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Acórdão Doutrinário , de 16 de Março

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Sumário

Proferido no processo n.º 31408, em que era recorrente o Ministério Público e recorrido Leonel Fernando Duarte Fialho

Texto do documento

Acórdão doutrinário

Processo 31408. - Autos de recurso para o tribunal pleno. Recorrente, Ministério Público. Recorrido, Leonel Fernando Duarte Fialho.

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça em tribunal pleno:

O Ministério Público traz, perante o tribunal pleno, o presente recurso do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Julho de 1963, lavrado no processo 31228, que diz em oposição com o proferido pelo mesmo Tribunal em 14 de Junho de 1961 (Boletim do Ministério da Justiça, vol. 108, p. 250).

Seguiu o recurso seus normais e regulares termos, de harmonia com o preceituado no artigo 668.º e § único do Código de Processo Penal, com referência aos artigos 763.º e seguintes do Código de Processo Civil.

Assim se lavrou, a fl. 8, o competente acórdão preliminar do artigo 766.º, que, verificando terem sido os dois arestos proferidos em processos diferentes, no domínio da mesma legislação, o mais antigo com trânsito, mas sem constituir caso julgado entre as partes em causa, e o segundo insusceptível de recurso ordinário, mas com oposição, sobre a mesma questão fundamental de direito, ordenou que o recurso seguisse seus termos para tribunal pleno.

A fls. 22 e seguintes alegou o recorrente, dentro da regra do artigo 767.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

E fê-lo larga e doutamente nos termos que a seguir indicamos, em resumo:

Começa por um brilhante estudo sobre as origens, evolução e vantagens da pena de multa, desde os tempos mais remotos, passando em revista o direito romano, germânico, canónico e medieval, até às formulações do moderno direito criminal.

Pondera lùcidamente os inconvenientes que se lhe atribuíram em determinadas épocas, ao lado do favor com que modernamente está a ser acolhida, até mesmo no futuro Código Penal Português, como pode desde já presumir-se através o disposto no artigo 84.º do projecto respectivo.

E encara as diversas modalidades desta espécie de pena para concluir como o seu maior inconveniente, que por vezes lhe atribuem de acarretar, em regra, uma desigualdade de sofrimento, consoante os meios do delinquente, maior quando é pobre, deve ter-se hoje por arredado com a fórmula que gradua o seu montante, não só em função da culpa, ou da gravidade objectiva do facto, mas da fortuna do delinquente.

E propõe um assento com esta redacção:

Assento: «A atenuação extraordinária da pena abrange a multa complementar variável».

Correram-se depois os vistos legais a todos os Srs. Juízes do Tribunal e o processo apresenta-se agora para decidir.

Tudo visto e ponderado:

1) Como resulta do disposto no artigo 786.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, e sempre se tem entendido, a decisão tomada no acórdão preliminar não obsta a que o tribunal pleno resolva em sentido contrário.

No caso dos autos, porém, é de entender que se verificam, na verdade, todos os já apontados pressupostos essenciais, para que o mesmo tribunal venha a conhecer do recurso.

E isso nos leva a encarar o fundo do problema e decidir sobre ele como nos cumpre.

2) É este sumamente restrito e enuncia-se nos seguintes termos:

A atenuação extraordinária do artigo 94.º e seus números deverá restrigir-se à pena de prisão em cada caso cominada ou abranger também a multa complementar, variável, baixando esta mesma do mínimo quando estabelecido na lei?

Na orientação negativa se movimentou o acórdão de 1961. Pela afirmativa se pronuncia o de 1963.

É esta última, sem dúvida, a tese a perfilhar.

3) Seguindo a argumentação do acórdão recorrido, é de entender que, embora a actual redacção do artigo 94.º do Código Penal haja feito caducar a regra do Assento deste Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Janeiro de 1935, certo é que da mesma resulta que tanto a pena de prisão como a de multa devem beneficiar da atenuação extraordinária a que a sua incidência dê lugar.

E, portanto, baixar o período da multa até ao mínimo geral de um dia, quando a pena de prisão haja de vir até aos três dias do artigo 56.º, n.º 1, sempre que as atenuantes sejam de especial valor e o justifiquem, independentemente do limite especial que na lei se haja fixado, como na hipótese do artigo 360.º, n.º 4.

Nada há que o contrarie.

Antes seria de estranhar que, sendo a pena de prisão considerada mais grave que a da multa, quanto a esta não possa o réu beneficiar de uma redução àquela aplicável.

Nem obta a circunstância de o artigo 94.º, n.º 4, encarar expressamente essa redução do mínimo especial da pena de prisão para o seu mínimo geral. Antes haveremos de compreender como esse efeito tem de repetir-se quanto à pena de multa e abrangê-la no campo das respectivas incidências.

As determinantes gerais de uma e outra das penas de prisão e multa são da mesma natureza, e por isso a sua duração deve informar-se nas mesmas razões e ser sujeita a idênticas regras.

Se os motivos e razões do preceituado no artigo 94.º são susceptíveis de fazer baixar a pena de prisão, devem sê-lo também para ter idêntica influência na de multa, e nos mesmos termos e extensão.

A outra luz, a contradição seria em certos casos manifesta, podendo levar-nos, por exemplo, à situação aberrante que o acórdão recorrido nos lembra.

Por substituição da prisão maior por multa (Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Julho de 1957), a pena do artigo 360.º, n.º 5, poderia baixar até um dia de multa, ao passo que a do artigo 360.º, n.º 4, sem dúvida menos grave, nunca poderia descer abaixo de um ano.

Demais. Para que a pena de multa funcione com a elasticidade que lhe atribui a moderna concepção da ciência criminal, e portanto dela se exige, necessário é se conforme com as regras gerais e legais do respectivo e conveniente doseamento.

Que se adapte ao grau e natureza da culpa do delinquente.

Que se proporcione à gravidade objectiva da infracção, tendo em vista, além do mais, o número e, sobretudo, o valor relativo das agravantes e atenuantes.

E, finalmente, que haja de adequar-se às possibilidades económicas do delinquente.

Estamos, em última análise, dentro do condicionalismo do artigo 84.º e seu § único.

Mas, enquanto para o quantitativo da multa expressamente funciona o parágrafo, necessário é que a fixação do período da sua duração se informe também, e com igual segurança e intensidade, nos moldes dele e do corpo do artigo.

Só assim poderá conseguir-se a desejada e harmónica adequação às possibilidades económicas em vista.

Assim, tudo parece mostrar que a medida da atenuação extraordinária terá de executar-se em relação a cada uma delas.

A ambas as penalidades é aplicável com autonomia. Não se atenua uma ou outra, mas a pena aplicável.

Neste sentido o Prof. Cavaleiro de Ferreira (Direito Penal, II, 1961, p. 314).

4) Nestes termos se decide confirmar o acórdão recorrido, lavrando-se o seguinte assento:

A atenuação extraordinária da pena abrange a multa complementar variável.

Sem imposto de justiça.

Lisboa, 23 de Fevereiro de 1966. - Fernando Toscano Pessoa - Gonçalves Pereira - Alberto Toscano - Torres Paulo - Lopes Cardoso - Ludovico da Costa - Joaquim de Melo - H. Dias Freire - Oliveira Carvalho - Francisco Soares - Vera Jardim - Santos Carvalho - Albuquerque Rocha - Fernando Bernardes de Miranda.

Está conforme.

Supremo Tribunal de Justiça, 8 de Março de 1966. - O Secretário, Joaquim Múrias de Freitas.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2469518.dre.pdf .

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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