Resolução do Conselho de Ministros n.º 128/2007
Em Portugal persistem problemas tradicionais de carência habitacional e, ao mesmo tempo, emergem novas necessidades habitacionais, num contexto marcado por disfunções em termos de oportunidades de escolha por parte dos vários segmentos da população e de níveis de qualidade da oferta disponível no mercado.
A concretização do acesso generalizado a uma habitação condigna e adequada às expectativas de uma sociedade moderna e desenvolvida não pode deixar de se associar à efectivação do fundamental direito à habitação consagrado no artigo 65.º da Constituição, requerendo a adopção de políticas públicas capazes de dinamizar os vários mercados associados ao sector da habitação.
A resolução dos problemas existentes e a criação de novas oportunidades no acesso à habitação tem ainda um enquadramento estratégico numa política de cidades, nomeadamente nas suas componentes de reabilitação do edificado e de revitalização demográfica, económica e cultural dos espaços urbanos. Ao garantir uma melhor articulação entre distintos instrumentos de política pública e uma maior participação e concertação de interesses, a política de cidades contribui para a boa prossecução dos objectivos especificamente definidos para o domínio da habitação.
Tais objectivos, de acordo com o Programa do XVII Governo, devem ser concretizados mediante o envolvimento concertado entre a administração central, as autarquias locais e as entidades privadas ou do sector cooperativo e associativo e assentam em três eixos fundamentais:
A dinamização do mercado do arrendamento, quer ao nível da reforma do arrendamento urbano quer através de uma gestão mais eficiente do parque de arrendamento público;
A prossecução de novas políticas sociais de habitação, visando dar resposta adequada a situações específicas, nomeadamente relativas a cidadãos idosos e portadores de deficiência, bem como aos jovens em busca de uma primeira habitação e às famílias sem meios para aceder ao mercado imobiliário privado;
A articulação da política de habitação com a requalificação e revitalização das cidades, tendo em vista, designadamente, reabilitar o parque degradado e requalificar o ambiente urbano.
É, assim, necessário garantir uma maior diversidade e flexibilização de respostas e, por essa via, uma maior adequação de soluções no que se refere a aspectos que se complementam entre si, como a oferta de habitação a custos controlados, a reabilitação e qualificação do parque habitacional disponível e a dinamização do mercado de arrendamento.
No que toca especificamente à dinamização do mercado de arrendamento, o Governo tomou já a iniciativa da reforma do regime jurídico do arrendamento urbano, operada através da aprovação do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) pela Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, e da publicação de um conjunto de diplomas complementares.
Importa, agora, dispor de instrumentos que favoreçam a gestão sustentável do parque habitacional tanto público como privado destinado a arrendamento com vocação social, que estimulem a mobilidade residencial associada a esse parque habitacional e que incentivem o arrendamento.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Aprovar a Iniciativa Porta 65 e os objectivos, os instrumentos de execução e o modelo de organização e funcionamento a que essa Iniciativa deve obedecer, de acordo com o determinado no anexo à presente resolução, da qual faz parte integrante.
2 - A presente resolução entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Presidência do Conselho de Ministros, 21 de Junho de 2007. - O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
ANEXO
Iniciativa Porta 65
1 - Enquadramento e objectivos. - A Iniciativa Porta 65, abreviadamente designada por Porta 65 ou por Iniciativa, é criada na prossecução dos objectivos da política de habitação do XVII Governo Constitucional, enquadrando-se na política social de habitação em articulação com outros instrumentos de planeamento e gestão, designadamente:a) Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT);
b) Política de Cidades Polis XXI;
c) Plano Estratégico da Habitação e da Reabilitação;
d) Recomendações resultantes das actividades de análise, acompanhamento e avaliação desenvolvidas no âmbito do Observatório da Habitação e da Reabilitação Urbana;
e) Outros documentos estratégicos e instrumentos de planeamento e gestão, especialmente nas áreas da acção social, da saúde e da educação.
1.1 - Missão. - A Iniciativa Porta 65 tem como missão promover um mercado de arrendamento para habitação mais dinâmico, através do apoio à gestão do parque habitacional, público ou privado, destinado a arrendamento com vocação social, do estímulo à criação de novas soluções de gestão da oferta e da procura que favoreçam a mobilidade residencial associada a esse parque e da criação de instrumentos de incentivo ao arrendamento.
