Resolução do Conselho de Ministros n.º 17/2004
A dimensão dos incêndios florestais do passado Verão e a severidade dos seus efeitos trouxeram uma nova consciência à sociedade portuguesa quanto aos problemas estruturais que afectam a floresta e que estiveram na origem desta enorme calamidade.
A reforma estrutural do sector florestal, agora em curso, irá projectar e consolidar novos instrumentos e medidas, dando assim corpo a um movimento de mudança mobilizador de todos os agentes do sector empenhados em vencer este desafio.
Pôr em funcionamento o novo modelo orgânico para o sector das florestas previsto na Resolução do Conselho de Ministros n.º 178/2003, de 17 de Novembro, exige tempo, pelo que, perante a urgência da reflorestação das áreas florestais afectadas pelo fogo, se justifica, desde já, e sem prejuízo das iniciativas em curso, a tomada de medidas imediatas que estimulem, mobilizem e apoiem os proprietários florestais, as organizações sócio-profissionais do sector e as instituições locais.
Neste contexto, é criada uma estrutura de missão temporária, com a duração máxima de dois anos, a qual se extingue automaticamente findo esse prazo, sem prejuízo da antecipação do mesmo pelo Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, face à institucionalização do novo modelo orgânico do sector florestal, designadamente da Direcção-Geral dos Recursos Florestais.
Por outro lado, para atingir este objectivo é também essencial definir um conjunto de orientações que, até à aprovação dos competentes instrumentos de planeamento, enquadrem as acções de recuperação das áreas percorridas pelos incêndios e permitam a implantação de soluções florestais diversificadas e de modelos sustentáveis de organização territorial.
Para o efeito, importa priorizar o estabelecimento no terreno de uma rede consistente de infra-estruturas preventivas, bem como a instalação de uma floresta resiliente à acção do fogo, a integrar, progressivamente, em "zonas de intervenção florestal» que potenciem uma gestão activa e profissional das áreas afectadas pelos incêndios e zonas envolventes.
Considerando o disposto nas subalíneas viii) e ix) da alínea a) do n.º 3 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 178/2003, de 17 de Novembro:
Assim:
Ao abrigo do n.º 1 do artigo 28.º da Lei 4/2004, de 15 de Janeiro, e nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Criar, na dependência do Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, uma estrutura de missão designada "Equipa de Reflorestação» com o objectivo de proceder ao planeamento integrado das intervenções nos espaços florestais percorridos pelo fogo em 2003 e suas áreas envolventes, com a participação activa das organizações e agentes locais com interesses nas áreas a intervir, e coordenar as acções de recuperação desses espaços, em articulação com as entidades públicas com competências no sector.
2 - Determinar que a estrutura de missão compreende o Conselho Nacional de Reflorestação (CNR) e as comissões regionais de reflorestação (CRR).
3 - Determinar que a estrutura de missão tem um mandato de dois anos contados a partir da data de entrada em vigor desta resolução, extinguindo-se automaticamente findo esse prazo, sem prejuízo de o Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, a todo o tempo, antecipar este prazo.
4 - Determinar que a estrutura ora criada é dirigida por um encarregado de missão, coadjuvado por quatro coordenadores regionais, equiparados para efeitos remuneratórios, respectivamente, a cargo de direcção superior de 2.º grau e a cargo de direcção intermédia de 1.º grau da administração pública central.
5 - Estabelecer que o encarregado de missão e os coordenadores regionais são nomeados, no prazo de 15 dias a contar da entrada em vigor da presente resolução, por despacho do Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, preferencialmente em regime de comissão de serviço, por requisição ou destacamento de pessoal pertencente aos quadros dos serviços e organismos da Administração Pública.
6 - Estabelecer que à Equipa de Reflorestação cabe:
a) Identificar as funções dominantes desempenhadas pelos sistemas florestais, tendo em conta os modelos de organização territorial, e definir os modelos de silvicultura mais adequados com vista à satisfação das necessidades económicas, ambientais e sociais, actuais e futuras, das regiões afectadas pelo fogo;
b) Coordenar as acções de recuperação dos espaços florestais ardidos;
c) Assegurar a articulação da acção dos serviços do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas (MADRP) com outros serviços da administração central e local e com as organizações e os agentes privados do sector, por forma a garantir uma cooperação efectiva entre todos os intervenientes;
d) Envolver a sociedade civil por formas que assegurem a sua participação no processo de decisão para a recuperação dos espaços florestais afectados pelo fogo.
