Resolução da Assembleia da República n.º 51/2008
Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e as Nações Unidas sobre a
Execução de Sentenças do Tribunal Penal Internacional para a Ex-Jugoslávia,
feito na Haia, em 19 de Dezembro de 2007.
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea i) do artigo 161.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, aprovar o Acordo entre a República Portuguesa e as Nações Unidas sobre a Execução de Sentenças do Tribunal Penal Internacional para a Ex-Jugoslávia, feito na Haia, em 19 de Dezembro de 2007, cujo texto, nas versões autenticadas nas línguas portuguesa e inglesa, se publica em anexo.
Aprovada em 18 de Julho de 2008.
O Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.
ACORDO ENTRE A REPÚBLICA PORTUGUESA E AS NAÇÕES UNIDAS SOBRE
A EXECUÇÃO DE SENTENÇAS DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA A
EX-JUGOSLÁVIA
A República Portuguesa, doravante denominada «Portugal», e as Nações Unidas, actuando através do Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia, doravante denominado «Tribunal Internacional»:Recordando o artigo 27.º do Estatuto do Tribunal Internacional adoptado pelo Conselho de Segurança na sua Resolução 827 (1993), de 25 de Maio de 1993, nos termos do qual a pena de prisão das pessoas condenadas pelo Tribunal Internacional deverá ser cumprida num Estado designado pelo Tribunal Internacional a partir da lista de Estados que manifestaram junto do Conselho de Segurança a sua disponibilidade para receber pessoas condenadas;
Considerando a declaração feita pela República Portuguesa nos termos do referido artigo 27.º e da lei portuguesa, na qual manifesta a sua disponibilidade para receber pessoas condenadas pelo Tribunal Internacional para efeitos de execução das penas de prisão;
Tendo em conta que a República Portuguesa adoptou uma lei que estabelece normas sobre a cooperação entre Portugal e os tribunais penais internacionais para a ex-Jugoslávia e para o Ruanda (Lei 102/2001, de 25 de Agosto);
Recordando as disposições contidas nas Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos aprovadas pelo Conselho Económico e Social das Nações Unidas nas suas Resoluções n.os 663 C (XXIV), de 31 de Julho de 1957, e 2076 (LXII), de 13 de Maio de 1977, o Conjunto de Princípios para a Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão adoptado pela Assembleia Geral na sua Resolução 43/173, de 9 Dezembro de 1988, e os Princípios Básicos Relativos ao Tratamento de Reclusos adoptados pela Assembleia Geral na sua Resolução 45/111, de 14 de Dezembro de 1990;
A fim de dar execução às sentenças e penas do Tribunal Internacional;
acordam no seguinte:
Artigo 1.º
Objecto e âmbito do Acordo
O presente Acordo regula as questões relacionadas com ou suscitadas por todos os pedidos de execução das penas impostas pelo Tribunal Internacional dirigidos a Portugal.
Artigo 2.º
Processo
1 - Um pedido de execução de uma sentença dirigido a Portugal deverá ser formulado pelo Secretário do Tribunal Internacional (doravante denominado «Secretário»), mediante aprovação do presidente do Tribunal Internacional.2 - Ao efectuar o pedido, o Secretário deverá fornecer a Portugal os seguintes documentos:
a) Uma cópia autenticada da sentença;
b) Uma declaração indicando o período de condenação já cumprido, incluindo informações sobre qualquer prisão preventiva;
c) Sempre que tal se revele oportuno, quaisquer relatórios médicos ou psicológicos sobre a pessoa condenada, qualquer recomendação para a continuação do seu tratamento em Portugal e qualquer outro elemento relevante para a execução da sentença.
3 - A autoridade central em Portugal competente para receber o pedido do Secretário referido no n.º 1 deste artigo é a Procuradoria-Geral da República.
4 - A Procuradoria-Geral da República deverá submeter o pedido ao Ministro da Justiça para decisão sobre a sua admissibilidade.
5 - A Procuradoria-Geral da República deverá informar prontamente o Secretário da decisão sobre o pedido, em conformidade com a lei portuguesa.
Artigo 3.º
Execução
1 - Ao executar a sentença proferida pelo Tribunal Internacional, as autoridades nacionais competentes de Portugal estão vinculadas à duração da pena.2 - Portugal só executará as sentenças proferidas pelo Tribunal Internacional que determinem a aplicação de penas de duração não superior ao limite máximo da pena então prevista para qualquer crime na lei portuguesa.
3 - As condições de reclusão deverão reger-se pela lei portuguesa, estando sujeitas à fiscalização do Tribunal Internacional, conforme o disposto nos artigos 6.º a 8.º e nos n.os 2 e 3 do artigo 9.º 4 - Se, nos termos do direito português, a pessoa condenada puder beneficiar de libertação antecipada, Portugal deverá notificar o Secretário em conformidade.
5 - O Presidente do Tribunal Internacional deverá, ouvidos os juízes do Tribunal Internacional, decidir se a libertação antecipada é uma medida adequada. O Secretário deverá informar Portugal da decisão do Presidente. Se o Presidente decidir que a libertação antecipada não é uma medida adequada, a sentença não poderá continuar a ser executada em Portugal, e o Secretário terá de tomar as providências adequadas à transferência da pessoa condenada nos termos do artigo 10.º 6 - As condições de reclusão deverão ser compatíveis com as Regras Mínimas para o Tratamento dos Reclusos, o Conjunto de Princípios para a Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão, os Princípios Básicos Relativos ao Tratamento de Reclusos e outras normas importantes em matéria de direitos humanos.
