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Acórdão 3/96, de 14 de Março

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Sumário

FIXA, COM CARÁCTER OBRIGTORIO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS, A SEGUINTE JURISPRUDÊNCIA: A PRISÃO PREVENTIVA DEVE SER REVOGADA OU SUBSTITUÍDA POR OUTRA MEDIDA DE COACAO LOGO QUE SE VERIFIQUEM CIRCUNSTANCIAS QUE TAL JUSTIFIQUEM, NOS TERMOS DO ARTIGO 212 (REVOGACAO E SUBSTITUIÇÃO DAS MEDIDAS DE COACAO) DO CODIGO DE PROCESSO PENAL-APROVADO PELO DECRETO LEI 78/87, DE 17 DE FEVEREIRO-, INDEPENDENTEMENTE DO REEXAME TRIMESTRAL DOS SEUS PRESSUPOSTOS, IMPOSTO PELO ARTIGO 213 DO MESMO CODIGO. (PROCESSO 47781)

Texto do documento

Acórdão 3/96
Processo 47781. - Acordam no plenário das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça:

1 - Invocando os artigos 437.º e 438.º do Código de Processo Penal (CPP), Carlos Inácio dos Santos Pina, arguido no processo comum colectivo n.º 295 da 2.ª Vara Criminal de Lisboa, interpôs o presente recurso extraordinário, para fixação de jurisprudência, do acórdão da Relação de Lisboa proferido em 12 de Outubro de 1994 no processo 33494, por neste se haver decidido que o despacho de manutenção da sua prisão preventiva, com trânsito em julgado, só poderia alterar-se aquando do reexame trimestral dos respectivos pressupostos, contrariamente ao resolvido pela Relação do Porto, que no processo 24/93, por Acórdão de 3 de Fevereiro de 1993, entendeu ter lugar a revogação ou substituição da prisão preventiva a todo o tempo, apenas dependendo da verificação de fundamentos que tal justifiquem.

2 - Observada neste Supremo Tribunal a devida tramitação, o recurso foi mandado prosseguir, depois de reconhecida a oposição de julgados, por se tratar de dois acórdãos das Relações, que assentaram em soluções opostas, relativamente à mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação, pois fizeram interpretação antagónica dos artigos 212.º e 213.º do CPP (decisão de 27 de Setembro de 1995, a fl. 35).

Alegando nos termos do artigo 442.º do mesmo Código, o arguido propôs que se consagre a posição defendida no aresto fundamento.

O Ministério Público pronunciou-se no mesmo sentido, sugerindo a uniformização de jurisprudência, nos seguintes termos:

«A prisão preventiva deve ser revogada quando tenham deixado de subsistir as circunstâncias que a ditaram, independentemente do decurso do prazo de três meses a que se refere o artigo 213.º do Código de Processo Penal.»

3 - Simultaneamente, considerou o Ministério Público que, verificada e decretada aquela oposição de julgados, ela não pode ser novamente apreciada agora, «porquanto o Código de Processo Penal em vigor não comporta no seu articulado normativo um preceito idêntico ao do artigo 766.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável aos assentos requeridos no domínio do Código de Processo Penal de 1929».

Todavia, acerca dessa questão prévia, outra tem sido a orientação deste Supremo Tribunal, que ficou definida no texto do assento de 6 de Maio de 1992 (Diário da República, 1.ª série, de 6 de Agosto de 1992) e foi depois reafirmada através de dois assentos de 27 de Janeiro de 1993, um no processo 43073 e o outro no processo 43398 (Boletim, n.º 423.º, pp. 47 e 65).

Na verdade, entende-se que o acórdão inicial, nos termos do artigo 441.º do CPP, é apenas uma decisão preliminar de que depende o prosseguimento do recurso, não podendo vincular o plenário dos juízes, depois chamado a apreciar o seu objecto. Exactamente como sucede em processo civil, cujo regime aqui se aplica por identidade de razões, visto o artigo 4.º daquele mesmo Código.

