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Assento 9/2000, de 27 de Maio

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Sumário

Uniformiza a jurisprudência no sentido de que considerando o disposto nos artigos 412º, nºs 1 e 2 , alínea b), 420º, nº 1, 438º, nº 2, 448º, todos dos Código de Processo Penal, no requerimento de interposição de recurso de fixação de jurisprudência deve constar, sob penal de rejeição, para além dos requisitos exigidos no referido artigo 438º, nº 2, o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência cuja fixação é pretendida.

Texto do documento

Assento 9/2000
Processo 186/99. - Acordam no plenário das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça:

1 - Relatório
O Exmo. Magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal de Justiça veio interpor recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, ao abrigo dos artigos 437.º e seguintes do Código de Processo Penal, nos termos e com os fundamentos seguintes:

No Acórdão de 7 de Janeiro de 1999, proferido no processo 1293/98, decidiu-se que na petição de recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, para além dos requisitos referidos no artigo 438.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, é obrigatória a indicação do sentido em que, do ponto de vista do recorrente, deverá ser fixada a jurisprudência relativamente ao objecto do recurso, o que resultaria do artigo 412.º, aplicável por força do artigo 448.º, ambos do mesmo Código.

Contudo, no Acórdão deste mesmo Supremo Tribunal de 2 de Dezembro de 1998, proferido no processo 1291/98, foi deliberado que em recurso para fixação de jurisprudência seria suficiente para a interposição a identificação pelo recorrente da questão controvertida e dos acórdãos em oposição, sem necessidade de indicação do sentido em que a jurisprudência deveria ser fixada.

Considerou-se, ainda, que os dois acórdãos se achavam em oposição acerca da mesma questão de direito, ou fosse:

Saber se os requisitos do requerimento da interposição do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência são apenas os indicados no artigo 448.º do Código de Processo Penal ou se a esses acrescem e no domínio da mesma legislação os referidos no artigo 412.º do mesmo diploma.

O Exmo. Magistrado requerente pronuncia-se, ainda, no sentido de que deve fixar-se a jurisprudência em favor do Acórdão de 2 de Dezembro de 1998, porquanto o recurso extraordinário de fixação de jurisprudência tem uma regulamentação específica, sendo-lhe aplicáveis, por via do artigo 448.º do Código de Processo Penal, as normas do regime geral aos casos omissos, sendo que a interposição do recurso para fixação de jurisprudência está regulada no n.º 2 do artigo 438.º do Código de Processo Penal, pelo que não constitui caso omisso.

Foi o recurso recebido pela forma legal e o Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal teve vista dos autos e promoveu o seu prosseguimento para os fins e efeitos do n.º 4 do artigo 440.º do Código de Processo Penal.

Colhidos os vistos, por Acórdão deste mesmo Supremo de 9 de Dezembro de 1999, foi decidido que as soluções a que cada um dos acórdãos chegou sobre a mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação são substancialmente contraditórias e opostas entre si, pelo que se ordenou o cumprimento dos artigos 442.º e seguintes daquele referenciado diploma.

A Exma. Procuradora-Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal apresentou as suas mui doutas alegações em que, eruditamente, equacionou a questão jurídica em causa neste recurso, tendo sugerido a fixação da seguinte jurisprudência:

«Os requisitos do requerimento de interposição de recurso extraordinário para fixação de jurisprudência a que alude o artigo 437.º são apenas os expressamente indicados no artigo 438.º, não sendo de exigir a indicação, nesse requerimento, do sentido em que, do pondo de vista do recorrente, deve fixar-se a jurisprudência, não havendo lugar à aplicação subsidiária do disposto no artigo 412.º, todos do Código de Processo Penal.»

2 - A questão tal como resulta dos acórdãos em oposição
2.1 - No acórdão recorrido:
Este acórdão referia-se a um recurso de fixação de jurisprudência em que estava em causa o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 8 de Maio de 1997, no recurso penal n.º 223/97 e sobre factos ocorridos em 2 de Abril de 1995, e no qual se decidiu que ainda se mantinha em vigor o disposto no artigo 2.º, n.º 1, da Lei 18/96, de 19 de Julho, lei que lhes foi aplicável; e o Acórdão do mesmo Tribunal de 16 de Abril de 1998, no recurso penal n.º 124/98, por factos verificados em 15 de Julho de 1996, no qual foi decidido que aquele normativo legal se encontrava revogado pelo artigo 272.º, n.os 2 e 3, do Código Penal de 1995, tomando-se em conta o disposto no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei 98/95, de 19 de Julho.

