Resolução do Conselho de Ministros n.º 17/90
O Governo, consciente da complexidade e interdepartamentalidade do problema do uso e abuso de substâncias tóxicas e do seu tráfico ilícito, aprovou, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 23/87, de 31 de Março, um plano integrado de combate à droga, designado «Projecto VIDA».
Para execução das medidas aprovadas, designadamente nas áreas de prevenção primária, secundária e terciária, foi criado um grupo coordenador, que integrava representantes dos diversos departamentos governamentais responsáveis por essas áreas.
Decorridos três anos sobre o início da execução daquele Projecto e após uma análise do trabalho realizado, verifica-se ser necessário proceder não só a ajustamentos estruturais e institucionais, mas também à revisão e adequação de algumas das medidas anteriormente preconizadas, nomeadamente conferindo uma especial relevância às que se enquadram no âmbito da prevenção primária, que o Governo considera prioritárias, bem como no reforço do combate ao tráfico.
De entre as alterações de estrutura consagradas na presente resolução, importa salientar a criação de uma comissão interministerial, presidida pelo Primeiro-Ministro, destinada a reforçar o empenho político do Governo no combate à droga, e ainda a criação do Conselho Nacional do Projecto VIDA, o qual tem por objectivo mobilizar a sociedade civil e as suas instituições na luta contra um dos flagelos que mais profundamente atinge a sociedade, nomeadamente os jovens e a família.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 202.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolveu o seguinte:
1 - Reforçar o Programa Nacional de Combate à Droga, através da reformulação do Projecto VIDA, que passa a integrar as medidas constantes do anexo à presente resolução e que dela é parte integrante.
2 - A coordenação das medidas a desenvolver no âmbito do Programa Nacional de Combate à Droga, adiante designado por Projecto VIDA, é cometida a um coordenador nacional para o Combate à Droga, adiante designado por coordenador, a nomear por despacho do Primeiro-Ministro, de quem depende directamente.
3 - Ao coordenador compete:
a) Coordenar, em termos globais, as acções e programas a desenvolver no âmbito do Projecto VIDA;
b) Garantir uma eficaz articulação e colaboração entre os vários departamentos governamentais envolvidos no Projecto VIDA, bem como entre aqueles e as organizações de natureza não governamental;
c) Assegurar a representação portuguesa, a nível internacional, em matérias relacionadas com o combate à droga, designadamente a representação portuguesa no Comité Europeu de Luta Anti-Droga (CELAD), sem prejuízo das competências cometidas por lei, nesta matéria, a outros serviços, bem como coordenar as relações desenvolvidas com entidades ou organismos internacionais;
d) Garantir a articulação das medidas desenvolvidas no Projecto VIDA com as acções desenvolvidas no âmbito do combate ao tráfico;
e) Elaborar o plano e o relatório anual de actividades a apresentar à comissão interministerial referida no n.º 7;
f) Propor à comissão interministerial as medidas e acções que entenda convenientes para uma correcta execução dos objectivos do Projecto VIDA.
4 - Os departamentos e serviços envolvidos no Projecto VIDA devem fornecer ao coordenador todas as informações e esclarecimentos necessários à prossecução das suas competências.
5 - O coordenador disporá de um secretário executivo e de uma equipa de apoio técnico, a recrutar por recurso aos instrumentos de mobilidade previstos na lei.
6 - O estatuto remuneratório do coordenador e do secretário executivo é fixado por despacho do Primeiro-Ministro.
7 - A estrutura ora criada para a prossecução dos objectivos constantes da presente resolução compreende ainda uma comissão interministerial e um conselho nacional, com vista a assegurar uma maior eficácia, a nível da coordenação e execução interdepartamentais, das medidas adoptadas no âmbito do Projecto VIDA.
8 - A comissão interministerial é presidida pelo Primeiro-Ministro e tem a seguinte composição:
a) O Ministro da Administração Interna;
b) O Ministro da Justiça;
c) O Ministro da Educação;
d) O Ministro da Saúde;
e) O Ministro do Emprego e da Segurança Social;
f) O Ministro Adjunto e da Juventude.
