Resolução do Conselho de Ministros n.º 131/2019
Sumário: Aprova a Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030.
O XXI Governo Constitucional encara o ambiente como uma das suas apostas prioritárias, numa altura em que o país e o mundo se debatem com os efeitos das alterações climáticas, que estão a desequilibrar o termómetro do planeta e que expõem Portugal aos perigos decorrentes dos degelos, da subida das águas do mar, das secas prolongadas e do risco agravado de incêndios.
Nesse sentido, o Programa do Governo destacou a sustentabilidade ambiental, a liderança na transição energética e a valorização territorial como objetivos cimeiros no desenho de políticas para tornar a sociedade e a economia portuguesas mais preparadas relativamente ao grande desafio das próximas décadas: reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e atingir a neutralidade carbónica nos próximos 30 anos.
Correspondendo a cerca de 25 % das emissões, o setor dos transportes desempenha um papel crucial neste caminho, sobretudo num país onde a maioria da população ainda usa carro próprio para grande parte dos seus percursos. A ação governamental assenta, por isso, em três grandes pressupostos: a promoção do transporte público, a eletrificação dos veículos e a transferência de utilizadores para modos de deslocação mais sustentáveis e ativos, como a bicicleta.
Considerando este último pressuposto, foi elaborada a Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030 (EMNAC 2020-2030), um compromisso para a próxima década e independente de ciclos políticos, que assegurará a promoção do uso da bicicleta, a consequente adoção de hábitos de vida mais saudáveis e o investimento na construção de ciclovias.
A concretização desta estratégia colocará Portugal ao nível de outros países onde esta prática já está enraizada, permitindo maximizar benefícios para a saúde das populações, retirar carros das ruas, devolver o espaço público, aliviar o congestionamento urbano, baixar os níveis de ruído e reduzir a poluição atmosférica.
Com uma estratégia integrada e clara na área da mobilidade ativa ciclável, pretende-se tornar Portugal num país «orgulhosamente ativo», onde pedalar é uma atividade segura e amplamente praticada, constituindo uma opção de mobilidade acessível e atrativa, e assim maximizando benefícios para a saúde, economia, emprego, ambiente e cidadania.
A concretização desta estratégia privilegia um trabalho temático e transversal, capaz de garantir os compromissos nacionais e internacionais assumidos por Portugal no domínio da sustentabilidade, dos quais se destaca o Acordo de Paris sobre as alterações climáticas e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável adotados no contexto da Organização das Nações Unidas, prevendo 51 medidas de promoção da mobilidade ativa ciclável, em quatro grandes áreas transversais - enquadramento e legislação, investigação e desenvolvimento, monitorização e avaliação, e financiamento - , a que acrescem três eixos específicos de intervenção - infraestruturas e intermodalidade, capacitação e apoio, e cultura e comportamentos.
A elaboração EMNAC 2020-2030 foi sujeita a um processo de participação, que visou promover uma efetiva apropriação e responsabilização da sociedade civil. Este processo foi consubstanciado em dois momentos: o primeiro, de participação pública de diversas entidades públicas e da sociedade civil, e o segundo, de consulta pública à população em geral.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Aprovar a Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030 (ENMAC 2020-2030), constante do anexo à presente resolução e que dela faz parte integrante.
2 - Determinar que a promoção e a supervisão da ENMAC 2020-2030 são asseguradas pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I. P. (IMT, I. P.), de acordo com as diretrizes emanadas pelo membro do Governo responsável pela área da mobilidade.
3 - Criar a Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável, visando garantir a articulação política e a orientação para os objetivos estabelecidos na ENMAC 2020-2030.
4 - Determinar que a Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável é composta pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna, das autarquias locais, da economia, da ciência, tecnologia e ensino superior, da educação, do desporto, do trabalho, da saúde, das infraestruturas, do ambiente, da mobilidade e da energia.
5 - Criar a Rede de Pontos Focais da ENMAC 2020-2030, responsável pela coordenação da ENMAC 2020-2030, a quem compete dinamizar e acompanhar a execução das medidas, atuando junto das entidades responsáveis e reportando à Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável.
6 - Determinar que a Rede de Pontos Focais da ENMAC 2020-2030 é composta por um representante designado por cada uma das seguintes entidades:
a) O IMT, I. P., que preside;
b) A Direção-Geral da Educação;
c) A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária;
d) A Associação Nacional de Municípios Portugueses;
e) A Infraestruturas de Portugal, S. A.
7 - Determinar que a Rede de Pontos Focais da ENMAC 2020-2030 reúne ordinariamente pelo menos três vezes por ano, ou sempre que a Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável a convocar.
8 - Determinar que a Rede de Pontos Focais da ENMAC 2020-2030 deve, até ao final de 2019, definir a programação das medidas constantes da ENMAC 2020-2030 e, quando possível, a respetiva orçamentação, apresentando-as à Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável.
9 - Determinar que, após a data referida no número anterior, a Rede de Pontos Focais da ENMAC 2020-2030 deve garantir o acompanhamento e continuidade dos trabalhos, preparando nomeadamente a documentação necessária para a tomada de decisões da Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável.
10 - Estabelecer que junto da Rede de Pontos Focais funciona o Conselho Consultivo da ENMAC 2020-2030, a quem compete pronunciar-se sobre os assuntos que lhe sejam submetidos pela Rede de Pontos Focais ou apresentar a esta, por sua iniciativa, recomendações e sugestões no âmbito dos trabalhos desenvolvidos na ENMAC 2020-2030.
11 - Determinar que o Conselho Consultivo da ENMAC 2020-2030 é composto pelas seguintes entidades:
a) A Federação Portuguesa de Ciclismo;
b) A Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta;
c) A Associação para a Mobilidade Urbana em Bicicleta;
d) O Laboratório Nacional de Engenharia Civil, I. P.;
e) A Agência Portuguesa do Ambiente, I. P.;
f) O Instituto do Turismo de Portugal, I. P.
12 - Estabelecer que a constituição e o funcionamento da Rede de Pontos Focais da ENMAC 2020-2030 e do Conselho Consultivo da ENMAC 2020-2030 não confere àqueles que a integram, ou que com ela colaboram, o direito ao pagamento de qualquer remuneração, nem à assunção de qualquer encargo.
13 - Estabelecer que compete ao IMT, I. P., assegurar à Rede de Pontos Focais da ENMAC 2020-2030 os meios de apoio logístico e administrativo necessários.
14 - Desenvolver uma proposta de Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Pedonal 2020-2030, até ao final do 1.º semestre de 2020, através de um grupo de trabalho a constituir por despacho do membro do Governo responsável pela área do ambiente, coordenado pelo IMT, I. P., e constituído por representantes de outras áreas governativas e representantes de associações do setor.
15 - Determinar que a presente resolução produz efeitos no dia seguinte ao da sua publicação.
Presidência do Conselho de Ministros, 4 de julho de 2019. - O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.
ANEXO
(a que se refere o n.º 1)
Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável (2020-2030)
1. CONTEXTO
Privilegiar a mobilidade ativa em detrimento do transporte individual motorizado é uma tendência crescente nas sociedades desenvolvidas, pela excelente relação custo-benefício e enormes vantagens que proporciona em áreas fundamentais para a qualidade de vida de todos - mesmo para quem (ainda) não se desloca ativamente.
Entende-se por mobilidade ativa a capacidade de deslocação, com recurso a meios de transporte sem autopropulsão, implicando atividade física deliberada e necessária. Aqui incluem-se o andar a pé e a deslocação em bicicleta. As bicicletas com assistência elétrica («pedelec») são, para efeitos da presente estratégia, abrangidas no conceito de mobilidade ativa.
A utilização da bicicleta contribui para a maioria dos objetivos de desenvolvimento sustentável definidos pela Organização das Nações Unidas, e a sua promoção deve ser encarada de forma objetiva, sistematizada, transversal e ambiciosa. Com a progressiva disponibilidade de bicicletas com assistência elétrica, que ampliam e permitem generalizar o alcance dos benefícios decorrentes da adoção de padrões de deslocação ativos na sociedade, há fortes razões para adotar novas formas de mobilidade e melhorar a utilização do sistema de transportes.
A deslocação a pé ou com bicicleta, em condições de conforto e segurança, nomeadamente para a escola e para o trabalho, é um direito de todos e deve ser uma atividade prática e agradável.
1.1. RAZÕES PARA PROMOVER A MOBILIDADE ATIVA
Faz bem à saúde
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a inatividade física constitui um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento de doenças crónicas não transmissíveis, como a diabetes, a depressão, as doenças cérebro-cardiovasculares, oncológicas e respiratórias
Pelo contrário, usar a bicicleta nas deslocações quotidianas contribui para reduzir os riscos e patologias associadas ao sedentarismo, que diminuem com a prática diária de atividade física.
Complementarmente, uma redução do uso dos veículos motorizados beneficia a saúde de todos, aumentando a qualidade do ar que respiramos e reduzindo a poluição sonora, em particular nas cidades, onde a principal fonte de ruído é o tráfego motorizado.
Um contexto urbano e rodoviário mais favorável a ciclistas também contribui para moderar a velocidade excessiva de veículos motorizados, o que pode contribuir para reduzir a sinistralidade rodoviária que, no nosso país, apresenta ainda níveis elevados de vítimas mortais e feridos.
Os custos externos do uso do automóvel são de cerca de 500 000 milhões de euros por ano. Devido a efeitos positivos na saúde, pedalar de bicicleta tem um benefício externo de 24 000 milhões de euros por ano e caminhar de 66 000 milhões de euros por ano.
Fortalece a economia e cria emprego
A bicicleta é um meio de transporte económico e prático de usar. Nos percursos até 3 a 5 km, pedalar é a forma mais rápida e fiável de deslocação (Fig.1), permitindo estacionar rapidamente e mais próximo do destino, com total flexibilidade nos horários e uso racional do espaço público.
Para além de aumentar a produtividade da economia, ao reduzir o dispêndio de tempo em grande parte das deslocações urbanas, reduz os encargos com o congestionamento de tráfego nas localidades e racionaliza o uso do espaço urbano necessário para deslocações e estacionamento (Fig.2). Um maior recurso aos modos ativos em Portugal poderá reduzir os encargos diretos e indiretos associados à sinistralidade rodoviária, e tornará mais resiliente e menos dependente do exterior o sistema de transportes, equilibrando a balança comercial do país.
A deslocação ativa para o trabalho ou escola reduz o absentismo por doença, e permite significativas poupanças individuais com transportes, facilitando e alargando o acesso a oportunidades de trabalho por parte dos trabalhadores.
Mais ciclistas em circulação proporcionam maior sensação de segurança nas ruas, e mais oportunidades de interação social, beneficiando a economia de proximidade, pois o número médio de visitas a estabelecimentos comerciais tende a aumentar, bem como o nível total de consumo per capita.
