciou a questão objecto da presente declaração, na linha, sem mais, do Acórdão 408/89 - foram por mim assinados sem qualquer reserva, isso não significa, em rigorosas contas, que haja, desde então, modificado o meu ponto de vista acerca de tal questão: significa, tão-só, que, havendo, nesses casos, de chegar-se sempre ao mesmo resultado ou à mesma decisão, não me preocupei, então, em aprofundar, em toda a extensão devida, as implicações dos critérios e das fórmulas utilizadas nesses arestos quanto ao ponto em apreço, para dessas implicações me afastar expressamente. - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1832315.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1996-03-23 - Lei 10-B/96 - Assembleia da República

    Aprova o Orçamento do Estado para 1996.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-20 - Lei Constitucional 1/97 - Assembleia da República

    Aprova a quarta revisão da Constituição da República Portuguesa, de 2 de Abril de 1976, e fixa normas para aplicação no tempo de alguns dos preceitos revistos. Publica, em anexo, o novo texto constitucional.

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