Portaria 17880
A indústria de fabricação de calçado tem presentemente uma produção anual que se aproxima do milhão de contos, mas a sua estrutura não está adequada a tão grande volume e à importância que lhe deve caber na economia portuguesa.
Actividade tradicionalmente manual, não contam mais de 40 anos as primeiras tentativas de mecanização feitas entre nós; mas as necessidades inflexíveis de produzir mais e a melhor preço levaram a alargar sucessivamente a fabricação mecânica.
Esta evolução não se processou, porém, em termos inteiramente correctos. Em vez de estabelecimentos de tamanho equilibrado, multiplicaram as unidades muito pequenas, onde as máquinas não alcançam o rendimento desejável; em vez de um esquema técnico coerente, adoptou-se em muitos casos a solução de uma semimecanização, em que o rendimento é pior ainda, e exerce-se em grande escala, com forma de fugir a encargos e fiscalizações, o sistema de ter o pessoal a trabalhar nas próprias casas, o que constitui uma falsa indústria caseira.
Desta falta de ordenamento resultou uma actividade cuja defeituosa organização se cifra em dois números: há em Portugal 2000 fábricas, número muito superior ao de qualquer outro país da Europa e só comparável ao da Itália, mas a produção italiana é 10 vezes superior à nossa; a produção média por operário e por ano é, no nosso país, de 250 pares, número que não excede 1/3 a 1/5 dos correspondentes aos outros países europeus.
A dificuldade de concorrência em mercados externos, apesar da boa nomeada do nosso calçado, aparece assim como evidente; a subordinação desta indústria a certas exigências comerciais, que nem sempre se ajustam às regras de bem produzir, é inevitável enquanto a produção não criar uma estrutura resistente; e disto resulta a necessidade de buscar essa estrutura.
Com a indústria de calçado se liga ìntimamente a dos curtumes, que constitui um dos casos mais gritantes de dispersão e amadorismo que se encontram no quadro industrial português; mas esta actividade não pode ser desde já sujeita a qualquer estudo de reorganização, por estar a ser objecto de um inquérito prévio que permita ajuizar exactamente a situação actual.
Pelo exposto:
Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Economia, nos termos da base XVII da Lei 2005, de 14 de Março de 1945, nomear uma comissão para o estudo da reorganização da indústria do calçado constituída por um presidente, um representante da Junta Nacional dos Produtos Pecuários, um representante da Direcção-Geral dos Serviços Industriais e dois industriais indicados pelo Grémio Nacional dos Industriais de Calçado. A esta comissão serão ainda agregados três representantes, respectivamente, do Ministro da Defesa Nacional e dos Ministérios do Ultramar e das Corporações e Previdência Social. A comissão apresentará o seu relatório no prazo de seis meses, a contar da nomeação dos comissionados.
Ministério da Economia, 4 de Agosto de 1960. - O Ministro da Economia, José do Nascimento Ferreira Dias Júnior.