(ver documento original)
Fig. 1 - Velocidade relativa dos vários meios de transporte em contexto urbano
[fonte: Comissão Europeia, Cycling: the way ahead for towns and cities (1999)].
(ver documento original)
Fig. 2 - Número potencial de pessoas transportadas num canal urbano com 3,5 m de largura, no período de uma hora
[fonte: Bota & Papendrecht, traffic operation of bicycle traffic (TU-Delft, 1991)]
Concomitantemente, o turismo com bicicleta é uma atividade sustentável e vantajosa, trazendo grandes benefícios aos territórios que o promovem, ao estimular, sem excessiva carga ambiental, o desenvolvimento de atividades económicas em zonas rurais, e potenciando a articulação com o transporte público no interior do país. De acordo com a Estratégia Turismo 2027, numa ótica de valorização dos ativos turísticos, atenuação da sazonalidade e geração de fluxos para o interior do país, as atividades turísticas associadas à utilização da bicicleta («cycling») são um relevante contributo para a diversificação da oferta e captação de procura internacional.
A integração do modo ciclável nas deslocações pendulares permite oferecer a liberdade de escolha e vantagens que a intermodalidade proporciona, ampliando significativamente a área de cobertura da rede de transportes públicos, e aumentando o retorno do investimento.
Um incremento da atividade física contribui para reduzir os pesados encargos públicos com o Serviço Nacional de Saúde (SNS), que são estimados em aproximadamente 900 milhões de euros por ano, diretamente associados ao sedentarismo e inatividade física.
A fileira industrial da bicicleta é mais trabalho-intensiva que outras no setor dos transportes, sendo Portugal um dos principais exportadores europeus, com um crescimento consistente da produção para exportação nos últimos anos, que pode ser potenciada por um aumento da procura do mercado interno e dinâmicas de promoção integradas.
É melhor para o ambiente
Os compromissos nacionais decorrentes do Acordo de Paris, no sentido de garantir a neutralidade carbónica em 2050, implicam uma progressiva descarbonização da economia, na qual os transportes têm uma parte decisiva, importando alterar profundamente os padrões de deslocação, para tornar o setor sustentável em termos ambientais.
O Roteiro para a Neutralidade Carbónica e o Plano Nacional de Energia e Clima estabelecem que, até 2030, as emissões de gases de efeito de estufa terão de ser reduzidas entre 45% e 55%, e que 45% a 47% do consumo de energia terá de ser de origem renovável. Neste contexto, as deslocações realizadas a pé ou com bicicleta constituem opções racionais do ponto de vista energético, em particular em relação ao automóvel individual, ao consumirem muito menos recursos energéticos, tornando o transporte de pessoas e bens mais eficiente. Enquanto a produção de um automóvel tem um custo ambiental de várias toneladas de CO(índice 2), produzir uma bicicleta e assegurar a sua manutenção consome escassos recursos.
Substituir a utilização do automóvel por modos ativos também reduz a poluição sonora e as emissões poluentes produzidas pelo setor dos transportes (partículas, gases de escape, poeiras de pneus e travões).
Promove a cidadania
Em pouco mais de três décadas, despromoveram-se de forma inaceitável atividades como brincar na rua ou ir de bicicleta para a escola. Na verdade, a opção pela mobilidade ativa confere mais autonomia, responsabilidade e perspetivas de exploração do mundo em redor às crianças e jovens que, no futuro, serão condutores mais conscientes, e permite poupanças significativas face ao transporte diário dos alunos em automóvel.
Uma sociedade que garante ao indivíduo liberdade para escolher andar de bicicleta nas suas deslocações quotidianas evidencia um espaço público mais democrático, que a todos serve condignamente e de igual forma, incluindo grupos mais sensíveis a condições de circulação desconfortáveis ou inseguras, como crianças, idosos, ou pessoas com mobilidade reduzida.
Adicionalmente, usar a bicicleta contribui para a humanização das cidades e promove o exercício da cidadania, a participação na vida pública e a inclusão social, reduzindo desigualdades, aumentando o sentido comunitário e o bem-estar individual e coletivo, sendo para isso indispensável que o espaço urbano garanta condições de segurança e conforto.
1.2. DIAGNÓSTICO
O que está a Europa a fazer para promover o uso da bicicleta
Tendo em conta as vantagens decorrentes da promoção da mobilidade ativa e, em particular, do uso da bicicleta, tem-se alargado o consenso ao nível europeu em torno do tema.
Um estudo encomendado pelo Parlamento Europeu em 2012 estimou em 2,2 000 milhões o número de viagens de turismo com bicicleta na União Europeia (UE), totalizando 20 milhões de estadias e um impacto económico de 44 000 milhões de euros por ano. Desde então, tem havido um investimento crescente na promoção do turismo ativo com bicicleta, nomeadamente com a promoção da Rede Eurovelo, da qual Portugal faz parte, mas também com a implementação de várias políticas nacionais de promoção do turismo com bicicleta.
A promoção da bicicleta em contexto quotidiano também tem ganho crescente visibilidade. Em 2014, a Comissão Económica das Nações Unidas para a Europa e a OMS assinaram a Declaração de Paris, comprometendo-se a iniciar o desenvolvimento de um programa europeu para promover a bicicleta, cuja proposta será votada em outubro de 2019, apoiado por diretrizes e instrumentos para apoiar a implementação de políticas nacionais.
A Federação Europeia de Ciclistas (ECF), com um grupo alargado de entidades do setor da indústria, lazer, mobilidade e desporto, apresentou à UE, em 2017, um conjunto de recomendações para a implementação de uma estratégia europeia, tendo como principais objetivos garantir igualdade no sistema de transportes para o modo ciclável, incrementar o uso da bicicleta em 50%, entre 2020 e 2030, reduzir para metade as vítimas mortais e feridos graves por Km percorrido em bicicleta, e ampliar o investimento europeu para (euro)3 000 milhões (2021-2027) e (euro) 6 000 milhões (2028-2034).
Atualmente, a fileira da bicicleta já é responsável por cerca de 650 000 postos de trabalho, sendo estimado que o número de bicicletas com assistência elétrica (EPAC) em circulação na Europa é de 6,5 milhões, número que poderá superar os 60 milhões em 2030.
A OMS lançou em 2018 o Plano Global de Promoção da Atividade Física, que pretende reduzir a inatividade física em 15% até 2030, mobilizando agentes públicos e privados numa abordagem sistémica com amplos benefícios sociais e económicos, e no qual a mobilidade ativa é peça central.
Um número relevante de países e cidades europeias está já a implementar programas integrados de promoção do uso da bicicleta, com objetivos ambiciosos (Quadro 1).
QUADRO 1
Objetivos oficiais para a utilização da bicicleta em várias cidades europeias (fonte: ECF, 2015)
(ver documento original)
Também em relação ao Desempenho Energético dos Edifícios, cuja mais recente Diretiva da UE (UE 2018/844) terá de ser transposta para as legislações nacionais até março de 2020, inclui agora referências às questões da mobilidade, nomeadamente indicações aos Estados-Membros para que tenham em consideração políticas coerentes para edifícios, mobilidade ativa e sustentável e planeamento urbano:
«(28) [...] os Estados-Membros deverão ter em conta a necessidade de um planeamento urbano holístico e coerente, bem como a promoção de modos de transporte alternativos, seguros e sustentáveis e das respetivas infraestruturas de apoio, por exemplo, através de infraestruturas de estacionamento específicas para bicicletas elétricas e para os veículos para as pessoas de mobilidade reduzida.»
Em que ponto estamos, a nível nacional?
Nos últimos anos, assistiu-se a uma inversão da tendência verificada nas últimas décadas, em relação à promoção dos modos ativos e, em particular, à bicicleta enquanto modo de transporte.
O CiclAndo (Plano para a Promoção da Bicicleta e Outros Modos Suaves), apresentado em 2012, lançou as bases para uma progressiva sensibilização para a mobilidade ativa e tornou claras as vantagens de uma mudança de paradigma.
O enorme potencial que Portugal apresenta para se tornar um destino de excelência para a prática de caminhadas e ciclismo de lazer e ciclismo de lazer está materializado no projeto nacional Portuguese Trails, constante da Estratégia Turismo 2027, o qual visa promover Portugal como destino de «Cycling e Walking» junto dos turistas nacionais e internacionais. Este projeto, promovido pelo Governo de Portugal, conta já com mais de 14 200 Km em mais de 400 de percursos cicláveis e pedestres, ao longo dos quais se oferecem 194 programas turísticos distintos, e é desenvolvido em parceria com entidades públicas locais, regionais e nacionais e empresas turísticas. Todos estes percursos estão disponíveis na plataforma www.portuguesetrails.com. Neste âmbito foi ainda desenvolvida uma proposta de Sinalização das Rotas Cicláveis. Com o apoio do Instituto Português do Desporto e Juventude, I. P. (IPDJ, I.P.) e do Instituto Nacional para a Reabilitação, I.P. (INR, I. P.), a Federação Portuguesa de Ciclismo (FPC) lançou em 2014 o Programa Nacional de Ciclismo para Todos, que tem contribuído para apoiar a transição da prática desportiva e recreativa para o contexto quotidiano, e inclui o projeto «O Ciclismo vai à Escola» que, em articulação com a Direção-Geral da Educação (DGE), está a ensinar a pedalar os alunos, alcançando em 2018 um universo de 10 000 alunos.
(ver documento original)
Nas universidades, o programa U-BIKE tem proporcionado a milhares de alunos e também a docentes e funcionários, a possibilidade de utilizarem bicicletas nas suas deslocações, mediante um pioneiro sistema de disponibilização de 2 500 velocípedes tradicionais e com assistência elétrica.
Verifica-se também uma dinâmica promissora na construção de redes municipais de ciclovias (Fig. 3 e Fig. 4). Os Planos Estratégicos de Desenvolvimento Urbano e os Planos de Ação de Mobilidade Urbana Sustentável ampliaram, ao nível municipal, o investimento disponível para apoiar alterações significativas no padrão de deslocações nas localidades. As ciclovias atualmente em fase de execução, financiadas através do Fundo de Coesão, constituirão, em 2023, uma rede ciclável nacional superior a 6 000 km (Quadro 2).
QUADRO 2
Rede ciclável existente e prevista, em Portugal Continental
(fonte: Fundo Ambiental / IMT, I. P., 2018)
(ver documento original)
A estas acrescem os mais de 850 km previstos no âmbito do Programa Portugal Ciclável 2030, destinados sobretudo à interconexão de redes municipais, o que resulta numa rede nacional em 2030, considerando apenas os planos conhecidos no presente, superior aos 7,5000 km. Importa manter o investimento dos municípios para além de 2023, de forma a que a rede completa se aproxime dos 10 000 km em 2030.
A fileira industrial da bicicleta no nosso país está a beneficiar desta tendência global (Quadro 3), e Portugal é já o terceiro maior país fabricante europeu, com uma fileira industrial localizada na Região de Aveiro, que exporta maioritariamente a sua produção.
