Resolução do Conselho de Ministros n.º 45/2006
O conhecimento dos limites e da titularidade da propriedade é reconhecidamente imprescindível para as actividades de planeamento, gestão e apoio à decisão sobre a ocupação e uso do território, para a regulação da repartição das mais-valias fundiárias e para a gestão, controlo e desenvolvimento dos recursos naturais das obras públicas.
A localização é um referencial comum aos serviços da Administração Pública, às empresas e ao cidadão.
A existência de um cadastro contribui decisivamente para um aumento da eficiência dos serviços públicos. Ao servir de suporte transversal a múltiplos tipos de dados e estruturas de informação, constitui-se como um vector chave para a modernização administrativa e desburocratização de processos e procedimentos e para o aumento da transparência nos processos públicos de decisão.
Assim, o cadastro, enquanto conjunto de dados, metódico e actualizado, caracterizador e identificador dos prédios de uma determinada região, constitui uma ferramenta indispensável para as políticas de ordenamento do território, ambiente, económicas, fiscal e de obras públicas.
A necessidade de cadastro dos prédios rústicos é particularmente urgente nos espaços florestais de propriedade fragmentada onde, por falta de ordenamento e gestão, o problema dos incêndios se tem agravado.
Além disso, uma informação actualizada sobre a estrutura predial do País conduz a uma maior e mais equilibrada justiça fiscal e social e viabiliza a criação de novos produtos e serviços emergentes do cadastro predial, permitindo obter um maior retorno financeiro do investimento a efectuar na sua produção.
O Sistema Nacional de Exploração e Gestão de Informação Cadastral, adiante designado por SINERGIC, é importante para o sucesso de uma medida fundamental do Programa do Governo - a informação predial única, uma vez que, independentemente das várias formas como pode ser descrito um prédio, este encontra-se registado de acordo com a sua localização e geometria. Só assim se consegue um suporte eficaz para a reconciliação e condensação sistemática da realidade factual da propriedade imobiliária com o registo predial, as inscrições matriciais e as informações cadastrais.
A informação predial única, medida central do Programa do XVII Governo Constitucional, consiste na reconciliação e condensação sistemática da realidade factual da propriedade imobiliária com o registo predial, as inscrições matriciais e as informações cadastrais.
Assim, a criação do SINERGIC contribui com um decisivo passo no sentido da implementação desta medida, porquanto a disponibilização, num sistema de informação cadastral, do proprietário inscrito no registo predial, bem como da sua identificação fiscal, envolve, necessariamente, um dos passos do trabalho de harmonização das informações da competência de diversas entidades, pressuposto essencial da criação de uma informação predial única.
Em Portugal, o maior esforço de execução cadastral ocorreu entre as décadas de 30 e 90 do século XX, tendo sido efectuado o cadastro geométrico da propriedade rústica (CGPR) em 126 concelhos, correspondentes a cerca de 50% da área total do País, mas, como a própria designação o faz prever, apenas os prédios rústicos dos concelhos abrangidos foram cadastrados.
Mais ainda, a área coberta, maioritariamente na região Sul do continente, corresponde a regiões onde o fraccionamento da propriedade não é muito significativo. Assim, em termos do número de prédios, o trabalho realizado em, aproximadamente, dois milhões de prédios rústicos apenas corresponde a cerca de 12% do universo.
Embora estivesse previsto na legislação de suporte ao CGPR que o esforço de actualização periódica seria competência do Estado, tal não se verificou.
Assim, apenas se efectuam actualizações pontuais, a pedido do proprietário, suportando este todas as despesas inerentes ao processo.
O Decreto-Lei 172/95, de 18 de Julho, alterou substancialmente os conceitos relativos ao cadastro, criando o cadastro predial. As alterações mais significativas dizem respeito à cobertura integral do território, à abertura ao mercado privado da produção de informação cadastral e à criação de um identificador único para os prédios, o número de identificação do prédio, garantindo o carácter multifuncional do cadastro.
A partir dessa data, iniciaram-se os trabalhos de execução do cadastro predial, os quais abrangeram apenas cinco concelhos, significando a cobertura de cerca de 1,5% do território nacional.