Porém, no caso ora em apreço, não há dúvida de que se verifica a oposição de julgados reconhecida no acórdão preliminar de fl. 35, nos termos que sumariamente deixamos referidos nos n.os 1 e 2.

E nenhuma outra questão prejudicial ocorre.
4 - Quanto ao problema de fundo:
Como vimos, a questão consiste em saber se a revogação ou substituição da prisão preventiva depende apenas da verificação de fundamentos que a justifiquem, sendo de operar-se a todo o tempo, ou só pode ter lugar aquando do reexame trimestral dos respectivos pressupostos.

Para tomar posição, convirá que nos debrucemos sobre o regime legal de aplicação das medidas de coacção em geral e da prisão preventiva em particular, com vista a surpreender as linhas mestras que juridicamente as estruturam e caracterizam, máxime a prisão como medida coactiva extrema.

As medidas de coacção restringem a liberdade das pessoas em maior ou menor grau, pelo que assumem natureza excepcional e têm de estar taxativamente previstas na lei, conforme decorre dos artigos 27.º e 28.º da Constituição da República e do artigo 191.º do CPP, apenas se justificando «em função de exigências processuais de natureza cautelar».

Por isso mesmo, todas elas obedecem aos princípios da necessidade, da proporcionalidade e da adequação, segundo o disposto no artigo 18.º, n.os 2 e 3, da Constituição da República, como limites que representam a um direito fundamental - a liberdade das pessoas - e consoante estabelece o artigo 193.º daquele Código, que manda adequá-las às exigências cautelares que o caso requer e proporcioná-las à gravidade do crime e das suas previsíveis sanções. Não do simples termo de identidade e residência até à prisão preventiva.

Depois, e ainda como reflexo de tais princípios, as medidas de coacção são necessariamente precárias, substituíveis ou revogáveis, única forma de em cada momento se ajustarem à finalidade que visam e as justifica no caso concreto. Isto resulta claramente do artigo 212.º do CPP, de que vale a pena transcrever as passagens seguintes:

«1 - As medidas de coacção são imediatamente revogadas por despacho do juiz, sempre que se verificar:

a) Terem sido aplicadas fora das hipóteses ou das condições previstas na lei; ou

b) Terem deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação.

[...]
3 - Quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação de uma medida de coacção, o juiz substitui-a por outra menos grave ou determina uma forma menos gravosa da sua execução.

4 - A revogação e a substituição previstas neste artigo têm lugar oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido [...]»

Relativamente à prisão preventiva, acresce tratar-se de providência subsidiária, que «só pode ser aplicada quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coacção», segundo reza o n.º 2 do artigo 193.º e repete o n.º 1 do artigo 202.º do mesmo Código, onde se lhe fixam outras condições. Isso em obediência ao artigo 29.º, n.º 2, da Constituição e de acordo também com a Lei de Autorização 43/86, de 26 de Setembro, cujo artigo 2.º, n.º 2, alínea 38, mandou acentuar no novo Código de Processo Penal tal carácter subsidiário, a par da índole provisória da prisão preventiva.

Porque esta é a mais gravosa das medidas de coacção, impõe a lei o seu controlo periódico, dispondo o artigo 213.º, n.º 1, daquele Código:

«Durante a execução da prisão preventiva o juiz procede oficiosamente, de três em três meses, ao reexame da subsistência dos pressupostos daquela, decidindo se ela é de manter ou deve ser substituída ou revogada.»

Mas parece evidente que não pode deixar de aplicar-se também à prisão preventiva o prescrito em termos genéricos para as medidas de coacção pelo antecedente artigo 212.º, no sentido de ser revogada imediatamente e portanto sem condicionamento temporal - quer oficiosamente quer a requerimento do Ministério Público ou do arguido - sempre que se verifique algum dos fundamentos de revogação ali previstos: aplicação indevida ou desaparecimento das circunstâncias que a justificaram.