QUADRO 3
Produção e venda de bicicletas, nível de emprego na fileira industrial em Portugal
(fonte: ABIMOTA, 2017)
(ver documento original)
No entanto, e apesar de nos últimos anos terem sido desenvolvidas várias iniciativas, o reduzido uso da bicicleta em contexto quotidiano demonstra a existência de um contexto desafiante para os ciclistas, e a necessidade de uma intervenção estruturada para mudar o paradigma da mobilidade em Portugal.
A ECF colocou Portugal na 27.ª posição em 28 países europeus em relação às condições de contexto para pedalar, devido à elevada sinistralidade e à reduzida quota modal da bicicleta. No que diz respeito à sinistralidade com peões, de acordo com a Comissão Europeia, Portugal apresenta uma taxa de mortalidade (número de mortos por milhão de habitantes) de 11,9, ligeiramente superior à média europeia de 10,6. Quanto aos utentes de velocípedes, Portugal apresenta uma taxa de mortalidade de 3,2, valor inferior à média europeia que é de 4.
(ver documento original)
Fig.5 - Percentagem da população que usa a bicicleta como principal modo de transporte
[fonte: Eurobarómetro 422a, 2014]
Por outro lado, os dados de 2014 indicam que em Portugal apenas 1% das pessoas usa a bicicleta como meio principal de transporte no dia-a-dia (Fig. 5). Apesar de andar a pé constituir o principal modo de transporte para 23% das pessoas que se deslocam no território nacional, o automóvel continua a ser usado em 47% dos casos. Também segundo os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística, I.P. (INE, I.P.) (Quadro 4), no inquérito realizado nas áreas metropolitanas, o uso do automóvel continua a ser prevalente.
QUADRO 4
Percentagem de deslocações semanais, por meio de transporte principal nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto
(fonte: Inquérito à Mobilidade nas Áreas Metropolitanas - INE, I.P., 2017)
(ver documento original)
Portugal é um dos países da UE onde menos se pratica exercício físico, constituindo a atual situação um sério problema de saúde pública, contribuindo negativamente para o bem-estar físico e mental de parte significativa da população. Os dados mais recentes mostram que 74% dos portugueses nunca ou raramente praticam exercício, e o número dos que praticam desporto de forma regular desceu de 8% em 2013 para 5% em 2017. Os próximos anos serão decisivos para recuperar o atraso significativo nesta área em relação a outros países europeus.
A partilha de bicicletas começou finalmente a ganhar escala, nomeadamente com a implementação de sistemas públicos como as GIRAS (Lisboa), cuja frota inclui bicicletas com assistência elétrica. Com efeito, a agradável experiência proporcionada pelas bicicletas assistidas eletricamente, com a qual estão a ter contacto cada vez mais pessoas, está a contribuir de forma significativa para uma mudança de perceção em relação à bicicleta enquanto meio de transporte.
Numa perspetiva de futuro para o nosso país, em que se alterará a repartição modal das deslocações dos cidadãos, reduzindo a preponderância do transporte individual motorizado e privilegiando a mobilidade ativa e os transportes públicos coletivos, há que sublinhar uma medida já tomada para todo o território nacional: o Programa de Apoio à Redução Tarifária, implementado a partir de 2019, e que permitirá uma significativa redução no preço dos passes de utilização dos transportes públicos em todo o país, constituindo um estímulo decisivo para aumentar o peso relativo do transporte coletivo e da intermodalidade, com reflexos positivos na mobilidade ativa.
Porque não temos usufruído das enormes vantagens da mobilidade ativa?
No nosso país, a cultura do automóvel e o uso do transporte individual estão profundamente enraizados e são sustentados por um contexto que tem, de uma forma geral, despromovido a mobilidade ativa.
De facto, o contexto socioeconómico e o crescimento das urbes favoreceu o uso individual dos veículos motorizados nas últimas décadas, tornando-os relativamente mais competitivos que os modos ativos (inclusive na articulação com o sistema de transportes públicos), para parte significativa da população que tem de efetuar deslocações pendulares mais extensas e nas quais a infraestrutura serve primordialmente o automóvel. As descontinuidades na rede ciclável, a semaforização desadequada, a ausência ou insuficiente visibilidade de informação útil são alguns dos fatores que desmotivam a opção por pedalar.
A última revisão do Código da Estrada (2013), incluiu alterações significativas para garantir maior segurança aos ciclistas, equiparando os velocípedes aos veículos motorizados, mas não conseguiu alterar a perceção de insegurança dos ciclistas, nem teve as consequências expectáveis na fiscalização e penalização efetiva dos incumprimentos da lei.
Apesar do nível de investimento público na promoção da mobilidade ativa ter crescido progressivamente nas localidades, as intervenções estão ainda longe, com algumas exceções, de corresponderem a estratégias integradas para promover uma efetiva mudança, em tempo útil.
A prática recreativa e desportiva é adotada por muitos ao fim de semana, mas a bicicleta continua a ser encarada, por muitos, exclusivamente como um instrumento de lazer. Abundam ainda os preconceitos e barreiras psicológicas em relação à bicicleta como meio de transporte. A sua utilização é frequentemente percecionada como pouco confortável, seja pela ausência de ciclovias, pelo clima, pela orografia, pela possível sensação de cansaço ou pelo suor excessivo, subsistindo inúmeras justificações para não pedalar. Acrescem questões relacionadas com a representação social da bicicleta enquanto brinquedo sem valor prático e associado a um estatuto social menos valorizado.
Por outro lado, existem desafios concretos para ultrapassar, nomeadamente a elevada sinistralidade rodoviária, que decorre de uma deficiente configuração e formas de uso do espaço público, prejudicando peões e ciclistas.
A insuficiência de infraestruturas e equipamentos facilitadores da mobilidade ativa e uma reduzida valorização da atividade física são aspetos que têm de ser alterados, para que o paradigma da mobilidade em Portugal evolua.
1.3. PORQUÊ UMA ESTRATÉGIA NACIONAL?
Até 2030, Portugal deve tornar-se um país no qual a deslocação individual em modos ativos representa uma experiência segura, acessível e atrativa para todos, o que apenas será possível promover adequadamente através de uma abordagem integrada, transversal e plural, centrada nas pessoas.
Atendendo à complexidade deste desafio, que deverá ser ultrapassado com enorme eficiência na utilização dos escassos recursos disponíveis, mas garantindo eficácia na obtenção de resultados, é necessário um plano estratégico de ação.
É imperativo garantir as melhores condições para uma adequada concertação política, orçamental e operacional. A presente estratégia estabelece uma abordagem global e sistematizada para a implementação de medidas concretas decorrentes de políticas de médio e longo prazo, em vários níveis de intervenção.
Com uma estratégia integrada e clara na área da mobilidade ativa, pretende-se:
. Uma contextualização e um enquadramento claros, demonstrando a vontade e compromisso políticos para o desenvolvimento do transporte ativo;
. A facilitação da adoção, ao nível nacional, de novas medidas legislativas;
. Uma visão global e estratégia comum, garantindo as melhores condições para a coordenação de políticas, objetivos, metas e ações para a mobilidade ativa (entre entidades públicas e privadas), ao nível vertical (local/regional/nacional) e horizontal (nas áreas dos transportes, saúde, educação, ambiente, economia ou outras);
. O reforço de competências dos intervenientes a diferentes níveis, promovendo também um maior intercâmbio de conhecimentos e boas práticas;
. A facilitação do acesso a financiamento de projetos e garantia de dotação orçamental adequada;
. Promover novas ofertas turísticas associadas ao uso da bicicleta, ao longo de todo o ano e em todo o território nacional;
. O combate ao sedentarismo e à inatividade física com uma abordagem integrada que garanta o acesso universal ao meio envolvente, de forma autónoma e segura.
Para a implementação da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável (ENMAC) 2020-30, adota-se o modelo conceptual ilustrado na Fig. 6. A realização da Visão e o cumprimento dos Objetivos é acompanhada por uma Comissão Interministerial e uma Rede de Pontos Focais que garantirão as condições, a coordenação e a articulação entre as múltiplas entidades que, no terreno, concretizarão as medidas previstas.
Preveem-se quatro grandes áreas transversais: Enquadramento e Legislação, Investigação e Desenvolvimento, Monitorização e Avaliação, e Financiamento. A estas acrescem três eixos específicos de intervenção: Infraestruturas e Intermodalidade, Capacitação e Apoio, e Cultura e Comportamentos.
(ver documento original)
Fig. 6 - ENMAC (2020-30) - Modelo conceptual de implementação
2. VISÃO E OBJETIVOS
O diagnóstico da mobilidade a nível nacional permite identificar um predomínio das deslocações em automóvel, com impactos no consumo energético, no aumento das emissões de CO(índice 2) e de poluentes atmosféricos, do ruído, de congestionamentos de tráfego e, consequentemente, impactos negativos na competitividade económica, saúde pública e qualidade de vida.
O desaproveitamento do potencial do sistema de transportes públicos tem ainda consequências negativas quanto à mobilidade, à acessibilidade e à exclusão social.
Os problemas relacionados com a mobilidade colocam-se, de forma particularmente acentuada, nas cidades, quer por via das externalidades negativas que lhe estão associadas, quer pela qualidade do espaço público, desenhado muitas vezes a pensar no automóvel, com impacto na qualidade de vida dos cidadãos. Por isso, é necessário agir concertadamente nos domínios que influenciam a mobilidade, desde o urbanismo e uso do solo aos transportes. A massificação dos modos ativos não representa um fim em si mesmo, mas constitui um contributo significativo para uma sociedade dinâmica, próspera e inclusiva, com enormes vantagens para indivíduos e comunidades.
O nosso país apresenta um enorme potencial para a mobilidade ativa, que deve ser aproveitado e concretizado para benefício de todos. No entanto, para atingir níveis de sucesso comparáveis aos de outros países europeus, é fundamental ser criativo e inovador na implementação de políticas, adaptando boas práticas internacionais aos contextos nacional e local.
Em 2030, qualquer cidadão em Portugal deverá poder optar naturalmente por deslocar-se em bicicleta. Para tal, será necessário mobilizar um elevado número de diferentes agentes para este desígnio nacional, que possam contribuir para o desenvolvimento de uma sociedade ativa, que valoriza, apoia e celebra o andar de bicicleta, em todas as suas formas: na estrada e fora de estrada, em deslocações quotidianas, atividades de recreio e prática desportiva.
Para garantir a maior eficiência e eficácia no uso dos recursos disponíveis, é importante o estabelecimento de um plano de ação, centrado nos utilizadores finais (peões e ciclistas), e devidamente orientado para os resultados, para maximizar o retorno do investimento.
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2.1. FATORES CRÍTICOS DE SUCESSO
Para que a estratégia seja implementada com sucesso, é necessário garantir um conjunto de requisitos, sem os quais não será possível atingir os resultados esperados.