Ora, o douto acórdão recorrido começava por dizer que, tratando-se de um recurso de fixação de jurisprudência, muito embora se verificassem os demais requisitos impostos pelo artigo 438.º do Código de Processo Penal, tornava-se necessário quer na motivação quer nas respectivas conclusões, se apontasse, concreta e inequivocamente, o sentido em que deveria ser fixada a jurisprudência, quanto ao recorrente.

Refere-se que esta obrigatoriedade se exige em todos os recursos ordinários e extraordinários, e reveste ainda uma maior acuidade num recurso que tem como objectivo fixar a própria jurisprudência.

Firmou-se esta posição fundamentalmente no artigo 448.º do Código de Processo Penal, que manda aplicar aos recursos extraordinários, como é o caso, subsidiariamente, o que rege para os recursos ordinários, e assim se recorre ao preceituado no n.º 2 do artigo 412.º do Código de Processo Penal, que aponta para o dever de indicação do sentido em que, na maneira de ver do recorrente, deve ser fixada a jurisprudência.

No recurso a que se referia o acórdão, verificava-se que existia a omissão na parte conclusiva do sentido em que se pretendia ver fixada a jurisprudência, o que implicaria a rejeição do recurso, o que veio a acontecer, por aplicação do normativo constante das disposições combinadas dos artigos 412.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, sendo certo que no processo penal, ao contrário do que acontece no processo civil, não há recurso a qualquer norma que permita colmatar, por convite, quaisquer deficiências ou omissões.

Por último, utilizou-se em abono da tese defendida um argumento de peso:
É que sempre se poderia dizer que o sentido da fixação de jurisprudência poderia decorrer do n.º 2 do artigo 442.º, que a ele alude, mas a verdade é que, não sendo obrigatórias as alegações referidas no artigo, poderia deparar-se um caso em que o Supremo tivesse de apreciar um recurso sem conclusões quanto à fixação de jurisprudência.

E assim se houve por bem rejeitar o recurso em que no requerimento de interposição esta matéria era omissa.

2.2 - No acórdão fundamento:
Este aresto, aliás douto, refere-se ao Acórdão de 28 de Maio de 1998 (processo 322/98) do Tribunal da Relação de Coimbra, o qual estaria em contradição com o decidido no Tribunal da Relação de Lisboa de 24 de Setembro de 1997, publicado na Colectânea de Jurisprudência, ano XXII, t. IV, pp. 144 a 146, que decidiram sobre a questão de qual o vício que integrará a circunstância de o assistente ter deduzido acusação por crime público ou semipúblico e o Ministério Público, posteriormente, ter vindo a aderir a essa acusação, acompanhando-a; sendo certo que o Acórdão recorrido de 28 de Maio de 1998 decidiu que, não tendo o assistente legitimidade para o efeito, a adesão do Ministério Público à acusação particular carece de qualquer valor, integrando a nulidade insanável da alínea b) do artigo 119.º do Código de Processo Penal, enquanto que no acórdão fundamento foi decidido tratar-se de mera irregularidade.

Não foi indicado o sentido da fixação de jurisprudência, como aliás resulta do próprio acórdão fundamento, que apenas se refere aos requisitos contemplados no artigo 438.º do Código de Processo Penal.

3 - Fundamentos e decisão
3.1 - Normativos que interessam à resolução da questão suscitada:
a) Artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal:
«1 - A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.»

b) Artigo 412.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Penal:
«2 - Versando matéria de direito, as conclusões indicam ainda, sob pena de rejeição:

...
b) O sentido em que, no entendimento do recorrente, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada;»

c) Artigo 420.º, n.º 1, do Código de Processo Penal:
«1 - O recurso é rejeitado sempre que for manifesta a sua improcedência ou que se verifique causa que devia ter determinado a sua não admissão, nos termos do artigo 414.º, n.º 2.»

d) Artigo 438.º, n.os 1 e 2, do Código de Processo Penal:
«1 - O recurso para fixação de jurisprudência é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar.