7 - Atribuir ao encarregado de missão as seguintes competências:
a) Assegurar e organizar os meios necessários ao funcionamento da estrutura de missão e coordenar o trabalho da mesma, superintendendo a actividade dos coordenadores regionais;
b) Presidir ao CNR, convocar os respectivos membros sempre que entender conveniente ou quando, para tanto, for solicitado pelos coordenadores regionais e dirigir as respectivas reuniões, bem como nelas fazer participar quaisquer outras personalidades quando se mostrar justificado;
c) Intervir junto do gestor do Programa AGRO, do Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas, do Instituto Nacional de Garantia Agrícola e do organismo do MADRP com responsabilidade no âmbito da política florestal sempre que se revele de interesse para a realização dos objectivos da estrutura ou para o funcionamento do CNR e das CRR;
d) Propor ao Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas eventuais medidas de correcção que se revelem imprescindíveis, tendo em vista o cumprimento da missão, de harmonia com o disposto no n.º 1 da presente resolução;
e) Elaborar, com periodicidade trimestral, relatórios de progresso e apresentá-los ao Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, bem como elaborar, no termo da missão, o relatório da actividade desenvolvida e dos resultados alcançados, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 28.º da Lei 4/2004, de 15 de Janeiro.
8 - Estabelecer que ao CNR cabe:
a) Definir as orientações estratégicas de carácter geral para a recuperação das áreas afectadas pelo fogo, com respeito pelos objectivos e funções dominantes dos espaços florestais;
b) Aprovar as linhas de orientação que lhes forem propostas pelas CRR, ao abrigo das alíneas a) e b) do n.º 10 da presente resolução;
c) Coordenar as intervenções nos espaços florestais e acompanhar as acções de recuperação das áreas afectadas pelo fogo;
d) Promover as diligências necessárias à harmonização dos interesses em presença, por forma a serem alcançados os objectivos da estrutura de missão.
9 - Determinar que o CNR integra os seguintes organismos e entidades:
a) Um representante do serviço central do MADRP com competências no âmbito da política florestal;
b) Um representante do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil;
c) Um representante do Instituto da Conservação da Natureza (ICN);
d) Um representante da Associação Nacional de Municípios Portugueses;
e) Um representante da Federação dos Produtores Florestais de Portugal;
f) Um representante da Federação Nacional das Cooperativas de Produtores Florestais;
g) Um representante da Associação Florestal de Portugal;
h) Três personalidades de reconhecido mérito, a convidar pelo encarregado de missão, ouvido o CNR.
10 - Estabelecer que em cada área definida no anexo da presente resolução, que dela faz parte integrante, funciona uma comissão regional de reflorestação, à qual incumbe:
a) Definir orientações de arborização e gestão dos espaços abrangidos, com vista ao restabelecimento do potencial florestal, e, neste âmbito, hierarquizar prioridades e programar e calendarizar as acções com o objectivo de:
i) Estabelecer um quadro regional das funções dominantes a desempenhar pelos espaços florestais, tendo presente o objectivo de uso múltiplo da floresta e da organização dos grandes usos do solo - florestal, agrícola e urbano;
ii) Constituir um mosaico florestal diversificado, com recurso ao fomento de folhosas e de um leque variado de resinosas, ao aproveitamento da regeneração natural e à utilização de material genético melhorado;
iii) Estabelecer medidas de silvicultura preventiva na óptica da defesa da floresta contra incêndios;
iv) Identificar e estimular a constituição de zonas de intervenção florestal (ZIF) que permitam a adopção de sistemas de gestão florestal sustentável;
b) Definir linhas orientadoras, à escala sub-regional, para a defesa da floresta contra incêndios, com o objectivo de minimizar a área ardida, melhorar as condições de combate ao fogo e reduzir o número de ocorrências, estabelecendo, designadamente:
i) Uma rede primária de corta-fogos, associada à rede de estradas, às linhas de água permanentes, às linhas de cumeada e a outras descontinuidades da paisagem;
ii) Uma malha adequada de caminhos de acesso aos espaços florestais que atenda também a outras exigências da gestão florestal;
iii) Uma rede de pontos de água associada aos principais caminhos de acesso;
iv) Um sistema eficaz de vigilância dos espaços florestais e de detecção de incêndios;
v) Zonas de protecção dos aglomerados populacionais localizados no interior dos maciços arborizados e sistemas de autodefesa desses aglomerados;
vi) A sinalização das infra-estruturas instaladas e da acessibilidade aos espaços florestais;
vii) A programação das medidas e intervenções a promover, hierarquizando as prioridades;
c) Emitir parecer sobre os projectos florestais cuja aprovação seja da competência de organismos ou serviços da administração central e local, no que respeita à sua conformidade com as orientações definidas nas alíneas anteriores.