- Compromisso político continuado
- Estimular o envolvimento de «stakeholders» relevantes, como ministérios, administração pública central, regional e local, bem como outras instituições públicas e privadas, e a sociedade civil;
- Integrar os objetivos para a mobilidade ativa nos processos de gestão e planeamento urbano e de infraestruturas.
- Financiamento adequado, oportuno e transversal aos três eixos de intervenção
- Promover políticas e ações favoráveis ao transporte ativo nos três eixos específicos de intervenção: infraestruturas e intermodalidade, capacitação e apoio, e cultura e comportamentos.
- Estratégias locais de intervenção
- Fomentar abordagens adequadas às especificidades locais na gestão da mobilidade ativa.
- Recursos humanos dedicados e competentes
- Promover a internalização de prioridades e competências específicas nas instituições.
- Melhoria contínua de produtos, processos e serviços
- Assegurar monitorização abrangente, consistente e comparável, e avaliação crítica de resultados obtidos;
- Incentivar a pesquisa, análise e reflexão crítica e fundamentada.
- Foco nas crianças e jovens em idade escolar
- Criar condições para uma mudança drástica de comportamentos nas novas gerações.
- Foco nas pessoas com deficiência
- Assegurar boas condições de acessibilidade ao espaço público para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.
METAS 2030
- Quota modal de viagens em bicicleta no território nacional de 7,5%
- Quota modal de viagens em bicicleta nas cidades de 10%
- Extensão total de ciclovias de 10 000 Km
- Redução da sinistralidade rodoviária de ciclistas em 50%
As metas relativas à quota modal deverão resultar diretamente da redução da utilização do transporte automóvel privado.
Para que seja assegurada uma correta avaliação e monitorização dos resultados da ENMAC são ainda definidas metas intermédias para 2025.
METAS 2025
- Quota modal de viagens em bicicleta no território nacional de 3%
- Quota modal de viagens em bicicleta nas cidades de 4%
- Extensão total de ciclovias de 5 000 Km
- Redução da sinistralidade rodoviária de ciclistas em 25%
Em relação à infraestrutura, a qualidade deverá acompanhar a quantidade, nomeadamente ao nível do desenho/construção das vias, localização e manutenção.
O objetivo de redução da sinistralidade de peões e ciclistas pressupõe um reforço de políticas de prevenção de risco rodoviário, mas também uma evolução nos métodos de recolha de dados.
2.2.RESULTADOS ESPERADOS
O aumento da utilização dos modos ativos oferece benefícios concretos para a sociedade, contribuindo significativamente para a melhoria generalizada da qualidade de vida. Indicam-se em seguida alguns dos benefícios esperados, por área.
Saúde
- Potencial redução das vítimas de sinistralidade rodoviária;
- Melhoria nos níveis gerais de saúde e bem-estar da população;
- Redução do sedentarismo, obesidade e inatividade física;
- Redução da incidência de problemas respiratórios nas localidades.
Economia e Emprego
- Incremento do turismo ativo;
- Redução do peso dos combustíveis fósseis no setor dos transportes;
- Aumento do emprego e da criação de valor na fileira industrial da bicicleta;
- Redução de custos com congestionamento de tráfego;
- Redução do absentismo laboral e escolar;
- Aumento da cobertura e utilização dos transportes públicos;
- Incremento do comércio de proximidade;
- Redução de encargos do SNS;
- Redução de encargos com sinistralidade rodoviária.
Ambiente
- Redução das emissões poluentes e de gases com efeito de estufa no setor dos transportes;
- Redução da poluição sonora;
- Promoção de um sistema de transportes eficiente e sustentável;
Cidadania
- Localidades mais seguras, acessíveis e atrativas, privilegiando o transporte ativo
- Redução de desigualdades sociais no acesso ao trabalho, educação e consumo;
- Aumento da independência de mobilidade entre os mais jovens e pessoas com mobilidade reduzida
3. LIDERANÇA E GOVERNANÇA
A presente estratégia será implementada ao longo da próxima década, após um ano de planeamento e preparação (2019), e concretizar-se-á em medidas detalhadas, devidamente orçamentadas e calendarizadas, prevendo-se as seguintes etapas:
Fase 1 (2019)
Preparação de documento orientador, com diagnóstico atual, identificação de vantagens e razões para uma estratégia nacional, definição de metas, medidas a implementar e auscultação de stakeholders.
Fase 2 (2019)
Criação de Rede de Pontos Focais, a quem compete dinamizar e acompanhar a execução das medidas, atuando junto das entidades responsáveis, bem como a definição do quadro de monitorização e avaliação.
Fase 3 - Implementação (2020-2030)
Em cada ano, aprovação dos pacotes de medidas. Implementação de sistema de controlo e gestão, financiamento, comunicação, desenvolvimento de atividades, implementação de medidas, monitorização e avaliação.
3.1. COORDENAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS AO NÍVEL CENTRAL E LOCAL
3.1.1. Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável
Atendendo à natureza transversal da estratégia a implementar, as políticas governamentais serão devidamente articuladas, garantindo a orientação para os objetivos. Para o efeito, é criada uma Comissão Interministerial para a Mobilidade Ativa Ciclável, que reunirá ordinariamente três vezes por ano, integrando pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna, das autarquias locais, da economia, da ciência, tecnologia e ensino superior, da educação, do desporto, do trabalho, da saúde, das infraestruturas, do ambiente, da mobilidade e da energia.
3.1.2. Rede de Pontos Focais
A coordenação da ENMAC será assegurada por uma Rede de Pontos Focais, a quem compete dinamizar e acompanhar a execução das medidas, atuando junto das entidades responsáveis e reportando à Comissão Interministerial. Esta Rede de Pontos Focais é constituída por representantes das seguintes entidades:
- Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P. (IMT, I. P.), que preside;
- DGE;
- Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR);
- Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP);
- Infraestruturas de Portugal, S.A..
A Rede de Pontos Focais deverá interagir com entidades públicas ou privadas, como as associações de peões, utilizadores de bicicleta ou pessoas com mobilidade reduzida deficiência, mas também de setores económicos interessados na promoção da mobilidade ativa.
Junto da Rede de Pontos Focais funcionará um Conselho Consultivo composto pelas seguintes entidades:
- FPC;
- Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta;
- Associação para a Mobilidade Urbana em Bicicleta;
- Laboratório Nacional de Engenharia Civil, I. P. (LNEC, I.P.);
- Agência Portuguesa do Ambiente, I. P.;
- Instituto do Turismo de Portugal, I. P..
3.1.3. Identificar e mobilizar elementos, recursos e canais de contacto direto
A pluralidade de estruturas a envolver torna imprescindível a adequada definição e temporização das respetivas áreas de intervenção no âmbito da estratégia, bem como os recursos disponíveis, identificando sinergias potenciais e canais de contacto direto.
3.1.4. Integrar a mobilidade ativa nas políticas públicas, de forma concreta
Para explorar o potencial de sinergias com programas e iniciativas nacionais ou locais, serão garantidas boas condições para andar de bicicleta nos instrumentos de planeamento em áreas como o turismo, a saúde, o ambiente, o desporto, o urbanismo, a educação, ou a inclusão social, proporcionando o devido apoio político por parte da administração central.
3.2. GARANTIA DE PROCESSOS PARTICIPADOS
3.2.1.Criar Fóruns da Mobilidade
Para maximizar o impacto, visibilidade e participação nas medidas a implementar, todas as entidades relevantes, do setor público, privado e associativo, serão periodicamente envolvidas, garantindo espaços específicos de debate e discussão sobre a mobilidade ativa e acessibilidade, em eventos destinados a fomentar a reflexão e discussão, à escala nacional, regional e local.
3.2.2. Reforçar a participação pública
Os processos participativos serão promovidos e generalizados, simplificando e tornando acessível a auscultação de cidadãos e entidades sobre a implementação de políticas de promoção da mobilidade ativa, tornando evidentes as respetivas vantagens perante a população, para contextos concretos e delimitados.
4. ENQUADRAMENTO E LEGISLAÇÃO
Um adequado enquadramento regulatório nacional constitui a base para garantir as melhores condições de segurança e conforto e o incentivo para os utilizadores de modos ativos de transporte, aumentando a atratividade em relação ao transporte individual motorizado.
Por outro lado, e considerando que as necessidades de deslocação são tanto maiores quanto maior a dispersão das atividades no território, importa que as estratégias de gestão do território articulem o uso do solo - as atividades a instalar, a compacidade e a densidade de ocupação - com a acessibilidade proporcionada pelas infraestruturas e pelos serviços de transporte, de modo a estabelecer níveis adequados de conectividade entre os espaços. Ao nível territorial, deve ser incentivado o compromisso de cada município com a mobilidade ativa e a acessibilidade, através da adoção de medidas concretas, adequadas ao contexto e sustentadas no tempo.
Adicionalmente, importa mitigar a utilização do transporte individual através da promoção de transportes públicos, investindo na melhoria da qualidade dos serviços prestados e numa progressiva articulação com os modos ativos de transporte, contribuindo para um sistema mais sustentável e inclusivo, e para a melhoria da qualidade de vida de todas as pessoas.
4.1. ENQUADRAMENTO REGULATÓRIO GARANTINDO SEGURANÇA E CONFORTO DE CICLISTAS
4.1.1. Aperfeiçoar o Código da Estrada
Apesar de a recente revisão do Código da Estrada ter vindo garantir mais direitos aos utilizadores vulneráveis, subsistem aspetos a rever, de forma participada, para tornar mais segura e fácil a circulação com bicicleta, introduzindo regras mais consentâneas com a regulação adequada do tráfego urbano, e que constituam um «Código da Rua». Tendo em conta a experiência comprovada em outros países, deverão ser avaliadas soluções inovadoras que favoreçam de forma clara a circulação com bicicleta. Também será avaliada a possibilidade de transportar bicicletas no exterior de veículos pesados de transporte de passageiros.
4.1.2. Rever e publicar o Regulamento de Sinalização de Trânsito
O Regulamento de Sinalização de Trânsito associado à última revisão do Código da Estrada será publicado nos termos da lei, e incluirá sinalética horizontal e vertical específica e adequada para velocípedes.
4.1.3. Avaliar a atenuação da culpa do lesado como causa de exclusão ou redução da indemnização em caso de responsabilidade objetiva
Colocar-se-á em discussão, de forma participada, com o apoio de juristas e instituições públicas e privadas, uma proposta que garanta mais condições de segurança para ciclistas, levando em consideração a maior vulnerabilidade dos modos ativos de transporte.
4.1.4. Avaliar o alargamento do âmbito do Fundo de Garantia Automóvel
Avaliar-se-á a possibilidade de ampliação da cobertura do Fundo de Garantia Automóvel, salvaguardando o seu equilíbrio financeiro, para abranger sinistros envolvendo ciclistas, tal como já sucede atualmente para veículos motorizados que circulam na via pública sem seguro de responsabilidade civil, tornando-se um «Fundo de Garantia Rodoviário».
