Decreto do Presidente da República n.º 59-A/2020
de 20 de novembro
Sumário: Renova a declaração do estado de emergência, com fundamento na verificação de uma situação de calamidade pública.
A evolução da pandemia COVID-19 e a tomada de medidas sanitárias indispensáveis para lhe fazer face mostram que restrições ao contacto entre pessoas reduzem o risco de contágio e de propagação do vírus.
Algumas dessas medidas, pela sua gravidade e potencial lesão de direitos, liberdades e garantias, exigem constitucionalmente a declaração do estado de emergência.
Os peritos indicam que o efeito das medidas tomadas sobre a evolução da pandemia se fazem sentir, no número de infetados, cerca de duas a seis semanas depois de serem tomadas e, no número de falecimentos, cerca de um mês depois.
Neste momento, a indicação de possível próxima produção de efeitos resulta do facto de o índice de risco de transmissão efetiva da doença (Rt) indicar uma ligeira tendência de abrandamento, bem como de uma pequena desaceleração da taxa de crescimento da incidência.
No entanto, este nível de incidência, com os muito inquietantes números de novos infetados e de falecimentos, continua a ser muito elevado e a colocar uma enorme pressão no SNS e no sistema de saúde em geral, em particular na capacidade de acolhimento em unidades de cuidados intensivos, pelo que, para além das medidas genéricas e fundamentais de higiene pessoal, de uso adequado de máscaras e de distanciamento social, é indispensável renovar o estado de emergência, para que certas medidas restritivas possam ser também renovadas, mas mais adaptadas à experiência da realidade e mais diferenciadas em função da situação e heterogeneidade em cada município, esperando-se que possam em breve produzir efeitos positivos.
Para esta diferenciação, serão certamente úteis os critérios permitindo o agrupamento de níveis de risco, definidos pelo Centro Europeu de Controlo de Doenças.
Acresce que a janela de esperança que é aberta pelas novas vacinas só se poderá começar a concretizar, se tudo correr como previsto, a partir de janeiro de 2021 e a vacinação de todos os interessados levará necessariamente vários meses.
Nestes termos, o Presidente da República decreta, nos termos dos artigos 19.º, 134.º, alínea d), e 138.º da Constituição e da Lei 44/86, de 30 de setembro, alterada pela Lei Orgânica 1/2011, de 30 de novembro, e pela Lei Orgânica 1/2012, de 11 de maio, sob proposta e ouvido o Governo e obtida a necessária autorização da Assembleia da República, através da Resolução da Assembleia da República n.º 87-A/2020, de 20 de novembro, o seguinte:
1.º
A declaração do estado de emergência é renovada por igual período de 15 dias, com fundamento na verificação de uma situação de calamidade pública.
2.º
A declaração do estado de emergência abrange todo o território nacional, sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º
3.º
A renovação do estado de emergência inicia-se às 00h00 do dia 24 de novembro de 2020 e cessa às 23h59 do dia 8 de dezembro de 2020, sem prejuízo de eventuais renovações, nos termos da lei.
4.º
Durante todo o período referido no artigo anterior, fica parcialmente suspenso o exercício dos seguintes direitos, nos estritos termos seguidamente previstos:
1) Direitos à liberdade e de deslocação:
a) Nos municípios com níveis mais elevados de risco, podem ser impostas restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia, devendo as medidas a adotar ser calibradas em função do grau de risco de cada município, podendo, para este efeito, os mesmos ser agrupados de acordo com os dados e avaliação das autoridades competentes, incluindo a proibição de circulação na via pública durante determinados períodos do dia ou determinados dias da semana, bem como a interdição das deslocações que não sejam justificadas nos termos da alínea c);
b) Na medida do estritamente necessário e de forma proporcional, pode ser imposto o confinamento compulsivo em estabelecimento de saúde, no domicílio ou, não sendo aí possível, noutro local definido pelas autoridades competentes, de pessoas portadoras do vírus SARS-CoV-2, ou em vigilância ativa;
c) As restrições referidas supra na alínea a) devem prever as regras indispensáveis para a obtenção de cuidados de saúde, para apoio a terceiros, nomeadamente idosos, incluindo acolhidos em estruturas residenciais, para a frequência de estabelecimentos de ensino, para a produção e abastecimento de bens e serviços e para a deslocação por outras razões ponderosas, cabendo ao Governo, nesta eventualidade, especificar as situações e finalidades em que a liberdade de circulação individual, preferencialmente desacompanhada, se mantém.
