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Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma Dos Açores 23/2023/A, de 23 de Maio

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Sumário

Defesa dos oceanos e do património natural azul: moratória à mineração dos fundos marinhos

Texto do documento

Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 23/2023/A

Sumário: Defesa dos oceanos e do património natural azul: moratória à mineração dos fundos marinhos.

Defesa dos oceanos e do património natural azul: moratória à mineração dos fundos marinhos

Cerca de 99 % do mar dos Açores é concebido como mar profundo, alcançando uma profundidade média de 3000 metros, visto, por isso, como um local privilegiado para a ocorrência de campos hidrotermais e de fontes hidrotermais - os habitats mais singulares da Terra, comunidades únicas, de enorme riqueza de ecossistemas e endemismos, um oásis de vida no oceano profundo, onde, segundo algumas teorias, a própria vida pode ter tido a sua origem.

Esses locais possuem características biológicas, geológicas, químicas e hidrotermais particulares, variáveis de campo para campo hidrotermal, de grande interesse para a investigação científica, amplamente reconhecido pela comunidade científica mundial. A par da singularidade dos ecossistemas, o interesse externo pelas fontes hidrotermais recai na existência de matérias geológicas de interesse comercial. Diversas investigações demonstraram que as fontes hidrotermais libertam fluídos com quantidades massivas de sulfitos, ricos em metais, como cobre, chumbo, prata, zinco, ferro e ouro.

Em paralelo, o aumento da população mundial bem como a procura pelos progressos tecnológicos motivaram o incremento da busca, a nível global, por minerais, e os particularismos dos fundos marinhos açorianos despertaram, por isso, um grande interesse na sua exploração comercial.

Contudo, a avaliação ambiental desses espaços marinhos não é imediata, devido à diversidade dos ecossistemas bentónicos costeiros e oceânicos presentes na Região, bem como às limitações no mapeamento e caracterização organizada dos desiguais tipos de fundos e biótopos, dada a dispersão geográfica, a complexidade do mosaico ecológico e a profundidade e localização de muitos habitats. Acrescem as dificuldades inerentes à avaliação dos impactos reais da mineração nas diversas atividades marítimas que compõem o cluster marítimo da economia azul, sobretudo aquelas com maior relevância socioeconómica regional, e ao facto de os campos hidrotermais serem ecossistemas extremamente vulneráveis à intervenção humana.

É importante considerar que os campos hidrotermais dos Açores estão localizados numa crista médio-oceânica que se movimenta de forma lenta, ao contrário do Pacífico, onde a extinção e aparecimento de campos ativos, num complexo processo de sucessão ecológica, decorre à escala de décadas.

Como tal, os instrumentos económicos e legais aplicados devem estar em consonância com essas variáveis, considerando-se os particularismos e especificidades dos ecossistemas. Apesar do interesse que desperta, o conhecimento da biodiversidade marinha do mar dos Açores é restrito a algumas categorias taxonómicas e centrado em espécies de maiores dimensões, existindo grupos menos estudados, como os invertebrados e a fauna de baixa profundidade.

O mar dos Açores é, ainda, um importante ponto de passagem para espécies migratórias e mamíferos marinhos. Existem atividades económicas desenvolvidas na Região que dependem, diretamente, dos recursos naturais provenientes e do bom estado ambiental do mar, o que exige o maior rigor na governação do mar dos Açores, de modo a evitar a ocorrência de danos irreparáveis e efeitos desastrosos nos setores diretamente dependentes do mar, onde se incluem a alimentação e o bem-estar das comunidades locais.

Segundo os mais recentes estudos, os primeiros impactos da exploração dos fundos marinhos consistem em mudanças na paisagem do fundo do mar e no habitat da vida marinha, redução do oxigénio e da luz na coluna de água, introdução de metais na coluna de água e possível libertação indesejada de petróleo, causando a perda de biodiversidade, transferência da vida marinha e recuperação muito lenta do ecossistema, em termos de tempo geológico, afetando o património natural azul das gerações presentes e vindouras. Está ainda demostrado que a mineração pode comprometer os ciclos de carbono e nutrientes do oceano, pondo em causa a capacidade do mesmo na mitigação e adaptação às alterações climáticas.

Toda a atividade que represente um forte risco ou sério perigo para o meio ambiente deve ser precedida de um estudo exaustivo, e os proponentes devem demonstrar que os benefícios compensarão largamente os danos causados. Quando os potenciais efeitos adversos não são plenamente compreendidos, deve optar-se por uma lógica de prevenção, pelo que atividades que não oferecem garantias de salvaguarda ambiental não devem prosseguir, fazendo uso do princípio de in dubio pro ambiente. Quer isto dizer que a ignorância científica sobre atos ou omissões potencialmente danosos, sob o fundamento da inexistência de provas geradoras de efeitos prejudiciais, constitui, per si, justificação para não se avançar com aquela ação devido à dúvida gerada, sobretudo se considerados os eventuais danos que pode causar - como se verifica no caso da mineração dos fundos marinhos.

Pese embora a produção científica sobre a mineração dos fundos marinhos não permita compreender, integralmente, os efeitos e as consequências ambientais que daí possam advir, o conhecimento científico existente é claro nas conclusões que retira dos impactos e consequências ambientais negativas na proximidade das zonas de mineração marinha, estando, ainda, por avaliar potenciais consequências nocivas a maiores escalas espaciais e temporais.