9 - A comissão interministerial tem por objectivo garantir uma eficaz execução das medidas adoptadas, no âmbito do Projecto VIDA, competindo-lhe:
a) Garantir os meios necessários para uma eficaz coordenação interdepartamental entre todos os sectores envolvidos no Projecto VIDA, bem como a afectação dos recursos indispensáveis à execução das medidas aprovadas no âmbito deste Projecto;
b) Avaliar o grau de execução das medidas constantes do Projecto VIDA;
c) Informar o Conselho de Ministros sobre as orientações seguidas e as medidas adoptadas na luta contra o uso e abuso da droga, bem como contra o seu tráfico ilícito,
d) Aprovar o plano de actividades do Projecto VIDA.
10 - O Conselho Nacional é presidido pelo Ministro Adjunto e da Juventude e tem a seguinte composição:
a) O coordenador, na qualidade de vice-presidente;
b) Um representante da magistratura judicial e um da magistratura do Ministério Público, a designar, respectivamente, pelo Conselho Superior da Magistratura e pela Procuradoria-Geral da República;
c) Um representante de cada um dos governos regionais;
d) Um representante da Associação Nacional de Municípios Portugueses;
e) Um representante da Direcção-Geral de Comunicação Social;
f) Um representante da Comissão Nacional de Luta contra a SIDA;
g) Um representante da Radiotelevisão Portuguesa, E. P., e um da Radiodifusão Portuguesa, E. P.;
h) Dois representantes dos operadores privados de radiodifusão;
i) Um representante da Associação da Imprensa não Diária e um da Associação da Imprensa Diária;
j) Um representante do Comité Olímpico Português;
l) Um representante da Conferência Episcopal Portuguesa;
m) Um representante das misericórdias, a designar pela respectiva União;
n) Um representante das instituições privadas de solidariedade social, a designar pela respectiva União;
o) Um representante da Cruz Vermelha Portuguesa;
p) Um representante da Cáritas Portuguesa;
q) Um representante das associações de estudantes do ensino superior e outro das associações de estudantes do ensino secundário;
r) Um representante das associações de pais, a designar pela Confederação Nacional das Associações de Pais;
s) Um representante da Confederação Nacional das Associações de Famílias;
t) Um representante do Departamento de Juventude da UGT;
u) Um representante do Departamento de Juventude da CGTP-IN;
v) Personalidades de reconhecida competência, a designar pela comissão interministerial, em número não superior a três;
x) Representantes das instituições que actuam nas áreas da prevenção, tratamento e reinserção social de toxicodependentes, a designar pelo coordenador, em número não superior a cinco.
11 - Por despacho do Primeiro-Ministro, outras personalidades ou entidades, cujo contributo se afigure útil, poderão vir a ter assento no Conselho Nacional.
12 - O Conselho Nacional tem por objectivo assegurar a intervenção dos sectores mais representativos da sociedade que estejam, directa ou indirectamente, relacionados com o Projecto VIDA para, em colaboração com o Estado, participarem na sua execução, competindo-lhe:
a) Emitir parecer sobre as medidas ou acções que o Governo promova no âmbito do Projecto VIDA;
b) Apresentar as propostas que considere mais adequadas para a prevenção, tratamento e reinserção social de toxicodependentes e para o combate ao tráfico de droga;
c) Emitir parecer sobre o plano de actividades do Projecto VIDA, a solicitação da comissão interministerial;
d) Emitir parecer sobre as regras para a concessão de apoios pelo Estado às organizações não governamentais;
e) Apresentar propostas de cooperação, com entidades públicas ou privadas, para execução das medidas contempladas no Projecto VIDA;
f) Propor as medidas legislativas que entenda mais convenientes, em execução das convenções sobre droga ratificadas por Portugal;
g) Emitir parecer sobre todas as matérias que lhe sejam submetidas pela comissão interministerial.
13 - Cada um dos membros do Governo que integram a comissão interministerial nomeará um responsável sectorial, que dele dependerá directamente, a fim de garantir, no âmbito do respectivo departamento, uma mais eficaz execução das medidas de prevenção, tratamento a reinserção social previstas no Projecto VIDA.
14 - O despacho de nomeação dos responsáveis referidos no número anterior deve também indicar o âmbito das respectivas competências, tendo em vista a necessidade de assegurar uma eficaz articulação a nível interdepartamental.