4.1.5. Avaliar o alargamento do âmbito e cobertura dos patrulheiros de trânsito
A atividade de apoio à mobilidade ativa por parte de «patrulheiros» será avaliada, com vista à adequada capacitação de elementos civis que contribuam para tornar mais segura a circulação junto a escolas e equipamentos de saúde, cultura e educação, priorizando os que possuem volume significativo de peões, facilitando o desenvolvimento de pedibus e ciclobus, bem como a realização de atividades com bicicleta, em articulação com as autoridades competentes.
4.1.6. Melhorar a legislação sobre condições de trabalho
Serão asseguradas aos trabalhadores boas condições para se deslocarem de bicicleta para o local de trabalho, em particular balneários e vestiários, com caráter obrigatório para médias e grandes empresas de qualquer setor de atividade. Nos complexos industriais ou parques empresariais deverão ser disponibilizados equipamentos e serviços incentivando o uso de bicicletas partilhadas no interior dos mesmos.
4.1.7. Avaliar o alargamento da cobertura do seguro escolar
Será avaliada a possibilidade de incluir na cobertura do seguro escolar os acidentes envolvendo alunos que se deslocam para a escola com velocípede.
4.2. REGULAÇÃO TERRITORIAL FAVORECENDO OS MODOS ATIVOS DE TRANSPORTE
4.2.1. Contemplar as redes e cicláveis nos instrumentos de gestão territorial
A gestão do território pressupõe uma abordagem integrada e articulada com as orientações de desenvolvimento territorial decorrentes dos programas de âmbito nacional, regional e sub-regional. O plano diretor municipal, sendo o instrumento de referência para a elaboração dos demais planos municipais e outros documentos orientadores, deverá explicitar a estratégia e as opções de base territorial para o favorecimento dos modos ativos em geral e, em particular, das redes de percursos cicláveis estruturantes, especificando os parâmetros de referência.
4.2.2. Assegurar a articulação intermunicipal no desenvolvimento de redes
A implementação de redes cicláveis deverá ser concertada entre as comunidades intermunicipais (CIM), as áreas metropolitanas ou entre os respetivos municípios, garantindo desenho compatível, continuidade de traçados e adequada manutenção.
4.2.3. Incluir mecanismos de promoção da mobilidade ativa na legislação
Os regulamentos municipais realizados no âmbito da urbanização e ou de edificação deverão especificar os aspetos morfológicos e estéticos a que devem obedecer os projetos de urbanização e edificação (públicos e privados), garantido a concretização e execução de lugares para o estacionamento de bicicletas. Deverá ser avaliada a revisão de outros regulamentos que possam potenciar os modos ativos de transporte, como, por exemplo, o atual Regulamento de Passagens de Nível, ou a regulamentação relativa a lugares de estacionamento, que deverá privilegiar a garantia de requisitos mínimos para bicicleta e de limites máximos para estacionamento automóvel.
4.2.4. Regular cargas e descargas de mercadorias em zonas urbanas
Deverá ser potenciada a implementação de normas de promoção de bicicletas de carga nos sistemas de logística, explorando as vantagens relativas dos veículos híbridos para entregas e recolhas, em particular no primeiro e último Km, face a outros modos de transporte.
5. INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
Atualmente existe abundante informação disponível sobre as diferentes dimensões associadas à promoção e implementação de políticas de mobilidade ativa. Importa, contudo, aprofundar e partilhar conhecimento relevante e de qualidade sobre a realidade nacional, nos seus diversos contextos.
5.1. APROFUNDAMENTO E DISSEMINAÇÃO DO CONHECIMENTO TÉCNICO E CIENTÍFICO
5.1.1. Apoiar a investigação aplicada ao contexto nacional
Estimular-se-á a produção de conhecimento técnico e científico, com vista a ampliar os resultados da implementação de políticas de promoção dos modos ativos, atendendo às especificidades locais e operacionais e ao público-alvo, criando linhas de investigação focadas nos modos ativos, no âmbito do sistema científico e tecnológico nacional, e articulando o sistema académico com outras instituições e com a indústria.
5.1.2. Promover a partilha de conhecimento especializado
Para garantir mais eficiência e eficácia no desenvolvimento e implementação de novos produtos, materiais e processos, facilitar-se-á o acesso a informação adequada sobre conceitos, iniciativas, boas práticas e estudos de caso, em áreas tão diversas como a indústria, ambiente, sociologia, legislação, sistemas de informação ou marketing. A articulação entre a academia e outros agentes públicos e privados será estimulada.
6. EIXO DE INTERVENÇÃO #1: INFRAESTRUTURAS E INTERMODALIDADE
Nas últimas décadas, conferiu-se ao uso do automóvel particular uma primazia excessiva, em particular dentro das localidades, afetando negativamente a qualidade do espaço público e o seu potencial de fruição por parte de todos e limitando o usufruto dos modos ativos.
De forma a inverter significativamente esta tendência, é da maior importância adaptar o contexto físico às necessidades concretas dos utilizadores, cujos comportamentos são condicionados pela segurança, acessibilidade e atratividade que cada modo de transporte apresenta em relação a outros.
Para promover a mobilidade ativa, deve ser aplicada uma priorização efetiva de tipos de uso dos canais de circulação, particularmente em meios urbanos, onde o espaço é um bem escasso que importa distribuir adequadamente, para circulação ou estacionamento. Neste sentido, deverá ser prioritária a disponibilização de vias adequadas para as deslocações pedonais, que agregam todas as outras, bem como canais de circulação em bicicleta e acesso a transportes públicos.
As alterações e melhorias na infraestrutura devem ser devidamente planeadas, em articulação com outros planos com potencial de complementaridade, maximizando os efeitos de rede e a relação custo-benefício quanto ao impacto real nos padrões de mobilidade.
Em relação à promoção do uso da bicicleta, as redes de ciclovias podem funcionar como autênticas incubadoras, tornando mais visíveis os ciclistas, conferindo maior sensação de segurança, e incentivando a prática junto de um público mais alargado. E devem permitir também a circulação confortável com outros meios de transporte como trotinete, skate ou patins. No entanto, a partilha da rodovia entre os diferentes utilizadores é também uma opção adequada para generalizar a utilização quotidiana da bicicleta nas localidades, tendo em conta que não é possível segregar o tráfego rodoviário em todas as vias, o que pressupõe um aumento das zonas de coexistência.
Em contextos urbanos, recomenda-se a adoção de soluções diferenciadas, de acordo com fatores como a «caminhabilidade», o risco rodoviário ou a intensidade e velocidade do tráfego automóvel. Por exemplo, em cidades onde a opção pelos modos ativos implica ainda um desconforto ou risco relativamente elevados, poderão ser identificados bairros ou zonas com elevado potencial para efetuar intervenções que melhorem a qualidade do espaço público para os utilizadores vulneráveis, bem como medidas de acalmia de tráfego que reduzam a velocidade e a circulação automóvel. Complementarmente, em locais onde já existam áreas seguras e confortáveis para pedalar, poderão ser privilegiadas a eliminação de pontos críticos, a melhoria das ligações entre zonas seguras ou a criação de infraestrutura dedicada de qualidade, nomeadamente em vias com elevado potencial de utilização, densificando a rede pedonal e ciclável, ou equacionando a disponibilização de bicicletas partilhadas, bem como outros equipamentos (elevadores, escadas rolantes, rampas, estacionamentos para bicicleta, etc.).
Uma elevada taxa de utilização de transportes públicos, em combinação com soluções de mobilidade ativa, como circular com bicicleta, garante um sistema de transportes e mobilidade para todos. É importante articular adequadamente os modos ativos e o sistema de transportes públicos para potenciar o uso de alternativas ao transporte individual motorizado.
Os sistemas públicos de bicicletas partilhadas (que podem incluir bicicletas com assistência elétrica, bicicletas de carga ou bicicletas adaptadas para pessoas com deficiência) disponibilizam um serviço de mobilidade que apresenta muitas vantagens, e permite multiplicar os benefícios do investimento em infraestruturas dedicadas, mas também nos transportes públicos.
6.1. MOBILIDADE ATIVA FÁCIL E ATRATIVA, COM INFRAESTRUTURA ADEQUADA
6.1.1. Desenvolver e aplicar um guia de normas nacionais para intervenções físicas
A elaboração de um guia de normas técnicas para infraestrutura e equipamentos, em contexto público e privado, adaptando boas práticas internacionais à realidade nacional, tornará comum e acessível a implementação de soluções adequadas e atrativas para ciclistas e compatíveis com os diferentes usos.
6.1.2. Privilegiar, priorizar e promover a implementação de intervenções ligeiras
Intervenções pontuais podem apresentar um retorno efetivo superior a grandes obras, e a execução de projetos-piloto permite aferir com baixo custo a adequabilidade de soluções permanentes, testando com firmeza, e em contextos delimitados, a implementação de processos de mudança. As operações de regeneração urbana constituem excelentes oportunidades para promover alterações no desenho urbano, tal como as iniciativas temporárias ou periódicas (por exemplo, zonas sem carros), que podem ser progressivamente alargadas.
6.1.3. Eliminar descontinuidades e obstruções nas vias para ciclistas
Para melhorar as condições de circulação nas localidades para os utilizadores vulneráveis, serão identificadas e eliminadas interrupções na rede ciclável, bem como pontos críticos ao nível da segurança efetiva e percecionada.
6.1.4. Generalizar medidas de acalmia de tráfego em zonas urbanas
Serão ativamente promovidas medidas de acalmia de tráfego, com implementação de zonas de coexistência, que proporcionem a necessária segurança a peões e ciclistas. O tráfego de atravessamento será despromovido no centro das localidades, em particular nas imediações de estabelecimentos escolares.
6.1.5. Tornar as interseções para ciclistas seguras e confortáveis
Os cruzamentos, atravessamentos e outras interseções para ciclistas garantirão adequadas condições para uma utilização universal, recorrendo quando necessário a soluções inovadoras como bike boxes.
6.1.6. Massificar a instalação de estacionamentos de bicicleta
Disponibilizar-se-á estacionamento para bicicletas em todos os destinos que constituam polos geradores e atratores de deslocações, privilegiando o recurso a soluções técnicas padronizadas, garantindo condições de segurança (através, por exemplo, de estacionamento tipo Sheffield) e visando o conforto dos ciclistas, com localização prática e acessível e em quantidade adequada à procura.