Segundo a actual legislação do cadastro predial, o anterior CGPR deveria sofrer uma operação de renovação cadastral com o objectivo de cadastrar os prédios urbanos para além da actualização da informação existente, mas tal não ocorreu. Apenas tem sido realizado um esforço, também em parceria com municípios e associações de municípios, de conversão para formato digital dos elementos cadastrais do CGPR.
No que respeita aos entraves colocados pela excessiva fragmentação da propriedade para a gestão e protecção da floresta contra incêndios, decidiu já o Governo criar os mecanismos legais de constituição de zonas de intervenção florestal (ZIF), bem como de benefícios emolumentares com vista à regularização da situação jurídica dos prédios sitos em áreas de floresta, e ainda a criação da possibilidade de virem as autarquias a decidir do aumento do imposto municipal sobre os imóveis (IMI) quando os prédios rústicos não estejam a ser objecto de gestão florestal apropriada.
Considerando que o Instituto Geográfico Português tem por missão exercer a função de autoridade nacional de cartografia, produzir informação geográfica oficial, desenvolver e coordenar o sistema nacional de informação geográfica, promover a formação e a investigação nos domínios das tecnologias de informação geográfica e contribuir para a dinamização da sociedade de informação;
Considerando manifestamente escassa a cobertura territorial do cadastro predial, em parte motivada pela complexidade imposta pela legislação vigente que regista um desfasamento acentuado face à realidade;
Considerando a premência de dotar o País de uma base cadastral consentânea com os interesses e necessidades actuais da sociedade;
Considerando que tal objectivo só é possível com um esforço partilhado;
Considerando, também, que o sucesso das medidas já tomadas pelo Governo visando a protecção da floresta contra incêndios está dependente da existência de uma base cadastral actualizada nos espaços de floresta;
Tendo por referência as Grandes Opções do Plano 2005-2009 e o Programa do Governo, em que se aponta claramente para a necessidade de Portugal, um dos poucos países da Europa dos 25 onde ainda não há cadastro, conciliar as vontades e interesses que permitam suprir esta grave lacuna;
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas e a Associação Nacional de Municípios Portugueses:
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Aprovar as linhas orientadoras para a execução, manutenção e exploração de informação cadastral através da criação do Sistema Nacional de Exploração e Gestão de Informação Cadastral (SINERGIC), com os seguintes objectivos:
a) Assegurar a identificação unívoca dos prédios, mediante a utilização de um número único de identificação do prédio, comum a toda a Administração Pública, promovendo a criação futura de uma informação predial única;
b) Unificar, num único sistema de informação, os conteúdos cadastrais existentes e a produzir;
c) Permitir uma gestão uniforme e informática dos conteúdos cadastrais;
d) Garantir a sua compatibilidade com os sistemas informáticos utilizados pelas várias entidades envolvidas no projecto;
e) Assegurar que a descrição predial do registo predial é acompanhada de um suporte gráfico;
f) Possibilitar a utilização generalizada do sistema pela Administração Pública;
g) Assegurar o acesso à informação pelo cidadão e pelas empresas, designadamente por via electrónica e com garantia da protecção dos dados pessoais envolvidos.
2 - O desenvolvimento do SINERGIC deve observar as seguintes orientações:
a) Partilha de responsabilidades quanto ao conteúdo da informação constante no SINERGIC e respectiva actualização pelas várias entidades competentes para a sua produção;
b) Actualização da informação pelas entidades competentes para a sua produção, respeitando princípios de validação e harmonização que garantam a coerência da mesma;
c) Adopção do princípio da subsidiariedade, no sentido de a informação ser recolhida e transmitida pelas entidades legalmente competentes que mais adequadamente a possam prestar, designadamente tendo em conta factores de proximidade geográfica;
d) Manutenção, gestão e distribuição do SINERGIC pelo Instituto Geográfico Português, em ligação com a Direcção-Geral dos Impostos, a Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros, a Direcção-Geral das Autarquias Locais e a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado.
3 - A informação a introduzir no sistema deve assumir uma natureza simplificada, representando apenas a configuração geométrica dos prédios e outros elementos de base territorial a ela imprescindível, na qual é ainda possível incluir, a título meramente informativo, outros elementos com utilidade para o sistema, nomeadamente a indicação do proprietário inscrito no registo predial e respectivo número de identificação fiscal.
