Resolução do Conselho de Ministros n.º 112/98
Os espaços naturais surgem cada vez mais, no contexto internacional e nacional, como destinos turísticos em que a existência de valores naturais e culturais constituem atributos indissociáveis do turismo de natureza. As áreas protegidas (AP) são, deste modo, locais privilegiados com novos destinos, em resposta ao surgimento de outros tipos de procura, propondo a prática de actividades ligadas ao recreio, ao lazer e ao contacto com a natureza e às culturas locais, cujo equilíbrio, traduzido nas suas paisagens, conferem e transmitem um sentido e a noção de «único» e de «identidade de espaço», que vão rareando um pouco por todo o nosso território.
Considerando que as AP se assumem como fiéis depositárias de valores nacionais ímpares e como espaços detentores de potencialidades didácticas e recursos sensíveis, que carecem de uma adequada gestão e usufruto;
Considerando a necessidade de conciliar a preservação dos valores naturais e culturais, com uma actividade turística a eles ajustada;
Considerando que a consolidação da imagem de Portugal como um destino de qualidade, diferenciado e competitivo pode ser alcançada desde que os recursos naturais sejam preservados e as políticas sectoriais articuladas, em ordem a não comprometer a competitividade das empresas;
Considerando que o turismo nas AP deve:
Ser ecologicamente sustentável a longo prazo, de forma a assegurar a manutenção dos processos ecológicos essenciais à biodiversidade;
Ser cultural e socialmente sustentável, de forma a assegurar que o desenvolvimento desejável seja compatível com a manutenção dos valores culturais e sociais, podendo, deste modo, manter-se a identidade da comunidade;
Contribuir de maneira positiva para o desenvolvimento económico local, nomeadamente através da promoção de emprego, utilização dos produtos e valorização dos saberes locais, visando revitalizar as actividades ligadas às economias tradicionais, como a agricultura e pesca, e favorecer a criação do plurirrendimento e da pluriactividade;
Considerando ainda que o turismo nas AP deve obedecer aos seguintes princípios:
a) Os projectos de actividade turística devem ser concebidos na óptica do desenvolvimento sustentável, garantindo que a utilização dos recursos não comprometa o seu usufruto pelas gerações futuras;
b) As actividades turísticas, em cada AP, devem respeitar os valores ambientais intrínsecos e reconhecer que algumas zonas, pela sua sensibilidade ecológica, são interditas ou condicionadas;
c) A localização das actividades e instalações turísticas deverá obedecer a critérios de ordenamento que evitem a pressão em áreas sensíveis, respeitando a capacidade de carga do meio natural e social;
d) A tipologia de empreendimentos e de actividades turísticas, para cada AP, deverá ser previamente definida, tendo em conta a capacidade de carga dos diferentes ecossistemas, garantindo o seu equilíbrio e perenidade;
e) Os projectos turísticos devem ser ambientalmente responsáveis, designadamente através da adopção de tecnologias não poluentes, poupança de energias e de recursos essenciais como a água, reciclagem e reutilização de matérias-primas ou transformadas e formas de transporte alternativo e ou colectivo visando uma maior eficácia energética;
f) Devem ser estabelecidos programas de monitorização relativamente à visitação nas áreas protegidas, de modo a ajustar eventuais disfunções e introduzir formas compatíveis de actividades turísticas;
g) Os objectivos de conservação de cada AP devem ser claramente entendidos por todos os intervenientes, através do estabelecimento de parcerias entre a população local, a actividade turística e outras organizações interessadas;
h) Os conceitos de turismo sustentável e de turismo de natureza devem ser desenvolvidos e incorporados nos programas educacionais e de formação dos profissionais de turismo;
i) A promoção do turismo nas AP deverá obedecer a uma óptica de sensibilização dos visitantes para o respeito pelos valores que cada área encerra;
j) Os planos de ordenamento do território, no âmbito das AP, devem contemplar a criação de sistemas de gestão e planeamento que garantam um desenvolvimento turístico sustentável;
Tendo em conta as Resoluções do Conselho de Ministros n.º 102/96, de 5 de Julho, e 60/97, de 30 de Janeiro, e reconhecendo que o desenvolvimento da actividade turística deve, nas AP, contribuir para a valorização do seu património natural e cultural, foi celebrado um protocolo de cooperação entre o Ministério da Economia e o Ministério do Ambiente, em 12 de Março de 1998, com o objectivo de implementar o Programa Nacional de Turismo de Natureza.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolveu:
1 - Criar o Programa Nacional de Turismo de Natureza, adiante designado por PNTN, aplicável na Rede Nacional de Áreas Protegidas, visando a promoção e afirmação dos valores e potencialidades que estes espaços encerram, especializando uma actividade turística, sob a denominação «turismo de natureza», e propiciando a criação de produtos turísticos adequados.
2 - O turismo de natureza pressupõe a prática integrada de actividades diversificadas, que vão desde o usufruto da natureza através de um passeio à prática de caminhadas, escalada, espeleologia, orientação, passeios de bicicleta ou a cavalo, actividades aquáticas e subaquáticas, entre outras, ao contacto com o ambiente rural e culturas locais, através da sua gastronomia e manifestações etnográficas, rotas temáticas, nomeadamente históricas, arqueológicas e ou gastronómicas, e a estada em casas tradicionais.
3 - O enquadramento jurídico do turismo de natureza será efectuado através de decreto-lei e respectivos diplomas regulamentares, nos quais se estabelecerá, designadamente, a definição e a regulamentação das modalidades «casas da natureza», «actividades de animação ambiental», a sua instalação e funcionamento.
4 - O regime relativo aos «guias de natureza» será estabelecido em diploma regulamentar próprio.
