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Acórdão Doutrinário , de 30 de Novembro

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Sumário

Proferido no processo n.º 60970, em que era recorrente Henrique Santos da Silva Pinto e recorrida Nobre, Empreendimentos Imobiliários, Lda.

Texto do documento

Acórdão doutrinário

Processo 60970. - Autos de recurso para o tribunal pleno. Recorrente, Henrique Santos da Silva Pinto. Recorrida, Nobre, Empreendimentos Imobiliários, Lda.

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça:

O agente técnico de engenharia Henrique Santos da Silva Pinto recorre para o tribunal pleno do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Dezembro de 1964 (Boletim n.º 142, p. 305), invocando oposição com outro acórdão do mesmo Tribunal, este datado de 9 de Maio de 1961 (citado Boletim n.º 107, p. 597).

A secção verificou a oposição, mas a recorrida - Nobre, Empreendimentos Imobiliários, Lda. - insiste em não se verificar contradição justificativa do recurso, pois a questão suscitada pelo recorrente, no decurso decidido pelo acórdão recorrido, era a de saber se um prazo regulado pelo artigo 562.º do Código Civil permite a propositura de uma acção no dia imediato ao do seu termo, já que o último dia tem de ser completo e as secretarias judiciais encerram antes da meia-noite, enquanto o acórdão de 1961 se não ocupou desse problema por considerar o prazo de caducidade das acções anulatórias de deliberações sociais regulado pelo artigo 73.º da lei uniforme sobre letras, e não por aquele artigo 562.º do Código Civil.

O Ministério Público pronuncia-se pela existência de oposição relevante e sugere o seguinte assento:

No cômputo do prazo estabelecido no artigo 46.º, § 1.º, da Lei de 11 de Abril de 1901, deve observar-se o preceituado no artigo 562.º do Código Civil.

Pois que o tribunal pleno não fica vinculado pelo decidido na secção quanto ao seguimento do recurso, por oposição sobre a mesma questão fundamental de direito - Código de Processo Civil, n.º 3 do artigo 766.º -, começar-se-á pela questão prévia suscitada pela recorrida.

As acções que originaram os recursos decididos pelos acórdãos que se dizem contraditórios visavam a anulação de deliberações tomadas em assembleias gerais de sociedades comerciais por quotas. Em ambas se discutia a caducidade do prazo para a propositura dessas acções.

O acórdão de 1961 entendeu que, por virtude do artigo 3.º do Código Comercial, esse prazo deve contar-se aplicando por analogia o artigo 73.º da lei uniforme sobre letras, desprezando o dia inicial por se tratar de um prazo de direito comercial.

O acórdão recorrido, aludindo expressamente àquele aresto, repele a sua doutrina e, aderindo ao entendimento geral, também defendido pelo Prof. Pinto Coelho, decidiu que o cômputo desse prazo é regulado, por analogia, pelo artigo 562.º do Código Civil.

É certo que, antes do acórdão recorrido, não fora suscitada no processo a questão da aplicabilidade do artigo 73.º da lei uniforme, antes as partes, como as instâncias, estavam de acordo quanto à aplicabilidade do artigo 562.º do Código Civil. Discutia-se apenas a possibilidade de a acção poder ser proposta no dia imediato ao último do prazo, pois este deve ser completo e as secretarias judiciais encerram muito antes da meia-noite.

Esta questão, porém, e como bem nota o Ministério Público, implica a prévia determinação do preceito legal aplicável, para, em seguida, se interpretar ou integrar a norma escolhida.

Tanto assim que, optando-se pelo artigo 73.º da lei uniforme, tal como sucedera na hipótese julgada pelo acórdão de 1961, se desprezava o dia inicial; a acção teria sido proposta em tempo e prejudicada ficava a questão posta no recurso acerca da possibilidade de intentar a acção no dia imediato ao do termo do prazo.

E por se tratar de indagação, interpretação e aplicação da lei, a acção do tribunal não estava condicionada à alegação das partes (Código de Processo Civil, artigo 664.º). Legítima foi, portanto, a actuação do Supremo no acórdão recorrido, como expressamente o reconhece a sociedade recorrida.

Evidencia-se, assim, terem os dois acórdãos assentado sobre soluções diametralmente divergentes sobre a mesma questão fundamental de direito, qual seja a da determinação da norma legal reguladora da contagem do prazo de propositura das acções anulatórias de deliberações das assembleias gerais das sociedades comerciais.

E tão opostas são essas soluções que a do acórdão mais antigo levaria a concluir pela não verificação da caducidade, como, embora por outra via, pretendia o autor, ora recorrente, enquanto a do acórdão recorrido podia permitir a conclusão oposta, pois este aresto, revogando o que a Relação decidira por maioria, julgou verificada a caducidade.

Confirmada portanto a oposição relevante para o prosseguimento do recurso, deste se passa a conhecer.

Preceitua o n.º 3 do artigo 396.º do Código de Processo Civil que o prazo de vinte dias fixado pelo § 1.º do artigo 46.º da Lei de 11 de Abril de 1901, para as acções de anulação de deliberações tomadas em assembleia geral das sociedades por quotas, se conta da data dessas deliberações.

Sendo um prazo de caducidade, porque para propositura da acção é regulado pela lei substantiva. Assim o determina o n.º 2 do artigo 144.º do Código de Processo Civil, que veio consagrar a doutrina e jurisprudência correntes.

O instituto da caducidade ainda não se encontra regulamentado na lei portuguesa, que, até há pouco, o confundia com o da prescrição, usando até este vocábulo para designar indistintamente a prescrição pròpriamente dita e a caducidade que a doutrina nacional começou por designar usando as palavras estrangeiras déchéance e decadenza.