15 - Na dependência de cada governador civil poderão ser criados núcleos distritais do Projecto VIDA, integrando representantes, a nível regional, dos serviços dependentes de cada um dos membros do Governo referidos no n.º 8, aos quais caberá prosseguir, no distrito respectivo, os objectivos consagrados no âmbito do Projecto VIDA.
16 - Os núcleos distritais referidos no número anterior poderão ainda integrar representantes de organizações não governamentais.
17 - Cada um dos departamentos governamentais envolvidos na execução das medidas que constam do anexo à presente resolução assumirá a responsabilidade pelos encargos dela decorrentes.
18 - Os demais encargos resultantes da execução da presente resolução serão suportados pelo orçamento da Presidência do Conselho de Ministros.
19 - O apoio logístico e administrativo necessário ao funcionamento da estrutura orgânica do Projecto VIDA será garantido pela Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros.
20 - É revogada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 23/87, de 31 de Março.
Presidência do Conselho de Ministro, 5 de Abril de 1990. - O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.
ANEXO
Acções de prevenção da toxicomania
1 - Desenvolvimento de um plano de prevenção em meio escolar, em articulação com os serviços de saúde escolar, de educação para a saúde e com o PIPSE, visando os seguintes objectivos:
1.1 - Acompanhamento da integração nos programas escolares e no tempo «área-escola» de conteúdos referentes às problemáticas da droga, da sida, do alcoolismo, do tabagismo e do uso indevido de medicamentos, numa óptica de educação para a saúde.
1.2 - Introdução de tais matérias, nos, programas de formação - inicial e contínua - dos professores do ensino básico e secundário.
1.3 - Mobilização das associações de pais e de estudantes para o combate à droga, designadamente em acções de sensibilização e informação.
1.4 - Nomeação de professores-operadores, para as escolas mais fortemente atingidas pelo consumo de droga, que passarão a ser os responsáveis pelo desenvolvimento do plano de prevenção em meio escolar.
1.5 - Desenvolvimento de acções integradas de prevenção nas escolas consideradas de alto risco.
1.6 - Reforço dos sistemas de vigilância e fiscalização com vista a reduzir o campo de acção dos «passadores».
2 - Desenvolvimento de acções de sensibilização e formação destinadas a diversos grupos sócio-profissionais, a realizar pelos departamentos competentes, em articulação, para, nomeadamente:
2.1 - Jovens e estudantes de todos os graus de ensino, pais e professores, magistrados, profissionais de saúde, técnicos de segurança social, técnicos de formação profissional, técnicos dos serviços prisionais, técnicos de reinserção social, educadores de menores entregues ao tribunal, membros de organizações não governamentais, reclusos, animadores juvenis e desportivos, membros de instituições religiosas, autarcas, farmacêuticos, membros de organizações sindicais e patronais, etc.
2.2 - Profissionais da comunicação social e mobilização destes agentes de opinião para o combate à droga.
2.3 - Promoção de programas de sensibilização, nomeadamente:
Programa pais-a-pais, tendo em vista reforçar o papel da família como principal agente de prevenção;
Programa jovem-a-jovem, tendo em vista desenvolver a autoconfiança, a auto-estima e uma atitude de rejeição de consumos.
2.4 - Lançamento de programas piloto de intervenção comunitária, designadamente em bairros degradados das grandes zonas urbanas.
2.5 - Criação de apoios técnico e financeiro às instituições que promovam projectos de prevenção primária, estimulando a participação da sociedade civil.
2.6 - Estímulo e apoio à participação das organizações de juventude no trabalho de sensibilização e informação dos jovens sobre a problemática da toxicodependência.
2.7 - Mobilização das associações de pais, das associações de estudantes e das colectividades de bairro para o combate à droga.
3 - Desenvolvimento de um plano de prevenção em todas as unidades, estabelecimentos e órgãos dos três ramos das forças armadas e das forças de segurança, através de:
3.1 - Alargamento do corpo de operadores de prevenção de alcoolismo, toxicomanias e sida.
3.2 - Introdução de tais matérias nos programas de instrução de quadros e da recruta.
3.3 - Divulgação de material educativo e informativo.
3.4 - Utilização de novos processos e tecnologias no campo da prevenção e detecção.