11 - Atribuir aos coordenadores regionais as seguintes competências:
a) Participar nas reuniões do CNR e propor ao encarregado de missão a convocação deste Conselho para, no âmbito da sua competência, se pronunciarem sobre questões de relevante interesse para a região;
b) Promover reuniões das CRR, convocando os representantes das entidades e serviços que nelas devam participar, nos termos do n.º 12 da presente resolução, e dirigir as respectivas reuniões;
c) Identificar as organizações de produtores florestais e outros agentes locais necessários à dinamização das acções a executar;
d) Estimular e apoiar as dinâmicas locais conducentes à criação de organizações de produtores florestais;
e) Promover o envolvimento dos titulares dos terrenos e das suas organizações na recuperação dos espaços florestais afectados;
f) Assegurar a articulação da actividade das CRR com os planos regionais de ordenamento florestal;
g) Promover a criação de zonas de intervenção florestal (ZIF), enquanto espaços florestais contínuos, submetidos a um plano de gestão e geridos profissionalmente;
h) Assegurar uma articulação efectiva com as comissões municipais da defesa da floresta contra incêndios;
i) Promover e organizar encontros de informação, formação e sensibilização em torno das questões florestais, em articulação com outros organismos com competências nesta área;
j) Elaborar relatórios mensais a apresentar ao encarregado de missão.
12 - Incumbir os coordenadores regionais de assegurar a participação efectiva nas reuniões previstas na alínea b) do número anterior das seguintes entidades e serviços:
a) Comissão de coordenação e desenvolvimento regional territorialmente competente;
b) Direcção regional de agricultura territorialmente competente;
c) Municípios abrangidos;
d) ICN;
e) Serviço central do MADRP com competências no âmbito da política florestal;
f) Organizações de produtores florestais da área de incidência.
13 - Estabelecer que o encarregado de missão e os coordenadores regionais são assessorados por um gabinete técnico, constituído por cinco técnicos de nível superior, cabendo ao serviço central do MADRP com competências no domínio da política florestal assegurar as instalações e os meios logísticos indispensáveis ao funcionamento da estrutura.
14 - Determinar que os encargos anuais decorrentes da presente estrutura de missão não ultrapassem (euro) 400000 por ano e sejam suportados por verbas a inscrever no orçamento do serviço central do MADRP com competências no âmbito da política florestal.
15 - Determinar que os órgãos e serviços da administração central e local e os organismos da administração indirecta do Estado com atribuições no sector florestal devem prestar à Equipa de Reflorestação a colaboração que lhes seja solicitada como necessária à prossecução dos seus objectivos.
16 - Determinar que os elementos referidos nos n.os 9 e 12 e seus substitutos são designados pelos respectivos serviços e entidades no prazo máximo de 15 dias após a entrada em vigor da presente resolução.
Presidência do Conselho de Ministros, 4 de Fevereiro de 2004. - O Primeiro-Ministro, José Manuel Durão Barroso.
ANEXO
Área do Algarve - abrange os terrenos percorridos pelos incêndios em 2003 dos municípios de Aljezur, Lagos, Monchique, Portimão, Silves e Vila do Bispo, incluídos no PROF do Algarve, e do município de Odemira, incluído no PROF do Alentejo Litoral.
Área do Ribatejo - abrange os terrenos percorridos pelos incêndios em 2003 dos municípios de Abrantes, Chamusca e Constância, incluídos no PROF do Ribatejo.
Área do Alto Alentejo - abrange os terrenos percorridos pelos incêndios em 2003 dos municípios de Alter do Chão, Castelo de Vide, Crato, Gavião, Marvão, Nisa, Ponte de Sor e Portalegre, incluídos no PROF do Alto Alentejo.
Área do Pinhal Interior e Beira Interior - abrange os terrenos percorridos pelos incêndios em 2003 dos municípios de Mação, Oleiros, Proença-a-Nova, Sertã e Vila de Rei, incluídos no PROF do Pinhal Interior Sul, os municípios de Castelo Branco e Idanha-a-Nova, incluídos no PROF da Beira Interior Sul, o município de Pampilhosa da Serra, incluído no PROF do Pinhal Interior Norte, e o município do Fundão, incluído no PROF da Beira Interior Norte.
Para além dos terrenos efectivamente abrangidos pelos incêndios, estas áreas incluem os encravados não ardidos, bem como uma área envolvente a definir em sede das CRR.