2 - No requerimento de interposição do recurso o recorrente identifica o acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição e, se este estiver publicado, o lugar de publicação e justifica a oposição que origina o conflito de jurisprudência.»

e) Artigo 442.º, n.os 2 e 3, do Código de Processo Penal:
«2 - Nas alegações, os interessados formulam conclusões em que indicam o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência.

3 - Juntas as alegações, ou expirado o prazo para a sua apresentação, o processo é concluso ao relator, por 30 dias, e depois remetido, com projecto de acórdão, a visto simultâneo dos restantes juízes, por 10 dias.»

f) Artigo 448.º do Código de Processo Penal:
«Aos recursos previstos no presente capítulo aplicam-se subsidiariamente as disposições que regulam os recursos ordinários.»

3.2 - O que tudo visto e decidindo:
A) A primeira ideia que nos surgiu a propósito da questão que vem colocada neste recurso respeita à própria explicação do artigo 448.º do Código de Processo Penal, que, como se viu, manda aplicar subsidiariamente as disposições que regulam os recursos ordinários aos recursos extraordinários, o que só pode significar que, se o legislador tivesse pretendido organizar um regime de tal forma específico e fechado para os recursos extraordinários, impedindo qualquer introdução nestes de normas ou princípios que regem os recursos ordinários, nunca teria estabelecido uma norma deste tipo.

Mostra-se, assim, perfeitamente correcta e admissível a aplicação de normas dos recursos ordinários aos recursos extraordinários, em regime de subsidiariedade e para colmatar quaisquer lacunas existentes na regulamentação destes últimos.

B) Mas haverá neste caso uma verdadeira lacuna, lacuna esta que se poderia encontrar no artigo 438.º do Código de Processo Penal, por este não aludir expressamente ao sentido em que deve fixar-se a jurisprudência?

Em primeiro lugar, teremos de partir de um conceito de lacuna, o qual, para evitar desenvolvimentos desnecessários, bem poderá ser o de que, para se poder afirmar a existência de uma lacuna, não basta deparar com uma situação desprovida de regulamentação jurídica, como uma situação que se possa considerar, em abstracto, susceptível de tratamento jurídico. Indispensável se torna que a falta de regulamentação seja contrária ao plano ordenador do sistema jurídico.

Dito de outro modo: é preciso que o tratamento da situação seja exigido pelo ordenamento jurídico concreto. (Conselheiro Fernando Ferreira Ramos, in parecer da Procuradoria-Geral da República de 28 de Abril de 1989, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 6 de Junho de 1989.)

Posto isto e se analisarmos, agora, o artigo 438.º do Código de Processo Penal, verificamos com facilidade que os requisitos que ali se assinalam para a interposição do recurso em causa são de natureza formal ou extrínseca a contraporem-se a outro de natureza material e intrínseca que ali não aparece e que devia dele constar, ou seja, o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência, sem o que o recurso ficaria sem objecto.

Com efeito, a identificação dos acórdãos quer do recorrido, como do fundamento, o lugar da publicação, constituem, sem dúvida, requisitos de natureza formal.

Por outro lado, não se poderá dizer que o requisito material do sentido da fixação de jurisprudência se poderia ir encontrar na alusão que no referido normativo se faz à justificação da oposição que origina o conflito de jurisprudência.

É que tal oposição pode perfeitamente justificar-se e demonstrar-se, sem qualquer indicação do sentido da jurisprudência a fixar.

Falta, na verdade, um elemento importante de natureza intrínseca e material. Quase que poderíamos dizer essencial.

Portanto, teremos de recorrer ao ordenamento jurídico concreto em matéria de recursos penais para preencher esta lacuna e esse regime só poderá encontrar-se nos princípios contidos no artigo 412.º do Código de Processo Penal (artigo 448.º).

E o primeiro princípio que dali se extrai é que todo o recurso (ordinário ou extraordinário, dizemos nós) tem de ter um pedido.

Ora, precisamente, no recurso de fixação de jurisprudência, o pedido não consiste em se reconhecer a oposição entre dois acórdãos, mas sim e essencialmente que se fixe jurisprudência em determinado sentido.

Aliás, isto decorre expressamente do próprio n.º 1 do artigo 438.º do Código de Processo Penal, em que se alude a «recurso para fixação de jurisprudência».

