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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 4/2010, de 26 de Maio

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Sumário

Uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: as acções administrativas especiais - e as respectivas providências cautelares - onde é pedida a anulação ou a declaração de nulidade de actos administrativos, em que um dos autores reside em Portugal e o outro reside no estrangeiro, podem ser intentadas no tribunal da residência habitual ou sede do autor em Portugal ou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, cabendo aos autores essa escolha. ( Proc. nº 852/09 )

Texto do documento

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 4/2010

Processo 852/09

Acordam no pleno da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:

1 - Relatório

Astrazeneca Pharmaceutical e Astra Zeneca - Produtos Farmacêuticos, Lda., interpuseram o presente recurso para uniformização de jurisprudência do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul que confirmou a decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que, por seu turno, julgou esse Tribunal territorialmente incompetente para apreciação dos presentes autos (providência cautelar).

Terminou a motivação com as seguintes conclusões:

1.ª A douta decisão recorrida, já transitada, proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 25 de Junho de 2009, decidiu sobre a questão fundamental da competência territorial, sustentando que, estando em causa o pedido de nulidade e anulação de actos administrativos, e o correspondente pedido cautelar de suspensão de eficácia, formulado por dois requerentes - um com sede em país estrangeiro (no caso, a Astra Zeneca Pharmaceuticals, com sede nos EUA) e outro com sede em Portugal (no caso a AstraZeneca - Produtos Farmacêuticos, Lda., com sede em Queluz, Sintra) - o tribunal territorialmente competente seria o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, com fundamento na aplicação do disposto no artigo 16.º do CPTA;

2.ª Tal decisão diverge, e é totalmente contraditória, de duas decisões anteriores sobre a mesma questão fundamental da competência territorial, constantes dos Acórdãos proferidos pelo mesmo Tribunal Central Administrativo Sul em 25 de Agosto de 2008 (processo 3992/08 - doc. 1) e em 18 de Dezembro de 2008 (processo 4534/08 - doc. 2);

3.ª Os acórdãos fundamento, já transitados [...] decidiram sobre a mesma questão fundamental da competência territorial, sustentando que, estando em causa o pedido de nulidade e anulação de actos administrativos e o correspondente pedido cautelar de suspensão de eficácia, formulado por dois requerentes - com sede em país estrangeiro [...] e outro com sede em Portugal - o tribunal territorialmente competente seria o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, com fundamento na aplicação do disposto no artigo 22.º do CPTA;

4.ª Verifica-se, pois, a contradição e todos os demais requisitos de admissibilidade do presente recurso para uniformização nos termos do artigo 152.º do CPTA;

5.ª O artigo 20.º, n.º 6, do CPTA estabelece que os pedidos dirigidos à adopção de providências cautelares são julgados pelo tribunal competente para decidir a causa principal;

6.ª A acção principal, no caso destes autos, tem por objecto: i) a impugnação das AIM concedidas aos produtos das contra-interessadas, com fundamento em que tais actos são ilegais e lesivos dos direitos e interesses legítimos das requerentes e ii) a intimação da DGAE a abster-se de praticar actos administrativos relevantes de aprovação do PVP dos medicamentos das contra-interessadas, com fundamento também em que tais actos são ilegais e lesivos dos direitos e interesses legítimos dos requerentes;

7.ª De acordo com a regra geral constante do artigo 16.º do CPTA, a acção - e consequentemente a providência cautelar - deve ser proposta no tribunal da sede do autor ou da maioria dos autores;

8.ª Não existindo regras específicas de competência territorial para os casos em que a sede do autor se situe em Portugal, aplica-se a norma supletiva constante do artigo 22.º do CPTA, que determina a competência territorial do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa;

9.ª No caso presente, existindo duas requerentes, uma com sede nos Estados Unidos da América e outra com sede em Portugal, a regra constante do artigo 16.º do CPTA não tem aplicação, porquanto não é possível estabelecer-se uma maioria (de autores/requerentes);

10.ª Não sendo aplicável essa regra, nem sendo possível aferir a competência territorial com base nos artigos 17.º a 21.º do CPTA, a competência territorial do Tribunal para decidir o presente processo terá de ser aferida com recurso ao regime supletivo previsto no artigo 22.º do CPTA;