5 - O PNTN funcionará na dependência dos membros do Governo que tutelam a área do turismo e do ambiente.
6 - A estratégia de implementação do PNTN assume a necessidade de consagrar a integração e sustentabilidade dos seguintes vectores:
a) Conservação da natureza;
b) Desenvolvimento local;
c) Qualificação da oferta turística;
d) Diversificação da actividade turística.
7 - O PNTN tem os seguintes objectivos:
a) Compatibilizar as actividades de turismo de natureza com as características ecológicas e culturais de cada local, respeitando as respectivas capacidades de carga;
b) Promover projectos e acções públicas e privadas que contribuam para a adequada visitabilidade das AP, através da criação de infra-estruturas, equipamentos e serviços;
c) Promover no interior das AP a instalação e o funcionamento dos diferentes serviços de hospedagem em casas e empreendimentos turísticos de turismo em espaço rural;
d) Promover a instalação e o funcionamento de «casas de natureza», como infra-estruturas de alojamento que, não sendo as únicas nas AP, delas serão exclusivas;
e) Valorizar a recuperação e ou a reconversão dos elementos do património construído existentes, passíveis de utilização pelas actividades de turismo de natureza;
f) Promover a criação de infra-estruturas e equipamentos necessários às actividades de turismo de natureza que salvaguardem a sua adequada integração;
g) Instalação em cada AP de centros de recepção e ou interpretação, circuitos interpretativos, núcleos eco-museológicos e de sinalização adequada às funções de recepção, informação, interpretação e visitas turísticas;
h) Incentivar práticas turísticas, de lazer e de recreio não nocivas para o meio natural e compatíveis com a sua preservação;
i) Fomentar actividades que contribuam para a sensibilização e educação ambientais dos visitantes e população em geral;
j) Incentivar a criação de micro e pequenas empresas de serviços de alimentação e bebidas e de animação turística, particularmente as iniciativas endógenas que promovam o desenvolvimento local e as relações de proximidade entre as populações e os turistas;
l) Incentivar o aparecimento de novas profissões e actividades na área do turismo mais aliciantes à fixação dos jovens;
m) Promover as actividades de animação que se destinem à ocupação dos tempos livres dos visitantes e que contribuam para a divulgação e interpretação do património natural e cultural;
n) Promover os produtos de base local e a sua comercialização, nomeadamente através da gastronomia;
o) Divulgar as manifestações tradicionais e etnográficas locais como forma de afirmação da identidade cultural.
8 - Para a prossecução dos objectivos do PNTN, poderá ser necessário o envolvimento de outros órgãos da administração central, regional e local, empresas, instituições privadas sem fins lucrativos, organizações não governamentais e pessoas singulares, através da celebração de contratos, acordos e protocolos de colaboração.
9 - No âmbito da implementação do PNTN, devem ser concretizadas as seguintes medidas:
a) Elaboração do plano de promoção do PNTN e das acções nele contempladas, que será elaborado pelo Instituto da Conservação da Natureza (ICN) e pela Direcção-Geral do Turismo (DGT);
b) Elaboração de um guia do turismo de natureza, que será elaborado pelo ICN e pela DGT;
c) Elaboração de um plano de formação profissional, que será efectuado pelo Instituto Nacional de Formação Turística em parceria com o ICN;
d) Elaboração de um código de conduta para o turismo de natureza, que deverá ser efectuado pelo ICN e pela DGT, podendo ser ouvidas outras entidades com reconhecida competência na matéria, em estreita colaboração com o Instituto Nacional de Desporto, no tocante a matérias da sua competência.
10 - Acompanhamento e controlo de execução do PNTN:
a) A coordenação e avaliação da execução material e financeira do PNTN são efectuadas por uma comissão paritária.
b) A comissão paritária é composta por dois representantes da Secretaria de Estado do Ambiente e dois representantes da Secretaria de Estado do Turismo.
c) A comissão paritária procederá à elaboração do seu regulamento, no prazo de 60 dias a contar da data de publicação do presente diploma, o qual será sujeito à aprovação das respectivas tutelas.
11 - Financiamento:
a) O PNTN compõe-se de um programa de investimento público e de um programa de investimento privado.
b) O programa de investimento público será composto pelos projectos apresentados pelo ICN, sem prejuízo de colaboração com outras entidades públicas para o efeito.
c) Para efeitos de investimento público, será elaborado um plano relativo a cada AP, especificando o conjunto de acções, orçamentos e a respectiva calendarização.
d) O programa de investimento público a ser incluído no PNTN deverá ser proposto pela comissão paritária, sob proposta do ICN, no prazo de 30 dias úteis a contar da recepção daquela proposta, definirá o enquadramento financeiro das acções aí previstas e deverá ser submetido à homologação dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do turismo e do ambiente.
e) O programa de investimento público será financiado, para o ano de 1999, pelo ICN.
f) As acções de formação dos guias de natureza serão financiadas, para o ano de 1999, pelo Instituto Nacional de Formação Turística.
g) O investimento privado, para o ano de 1999, será aberto e financiado com recurso aos vários sistemas em vigor e nos termos neles estabelecidos.
h) No âmbito do PNTN, deverão ser entretanto preparadas as medidas e acções a serem incluídas no Quadro Comunitário de Apoio 2000-2006, nos termos e prazos previstos para o efeito, quer para o investimento público quer para o investimento privado.
12 - O programa de investimento para o PNTN e o respectivo enquadramento financeiro serão objecto de diploma próprio.
13 - Controlo e gestão do Programa - a comissão paritária assegurará as iniciativas de controlo, gestão e avaliação técnica e financeira da execução do PNTN.
Presidência do Conselho de Ministros, 30 de Julho de 1998. - O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.