Resolução do Conselho de Ministros n.º 31/92
A intensidade energética em Portugal, isto é, a quantidade de energia utilizada por unidade de produto, é a maior de todos os países da Europa comunitária. Mais do que isso, Portugal é, desde há vários anos, o único país da Comunidade em que o crescimento da economia é acompanhado por um crescimento da intensidade energética.
O Governo, considerando que a situação enunciada constitui uma fraqueza relativa face aos nossos parceiros comunitários, está atento ao problema e considera que se terão de adoptar medidas para a sua correcção, as quais se traduzirão em inegáveis benefícios para a sociedade no seu todo.
Um primeiro conjunto de vantagens é de natureza ambiental. A produção de grandes quantidades de energia é, com as tecnologias disponíveis actualmente, uma das maiores responsáveis pelos elevados níveis de emissão de diversos poluentes, com inúmeras consequências nefastas, de entre as quais pode servir de exemplo a emissão de CO(índice 2) e a correspondente criação do efeito de estufa.
A redução da intensidade energética diminuiria o ritmo de crescimento das emissões e potenciaria um aumento global da qualidade de vida das populações.
Em segundo lugar, benefícios de natureza estratégica. A elevada utilização de energia é uma das principais responsáveis pela dependência da nossa economia face ao exterior. Efectivamente, não possuindo Portugal os recursos endógenos necessários à produção da energia que consumimos, 88% dessa produção é baseada em energia primária importada, principalmente petróleo e carvão.
A redução da intensidade energética diminuiria a dependência da nossa economia face ao exterior e potenciaria uma mais eficaz utilização dos nossos recursos endógenos.
Finalmente, vantagens de natureza económica. A importação de matérias-primas para a produção de energia é responsável por uma factura anual que ascendeu, em 1990, a 272 milhões de contos e a 30% do défice da nossa balança de transacções correntes.
A diminuição da intensidade energética permitirá, sem que ocorra qualquer afrouxamento nos níveis de crescimento económico que se têm verificado e sem travar a melhoria das condições de vida das populações, reduzir significativamente os custos em divisas da nossa economia, corrigir a balança comercial do País, libertar recursos para novos investimentos e contribuir para que as empresas nacionais se tornem mais competitivas, numa altura em que se avizinham grandes desafios decorrentes da intensificação da concorrência no interior do espaço europeu.
Assim sendo, o Governo estabeleceu já como um dos objectivos prioritários da sua actuação a redução da intensidade e da dependência energéticas da economia nacional.
A concretização do objectivo enunciado não incumbe estritamente ao Governo, antes requer, de uma forma horizontal, a colaboração de toda a sociedade, desde os órgãos da Administração Pública, aos agentes e actores económicos e ainda aos cidadãos na sua globalidade. Ao Governo incumbe, antes, mobilizar o País para a conservação e a utilização racional da energia, como processo privilegiado de atingir o objectivo proposto.
A incumbência do Governo nesta matéria passa pelo reconhecimento de que, havendo embora uma estrutura governamental dedicada exclusivamente à área da energia e que define políticas e programas de acção, este é um problema que interessa a todos os ministérios em cujas áreas de responsabilidade se acabam por concretizar muitas daquelas políticas e programas.
Basta referir, a título de exemplo, que a utilização racional de energia abrange iniciativas com reflexos em edifícios residenciais e de serviços, nos transportes e em infra-estruturas de índole diversa, o que manifestamente extravasa a estrita área de intervenção directa do Ministério da Indústria e Energia.
Assim sendo, a dinamização de iniciativas neste domínio deverá ser potenciada através da criação de uma estrutura horizontal, com participação alargada, que abranja, para além do Ministério da Indústria e Energia, representantes de outras áreas governamentais sob cuja tutela se concretizem medidas ligadas à utilização da energia.
A filosofia de actuação desta estrutura deverá consistir na promoção e incentivo à intervenção, neste domínio da utilização racional de energia (URE), de todas as entidades públicas ou privadas que possam contribuir para a melhoria da eficiência energética.
Para tanto deverá constituir-se como «estrutura de progresso» que mantenha a sociedade mobilizada para este objectivo nacional de diminuição da intensidade energética e que possibilite o estreitamento da malha de actividades e contactos nesta área (incentivando, por exemplo, a criação de estruturas sectoriais, que promovam a URE, com participação de instituições ou entidades do domínio público ou privado).
Esta estrutura, não sendo um novo órgão da Administração Pública, mas antes constituindo-se como um instrumento de intervenção a nível estratégico e operacional na sociedade portuguesa na área da URE, que coordena recursos humanos já existentes, não necessitará de meios afectos à sua própria organização.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 202.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolveu:
1 - É criada a Comissão Nacional para a Utilização Racional de Energia, adiante abreviadamente designada por CNURE, com o objectivo de dinamizar junto da sociedade em geral a aplicação das medidas de conservação e utilização racional de energia decididas pelo Governo e inscritas no seu Programa.
2 - A CNURE é coordenada pelo Ministro da Indústria e Energia e terá a participação de representantes dos seguintes ministérios:
a) Ministério do Planeamento e da Administração do Território;
b) Ministério da Indústria e Energia;
c) Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações;
d) Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
3 - Poderão também participar na CNURE entidades de reconhecida competência na área da energia, convocadas para as reuniões em que a ordem de trabalhos justifique a respectiva presença.
4 - Compete à CNURE:
a) Estabelecer uma instância de amplo debate sobre questões relacionadas com o estudo e definição das políticas de conservação e utilização racional de energia nos diversos sectores da sociedade portuguesa;
b) Propor a adopção de acções e projectos concretos que conduzam à realização prática dessas políticas;
c) Coordenar a definição dos meios e dos recursos convenientes à concretização das medidas preconizadas e a preparação de propostas sobre os processos adequados para assegurar a disponibilização de uns e outros;
d) Estabelecer as estruturas de dinamização e disseminação dessas políticas no interior dos órgãos da Administração Pública e junto das estruturas produtivas, das organizações sociais e dos cidadãos em geral;
e) Estabelecer as redes de informação adequadas para a divulgação e promoção das políticas e medidas preconizadas;
f) Monitorar o desenvolvimento das acções e projectos adoptados.
5 - A CNURE publicará anualmente um relatório que conterá as principais medidas desenvolvidas e os resultados obtidos em cada área de intervenção na sociedade portuguesa.
6 - A CNURE constitui uma estrutura de dinamização e de promoção e incentivo à intervenção de todas as entidades públicas ou privadas na área da URE, pelo que caberão a estas entidades os esforços de investimento correspondentes ao desenvolvimento das acções a realizar, os quais terão por contrapartida as economias resultantes de uma mais elevada eficiência energética.
7 - O Governo apoiará os esforços de investimento através de fundos nacionais existentes, nomeadamente através do SIURE - Sistema de Incentivos à Utilização Racional de Energia, e procurará canalizar para este objectivo, com observância das regras comunitárias, todos os fundos que forem susceptíveis de serem utilizados no âmbito dos programas aplicáveis à URE, nomeadamente SAVE, ALTENER e THERMIE.
8 - O Gabinete do Secretário de Estado da Energia assegura o secretariado e o apoio logístico ao bom funcionamento da CNURE.
Presidência do Conselho de Ministros, 30 de Julho de 1992. - Pelo Primeiro-Ministro, Joaquim Fernando Nogueira, Ministro da Presidência.