Artigo 4.º
Transferência da pessoa condenada
O Secretário deverá efectuar as diligências necessárias à transferência da pessoa condenada entre o Tribunal Internacional e as autoridades competentes de Portugal. O Secretário deverá informar a pessoa condenada sobre o conteúdo do presente Acordo antes da sua transferência.
Artigo 5.º
Non bis in idem
A pessoa condenada não pode ser julgada por um tribunal em Portugal por actos que constituem violações graves do direito internacional humanitário, nos termos do Estatuto do Tribunal Internacional, e pelos quais já tenha sido julgada pelo Tribunal Internacional.
Artigo 6.º
Monitorização das condições de reclusão
1 - As autoridades portuguesas deverão permitir que o Comité Europeu para a Prevenção da Tortura e de Outros Tratamentos ou Penas Desumanos ou Degradantes (doravante denominado «CPT») inspeccione em qualquer altura e periodicamente as condições de detenção, bem como o tratamento dado ao(s) recluso(s). A periodicidade das visitas é determinada pelo CPT. O CPT submeterá à apreciação de Portugal um relatório confidencial sobre as conclusões dessas inspecções. Portugal deverá remetê-lo ao Presidente do Tribunal Internacional.
2 - Portugal e o Presidente do Tribunal Internacional deverão consultar-se mutuamente sobre as conclusões dos relatórios referidos no n.º 1. O Presidente do Tribunal Internacional pode em seguida solicitar a Portugal que o informe de quaisquer alterações às condições de detenção propostas pelo CPT.
Artigo 7.º
Informações
1 - Portugal deverá informar de imediato o Secretário:a) Dois meses antes de cumprida a pena;
b) Sempre que a pessoa condenada se evadir antes de ter cumprido a respectiva pena;
c) Em caso de morte da pessoa condenada.
2 - Sem prejuízo do número anterior, a pedido de qualquer das Partes, o Secretário e Portugal deverão consultar-se mutuamente sobre todos os assuntos relacionados com a execução da sentença.
Artigo 8.º
Perdão, amnistia e comutação de penas
1 - Se, nos termos da lei portuguesa aplicável, a pessoa condenada puder beneficiar de perdão, amnistia ou comutação da pena, Portugal deverá notificar o Secretário em conformidade.
2 - O Presidente do Tribunal Internacional deverá, ouvidos os juízes do Tribunal Internacional, decidir se perdoar, amnistiar ou comutar a pena é uma medida adequada. O Secretário deverá informar Portugal da decisão do Presidente. Se o Presidente decidir que o perdão, a amnistia ou a comutação da pena não são uma medida adequada, Portugal deverá agir em conformidade.
Artigo 9.º
Cessação da execução
1 - A execução da sentença cessa:a) Quando a pena tiver sido cumprida;
b) Em consequência da morte da pessoa condenada;
c) Em consequência de perdão concedido à pessoa condenada;
d) Em consequência de uma decisão do Tribunal Internacional, nos termos do disposto no n.º 2.
2 - O Tribunal Internacional pode em qualquer momento decidir solicitar a cessação da execução em Portugal e transferir a pessoa condenada para um outro Estado ou para o Tribunal Internacional.
3 - As autoridades competentes de Portugal deverão cessar a execução da sentença logo que sejam informadas pelo Secretário de qualquer decisão ou medida que tenham por efeito retirar à sentença o seu carácter executório.
Artigo 10.º
Impossibilidade de executar a sentença
Se, em qualquer momento, após ter sido tomada a decisão de executar a sentença, por quaisquer razões legais ou práticas, a continuação da execução se tornar impossível, Portugal deverá informar de imediato o Secretário. Este deverá tomar as providências adequadas à transferência da pessoa condenada. As autoridades competentes de Portugal não deverão adoptar outras medidas relativas ao assunto antes de decorridos pelo menos 60 dias após a notificação ao Secretário.
Artigo 11.º
Despesas
Salvo acordo em contrário das Partes neste Acordo, o Tribunal Internacional deverá suportar as despesas relacionadas com a transferência da pessoa condenada de e para Portugal, e Portugal deverá suportar todas as outras despesas decorrentes da execução da sentença.
Artigo 12.º
Entrada em vigor
O presente Acordo entra em vigor após a notificação enviada por Portugal ao Tribunal Internacional de que foram cumpridos os requisitos de direito interno necessários para o efeito.
Artigo 13.º
Vigência do Acordo
1 - O presente Acordo permanece em vigor enquanto Portugal executar as sentenças do Tribunal Internacional nos termos e condições do presente Acordo.2 - Feitas as consultas, qualquer das Partes pode denunciar o presente Acordo mediante notificação feita com dois meses de antecedência. O presente Acordo permanece em vigor até que as penas às quais se aplica tenham sido cumpridas ou declaradas extintas e, se for caso disso, até que a pessoa condenada tenha sido transferida de acordo com o artigo 10.º Em fé do que, os abaixo assinados, devidamente autorizados para o efeito, assinam o presente Acordo.
Feito na Haia aos 19 de Dezembro de 2007, em dois exemplares, nas línguas portuguesa e inglesa, fazendo os dois textos igualmente fé.
Pela República Portuguesa:
(ver documento original) Pelas Nações Unidas:
(ver documento original)