A comunidade científica tem-se manifestado pela improcedência da mineração dos fundos marinhos perante o risco irreparável que acarreta. A mineração é incompatível com as demais atividades económicas, pois, para além dos fatores atrás mencionados, levará ao impedimento de acesso de terceiros às zonas sob exploração. A extensão prevista para estas áreas de grandes dimensões pode, inclusivamente, interferir com rotas de navegação importantes para a economia.

O crescente interesse económico e geopolítico na mineração dos fundos marinhos representa um desafio à governação do mar dos Açores, com reflexos na gestão, conservação e exploração de recursos, ao qual a Região tem, obrigatoriamente, de estar atenta e agir em conformidade, no sentido de salvaguardar os ecossistemas e habitats do fundo e subsolo, coluna e superfície da água, da Zona Económica Exclusiva (ZEE) e da plataforma continental, bem como as atividades marítimas pré-existentes e de grande relevância socioeconómica regional.

Perante as ameaças colocadas e face às mudanças nos padrões de consumo, a Região deve destacar-se neste desafio global que representa a defesa dos oceanos e combater atividades que inviabilizem essa proteção, como a mineração dos fundos marinhos, pois detém uma posição estratégica no contexto dos arquipélagos atlânticos e desenvolve investigação científica de excelência, pioneira nas políticas para o planeamento, gestão e proteção dos recursos marinhos.

Asseverar a preservação ambiental e controlar, com rigor, as práticas conexas à atividade da exploração dos recursos minerais no espaço marítimo deve estar no topo das prioridades das políticas públicas, por forma a certificar os parâmetros da sustentabilidade ambiental, em conformidade com os compromissos internacionais assumidos, no âmbito da Convenção das Nações Unidas do Direito do Mar, da Convenção para a Proteção do Meio Marinho do Atlântico Nordeste (OSPAR), da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB) e Diretivas da União Europeia (UE).

Segundo a Diretiva-Quadro Estratégia Marinha (DQEM) para a subdivisão dos Açores, a integridade dos fundos marinhos deve assegurar que as funções desempenhadas pelos serviços dos ecossistemas estejam salvaguardadas e que os ecossistemas bentónicos não sejam afetados de forma negativa. Visa limitar a pressão da ação sobre o leito marinho, impedindo a afetação negativa dos componentes do ecossistema e garantindo o funcionamento dos processos ecológicos, tendo em conta a resiliência dos sistemas envolvidos.

Para o efeito, urge otimizar os benefícios provenientes do desenvolvimento sustentável do ambiente marinho, através da evolução dos setores responsáveis pelo bem-estar, numa cadeia de valor acrescentado e baseado num modelo económico que responda às necessidades básicas de todos, assente na conceção holística de que o oceano é uma fonte de desenvolvimento criadora de riqueza e emprego, e não o inverso, com respeito pelo património, material e imaterial, que representa o mar dos Açores.

Nestes termos, a presente resolução pretende, essencialmente, recomendar a aplicação de uma moratória à mineração em zonas marítimas sob gestão da Região Autónoma dos Açores, até 1 de janeiro de 2050, ao fim da qual é reavaliado o seu prolongamento face aos conhecimentos científicos à data.

Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores resolve, nos termos regimentais aplicáveis e ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 44.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, recomendar ao Governo Regional dos Açores que:

1 - Aplique uma moratória à mineração, incluindo atividades de prospeção, em zonas marítimas sob gestão da Região Autónoma dos Açores, até 1 de janeiro de 2050.

2 - Cinco anos antes do termo da moratória definida no número anterior, proceda à reavaliação da necessidade do prolongamento da moratória considerando o seguinte:

a) Os conhecimentos científicos existentes à data sobre os impactos associados à prospeção, pesquisa e exploração mineral dos fundos marinhos até que os riscos ambientais, sociais e económicos sejam compreendidos de forma abrangente e esteja cientificamente demonstrado que esta atividade pode ser gerida de forma a assegurar a efetiva proteção do ambiente marinho, evitando a perda de biodiversidade e salvaguardando as comunidades costeiras e a saúde humana;

b) O nível de informação e literacia da população local sobre os riscos sociais e ambientais associados, de modo que a cessação ou levantamento da moratória dependa do consentimento livre, prévio e informado da população, através de mecanismos eficazes de consulta pública e após amplo esclarecimento junto da mesma;

c) A existência de mecanismos que fomentem uma democracia participativa.

3 - Envide esforços, nos espaços de discussão e decisão relevantes para o efeito, designadamente Assembleia da República Portuguesa, Governo da República Portuguesa e Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos, sem prejuízo dos demais interessados, para instar à adoção de moratórias à mineração dos fundos marinhos em águas sob a jurisdição destes órgãos, com as mesmas condicionantes apresentadas no número anterior.

4 - Não financie ou apoie atividades relacionadas com a extração de minerais nos fundos marinhos.

5 - Promova a participação e envolvimento das Organizações Não Governamentais ambientais regionais na Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos.

6 - Questione a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos sobre os impactos da licença para exploração dos fundos marinhos em alto-mar concedida à Polónia a sul do mar dos Açores.

7 - Diligencie junto do Governo da República Portuguesa a divulgação dos contributos portugueses entregues à Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos para elaboração do regulamento para a exploração e mineração dos fundos marinhos.

8 - Assuma, claramente, a posição de defensor e protetor dos oceanos, designadamente da coluna de água e dos fundos marinhos.

Aprovada pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, em 20 de abril de 2023.

O Presidente da Assembleia Legislativa, Luís Carlos Correia Garcia.

116476757

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/5362853.dre.pdf .

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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