Portanto, dúvidas não pode haver que o requerimento de interposição do recurso deve conter o pedido, ou seja, o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência.

B) Sem embargo, outro princípio que se extrai também do artigo 412.º do Código de Processo Penal é o constante da sua alínea b), em que, como se viu, as conclusões (no nosso caso o requerimento de interposição) devem indicar, sob pena de rejeição do recurso, o sentido em que, no entendimento do recorrente, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada.

Desta forma, adaptando este princípio ao nosso caso, o mesmo só pode significar que no requerimento de interposição do recurso de fixação de jurisprudência tem de ser indicado pelo requerente o sentido da fixação, sob pena de rejeição.

C) De um outro ponto de vista podem ainda ser encaradas as coisas.
Poderá, porventura, argumentar-se em contrário, no sentido de que, na medida em que o n.º 2 do artigo 442.º do Código de Processo Penal dispõe que nas alegações os interessados formulem conclusões em que indicam o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência, não seria já indispensável tal indicação no requerimento de interposição.

Mas não é assim:
Em primeiro lugar, a determinação de que as alegações devem conter o sentido da fixação de jurisprudência é um injuntivo que só respeita àquela peça processual.

Dito por outras palavras: a lei diz expressamente que nas alegações é obrigatória a indicação do sentido da fixação. Nada mais a este respeito.

Simplesmente e como bem acentua o douto acórdão recorrido, existe um argumento, embora quase ad terrorem, extraído precisamente daqui, que mais impõe ainda a obrigatoriedade de a indicação do sentido da fixação constar do requerimento de interposição do recurso, por isso mesmo que, não sendo obrigatórias as alegações como resulta da própria lei (expirado o prazo para a sua apresentação) e não constando a indicação da fixação do requerimento inicial, ficaria o Supremo Tribunal com um recurso para decidir, sem conclusões, sem pedido, o que manifestamente, por absurdo, não pode ser.

D) Deve ainda acrescentar-se que a falta de indicação do sentido em que deve fixar-se a jurisprudência no requerimento de interposição do recurso, conduzindo, como conduz, a uma falta ou incompletude de conclusões, à falta de objecto e do próprio pedido do mesmo recurso, leva fatalmente e também à manifesta improcedência do referido recurso, nos termos do artigo 420.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

E) Quanto à posição do Ministério Público:
Recorrendo às próprias alegações, aliás, muito doutas, da ilustre procuradora-geral-adjunta, terá de se chegar a uma conclusão contrária à sua.

É que, e em suma, numa das conclusões ali tiradas diz-se expressamente:
«Com a motivação pretende o legislador que o recorrente - logo quando da interposição do recurso - formule com rigor o que pretende do tribunal e assim defina e fundamente o objecto do recurso.»

Ora, esta formulação com rigor do que pretende do tribunal e a definição e fundamentação do objecto do recurso só poderão logicamente ser conseguidas por via da indicação no requerimento da interposição do recurso em causa, do sentido em que, do ponto de vista do recorrente, deve fixar-se a jurisprudência.

Desta forma e pelo mais que explanado ficou, com o maior respeito e a devida vénia, não podemos aceitar a posição defendida pela ilustre procuradora-geral-adjunta.

F) Em face de todas estas considerações, mostra-se claro que consideramos que o pedido formulado pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso de fixação de jurisprudência tem de integrar o sentido em que deve fixar-se a mesma jurisprudência, sob pena de rejeição do recurso, isto sem prejuízo dos demais requisitos previstos no artigo 438.º do Código de Processo Penal.

Em síntese, esta conclusão resulta da conjugação dos normativos dos artigos 412.º, n.os 1 e 2, alínea b), 420.º, n.º 1, e 448.º do Código de Processo Penal.

4 - Conclusão
Por tudo o sobredito e o mais que dos autos consta:
Acordam os juízes que constituem o plenário das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça em negar provimento ao recurso do Ministério Público, mantendo inteiramente o acórdão recorrido de harmonia com a decisão que seguidamente se deixa exarada e que estabelece a seguinte jurisprudência, com a eficácia prevista no artigo 445.º do Código de Processo Penal:

«Considerando o disposto nos artigos 412.º, n.os 1 e 2, alínea b), 420.º, n.º 1, 438.º, n.º 2, e 448.º, todos do Código de Processo Penal, no requerimento de interposição de recurso de fixação de jurisprudência deve constar, sob pena de rejeição, para além dos requisitos exigidos no referido artigo 438.º, n.º 2, o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência cuja fixação é pretendida.»