6.1.7. Facilitar a mobilidade ativa nas zonas urbanas
A construção, adaptação e manutenção de infraestruturas dedicadas destina-se a encurtar e tornar os trajetos com bicicleta os mais atrativos. É particularmente importante cuidar da qualidade do espaço público e do índice de «caminhabilidade» em áreas envolventes a equipamentos geradores e atratores de deslocações (interfaces de transportes, hospitais, escolas e outros edifícios públicos). Nas zonas urbanas com elevado potencial de utilização, deverão ser desenvolvidos planos de mobilidade ativa, com definição de vias radiais (primárias e diretas) e vias tranquilas (menos diretas, com acesso a comércio e equipamentos). Deverá ser promovida a arborização de canais e zonas de circulação a pé e com bicicleta, articulando as infraestruturas verdes com as infraestruturas cinzentas de circulação, garantindo mais sombra, conforto térmico e psicológico, e contribuindo para reduzir a exposição de ciclistas a fontes de poluição atmosférica e sonora.
6.1.8. Criar e mapear redes cicláveis intermunicipais de excelência
Serão implementados eixos intermunicipais estratégicos com ligações diretas e interconectadas e potenciando redes já existentes ou em execução. Fora das localidades, estimular-se-á o desenvolvimento de ecovias (com percursos calmos e atrativos, com pouco ou nenhum tráfego automóvel e forte potencial para ligação intermunicipal, podendo incluir troços fora de estrada). As ligações entre localidades garantirão a existência de condições de circulação confortáveis para ciclistas. As intervenções físicas e a sinalética respeitarão elevados padrões de qualidade, sendo mantidos de forma diligente, com limpeza e tratamento regular da superfície e, sempre que seja adequado, a compatibilização com o uso pedestre.
6.1.9. Promover percursos cicláveis para desporto e lazer
A prática de atividades de recreio com bicicleta, estimulando o turismo ativo e de natureza, assim como a prática desportiva, serão incentivados e apoiados, com mapeamento, sinalização e manutenção de percursos adequados, em estrada e fora de estrada. Serão identificados pontos de articulação e potenciais sinergias com percursos pedestres já existentes e em desenvolvimento, assim como com a Rede Nacional de Ecopistas, os Centros e Percursos «Cyclin' Portugal», ou a rede Eurovelo, para bicicletas, bem como o Portuguese Trails enquanto projeto nacional de dinamização e promoção nacional e internacional da oferta de percursos pedestres e cicláveis.
6.2. PROMOÇÃO DA INTERMODALIDADE E INTEGRAÇÃO COM TRANSPORTES PÚBLICOS
6.2.1. Intervir junto dos operadores de transporte público
Será garantida a plena acessibilidade ao transporte público por parte de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, incluindo infraestruturas, material circulante e sistemas de informação. O transporte de bicicletas, bem como de cadeiras de rodas (manuais ou elétricas) tornar-se-á tendencialmente prático e acessível, em modo ferroviário, fluvial e, em situações justificadas, em modo rodoviário, nas deslocações interurbanas e urbanas. As zonas de embarque e desembarque em interfaces de transporte incluirão opções seguras, práticas, autónomas e acessíveis. Os estacionamentos para bicicletas deverão servir adequadamente a procura. As condições de utilização de paragens e estações serão revistas, tornando mais atrativos e seguros os embarques e desembarques de passageiros, e mais eficientes e confortáveis os tempos de espera.
6.2.2. Fomentar a implementação de sistemas públicos de bicicletas partilhadas
A disponibilização de bicicletas como um serviço de transporte apresenta um enorme potencial para generalizar o seu uso, em particular quando os sistemas incluem veículos assistidos eletricamente, que permitem experienciar os percursos como praticamente planos. Para garantir o seu sucesso e ampliar a cobertura da rede de sistemas públicos de partilha de bicicletas, assegurar-se-á uma adequada cobertura territorial com estações bem localizadas e visíveis, junto de equipamentos e interfaces de transporte.
7. EIXO DE INTERVENÇÃO #2: CAPACITAÇÃO E APOIO
É necessário intervir junto de indivíduos e instituições para disseminar as competências essenciais para promover a alteração dos atuais padrões de mobilidade, ampliando drasticamente o número de deslocações que não depende do automóvel particular. Para tal, é necessário formar crianças, adultos, profissionais e decisores para a mobilidade ativa, inclusiva e sustentável e para a cidadania rodoviária. Mas também é imprescindível garantir condições de segurança e conforto para todos os que pretendem deslocar-se com bicicleta, garantindo que a legislação é efetivamente cumprida. Atendendo aos ganhos concretos em áreas como a saúde (redução de encargos com o SNS, redução de vítimas de sinistralidade rodoviária), economia (aumento da produtividade pela redução de congestionamentos e absentismo laboral), e ambiente (redução de emissões), o quadro de benefícios deverá refletir as externalidades positivas associadas à mobilidade ativa.
7.1. INTERVENÇÃO JUNTO DE PEÕES, CICLISTAS E AUTOMOBILISTAS
7.1.1. Desenvolver um quadro de referência nacional para ensinar a pedalar
Será desenvolvido um referencial de formação para crianças e adultos, visando apoiar o desenvolvimento de competências para pedalar em condições de conforto e segurança, em contexto protegido (nível básico) e em meio rodoviário (nível avançado), incluindo manutenção da bicicleta e cidadania rodoviária. Este quadro de referência incluirá a formação, certificação e acompanhamento de monitores devidamente qualificados para ensinar crianças e adultos.
7.1.2. Incluir o ciclismo como matéria extracurricular
Sendo uma competência básica com múltiplas vantagens para o indivíduo e para a sociedade, será avaliada a oportunidade de os alunos aprenderem a pedalar, num processo de formação opcional faseado ao longo dos vários níveis de escolaridade, em perímetro delimitado e seguro (escola - 1.º ciclo), mas também em espaço público (rodovia - 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário).
7.1.3. Estimular a mobilidade ativa junto de pessoas com deficiência
A atividade física e a adoção de estilos de vida ativos constituem fatores de reabilitação e integração, favorecendo a autoestima e a autonomia de pessoas com deficiência motora ou intelectual. Serão garantidas condições apropriadas para promover a autonomia nas deslocações a pé ou com cadeiras de rodas, em articulação com os Balcões de Inclusão, bem como para aprender a pedalar em contexto de recreio ou de deslocações quotidianas, por exemplo através de sistemas de empréstimo de bicicletas, cadeiras de rodas e disponibilização de outros equipamentos adaptados, particularmente em contexto escolar e em instituições do setor.
7.1.4. Reforçar a formação para a cidadania rodoviária
A formação para obtenção de carta de condução de veículos motorizados, bem como a sensibilização de pré-condutores, será objeto de revisão profunda, de forma a incluir nas aulas e exames uma sólida componente específica orientada para a proteção dos utilizadores mais vulneráveis da rodovia, e para a redução progressiva e generalizada da sinistralidade («Visão Zero»).
7.2. FORMAÇÃO ESPECÍFICA PARA PROFISSIONAIS
7.2.1. Promover competências técnicas e académicas
Professores do ensino básico e secundário, mas também técnicos em áreas como a arquitetura, a engenharia e o turismo, no setor privado e público (nomeadamente nos municípios), terão ao seu dispor recursos formativos, devidamente acreditados, em várias dimensões necessárias à promoção da mobilidade ativa e acessibilidade para todos. A disponibilização de formação universitária especializada ampliará as competências profissionais no mercado interno. Os auditores de segurança rodoviária deverão estar devidamente sensibilizados e capacitados para os aspetos relacionados com os utilizadores vulneráveis e a infraestrutura para estes utilizadores.
7.2.2. Melhorar a formação de motoristas
Os condutores profissionais com habilitações específicas devem estar particularmente preparados para lidar com o trânsito de forma responsável e serão alvo de ações periódicas de formação com módulos específicos dedicados à segurança de ciclistas.
7.2.3. Formar formadores de utilizadores profissionais
Serão desenvolvidas plataformas para a formação e certificação de monitores para ensinar a pedalar em contextos específicos, como o transporte de mercadorias em bicicleta de carga ou a utilização da bicicleta pelas forças de segurança e proteção civil.
7.2.4. Criar um centro de informação interdisciplinar
A disponibilização online de recursos técnicos gratuitos e acessíveis para apoiar municípios e outras entidades a planear e implementar soluções de mobilidade ativa é da maior premência, para afetar positivamente os projetos previstos e em execução, e apoiar o planeamento de projetos futuros.
7.3. CAPACITAÇÃO DE DECISORES
7.3.1. Promover um encontro nacional - Cimeira da Mobilidade Ativa
A realização de um grande evento periódico estimula a concertação e implementação de medidas entre as várias instituições e níveis de governo e contribui para manter e reforçar o compromisso político com os objetivos, conferindo também maior visibilidade ao tema.
7.3.2. Realizar ações locais de capacitação e discussão
A promoção de iniciativas de escala local ou regional que fomentem a discussão e ampliem a rede de stakeholders envolvidos (municípios, empresas, profissionais, etc.), constitui uma forma adequada para interligar estratégias nacionais e locais, partilhar informação, disseminar boas práticas, estimular a criação de parcerias ou apresentar resultados de intervenções ou estudos e propostas inovadoras.
7.4. FISCALIZAÇÃO DE INCUMPRIMENTOS LEGAIS E REGULAMENTARES
7.4.1. Promover a dimensão preventiva no cumprimento do Código da Estrada
Embora o Código da Estrada já preveja regras de proteção aplicáveis aos utilizadores vulneráveis, nomeadamente os utilizadores de bicicleta, é de esperar que com o aumento da utilização da bicicleta haja necessidade de adaptação do padrão de comportamento dos condutores, pelo que se pretende intensificar a sua prevenção. Será também avaliada a revisão de normativos técnicos que possam facilitar esta efetiva prevenção pelas entidades competentes.
7.4.2. Aumentar o número de agentes da autoridade de bicicleta
O aumento de agentes da autoridade usando a bicicleta no desempenho das suas funções, em particular nas localidades, contribuirá para a afirmação dos modos ativos enquanto opções de deslocação plenamente integradas e legitimadas e melhorará a capacidade de intervir e fiscalizar adequadamente os incumprimentos do Código da Estrada.
7.5. INCENTIVOS
7.5.1. Implementar medidas de apoio à aquisição de bicicletas
Tendo em conta o maior potencial de substituição do automóvel nas deslocações, a aquisição de bicicletas elétricas de perfil urbano será apoiada e contemplada nas medidas de incentivo e promoção destinadas aos veículos de baixas emissões.
7.5.2. Incrementar os benefícios para entidades públicas e privadas
Serão apoiadas as adaptações necessárias para tornar os locais de trabalho confortáveis para quem prefere usar a bicicleta. O investimento em frotas de bicicletas para fins profissionais será incentivado e apoiado, bem como a equiparação da bicicleta ao automóvel como veículo de serviço.