Tal similitude dos institutos levou necessàriamente a preencher aquela lacuna legislativa socorrendo-se, por analogia, à regulamentação legal do instituto da prescrição.

Designadamente, a contagem dos prazos de caducidade sempre se tem feito em conformidade com os artigos 560.º a 563.º do Código Civil, formulados para regulamentar a contagem do tempo para o efeito da prescrição e, de harmonia com o artigo 562.º desse diploma, sempre se entendera que «o dia em que começa a correr a prescrição (e a caducidade, portanto) conta-se por inteiro, ainda que não seja completo, ...».

Supomos ter sido no acórdão de 1961, aqui invocado para fundamentar o presente recurso, que pela primeira vez o Supremo afastou aquela regra, decidindo que, por imperativo do artigo 73.º da lei uniforme, e este aplicável por força do artigo 3.º do Código Comercial, no prazo de caducidade para propositura de acções de anulação de deliberações sociais - portanto de acções sobre questões comerciais - se não leva em conta o dia inicial.

Comentando esse acórdão na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 95.º, o Prof. Pinto Coelho discorda da invocação do artigo 73.º da lei uniforme, embora entenda que, apesar de aplicável o artigo 562.º do Código Civil, mas porque este, mandando incluir no prazo o dia inicial, contraria um princípio geral consagrado no nosso direito: o dia em que começa a correr a caducidade não deve ser contado.

É certo que o citado artigo 73.º da lei uniforme determina:

Os prazos legais ou convencionais não compreendem o dia que marca o início.

Não destoa este preceito do direito cambiário do § único do artigo 311.º do Código Comercial, onde, depois do corpo do artigo, em matéria de contagem do tempo para o vencimento das letras, dando os conceitos do dia, do mês e do ano, se prescrevia:

No termo de determinado número de dias não se conta o dia em que ele começar, mas conta-se aquele em que findar.

É ainda certo que o artigo 3.º do Código Comercial preceitua:

Se as questões sobre direitos e obrigações comerciais não puderem ser resolvidas, nem pelo texto da lei comercial, nem pelo seu espírito, nem pelos casos análogos nela prevenidos, serão decididas pelo direito civil.

Não obstante, não parece de seguir a doutrina do acórdão de 1961.

Sendo os prazos de caducidade, como se disse, regulados pela lei substantiva, é nesta que haverão de encontrar-se as regras da sua disciplina.

«Ora - como disse o Prof. Alberto dos Reis -, as únicas regras que a lei substantiva nos oferece são as dos artigos 560.º a 563.º do Código Civil; são estas as que, por analogia, hão-de aplicar-se ao prazo de caducidade da acção, ao prazo fixado para o exercício do direito de intentar determinada acção.»

Desses preceitos o acórdão de 1961 apenas afastou a primeira regra do artigo 562.º, segundo a qual deve contar-se por inteiro, ainda que não seja completo, o dia em que começa a correr o prazo.

Como lùcidamente salienta o douto parecer do Ministério Público, o direito comercial, no seu conjunto, não é um direito excepcional quando confrontado com o direito civil, nem este é um direito regra a que aquele se oponha. Antes o direito civil é o direito geral, sendo o comercial um direito especial, embora num e noutro se encontrem normas excepcionais que contrariam, essas sim, os princípios regras que informam tanto o direito geral como o direito especial.

Um prazo de dias marcado pela lei para intentar uma acção será, na prática, mais longo de um dia quando no seu cômputo desprezemos o dia inicial (conforme os apontados preceitos privativos do direito cambiário - artigo 73.º da lei uniforme e § único do artigo 311.º do Código Comercial) do que se a contagem se fizer incluindo naquele o dia em que o mesmo prazo se inicia, como determina o citado artigo 562.º do Código Civil.

Portanto, a doutrina do acórdão de 1961 tornaria mais longo um prazo de caducidade para a instauração de uma acção sobre direitos e obrigações comerciais do que o prazo de igual número de dias fixado pela lei para propositura da acção que tivesse por objecto uma questão regulada pelo direito civil.

Mas uma tal solução contraria os princípios gerais do direito comercial, que, em confronto com os princípios gerais do direito civil, visam a assegurar às relações comerciais mais rapidez, segurança e firmeza.

Tanto basta para levar à opção pela doutrina do acórdão recorrido.

Nega-se, por isso, provimento ao recurso, com custas pelo recorrente.

E firma-se jurisprudência obrigatória através do seguinte assento:

No cômputo do prazo estabelecido no artigo 46.º, § 1.º, da Lei de 11 de Abril de 1901, deve observar-se o preceituado no artigo 562.º do Código Civil.

Lisboa, 4 de Novembro de 1966. - Albuquerque Rocha - Torres Paulo - Ludovico da Costa - Joaquim de Melo - Fernando Bernardes de Miranda - Oliveira Carvalho - Francisco Soares - Adriano Vera Jardim - Eduardo Correia Guedes - Lopes Cardoso - Gonçalves Pereira - António Teixeira de Andrade - José Cabral Ribeiro de Almeida - J. S. Carvalho Júnior (votei o assento com a declaração de que, em meu entender, a aplicação do artigo 562.º do Código Civil não conduz a resultado diferente do que se obteria com a aplicação do artigo 73.º da lei uniforme, pois que, exigindo aquele artigo que o último dia do prazo seja completo e encerrando-se as secretarias judiciais antes das 24 horas, o termo do prazo transfere-se necessàriamente para o dia seguinte).

Está conforme.

Secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, 18 de Novembro de 1966. - O Secretário, Joaquim Múrias de Freitas.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2469789.dre.pdf .

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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