11.ª E por força da aplicação dessa regra conclui-se no sentido de que é territorialmente competente o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa;

12.ª Nada na letra ou no espírito do artigo 16.º do CPTA - ou de qualquer norma do CPTA - determina, contrariamente ao sustentado pelo Tribunal a quo, que, existindo um requerente com sede em Portugal e outro requerente com sede no estrangeiro, a aferição da competência territorial deverá ser feita única e exclusivamente tendo em consideração o requerente com sede em Portugal;

13.ª Ao ignorar a requerente Astrazeneca Pharmaceuticals LP, e ao determinar a competência territorial única e exclusivamente com base na sede da requerente Astrazeneca - Produtos Farmacêuticos, Lda., e, consequentemente, ao aplicar o artigo 16.º do CPTA ao caso presente, o Tribunal a quo violou o artigo 22.º do CPTA, porquanto não o aplicou aos presentes autos, e violou também o artigo 16.º do CPTA, porquanto o aplicou erradamente aos presentes autos.

A Exma. Procuradora-Geral-Adjunta emitiu parecer no sentido de ser considerado competente o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.

O INFARMED contra alegou sustentando a manutenção do acórdão recorrido, formulando as seguintes conclusões:

1.ª A decisão recorrida esteve bem ao considerar que o artigo 16.º do CPTA é aqui aplicável, porque o artigo 22.º do CPTA surge apenas como de aplicação subsidiária, para casos em que não seja possível determinar a competência territorial por aplicação, designadamente, do artigo 16.º;

2.ª Contrariamente ao definido pelas recorrentes, o artigo 16.º é aqui aplicável, porque uma das requerentes, ora recorrentes, tem a sua sede localizada no território nacional, não existindo por isso uma impossibilidade de determinar qual o tribunal territorialmente competente para conhecer da causa;

3.ª Assim, não restarão dúvidas de que, através da aplicação do artigo 16.º do CPTA o tribunal competente para conhecer da causa será o Tribunal Administrativo de Sintra, nos termos supra-referidos.

2 - Fundamentação

2.1 - Matéria de facto. - O acórdão recorrido remeteu para a matéria de facto dada como assente na decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, nos termos do artigo 713.º, n.º 6, do CPC.

A matéria de facto, como se depreende do acórdão recorrido, é a seguinte: uma das duas autoras tem sede em Oeiras - Portugal e a outra autora tem a sede nos Estados Unidos da América.

2.2 - Matéria de direito. - Embora as recorrentes tenham indicado dois acórdãos fundamento, não se torna necessário o convite para escolha de apenas um deles, já que quanto à questão da competência territorial os acórdãos são idênticos (com as mesmas autoras).

O recurso deve ser admitido pois verifica-se efectivamente uma contradição de julgados.

No acórdão fundamento entendeu-se que, perante a circunstância de haver dois autores, um residente em Portugal e outro no estrangeiro, não era possível estabelecer uma «maioria de autores» e, desse modo, aplicar o artigo 16.º do CPTA.

Não havendo regra prevendo expressamente essa situação (dois autores, um com residência ou sede em Portugal e outro com residência ou sede no estrangeiro), aplicar-se-ia o artigo 22.º do CPTA, norma residual, que manda atribuir a causa ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.

No acórdão recorrido, entendeu-se que o artigo 16.º contemplava a situação em causa, desde que o seu âmbito de aplicação fosse restringido:

«[...] Efectivamente, diz o acórdão recorrido, restringindo-se o âmbito de aplicação deste normativo aos autores que tenham residência habitual ou sede em Portugal, não há que o aplicar se o autor ou todos os autores tiverem residência ou sede no estrangeiro. Por isso, se dos vários autores alguns tiverem residência ou sede em Portugal e outros no estrangeiro, só há que atender àqueles para aferir do Tribunal territorialmente competente [...]» Justificou esta interpretação apelando a Alberto dos Reis sobre a interpretação do artigo 85.º, n.º 3, do CPC, onde também se considera territorialmente competente o Tribunal de Lisboa nos casos em que o autor tenha domicílio no estrangeiro:

«[...] O juízo do domicílio do autor - escreve o autor citado, Comentário ao CPC, vol. i, 2.ª ed., 1960, pp. 257 e 258 - e o juízo de Lisboa são juízos a que se recorre em última extremidade, por não ser possível lançar mão do juízo do domicílio do réu; não há, portanto, que tomá-los em conta quando a competência pode assentar sobre o domicílio do réu, isto é, quando há réus domiciliados em Portugal [...]» O acórdão fundamento acolheu a tese das recorrentes (sumariada nas conclusões deste recurso) segundo a qual não vem prevista no artigo 16.º a situação destes autos, em que há duas autoras, uma com residência em Portugal e outra nos Estados Unidos da América, daí que seja aplicável a regra do artigo 22.º do CPTA.