4 - Na actualização dos dados do registo predial, deve ser ponderada a adopção das seguintes medidas:
a) Promoção do registo da propriedade, designadamente através de mecanismos de simplificação das rectificações, das descrições e das inscrições, incluindo a inscrição de prédios omissos;
b) Adopção de benefícios emolumentares.
5 - Devem ser adoptadas medidas que permitam a actualização constante da informação exclusivamente cadastral introduzida no sistema, independentemente da sua harmonização com as informações da competência das restantes entidades envolvidas.
6 - Devem ser criados mecanismos de reconhecimento e harmonização da informação disponibilizada pelas várias entidades intervenientes no projecto.
7 - Deve ser conferida especial prioridade e urgência aos trabalhos conducentes à realização do cadastro nas áreas de floresta, utilizando a informação geográfica actualmente disponível, em particular aquela que tenha resultado da constituição do «parcelário» desenvolvido pelo Instituto Nacional de Garantia Agrícola (INGA), bem como de outra informação produzida por entidades na dependência do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
8 - Incumbe ao Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional a responsabilidade pela condução do desenvolvimento do SINERGIC, em colaboração com os Ministros de Estado e das Finanças, de Estado e da Administração Interna, da Justiça e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
9 - Determinar a adopção das seguintes medidas prioritárias, com vista ao desenvolvimento do SINERGIC:
a) Proceder à elaboração de uma proposta de quadro legal de suporte ao SINERGIC, designadamente através da revisão do Decreto-Lei 172/95, de 18 de Julho;
b) Definir o modelo do sistema de informação do SINERGIC e a sua forma de implementação;
c) Definir as especificações técnicas para produção de informação cadastral.
10 - A elaboração de uma proposta de quadro legal de suporte ao SINERGIC é apresentada por um grupo de trabalho constituído por um representante das seguintes entidades:
a) Instituto Geográfico Português, que coordena;
b) Direcção-Geral dos Impostos;
c) Direcção-Geral das Autarquias Locais;
d) Direcção-Geral dos Registos e do Notariado.
11 - A apresentação de uma proposta modelo do SINERGIC e a sua forma de implementação é efectuada por um grupo de trabalho constituído por um representante das seguintes entidades:
a) Instituto Geográfico Português, que coordena;
b) Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros;
c) Direcção-Geral dos Impostos;
d) Direcção-Geral dos Registos e do Notariado;
e) Direcção-Geral dos Recursos Florestais;
f) Direcção-Geral das Autarquias Locais;
g) Direcção Regional de Geografia e Cadastro;
h) Associação Nacional de Municípios Portugueses;
i) Unidade de Coordenação da Modernização Administrativa.
12 - É criado um subprojecto denominado «Cadastro das áreas de floresta», no âmbito do SINERGIC, cujo desenvolvimento incumbe a um grupo de trabalho coordenado pelo Instituto Geográfico Português e que deve incluir a Direcção-Geral dos Recursos Florestais (DGRF), bem como outras entidades na dependência do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas que produzam ou detenham informação cadastral.
13 - Ao grupo de trabalho referido no número anterior incumbe o seguinte:
a) Propor a planificação dos trabalhos e dos recursos financeiros e humanos necessários para que, no prazo de três anos, se possa avançar significativamente nos trabalhos do cadastro das áreas de floresta, assegurando, como objectivo mínimo, a cobertura das áreas públicas comunitárias e as áreas integradas em ZIF;
b) Assegurar o cumprimento do plano de trabalhos adoptado nos termos da alínea anterior, garantindo a articulação com o SINERGIC, no que respeita à criação, validação e integração da informação.
14 - A definição das especificações técnicas para produção de informação cadastral é efectuada pelo Instituto Geográfico Português.
15 - As medidas previstas nos n.os 9, 10, 11 e 13 obedecem à seguinte calendarização:
a) As medidas referidas nos n.os 10 e 11 devem ser concretizadas até 15 de Abril de 2006;
b) As medidas referidas na alínea b) do n.º 9 e na alínea a) do n.º 13 devem ser concretizadas até 30 de Abril de 2006;
c) As medidas referidas nas alíneas a) e c) do n.º 9 devem ser concretizadas até 30 de Junho de 2006.
16 - A presente resolução produz efeitos desde a data da sua aprovação.
Presidência do Conselho de Ministros, 23 de Março de 2006. - O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.