Cumpra-se o artigo 444.º do Código de Processo Penal.
Sem tributação.
Lisboa, 30 de Março de 2000. - Sebastião Duarte de Vasconcelos da Costa Pereira - António Correia de Abranches Martins - António Luís de Sequeira Oliveira Guimarães - Álvaro José Guimarães Dias - Dionísio Manuel Dinis Alves - Hugo Afonso dos Santos Lopes - Emanuel Leonardo Dias - José Damião Mariano Pereira - Florindo Pires Salpico - Virgílio António da Fonseca Oliveira (vencido como declaração que junto) - Manuel de Oliveira Leal-Henriques (conforme declaração de vencido que junto) - António Gomes Lourenço Martins (vencido como declaração de voto anexa) - Luís Flores Ribeiro (vencido pelas razões constantes do voto do Exmo. Colega Leal-Henriques) - Bernardo Guimarães de Fisher Sá Nogueira (vencido pelas razões expressas no voto do Exmo. Conselheiro Lourenço Martins).


Declaração de voto
O recurso para fixação de jurisprudência está organizado nos artigos 437.º e seguintes do Código de Processo Penal com divisão em duas fases, uma pertinente à questão preliminar da oposição de julgados e a outra ao julgamento propriamente dito do conflito de jurisprudência. A primeira fase prepara o processo para o julgamento da oposição de julgados a levar a efeito pela conferência restrita. A outra, tendo por objecto a solução do conflito de jurisprudência, dirige-se à conferência pelo pleno das secções criminais. Nesta última fase é que os sujeitos processuais interessados são notificados para apresentarem, por escrito, as suas alegações, nas quais devem formular conclusões em que indiquem o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência. E é em relação a estas conclusões que deve colocar-se o problema da sua integração por recurso ao disposto no artigo 412.º do Código de Processo Penal, na parte aplicável, com a cominação da rejeição do recurso se tal disciplina não for observada. O artigo 438.º, n.º 2, do referido Código é, salvo o devido respeito, bem claro quando refere que «o recorrente identifica o acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição e, se este estiver publicado, o lugar da publicação e justifica a oposição que origina o conflito de jurisprudência». E é perante esse objecto que os sujeitos processuais podem apresentar resposta (artigo 439.º do Código de Processo Penal), da qual não tem de constar qualquer manifestação sobre o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência. A única questão a resolver é ainda e só, no essencial, a questão preliminar da oposição de julgados e nada mais. Aliás, a solução contrária depararia com o entrave de, sendo diferente o magistrado do Ministério Público nas duas referidas fases, eles virem a entrar em colisão de entendimentos ou então o magistrado do tribunal superior ter de acatar a proposta do magistrado do tribunal de menor hierarquia. No sentido do texto, trabalhando com regulamentação idêntica do Código de Processo Civil, a doutrina de Alberto dos Reis, no seu Código de Processo Civil Anotado, e Castro Mendes, no vol. III do seu Direito Processual Civil, AAFDL, pp. 104 e seguintes, confirmaria, portanto, a proposta do Exmo. Procurador-Geral neste Supremo Tribunal de Justiça sobre a solução do conflito. - Virgílio António da Fonseca Oliveira.


Declaração de voto
Vencido pelas seguintes razões:
«Os recursos extraordinários para fixação de jurisprudência, consagrados nos artigos 437.º e seguintes do Código de Processo Penal, são remédios jurídicos de impugnação das decisões, que, na sua estrutura, comportam duas fases: uma fase preliminar ou prévia, virada para o conhecimento da oposição entre acórdãos e que se inicia com o requerimento de interposição submetido aos requisitos enumerados no n.º 2 do artigo 438.º (identificação do acórdão fundamento e a justificação da oposição), tendo exclusivamente em vista decidir se o tribunal deve ou não admitir o expediente; e uma fase subsequente, destinada a conhecer de fundo (julgamento do objecto do recurso e fixação de jurisprudência), ultrapassada que foi a fase de admissão, e em que, dada a sua finalidade, se pede aos recorrentes que indiquem nas suas alegações (aí sim ...) o sentido em que deve fixar-se a jurisprudência (n.º 2 do artigo 442.º).