Vejamos.

O artigo 16.º do CPTA tem a seguinte redacção:

«Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes e das soluções que resultam da distribuição das competências em função da hierarquia, os processos, em primeira instância, são intentados no tribunal da residência habitual ou sede do autor ou da maioria dos autores.» O artigo 16.º tem em vista a competência territorial dos tribunais portugueses e, portanto, quando fala em residência ou sede do autor, está a referir-se à residência ou sede em Portugal. Deste modo, o sentido do artigo é de escolher como índice da competência territorial a residência ou sede em Portugal. O elemento de conexão relevante para estabelecer a competência (deixando de lado as soluções decorrentes da competência em razão da hierarquia ou da acumulação de pedidos - que não estão em causa) é a «residência habitual ou sede do autor, ou da maioria dos autores» em Portugal.

Há, porém, casos que o artigo 16.º não resolve. São os casos em que o autor (e acção tenha apenas um) reside ou tem a sede no estrangeiro. A solução não vem resolvida no artigo 16.º, nem nos artigos subsequentes, caindo na previsão do artigo 22.º, com a seguinte redacção:

«Quando não seja possível determinar a competência territorial por aplicação dos artigos anteriores, é competente o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.» Também há casos em que a conjugação das duas regras acima referidas atribui a competência a mais do que um tribunal. Tal ocorre, em todas as situações em que não há maioria de autores (um reside no Porto, outro em Braga e outro em Coimbra) ou, como no caso presente, em que um reside em Portugal e outro no estrangeiro).

Nestas situações, em bom rigor, há mais do que um tribunal territorialmente competente, dado que os elementos de conexão determinativos da competência territorial verificam-se relativamente a mais do que um tribunal.

A melhor solução é, então, a de permitir aos autores a escolha do foro dentro daqueles que são territorialmente competentes. Esta é, de resto, a solução do artigo 21.º do CPTA para outras situações em que as regras gerais atribuem competência a mais do que um tribunal, segundo o qual «quando forem cumulados pedidos para cuja apreciação sejam notoriamente competentes diversos tribunais, o autor pode escolher qualquer deles para a propositura da acção».

Permitir a opção dos autores justifica-se, além do mais, porque as regras de competência territorial que atendem à sede ou residência do autor são definidas em função da sua comodidade, sendo portanto aceitável que, dentro da pluralidade de comarcas competentes, sejam estes a escolher a que mais lhes convém - cf., neste sentido, Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2006, pp. 194 e 195: «Por outro lado, se não houver maioria ou o maior número - porque são só dois ou porque estão empatados - pergunta-se se funciona a regra do artigo 22.º ou se é dado aos autores escolher o tribunal da residência habitual de um deles, para instaurar a acção? Parece-nos bem preferível esta segunda opção. A que título três pessoas residentes na circunscrição de três tribunais administrativos diferentes - por exemplo, em Mirandela, em Castro Daire e em Penafiel - e que se querem coligar numa acção para a qual valha a norma de competência deste artigo 16.º, teriam que vir a Lisboa, ao Tribunal Administrativo e Fiscal, litigar com o Estado (ou com o próprio município de Penafiel, por exemplo) a propósito de questões que as afectam a todas, e não haviam de poder fazê-lo no tribunal de círculo de uma delas. Tal solução é, aliás, aquela que a analogia (com o artigo 21.º, 2) pede.» Do exposto resulta que, no caso dos autos, as autoras poderiam escolher o foro de Sintra, por residir na respectiva área uma das autoras; ou o de Lisboa, por residir no estrangeiro a outra autora. Tendo escolhido o de Lisboa, é o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa o territorialmente competente.