8. EIXO DE INTERVENÇÃO #3: CULTURA E COMPORTAMENTOS
O desenvolvimento de uma rede ciclável adequada e acessível, que potencie o recurso aos modos ativos de transporte e a devida articulação com os transportes públicos [eixo #1], e a garantia das melhores condições para capacitar e apoiar utilizadores, técnicos, dirigentes e instituições [eixo #2] não são suficientes para implementar com sucesso esta estratégia nacional de promoção da mobilidade ativa. A atual prevalência do uso do automóvel na sociedade portuguesa não resulta necessariamente de uma escolha livre, mas de um conjunto de circunstâncias socioeconómicas, infraestruturais e culturais, que condicionaram ao longo de décadas os padrões de mobilidade. Assim, é também necessário mudar comportamentos enraizados, num processo que não é imediato nem linear e que requer liderança e compromisso político sólido e continuado.
Promover a adoção de comportamentos favoráveis aos modos ativos implica um esforço integrado de marketing e comunicação - incluindo campanhas continuadas e consistentes de sensibilização, eventos e atividades impactantes, bem como uma educação que promova a mobilidade sustentável e a cidadania rodoviária - orientado para estimular uma profunda mudança de atitudes. A prática do ciclismo em contexto quotidiano deve ser promovida em todos os grupos-alvo significativos, relevando as vantagens para o bem-estar, flexibilidade, eficiência e fiabilidade que esta proporciona nas deslocações individuais. Em contexto recreativo, deverão ser promovidas atividades que incentivem o recurso a modos ativos de transporte, como passeios e viagens com bicicleta.
Este processo deverá também ser assegurado na esfera dos direitos das pessoas com deficiência, na perspetiva da educação para a cidadania associada à promoção da acessibilidade.
Trata-se de uma evolução cultural que requer a concretização com sucesso de uma estratégia de longo prazo, mas que proporcionará efeitos sociais positivos e duradouros, que serão particularmente ampliados se se mobilizarem instrumentos adequados para captar para esta opção todos os grupos de cidadãos sem qualquer tipo de discriminação.
A alteração de comportamentos será previsivelmente progressiva, calibrando a atratividade relativa dos diferentes modos de transporte, de acordo com os diferentes contextos. Tornar mais atrativa a opção pelos modos ativos só terá efeitos práticos se esta for favorável em comparação com outras soluções de transporte. Deslocar-se em bicicleta não deverá ser percecionado como opção secundária ou desprestigiante.
É fundamental mudar a cultura do cidadão face à rua, pois o espaço público existe para servir, acima de tudo, as pessoas e as suas necessidades. Pedalar deve ser uma atividade normal e segura para todos, independentemente das suas necessidades específicas. A sociedade deverá incentivar e promover a mobilidade ativa e o uso do transporte público, em detrimento do automóvel, e despromover o seu uso para as deslocações quotidianas, devendo ser apresentada e entendida como uma alternativa de transporte menos desejável.
8.1. PROMOVER UMA FORTE CULTURA DE MOBILIDADE ATIVA
8.1.1. Promover a «Visão Zero» na sinistralidade envolvendo velocípedes
Quando se opta por andar de bicicleta, a circulação na rodovia será uma opção de reduzido risco. Para reduzir ao mínimo o número de vítimas, são necessárias campanhas continuadas de sensibilização, inovadoras e impactantes, envolvendo diferentes agentes.
8.1.2. Criar oportunidades de reconhecimento de «campeões»
As boas práticas e exemplos de sucesso (ao nível individual, mas também ao nível dos municípios) serão estimulados, celebrados e disseminados, criando narrativas inspiradoras e mobilizadoras, através da criação de mecanismos como prémios, selos de qualidade ou outros projetos e iniciativas locais, regionais e nacionais, que contribuam para estimular um verdadeiro compromisso com a mobilidade ativa.
8.1.3. Intervir junto dos jovens em idade escolar
A educação para a mobilidade ativa e sustentável e para a importância da acessibilidade e da cidadania rodoviária, será providenciada a partir do ensino pré-escolar e continuada nos níveis seguintes, incentivando o uso partilhado e responsável do espaço público. Os alunos serão estimulados a andar de bicicleta.
8.1.4. Promover mudança de comportamentos em grupos específicos da população
Serão desenvolvidos e promovidos recursos, iniciativas e campanhas de comunicação orientadas para grupos com necessidades e expectativas diferenciadas, onde se verifique existir potencial significativo para aumentar o recurso à mobilidade ativa, como os trabalhadores, os estudantes universitários, os ciclistas de recreio e desporto, as pessoas com mobilidade reduzida ou os idosos, mas também com particular atenção à perspetiva de género em relação à mobilidade ativa.
8.1.5. Criar uma plataforma de comunicação digital integrada
Será desenvolvida uma plataforma acessível, atrativa e abrangente (incluindo site, apps e redes sociais) que centralize e disponibilize recursos e informação útil e relevante e potencie a comunicação no âmbito da estratégia de promoção da mobilidade ativa. Poderá também integrar recursos técnicos e destinados a profissionais, no âmbito da medida 7.2.4 - «Criar um centro de informação interdisciplinar».
8.1.6. Incentivar e apoiar a realização de eventos e iniciativas populares
Serão promovidas iniciativas de ativação e experimentação junto do público em geral, como roadshows, campanhas «de bicicleta para o trabalho/escola» ou «dias sem carros», mas também aproveitados grandes eventos desportivos com potencial para dar visibilidade e escala mediática ao tema.
8.1.7. Promover campanhas publicitárias e ativar parcerias
Será efetuado um trabalho de sensibilização do grande público, desenvolvendo campanhas publicitárias, mas também ativando parcerias e estimulando a divulgação de conteúdos selecionados em meios de comunicação e media, com ênfase nos meios públicos, através da edição online e física de informação e notícias de atividades, informações úteis, resultados de estudos, artigos e opiniões. A ideia de que a bicicleta é um brinquedo, ou exclusivamente para utilização desportiva, será desconstruída, até pelo enorme potencial em sensibilizar os praticantes de desporto para a mobilidade ativa. Serão também potenciadas sinergias com entidades e iniciativas em vários setores complementares como a educação, a saúde, o desporto, o turismo ou a indústria.
9. MONITORIZAÇÃO E AVALIAÇÃO
Para apoiar a implementação de medidas de acordo com os objetivos definidos, e para sustentar futuros investimentos, é necessário monitorizar um conjunto de parâmetros, em tempo útil e de forma credível, integrada e sistemática.
São várias as vantagens de monitorizar os níveis, tendências e formas de uso dos modos ativos de transporte: à escala local, as dinâmicas identificadas permitem aferir a evolução das condições de circulação a pé ou com bicicleta, em relação a outros modos; em localizações específicas, os resultados de contagens realizadas antes e depois da implementação de novas infraestruturas ou outras medidas concretas permitem conhecer o seu nível de eficácia, em comparação com o previsto; e, em termos gerais, o desenvolvimento progressivo de uma base de dados possibilitará apoiar futuras decisões de investimento e medir o impacto das políticas adotadas, para além de disponibilizar informação útil para projetos de investigação.
Será garantida a articulação com os diferentes parceiros relevantes (por exemplo, instituições públicas e universidades), para que a avaliação seja abrangente, incluindo dados, quando conveniente, em áreas como a saúde, ambiente ou economia. A informação gerada pelo sistema estará acessível publicamente e em formato digital (open data), bem como os resultados das avaliações regulares, com destaque para a disponibilização de dados detalhados sobre a circulação rodoviária nas suas diferentes dimensões (tipologias de utilização, sinistralidade, etc.).
9.1. MONITORIZAÇÃO DE MEDIDAS E RESULTADOS
9.1.1. Estabelecer um conjunto de indicadores de desempenho
Definir adequadamente, e nas múltiplas dimensões quantitativas e qualitativas, quais os indicadores de performance nacionais e locais a utilizar pelo sistema de monitorização, e que permitam comparações da evolução de resultados ao nível nacional e europeu.
9.1.2. Implementar uma rede nacional de monitorização
Os efeitos diretos e indiretos de projetos e medidas adotados serão aferidos de forma continuada no tempo, envolvendo as entidades responsáveis pelos mesmos e garantindo a disponibilidade de instrumentos e métodos robustos, que incluam contagens, inquéritos e outras soluções de recolha de dados.
9.1.3. Adaptar sistemas complementares de recolha de dados
A monitorização corrente em áreas como a saúde, a segurança rodoviária, o turismo ou o emprego, será aperfeiçoada em aspetos pontuais, permitindo uma leitura mais detalhada de dinâmicas relevantes para a mobilidade ativa (por exemplo, operações estatísticas oficiais e relatórios de sinistralidade rodoviária).
9.2. AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO E RETORNO DE INVESTIMENTO
9.2.1. Avaliar e rever periodicamente a estratégia nacional
O grau de cumprimento de metas e resultados, reais e esperados, das políticas de promoção da mobilidade ativa no território nacional será aferido e divulgado com periodicidade bienal. Prevê-se também uma avaliação global mais profunda, que inclua o acompanhamento e a análise de dinâmicas emergentes (designadamente as bicicletas assistidas eletricamente, o aumento da conectividade digital ou a tendência de «servitização» da mobilidade) e que sustente uma revisão intercalar da ENMAC, em 2025.
9.2.2. Avaliar e comparar resultados a nível regional, concelhio, local e setorial
Uma adequada monitorização permitirá aferir e comparar resultados, nomeadamente no cálculo e avaliação do retorno dos investimentos realizados e no estabelecimento de rankings em diferentes contextos (por exemplo, indicadores de execução financeira e física de projetos, indicadores de sinistralidade rodoviária e indicadores de impacto económico, social e ambiental - tal como o modelo HEAT).
10. FINANCIAMENTO
A implementação de políticas de promoção da mobilidade ativa necessita de um adequado financiamento, em particular tratando-se de uma área onde as intervenções podem apresentar uma relação custo-benefício muito vantajosa, seja ao nível da infraestrutura física, seja noutras dimensões. O investimento público deverá acompanhar as externalidades positivas associadas ao incremento da utilização dos modos ativos, devendo ser orientado para garantir os melhores resultados, recorrendo à avaliação prévia quanto ao impacto concreto e respetivo retorno em termos de ativação.
O compromisso público com a estratégia de promoção dos modos ativos de transporte deverá ser concretizado através de uma adequada e crescente disponibilização de meios financeiros, técnicos e humanos, ao nível da administração central (designadamente através do Orçamento do Estado e fundos nacionais) e local, bem como das instituições públicas, e de forma previsível, acessível e estruturada, sobretudo nos três eixos de intervenção previstos: infraestruturas e intermodalidade; capacitação e apoio; cultura e comportamentos.
Para potenciar a escala de intervenção, será crucial diversificar as fontes de financiamento, identificando e divulgando atempadamente oportunidades disponíveis ao nível europeu e internacional, destinadas a diferentes agentes públicos (municípios e entidades intermunicipais, administração central, agências governamentais e institutos) e privados (cidadãos, terceiro setor e empresas), e garantindo o necessário cofinanciamento.