2) Iniciativa privada, social e cooperativa:
a) Podem ser utilizados pelas autoridades públicas competentes, preferencialmente por acordo, os recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde integrados nos setores privado, social e cooperativo, mediante justa compensação, em função do necessário para assegurar o tratamento de doentes com COVID-19 ou a manutenção da atividade assistencial relativamente a outras patologias;
b) Podem ser adotadas as medidas adequadas e indispensáveis para garantir as condições de normalidade na produção, transporte, distribuição e abastecimento de bens e serviços essenciais à atividade do setor da saúde, designadamente com vista a assegurar o acesso e a regularidade no circuito dos medicamentos e vacinas, dos dispositivos médicos e de outros produtos de saúde, como biocidas, soluções desinfetantes, álcool e equipamentos de proteção individual;
c) Pode ser determinado pelas autoridades públicas competentes o encerramento total ou parcial de estabelecimentos, serviços, empresas ou meios de produção e impostas alterações ao respetivo regime ou horário de funcionamento.
3) Direitos dos trabalhadores:
a) Podem ser mobilizados, pelas autoridades públicas competentes e no respeito dos seus restantes direitos, trabalhadores de entidades públicas, privadas, do setor social ou cooperativo, independentemente do respetivo tipo de vínculo ou conteúdo funcional e mesmo não sendo profissionais de saúde, designadamente servidores públicos em isolamento profilático ou abrangidos pelo regime excecional de proteção de imunodeprimidos e doentes crónicos, para apoiar as autoridades e serviços de saúde, nomeadamente na realização de inquéritos epidemiológicos, no rastreio de contactos e no seguimento de pessoas em vigilância ativa;
b) Pode ser limitada a possibilidade de cessação dos vínculos laborais dos trabalhadores dos serviços e estabelecimentos integrados no SNS.
4) Direito ao livre desenvolvimento da personalidade e vertente negativa do direito à saúde: pode ser imposta a utilização de máscara e a realização de controlos de temperatura corporal, por meios não invasivos, assim como a realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2, designadamente para efeitos de acesso e permanência no local de trabalho ou como condição de acesso a serviços ou instituições públicas, estabelecimentos de ensino ou de formação profissional e espaços comerciais, culturais ou desportivos, na utilização de meios de transporte ou relativamente a pessoas institucionalizadas ou acolhidas em estruturas residenciais, estabelecimentos de saúde, estabelecimentos prisionais ou centros educativos e respetivos trabalhadores.
5) Direito à proteção de dados pessoais: pode haver lugar ao tratamento de dados pessoais na medida do estritamente indispensável para a concretização das medidas previstas no n.º 3 do presente artigo e no artigo 5.º do presente decreto, bem como para efeitos do disposto no n.º 4 do presente artigo sem que, neste caso, seja possível guardar memória ou registo das medições de temperatura corporal efetuadas nem dos resultados dos testes de diagnóstico de SARS-CoV-2.
5.º
Compete às Forças Armadas e de Segurança apoiar as autoridades e serviços de saúde, designadamente na realização de inquéritos epidemiológicos, no rastreio de contactos e no seguimento de pessoas em vigilância ativa. Podem igualmente ser mobilizados os recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde das Forças Armadas e de Segurança no apoio e reforço do Serviço Nacional de Saúde.
6.º
A execução da declaração do estado de emergência compete ao Governo, que dos respetivos atos manterá informados o Presidente da República e a Assembleia da República.
7.º
O presente Decreto entra imediatamente em vigor, produzindo efeitos nos termos definidos no artigo 3.º
Assinado em 20 de novembro de 2020.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendado em 20 de novembro de 2020.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.
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