Inserindo-se a missão da Porta 65 no âmbito das atribuições cometidas ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), incumbe a este Instituto assegurar, em moldes de flexibilidade funcional e eficácia de gestão, a prossecução dos objectivos da Iniciativa através da intervenção concertada do Estado, das autarquias locais e de outras entidades, públicas, privadas ou cooperativas.
1.2 - Objectivos. - São considerados objectivos específicos da Iniciativa Porta 65:
a) Atingir um espectro de beneficiários diversificado, dando resposta às respectivas necessidades habitacionais mediante soluções de arrendamento caracterizadas quer pela sua vocação social quer pela promoção da autonomização dos residentes na construção dos seus percursos residenciais, em articulação com outros apoios sociais;
b) Promover uma mobilidade residencial, tanto no interior do parque habitacional público como entre este e o parque privado, adequando-a às trajectórias geográficas e variações da capacidade económica das famílias e dos indivíduos e baseada em princípios de transparência e equidade no acesso à habitação disponível para arrendamento com vocação social;
c) Dinamizar soluções público-privadas para a disponibilização de fogos dispersos para arrendamento com vocação social, garantindo uma rendibilidade equilibrada e um contexto de confiança no sistema de funcionamento desse mercado e contrariando a tendência para a concentração de respostas em bairros específicos, a persistência de fogos devolutos e a degradação do parque habitacional;
d) Promover uma gestão integrada e sustentável do parque habitacional do Estado, bem como das autarquias que pretendam integrar a Iniciativa, para arrendamento público, baseada nos princípios do planeamento, da monitorização, da flexibilidade, da descentralização e da participação;
e) Contratualizar a gestão de proximidade do parque para arrendamento com vocação social com entidades com objectivos de intervenção sócio-urbanística, nomeadamente associações com fins assistenciais e de solidariedade social, organizações não governamentais (ONG), régies cooperativas ou microempresas de gestão de proximidade;
f) Promover a articulação dos instrumentos de apoio e incentivo à gestão, reabilitação e revitalização do parque para arrendamento com vocação social;
g) Disponibilizar informação e apoio técnico à profissionalização da actividade de gestão do parque habitacional para arrendamento com vocação social.
2 - Instrumentos. - A Iniciativa Porta 65 pressupõe a existência dos instrumentos necessários para, com o envolvimento concertado entre a administração central, as autarquias locais e entidades públicas, privadas ou do sector cooperativo e associativo, assegurar um leque de soluções ao nível do arrendamento com vocação social em complementaridade com a dinamização introduzida pelo NRAU no mercado do arrendamento.
Nesse sentido, até ao final de 2007, devem ser adoptadas as iniciativas legislativas e institucionais que consagrem os seguintes instrumentos de execução da Porta 65:
a) Porta 65 - Bolsa de Habitação & Mobilidades - instrumento de gestão da disponibilização de habitações de propriedade pública e privada para arrendamento directo ou mediado, através de um sistema de bolsa de habitações disponíveis para arrendamento;
b) Programa Porta 65 - Jovem - instrumento de apoio financeiro ao arrendamento por jovens, isolados, constituídos em agregados ou em coabitação;
c) Programa Porta 65 - Gestão e Proximidade - instrumento de apoio à gestão de proximidade do parque para arrendamento com vocação social, através da contratualização com entidades locais previamente certificadas como agências de intervenção local para a gestão do parque habitacional e de apoio técnico à profissionalização da actividade de gestão desse parque de arrendamento;
d) Programa Porta 65 - Residência (Coabitação) Apoiada - instrumento de apoio à promoção, por entidades que prossigam fins assistenciais e de solidariedade social, de soluções de arrendamento em residências colectivas para grupos populacionais com necessidades específicas ou temporárias, tais como pessoas sem abrigo, idosos ou imigrantes.
3 - Organização e gestão. - A Iniciativa Porta 65 integra-se no âmbito das atribuições do IHRU, que deverá assegurar a coordenação funcional e a eficácia de gestão necessárias à prossecução dos objectivos desta Iniciativa. Assim, a gestão central da Iniciativa é cometida ao IHRU, nos termos a definir pelo respectivo conselho directivo, constituindo-se também um grupo de trabalho que promove a concertação entre as várias entidades com intervenção no domínio do direito social à habitação.