As externalidades positivas associadas ao incremento da mobilidade ativa serão devidamente avaliadas e consideradas no envolvimento financeiro de setores como o ambiente, saúde e turismo. Da mesma forma, a criação e consolidação de redes e parcerias visando a implementação de projetos em áreas como o turismo ativo, desporto, educação ou transportes poderá constituir um fator adicional de apoio à promoção da mobilidade ativa.
A execução de políticas de investimento favoráveis e transversais à concretização dos objetivos de médio e longo prazo da estratégia nacional implicará também o envolvimento diligente das competentes entidades públicas e níveis de governo, estimulando a alocação de fundos europeus para a mobilidade ativa.
A sensibilização de agentes privados (como fundações e empresas) para o tema, mobilizando recursos adicionais, também permitirá ampliar o potencial e alcance das medidas, devendo ser privilegiadas as iniciativas que mais demonstrem contribuir para a obtenção de resultados. Neste sentido, é de incentivar a utilização de ferramentas que facilitem a previsão informada dos benefícios efetivos dos resultados de diferentes intervenções, projetos e atividades.
11. MAPA DE MEDIDAS
A ENMAC 2020-2030 organiza-se em 6 Dimensões Estratégicas, a saber:
EL - ENQUADRAMENTO E LEGISLAÇÃO
ID - INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
E1 - EIXO DE INTERVENÇÃO #1: INFRAESTRUTURAS E INTERMODALIDADE
E2 - EIXO DE INTERVENÇÃO #2: CAPACITAÇÃO E APOIO
E3 - EIXO DE INTERVENÇÃO #3: CULTURA E COMPORTAMENTOS
MA - MONITORIZAÇÃO E AVALIAÇÃO
Cada uma das Dimensões Estratégicas é concretizada por um conjunto de Medidas, num total de 51, cujo mapa se apresenta nas páginas seguintes, incluindo o respetivo cronograma de execução, as entidades responsáveis e as potenciais fontes de financiamento.
(ver documento original)
GLOSSÁRIO
Acordo de Paris
Tratado internacional no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, que rege medidas de redução de emissões de CO(índice 2) a partir de 2020.
Atividade Física
Qualquer movimento corporal produzido pelos músculos esqueléticos de que resulte dispêndio de energia acima do nível de repouso.
Bicicleta
Veículo de duas rodas (geralmente de diâmetro igual) presas a uma estrutura ("quadro"), movido pelo esforço do próprio utilizador ("ciclista"), através de pedais.
Bicicleta com Assistência Elétrica
Bicicleta na qual o esforço do ciclista é assistido por um pequeno motor elétrico. Ao contrário das bicicletas elétricas (as chamadas "e-bikes"), nas bicicletas com assistência elétrica (também chamadas de "pedelecs") o motor não tem mais de 250 watts de potência e interrompe a assistência a partir dos 25 km/h. São, para todos os efeitos legais, equiparáveis às bicicletas convencionais.
Bicicleta de carga
Velocípede concebido especificamente para o transporte de passageiros, ou mercadorias de grande dimensão/peso, podendo ter assistência elétrica. Estão atualmente disponíveis modelos variados muito variados, de acordo com o tipo de uso (pedicabs, longtail, boxbike, etc.).
"Bike Box"
Zona delimitada na faixa de rodagem, imediatamente antes de uma intersecção semaforizada, que proporciona aos ciclistas uma posição de maior visibilidade e segurança no arranque.
"Bike Sharing"
Ver Sistema de Bicicletas Partilhadas.
Caminhabilidade
Apreciação subjetiva diretamente relacionada com a qualidade do espaço público, e que se refere à atratividade de uma área para as pessoas que se deslocam a pé, e que pode depender de fatores que afetam a perceção individual de segurança, conforto e fruição, como largura e qualidade dos passeios, existência de bancos e zonas de descanso, espaços verdes, boa iluminação, trajetos fáceis e agradáveis, proximidade de comércio e equipamentos.
"Ciclobus"
Iniciativa local de promoção e apoio ao modo ciclável, que funciona como um "autocarro humano", em que as crianças, acompanhadas de um ou mais adultos (p.ex. familiares dos alunos em sistema de rotatividade), pedalam em grupo para a escola, segundo um trajeto com paragens predefinidas.
Ciclovia (ou Pista Ciclável)
Via de comunicação de sentido único ou bidirecional, destinada especificamente para a circulação de pessoas com bicicleta, com piso regular, podendo apresentar diferentes tipologias.
CO(índice 2)
O dióxido de carbono é um gás que contribui significativamente para o chamado "efeito de estufa", absorvendo e emitindo energia radiante para a atmosfera, sob a forma de luz infravermelha. Em 2016, o setor dos transportes foi responsável por 27% do total deste tipo de emissões na UE.
Ecopista
Via de comunicação reservada às deslocações não motorizadas, com traçado ininterrupto e agradável, onde o contacto com o meio ambiente é valorizado, cumprindo condições mínimas de largura, inclinação e qualidade de pavimentação, de forma a garantir uma utilização em convivência e segurança por parte de todos os utentes, independentemente da capacidade física dos mesmos.
Ecovia
Infraestrutura destinada à circulação a pé ou em bicicleta, e que tem como principal característica a ligação - tanto a nível local como regional - entre áreas de interesse ambiental. Pode incluir estradas ou estradões abertas ao trânsito motorizado, desde que o mesmo seja pouco frequente.
EPAC (Electrically Power Assisted Cycles)
Ver Bicicleta com assistência elétrica.
Faixa Ciclável (ou Ciclofaixa)
É uma faixa de tráfego, geralmente no mesmo sentido de direção dos automóveis e na maioria das vezes do lado direito e em sentido único. Nestas circunstâncias, a circulação de bicicletas é integrada no trânsito com outros veículos, separada por sinalização horizontal ou uma barreira física, contínua ou descontínua.
HEAT (Health Economic Assessment Tool for cycling and walking)
Simulador desenvolvido pela OMS para calcular o valor económico dos benefícios para a saúde decorrentes de aumentos do modo pedonal e ciclável em contextos concretos.
Intermodalidade
Caraterística do sistema de transportes que inclui a possibilidade de recorrer a vários modos (pedonal, ciclável, transporte público), combinando-os num mesmo trajeto, de acordo com a sua conveniência.
Medidas de Acalmia de tráfego
Conjunto de intervenções destinadas a condicionar o volume e/ou a velocidade de circulação do tráfego motorizado, com o objetivo de reduzir o risco rodoviário, em particular para os utilizadores mais vulneráveis das estradas e ruas, bem como o nível de ruído e emissões poluentes. Podem assumir diversas tipologias, incluindo intervenções no perfil horizontal e vertical das vias, semaforização, iluminação, entre outras.
Mobilidade Sustentável
É a capacidade de dar resposta às necessidades da sociedade em deslocar-se livremente, aceder, comunicar, transacionar e estabelecer relações, sem sacrificar outros valores humanos e ecológicos, hoje e no futuro.
Mobilidade Ativa
Ver Transporte Ativo.
Mobilidade Suave
Capacidade de deslocação entre dois lugares, recorrendo a meios de transporte com nível reduzido de ruído e emissões poluentes, e que contribuem para a diminuição do congestionamento rodoviário.
Plano Diretor Municipal
Instrumento legal fundamental na gestão do território municipal, definindo o quadro estratégico de desenvolvimento territorial da autarquia, constituído o instrumento de referência para a elaboração dos demais planos municipais.
Pedibus
Iniciativa local de promoção e apoio ao modo pedonal, que funciona como um "autocarro humano", em que as crianças, acompanhadas de um ou mais adultos (p.ex. familiares dos alunos em sistema de rotatividade), seguem a pé para a escola, segundo um trajeto com paragens predefinidas.
Portugal Ciclável
Programa nacional para promover a interconexão das redes cicláveis municipais, para a estruturação entre redes contíguas e para a promoção de redes em contexto isolado, prevendo um investimento de 300M(euro) (até 2030) para construir 960 km de ciclovias.
Quota Modal
Medida que indica o número ou percentagem de viagens realizadas utilizando uma determinada opção de transporte (andar a pé, de bicicleta, usar transporte público, usar veículo privado, etc.), e constitui um indicador primordial na área da mobilidade ativa, com forte potencial de comparabilidade ao longo do tempo, e entre diferentes contextos.
Seguro Escolar
O seguro escolar constitui um sistema de proteção destinado a garantir a cobertura dos danos resultantes do acidente escolar, incluindo os sinistros que ocorram em trajeto entre a residência e o estabelecimento escolar, nos termos definidos pela respetiva regulamentação (Portaria 413/99, de 8 de junho). Atualmente, a cobertura exclui expressamente as deslocações com velocípede (com ou sem motor).
Sistema de Bicicletas Partilhadas
Serviço público de transporte, no qual uma frota de bicicletas é disponibilizada para uso comum, em períodos de curta duração, podendo (ou não) ser gratuitas, ou incluir bicicletas com assistência elétrica.
Transporte Ativo
Deslocação entre dois lugares, com recurso a meios de transporte sem autopropulsão, implicando atividade física deliberada e necessária, promovendo a saúde pública e a redução significativa de ruído e emissões poluentes, e incluindo andar a pé e a deslocação em bicicleta (convencional ou com assistência elétrica). O transporte público é por vezes considerado um modo complementar aos modos ativos, pois muitos utilizadores caminham ou pedalam de/para o local de embarque/desembarque.
Transporte Público
Serviços de transporte de passageiros da responsabilidade da administração pública central, regional ou local, ou por esta concessionada segundo parâmetros previamente definidos de qualidade, preço, frequência e cobertura.
Turismo Ativo
Tipo de turismo no qual o motivo principal da viagem é a realização de atividades de recreio em ambiente natural, com algum nível de atividade física.
Veículo Motorizado
Veículo rodoviário utilizado para o transporte de passageiros, bens ou carga, com autopropulsão (motor de combustão interno, motor elétrico ou combinação de ambos).
Velocípede
Ver Bicicleta.
"Visão Zero"
Projeto internacional assente em princípios éticos que pressupõem uma análise crítica e integrada do sistema de circulação rodoviário, incluindo infraestruturas, legislação e comportamentos, visando eliminar as fatalidades associadas ao tráfego rodoviário.
ZER (Zona de Emissões Reduzidas)
Área onde só podem circular veículos com características específicas, no que diz respeito à emissão de poluentes, de acordo com a norma europeia de emissões considerada (Normas EURO) que abrange diversas tipologias de veículos sendo a sua implementação faseada, consoante a tipologia dos veículos, o seu desempenho ambiental e a abrangência geográfica da medida.
Zona de Coexistência
Área urbana delimitada onde são implementadas medidas de acalmia de tráfego, com o objetivo de reduzir o risco rodoviário, bem como o ruído e as emissões poluentes. Numa zona de coexistência, todos os utilizadores da via pública (com ou sem veículo) partilham o espaço de forma não hierarquizada.
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