4 - Acções de informação destinadas ao grande público, com recurso à televisão, rádio, imprensa e outros meios adequados.
5 - Elaboração, produção e ampla divulgação de material informativo e educativo, destinado a públicos específicos, abrangendo o uso de substâncias tóxicas, incluindo álcool e tabaco, e temas como a sexualidade e a sida.
6 - Alargamento do serviço prestado pela Linha Aberta (telefone e apartado), tendo em vista esclarecimentos genéricos, diagnóstico de problemas, encaminhamento para os serviços competentes e ainda informações sobre formação profissional, emprego e programas para jovens.
7 - Estímulo e apoio à criação de grupos ou organizações a nível local, visando o empenhamento e a mobilização da comunidade em acções de prevenção e no esclarecimento quanto ao combate às redes de tráfico de droga.
8 - Desenvolvimento de programas para ocupação de jovens em risco, tendo em vista a execução de actividades e iniciativas próprias, através de financiamentos específicos a organizações não governamentais e a organizações de juventude.
Acções de tratamento o reinserção social dos toxicómanos
9 - Reforço dos serviços competentes de prevenção e tratamento da toxicodependência, com o objectivo de proporcionar uma resposta integrada a nível nacional e que comporte as valências adequadas à importância do problema em cada distrito.
10 - Incremento dos apoios técnico e financeiro às organizações não governamentais, sem fins lucrativos, com vista a promover acções de tratamento, reabilitação e reinserção de toxicodependentes, procurando mobilizar a sociedade nestas acções.
11 - Estímulo à criação de grupos de auto-ajuda, de centros de dia, de centros de tratamento, de comunidades terapêuticas, de apartamentos de reinserção social, ou outras estruturas julgadas convenientes por parte de organizações privadas ou de autarquias locais.
12 - Criação de estruturas de apoio e acolhimento a situações específicas:
Mães toxicodependentes e seus filhos;
Toxicodependentes ou ex-toxicodependentes afectados pela sida.
13 - Promoção de acções visando os consumidores em fase inicial, nomeadamente através de equipas de rua ou equipas de aconselhamento a jovens ou pais, actuando nas áreas de residência ou convívio, em articulação com as autarquias locais.
14 - Criação dos meios adequados ao tratamento dos toxicodependentes reclusos nos estabelecimentos prisionais e desenvolvimento do apoio à reinserção social dos ex-reclusos com problemas de toxicodependência.
15 - Criação de meios para tratamento de menores toxicodependentes entregues ao tribunal, nomeadamente através do estabelecimento de protocolos com as instituições competentes.
16 - Prevenção do consumo abusivo de medicamentos através do controlo da sua comercialização e de campanhas de informação sistemática, realizadas em colaboração com instituições públicas e privadas.
17 - Incremento de programas visando a reinserção social dos ex-toxicómanos, através da sua integração no mercado de trabalho, mediante o desenvolvimento de acções de formação e aperfeiçoamento profissionais, em colaboração com instituições e empresas públicas ou privadas.
Acções de âmbito geral
18 - Criação de um sistema nacional de recolha de dados sobre a incidência, prevalência e consequências do consumo de substâncias estupefacientes e psicotrópicas para apoio ao planeamento e avaliação das acções executadas, articulado com sistemas semelhantes existentes noutros países, de acordo com a Resolução CEE n.º 89/c185/01.
19 - Promoção e realização de estudos visando determinar as causas profundas que levam os jovens à toxicodependência, as tendências da prescrição médica de substâncias estupefacientes e psicotrópicas, a interacção entre o consumo de droga e a delinquência juvenil e a criminalidade, o rendimento escolar, a estrutura familiar, o trabalho, etc.
20 - Desenvolvimento de acções de cooperação e intercâmbio com outros países, com vista à formação de técnicos, troca de experiências, apoio técnico e lançamento de acções conjuntas.
Acções de combate ao tráfico
21 - Reforçar a articulação entre os vários organismos responsáveis pelo combate ao tráfico e ao consumo.
22 - Reforçar a cooperação com outros países, com vista a tornar o combate à droga mais eficaz.
23 - Reforçar os mecanismos de controlo e fiscalização nas fronteiras terrestres, marítimas e nos pontos de entrada e saída do País.