Quer dizer, não pode ler-se o artigo 213.º desligado do artigo 212.º, de modo que a obrigatoriedade de reexame trimestral não exclui nem dispensa o reexame imediato, a todo o tempo em que se notem ou invoquem fundamentos para a prisão preventiva ser revogada ou substituída.

Aliás, seria ilógico que, além da obrigatória e oficiosa revisão de três meses, não houvesse lugar, pelo menos, a petição do arguido ou do Ministério Público, para os pressupostos da prisão serem reexaminados, com base em novas circunstâncias, verificadas antes de passar um trimestre sobre a última análise da situação prisional.

A invocação do respeito pelo caso julgado, feita no acórdão sob recurso, não faz sentido, relativamente a uma decisão de índole precária, como é o caso, destinada a só vigorar enquanto os seus pressupostos subsistirem.

Portanto, face aos princípios legais por que se rege a aplicação das medidas de coacção, o reexame trimestral imposto pelo artigo 213.º tem de ser entendido com uma garantia suplementar, para o arguido preso, de que não poderá decorrer esse período sem ver a sua situação oficiosamente revista; não excluindo, porém, a possibilidade de o ser mais cedo, quando tal se justifique, de acordo com a regra geral do artigo 212.º

5 - Este tem sido o entendimento dominante, expresso, v. g., nos Acórdãos deste Supremo Tribunal de 31 de Maio de 1989 (processo 39947), de 13 de Março de 1991 (processo 41758) e de 13 de Novembro de 1991 (processo 42301) (Boletim, n.º 387.º, p. 487, 405.º, p. 374, e 411.º, p. 450).

No dizer do conselheiro Maia Gonçalves, o reexame dos pressupostos da prisão preventiva prescrito no n.º 1 do artigo 213.º, «que é feito oficiosa e obrigatoriamente de três em três meses, acresce a qualquer outro reexame, que deve ser feito sempre que se verifiquem circunstâncias que o imponham. A lei não teve necessidade de o dizer aqui porque esses exames são impostos por outros normativos, máxime pelo artigo 212.º [...] As medidas de coacção, pelas contínuas variações do seu condicionalismo, estão sujeitas à condição rebus sic stantibus» (Código de Processo Penal Anotado, 6.ª ed., pp. 355 e 354).

6 - Em conclusão:
Opta-se, decididamente, pela orientação acolhida no acórdão fundamento.
Entretanto, visto qualquer decisão sobre prisão preventiva ter de ser reapreciada ao fim de três meses, é claro que o acórdão recorrido, neste momento, só conserva a utilidade de constituir suporte para a pretendida uniformização de jurisprudência, sendo agora descabido revogá-lo ou mandá-lo alterar, porque já despido da validade e interesse, em relação ao caso concreto nele resolvido, cumprindo sim declarar a superveniente inutilidade do recurso nesse aspecto.

E pelos fundamentos expostos se fixa, com carácter obrigatório para os tribunais judiciais, a seguinte jurisprudência:

«A prisão preventiva deve ser revogada ou substituída por outra medida de coacção logo que se verifiquem circunstâncias que tal justifiquem, nos termos do artigo 212.º do Código de Processo Penal, independentemente do reexame trimestral dos seus pressupostos, imposto pelo artigo 213.º do mesmo Código.»

Não há lugar a tributação.
Lisboa, 24 de Janeiro de 1996. - Pedro Elmano Figueiredo Marçal - Sebastião Duarte de Vasconcelos da Costa Pereira - António de Sousa Guedes - Vítor Manuel Ferreira da Rocha - Manuel Luís Pinto Sá Ferreira - José Moura Nunes da Cruz - Joaquim Daniel Araújo dos Anjos - Bernardo Guimarães Fisher de Sá Nogueira - Manuel Castro Ribeiro - José Joaquim da Costa Figueirinhas - Manuel Andrade Saraiva - Augusto Alves.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/73271.dre.pdf .

Ligações para este documento

Este documento é referido no seguinte documento (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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