Face ao exposto, a jurisprudência deve uniformizar-se nos seguintes termos:

As acções administrativas especiais - e as respectivas providências cautelares - onde é pedida a anulação ou a declaração de nulidade de actos administrativos, em que um dos autores reside em Portugal e o outro reside no estrangeiro, podem ser intentadas no tribunal da residência habitual ou sede do autor em Portugal, ou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, cabendo aos autores essa escolha.

Impõe-se, deste modo, anular a decisão do Tribunal Central Administrativo Sul (artigo 152.º, n.º 6), revogar a sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa e considerar este último Tribunal competente em razão do território para julgar a presente providência cautelar, pois foi este o foro escolhido pelas autoras.

3 - Decisão

Face ao regime exposto, os juízes do pleno da 1.ª Secção acordam:

a) Uniformizar a jurisprudência nos seguintes termos:

As acções administrativas especiais - e as respectivas providências cautelares - onde é pedida a anulação ou a declaração de nulidade de actos administrativos, em que um dos autores reside em Portugal e o outro reside no estrangeiro, podem ser intentadas no tribunal da residência habitual ou sede do autor em Portugal, ou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, cabendo aos autores essa escolha;

b) Anular o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, porque proferido em desconformidade com o entendimento referido em a);

c) Revogar a sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa e declarar esse Tribunal competente em razão do território para apreciar a presente causa.

Custas pela entidade recorrida (INFARMED) no Tribunal Central Administrativo Sul e neste Supremo Tribunal Administrativo.

Publique-se, nos termos do artigo 152.º, 4, do CPTA.

Lisboa, 25 de Março de 2010. - António Bento São Pedro (relator) - Rosendo Dias José - José Manuel da Silva Santos Botelho - Maria Angelina Domingues - Luís Pais Borges - Jorge Manuel Lopes de Sousa - Alberto Acácio de Sá Costa Reis - Adérito da Conceição Salvador dos Santos - Rui Manuel Pires Ferreira Botelho - Jorge Artur Madeira dos Santos (com a declaração que junta) - Fernanda Martins Xavier e Nunes - António Bernardino Peixoto Madureira - Alberto Augusto Andrade de Oliveira - António Políbio Ferreira Henriques - José António de Freitas Carvalho.

Declaração de voto

Concordo com a decisão do caso, mas não com os fundamentos do acórdão, ou seja, com a ideia de que aos autores cabe a escolha do tribunal territorialmente competente.

Primo, é verdade que as regras de competência que atendem à residência ou à sede do autor são definidas em função da sua presumível comodidade. Mas essa comodidade, que se reflecte na escolha do legislador, não significa que o autor se possa sobrepor a tal escolha.

Ora, e secundo, a competência territorial dos tribunais administrativos é de ordem pública (v. o artigo 13.º do CPTA). Por isso, a definição dessa competência não se encontra na disponibilidade do autor - salvo quando a lei especialmente o determine.

Mas a lei não prevê que, em situações como a destes autos, os autores escolham o tribunal territorialmente competente - aliás, o artigo 16.º do CPTA até parece excluir um tal direito de escolha. Logo, tudo sugere que esse direito de escolha não existe.

Tertio, e admitindo que a lei não prevê directamente tal direito de escolha, o aresto acaba por afirmá-lo, aplicando o artigo 21.º, n.º 2, do CPTA, por analogia. No entanto, o nosso sistema jurídico reserva a analogia para o preenchimento de lacunas (cf. o artigo 10.º do Código Civil). Ora, e relativamente a hipóteses como a que nos ocupa, as soluções do CPTA podem ser infelizes, mas não são lacunosas - já que, no artigo 22.º, existe uma regra que, in extremis, responde a todos os casos não anteriormente previstos. E, não havendo lacuna, não existe também o pressuposto da integração analógica.

Portanto, daria provimento ao recurso pelas razões invocadas pelos recorrentes: não podendo resolver-se o assunto à luz do artigo 16.º do CPTA, ou dos cinco artigos seguintes, funcionaria a regra supletiva do artigo 22.º do mesmo diploma, sendo de atribuir a competência territorial ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa. - Jorge Artur Madeira dos Santos.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2010/05/26/plain-274940.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/274940.dre.pdf .

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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