Esta dicotomia de fases, com momentos e objectos diferentes, está claramente consagrada na lei e tem cada uma delas regulamentação própria, pelo que distintas têm de ser as exigências feitas aos interessados.

Assim, e salvo o devido respeito, não se entenderia muito bem que fosse de exigir, na primeira fase, limitada ao conhecimento da oposição entre acórdãos, uma referência expressa ao sentido da jurisprudência a fixar quando, em tal momento, não se sabe ainda se o recurso irá ou não prosseguir.

Daí que o legislador tenha reservado a imposição para quando, ultrapassada a fase inicial, for de pôr a questão da jurisprudência a estabelecer, que será o momento das alegações.

E nem se esgrima com aquilo que se pretende seja um argumento de peso, decorrente da possibilidade de, face à não obrigatoriedade das alegações previstas no n.º 2 do artigo 442.º, o Supremo Tribunal de Justiça se ver na contingência de poder ter de julgar uma impugnação sem conclusões, por falta de alegações.

É que, se tal viesse a suceder, sibi imputet, cabendo ao Supremo, em tais casos, ou rejeitar o recurso, ou, para quem entenda que a lei as dispensará, fazê-lo seguir sem elas.

De resto, a forma como o legislador tratou exaustivamente a questão dos requisitos do requerimento inicial parece afastar, de uma vez por todas, a ideia de uma lacuna a preencher pelas regras gerais.

Finalmente, há que ter em atenção que a disciplina dos recursos para fixação de jurisprudência atribui um papel de grande relevo à posição do Procurador-Geral da República (cf. artigo 447.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), uma vez que, nos termos do Regulamento da Procuradoria-Geral, os procuradores-gerais-adjuntos submetem à apreciação daquele alegações em que se indica o sentido em que o Ministério Público entende se deve fixar a jurisprudência (único caso em que essa submissão tem lugar).

Ora, o acórdão que fez vencimento, e salvo o devido respeito, descaracteriza indirectamente a posição institucional e constitucional do Procurador-Geral da República.

Como assim, votaria o acórdão de fixação de jurisprudência, não no sentido que fez vencimento, mas de harmonia com a posição sugerida pelo Ministério Público neste Supremo Tribunal, e segundo o qual, em tais recursos, não há qualquer lacuna da lei no que concerne aos requisitos do requerimento de interposição, pelo que o respectivo petitório se resume à indicação das referências contidas no falado n.º 2 do artigo 438.º, sem necessidade, pois, de apelo ao regime supletivo cominado no artigo 412.º» - Leal-Henriques.


Declaração de voto
Vencido, com todo o respeito pela opinião que fez vencimento, mas não posso acompanhar.

O sistema que entendo resultar da lei, no que concerne ao recurso para fixação de jurisprudência, aponta para uma apreciação cindida em duas etapas: numa primeira, em que se procura esclarecer se existe ou não oposição entre os julgados; a segunda, em que se fixa a jurisprudência.

Para cada uma regem disposições apropriadas, batendo-se o Código de Processo Penal, na primeira fase, com a indicação pelo requerente dos elementos a que se refere o n.º 2 do artigo 438.º; para a segunda fase, então, observa-se o preceito do n.º 2 do artigo 442.º

Parece-me claro e coerente o sistema.
Argumento decisivo em sentido contrário é apontado, a não relevância do disposto no n.º 2 do artigo 438.º referido, o que, a nosso ver, não procede.

Na verdade, da eventual não apresentação de alegações caberá ao Supremo Tribunal adoptar então a medida apropriada, a qual, a nosso ver, não poderá deixar de passar pela predominância do interesse público, tónica do processo penal. - António Gomes Lourenço Martins.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/115072.dre.pdf .

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  • Tem documento Em vigor 2003-02-27 - Acórdão 1/2003 - Supremo Tribunal de Justiça

    No procedimento criminal pelo crime de falsificação de documento, previsto e punido pela alínea a) do n.º 1 do artigo 256.º do Código Penal, a pessoa cujo prejuízo seja visado pelo agente tem legitimidade para se constituir assistente (processo 609/02).

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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