3.1 - Gestão central. - Deve o IHRU, através da afectação dos seus recursos logísticos e humanos, nos termos definidos em deliberação do conselho directivo, assegurar a gestão central da Iniciativa, cabendo-lhe:
a) Propor um plano plurianual para a Iniciativa, acompanhado por planos anuais de desenvolvimento de cada um dos seus instrumentos;
b) Propor e assegurar, no âmbito das suas atribuições, medidas de optimização de gestão do parque de arrendamento público, em concertação com as autarquias e em proximidade com os seus beneficiários;
c) Propor, organizar e assegurar a gestão de uma «bolsa de habitações para arrendamento com vocação social», a angariar junto de proprietários públicos e privados ou fundos de investimento imobiliário, a ser disponibilizada através de uma plataforma de acesso rápido e transparente, pautada por uma definição de prioridades para o seu acesso, proposta pelo IHRU em concertação com os seus parceiros e validada anualmente pela tutela;
d) Propor, desenvolver e gerir instrumentos de apoio ao arrendamento e à disponibilização de soluções habitacionais para os segmentos populacionais mais vulneráveis no acesso ao mercado de arrendamento, nomeadamente a população jovem e idosa, a população com graves carências habitacionais e a população com necessidades específicas em termos de mobilidade georresidencial;
e) Propor, desenvolver e gerir programas e medidas de informação e de apoio técnico orientados para a gestão de proximidade do parque habitacional público ou privado mas destinado a arrendamento com vocação social;
f) Manter actualizada a base de dados relativa aos recursos disponibilizados por cada um dos instrumentos da Iniciativa bem como aos respectivos candidatos e beneficiários;
g) Criar e desenvolver uma plataforma de informação e comunicação relativa aos vários instrumentos da Porta 65 e mantê-la actualizada de forma a permitir uma adequada gestão de oportunidades por parte dos agentes disponibilizadores de recursos e dos seus utilizadores, em articulação com o Portal da Habitação;
h) Certificar, contratualizar, monitorizar e fiscalizar as agências de gestão e intervenção local contratualizadas para a gestão em proximidade do parque de arrendamento com vocação social (Programa Porta 65 - Gestão e Proximidade) e apoiar tecnicamente a sua actividade;
i) Assegurar o funcionamento do grupo de trabalho.
3.2 - Grupo de trabalho. - A composição do grupo de trabalho da Iniciativa Porta 65 deve reflectir o envolvimento concertado entre a administração central, as autarquias locais e as entidades públicas, privadas ou do sector cooperativo e associativo.
Deve o grupo de trabalho assegurar a concertação estratégica entre os vários actores sociais envolvidos na política de arrendamento com vocação social e a sua participação na prossecução dos objectivos estratégicos e operacionais da Porta 65.
A Iniciativa Porta 65 poderá activar conselhos consultivos locais ou recorrer às redes sociais, a solicitação das autarquias, de agrupamento destas ou por iniciativa do IHRU, sempre que o volume de actividade no âmbito dos diversos instrumentos assim o justifique.
4 - Agências de gestão e intervenção local. - Fazem parte integrante do Programa Porta 65 - Gestão e Proximidade as agências de gestão e intervenção local (AGIL), cabendo-lhes a promoção da execução do modelo de gestão do parque de arrendamento público, numa lógica de proximidade e de intervenção integrada.
O início e o desenvolvimento da actividade das AGIL são promovidos em directa ligação com a gestão central da Porta 65.
Poderão candidatar-se a AGIL, através da celebração de protocolos de cooperação ou contratos de prestação de serviços, as entidades cuja natureza e atribuições a gestão central da Iniciativa Porta 65 considere adequadas à prossecução dos fins desta Iniciativa, nomeadamente cooperativas ou régies cooperativas, ONG, IPSS, associações que prossigam fins assistenciais e de solidariedade social, empresas municipais, microempresas ou PME, juntas de freguesia ou associações de moradores.
5 - Encargos. - Cabe ao IHRU gerir os encargos com as despesas de administração da Iniciativa Porta 65, sendo as verbas necessárias para o efeito previstas nos diplomas que irão regular os instrumentos de execução da mesma.