Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/2014
A localização geográfica e as características geofísicas e edafoclimáticas do território português, modeladas pela intervenção humana com intensidade e significado variáveis consoante as regiões e as épocas, deram origem a uma grande variedade de biótopos, ecossistemas e paisagens, mais ou menos humanizadas, que propiciam a existência de um elevado número de habitats que albergam uma grande diversidade de espécies com os seus múltiplos genótipos.
Portugal possui uma extensa linha de costa e com níveis de poluição relativamente reduzidos, merecendo especial referência os ecossistemas costeiros e marinhos, que apresentam grande riqueza em termos de valores faunísticos e florísticos, assim como as Zona Económica Exclusiva e Plataforma Continental nacionais que, pelas suas extensões, encerram um considerável potencial em termos de investigação, bioprospeção e exploração de recursos genéticos.
Os recursos genéticos - o património genético constituído pelos recursos tanto naturais como cultivados - desempenham um papel significativo e crescente em muitos setores económicos. Um conjunto alargado de intervenientes, incluindo investigadores do mundo académico e empresas de diferentes setores da indústria (por exemplo, seleção vegetal e criação de animais, controlo biológico, cosméticos, alimentação e bebidas, horticultura, biotecnologia e indústria farmacêutica), utiliza recursos genéticos para fins de investigação e desenvolvimento.
Portugal assinou, em 20 de setembro de 2011, o Protocolo de Nagóia à Convenção sobre a Diversidade Biológica, sobre o acesso aos recursos genéticos e a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da sua utilização, também designado por Protocolo ABS (Access and Benefit Sharing), que foi adotado em 29 de outubro de 2010, em Nagóia, no Japão, durante a 10.ª Conferência das Partes (COP10) da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB).
O Protocolo de Nagóia alarga o quadro geral da CDB, visando a implementação do seu terceiro objetivo em matéria de acesso aos recursos e partilha dos benefícios, tal como regulado pelo artigo 15.º da Convenção, e especificando uma série de obrigações adicionais para as Partes. Espera-se que o Protocolo venha a gerar benefícios significativos para a conservação da biodiversidade nos Estados que concedem o acesso aos recursos genéticos sobre os quais detêm direitos soberanos. Concretamente, o Protocolo de Nagóia pretende reforçar a previsibilidade das condições de acesso aos recursos genéticos, assegurar a efetiva partilha dos benefícios entre utilizadores e fornecedores de recursos genéticos e garantir que não são utilizados recursos genéticos adquiridos ilegalmente.
A ratificação do Protocolo implica o desenvolvimento de medidas legislativas, políticas e administrativas que possibilitem a execução das suas disposições.
Em Portugal, não existe legislação específica em matéria de acesso aos recursos genéticos e de partilha dos benefícios que advêm da sua utilização, sendo, por isso, necessário desenvolver um modelo nacional de regulação neste domínio.
O Protocolo de Nagóia à Convenção sobre a Diversidade Biológica foi aprovado através da Decisão 2014/283/UE , do Conselho, de 14 de abril de 2014. Foi, igualmente, publicado o Regulamento (UE) n.º 511/2014 , do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, que estabelece as normas relativas ao cumprimento das regras de acesso aos recursos genéticos e conhecimentos tradicionais associados aos recursos genéticos, e de partilha dos benefícios decorrentes da sua utilização, em conformidade com o disposto no referido Protocolo. Importa, por isso, adotar as medidas necessárias à aplicação em Portugal desses atos de direito europeu.
O Protocolo ABS tem natureza interdisciplinar, razão pela qual o desenvolvimento de um modelo nacional de regulação neste domínio deve contar com o envolvimento de todos os setores da Administração que possam assumir responsabilidades na respetiva aplicação.
Justifica-se, pois, a constituição de um grupo de trabalho que integre representantes das entidades públicas com atribuições relevantes nos diversos domínios da aplicação do Protocolo de Nagóia, para o desenvolvimento do referido modelo.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Criar o Grupo de Trabalho sobre o Acesso aos Recursos Genéticos e a Partilha Justa e Equitativa dos Benefícios Decorrentes da sua Utilização, adiante designado por GT ABS, no âmbito da aplicação do Protocolo de Nagóia à Convenção Sobre a Diversidade Biológica.
2 - Determinar que o GT ABS tem por missão:
a) Elaborar o caderno de encargos de um estudo de avaliação custo-benefício do impacto do desenvolvimento de um regime nacional de acesso aos recursos genéticos e de partilha dos benefícios decorrentes da sua utilização, incluindo a regulação do acesso aos recursos genéticos sob jurisdição nacional e medidas adicionais de cumprimento do Protocolo de Nagóia à Convenção sobre a Diversidade Biológica sobre o acesso aos recursos genéticos e a partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da sua utilização, que foi adotado em 29 de outubro de 2010, em Nagóia, no Japão, e assinado por Portugal, em 20 de setembro de 2011;
b) Propor o modelo jurídico de aplicação do Protocolo de Nagóia e do Regulamento (UE) n.º 511/2014 , do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, incluindo a identificação das responsabilidades dos diferentes organismos da Administração Pública.
3 - Determinar que o GT ABS é presidido pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I. P. (ICNF, I. P.), integrando representantes desta e das seguintes entidades:
a) Autoridade Tributária e Aduaneira;
b) Direção-Geral de Política Externa;
c) Instituto de Investigação Científica Tropical, I. P.;
d) Marinha Portuguesa;
e) Autoridade Marítima Nacional;
f) Guarda Nacional Republicana;
g) Instituto Nacional da Propriedade Industrial, I. P.;
h) Direção-Geral das Atividades Económicas;
i) Autoridade de Segurança Alimentar e Económica;
j) Inspeção-Geral dos Ministérios do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia e da Agricultura e do Mar;
k) Agência Portuguesa do Ambiente, I. P.;
l) Direção-Geral de Alimentação e Veterinária;
m) Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural;
n) Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos;
o) Instituto Português do Mar e da Atmosfera, I. P.;
p) Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária;
q) Inspeção-Geral da Educação e Ciência;
r) Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P.;
s) INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P.;
t) Governo Regional dos Açores;
u) Governo Regional da Madeira.
4 - Determinar que o GT ABS funciona junto do ICNF, I. P., que assegura o respetivo apoio logístico.
5 - Determinar que as entidades referidas no n.º 3 indicam ao ICNF, I. P., os seus representantes no prazo de 10 dias a contar da publicação da presente resolução.
6 - Estabelecer que a atividade dos representantes que integram o GT ABS não é remunerada.
7 - Estabelecer que o mandato GT ABS tem início com a entrada em vigor da presente resolução, devendo a conclusão dos respetivos trabalhos ocorrer até 31 de março de 2015.
8 - Determinar a apresentação, pelo GT ABS, ao membro do Governo responsável pela área da conservação da natureza:
a) De um relatório intercalar, até 31 de dezembro de 2014;
b) De um relatório final, no prazo máximo de um mês após a conclusão dos trabalhos.
Presidência do Conselho de Ministros, 17 de julho de 2014. - O Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho.